12/18/06

Arte maconde elucida sobre história da etnia nas Ilhas Reunião.


Ilhas Reunião - Saint Denis - Há um nome (de um homem provavelmente moçambicano) a reter á entre nós: Dominique Maconde, um dos vários homens e mulheres que, nos séculos XVII, XVIII e mesmo XIX, principalmente, foi capturado nas suas terras como escravo para as ilhas do Índico, onde se encontra, na Reunião.
Quis a sorte - ou azar - que fosse parar naquela antiga colónia e hoje província ultramarina da França.
Sabe-se que se chamava Maconde (os franceses, ou reunionenses, escrevem e pronunciam Macondé).
Terá para lá ido parar transportado num dos vários navios que transportavam escravos depois de ter sido tirado ou da terra dos macondes, no planalto de Mueda, ou a algures no Sul do Tanzânia, pois esta tribo e cultura é partilhada pelo nosso país e o seu vizinho do norte.
Acredita-se mais que Maconde, que recebeu o nome Dominique para identificação no seu trabalho, terá saído do território moçambicano.
A sua alusão por estes dias vem do facto de a Reunião estar a comemorar o 158º aniversário da abolição (oficial) da escravatura pelo Estado francês e na ilha, em particular, que coincide com o 60º da transformação desta de colónia para "département", ou seja, província da França.
Foi a 20 de Dezembro que os governantes gauleses decidiram acabar com o comércio de escravos.
A transformação do estatuto de colónia para província ultramarina aconteceu em 19 de Março de 1946.
Moçambique é precisamente o convidado de honra das celebrações este ano do 20 de Dezembro, que é feriado aqui na Reunião.
O fim da escravatura que é por estes dias recordado é visto tanto pelos reunionenses como pelos moçambicanos como momento para a celebração de um passado - e presente - comuns, uma vez que o povoamento desta ilha teve em Moçambique como um ponto de partida.
Assim, rebuscam-se laços históricos e culturais comuns, o que aqui é atribuído grande valor.
Uma exposição artística e etnológica baseada em tradições maconde, temática principal escolhida, pela sua representatividade e significado histórico, celebra essa ligação entre moçambicanos e reunionenses.
A mostra, que decorre desde sexta-feira à noite num museu de Saint-Paul, a segunda maior cidade da Reunião depois da capital Saint-Denis, reúne essencialmente trabalhos de arte maconde moçambicana.
A ceramista Redinata Sadimba, com cerca de 30 obras, é a mais representativa, numa exposição que conta também com trabalhos que espelham o talento e a criatividade do xilogravurista Matias Ntundo e Miguel Vaingue, entre outros.
A mostra é denominada "Dominique Macondé", em alusão a tal escravo que deverá ter sido moçambicano e que ficou célebre aqui por ter sido avaliado pela sua dona por mais de mil francos (uma fortuna no século XVIII) e inclusive ter para ele sido deixado a herança dela, por meio de um testamento de um museu das Ilhas Reunião.
As obras da exposição pertenceram às colecções dos museus nacionais de Arte, sediado na cidade de Maputo, e de Etnologia, que está em Nampula.
Os respectivos directores, Juleita Massime e Guilherme Kulyumba, a historiadora de arte (especializada em arte maconde) Alda Costa e o italiano radicado em Moçambique Gianfranco Gondolfo foram, a par do director do museu da Reunião, os responsáveis pela montagem desta mostra que é, sublinhe-se, impressionante.
O primeiro andar do museu - que é uma antiga casa de uma das mais terríveis esclavagistas da Reunião - está repleto de trabalhos de arte que contam a história e mostram os principais traços culturais dos macondes.
Através de máscaras e até utensílios domésticos e musicais, os que não conhecem a arte e a civilização maconde ficam com ideia clara do simbolismo que esta representa no mosaico cultural que é Moçambique.
Um dos pontos interessantes da exposição é que para além das simples legendas aos trabalhos exibidos apresenta projecções multimédia de actividades que elucidam o vigor desta civilização que tem no planalto de Mueda o seu berço.
Também esta lá, numa das primeiras salas do piso do museu que hospeda a obra, um poema de Noémia de Sousa, "Se Me Quiseres Conhecer", como que a instruir os apreciadores da mostra ao que devem fazer para saberem quem são e de onde vêm os macondes.
A exposição vai durar até Julho de 2007.
MUSEUS E ARQUIVOS
Entretanto, no âmbito de um convite formulado pelo Governo semi-autónomo das Ilhas Reunião, chegou ontem a Saint-Denis o vice-ministro da Educação e Cultura, Luís Covane, que deverá aqui permanecer até sexta-feira e assinar com os responsáveis deste "département" francês acordos de cooperação cultural.
Segundo apurou o "Notícias" nesta capital, serão assinados acordos na área dos museus e dos arquivos, cujo acesso e tratamento são bem necessários para estudiosos (e não só) dos dois países, engajados na pesquisa sobre a sua história comum ou particular.
No âmbito das comemorações do 20 de Dezembro, artistas moçambicanos encontram-se aqui para algumas actuações e intercâmbios com os seus colegas locais.
Trata-se de um pequeno grupo de timbila de Inhambane e de um duo de mapiko, que deverão exibir-se amanhã num dos principais locais culturais da ilha.
Os moçambicanos antecederão a actuação de Miriam Makeba, a legendária cantora sul-africana que se encontra a efectuar a sua última digressão da carreira.
Makeba chegou ontem à Reunião no mesmo voo com o vice-ministro Covane.
A sua actuação está repleta de curiosidade, visto que a maioria dos ilhéus nem sequer a conhecem, apesar de ela ter durante algum tempo do seu exílio devido ao "apartheid" na África do Sul ter morado em França e lá ter efectuado vários espectáculos, cantando algumas canções em Francês, caso de "Come Un Sinphonie d'Amour".
Os moçambicanos que aqui se encontram já são algo conhecidos, uma vez que nesta terra tão pequena realizaram já uma actuação, bastante mediatizada.
Foi uma pequena demonstração, na noite de sexta-feira, durante a inauguração da mostra "Dominique Macondé".
GIL FILIPE, em Saint-Denis - Ilhas Reunião. - Maputo, Segunda-Feira, 18 de Dezembro de 2006:: Notícias

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