3/03/08

Moçambique, turismo e a ocupação desordenada do litoral de Pemba...III

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui)
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Sobre a ocupação desordenada e irresponsável do litoral de Pemba, os "alertas" vêm sendo feitos já hà alguma tempo. Será que os escutam ?...
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Do livro “O MAR QUE TOCA EM TI” escrito e publicado por Inez Andrade Paes em 2006:

Dia de Natal.
Um dia como os outros, talvez mais sereno que o anterior. As ondas também calmas convidam a chegar à água.
A manhã passou como habitualmente com a companhia das crianças e de alguns jovens. Antes da hora de maior calor surgem com mais ventos e ondas no Mar, no passeio que vem dar à casa dois homens.
Um que trabalha na recepção e um jornalista da rádio local.
- Podemos fazer-lhe uma entrevista?
- Sim!?
- Estamos a entrevistar todos os estrangeiros que vieram para passar esta época connosco e saber o que estão a achar de Pemba.
- Eu não sou estrangeira. Nasci em Pemba e tenho muito gosto em falar da minha terra e de vos dizer o que acho depois de anos de ausência.
O jornalista ainda hesitou em fazer-me a entrevista, porque era só para estrangeiros, mas ligou na mesma o microfone. Esta poderia ser sempre incluída noutro programa.

- Falei da beleza do Mar da forma como cada um de nós olha para ele e transmite a sua voz. Do recorte da praia que foi alterado, para um recorte protuberante e enriquecido só para uma minoria, devastado para aqueles que só dali vivem. A barreira de coral que meticulosamente vai perdendo o seu bordado, impedindo-a de fazer o seu trabalho. O Mar entra agora com mais fúria, uma fúria preventiva a mostrar um alerta urgente.
Venho de longe mas aqui pertenço. Venho de longe o Mar me chamou para dar som a vozes adormecidas a olhares perdidos e desencantados. Moralmente me obrigo e pela voz do Mar o faço.-

A entrevista foi dada.
O jornalista curiosamente tinha o mesmo nome que o de minha Mãe, fora ela que tinha inaugurado aquele emissor. O Emissor Regional de Cabo Delgado.
Não consegui ouvir a entrevista que foi transmitida duas vezes em dias separados. Soube-o mais tarde já na capital, mas consegui ouvir o som do martelo com ponta de borracha que batia nas placas de metal cada vez que se fazia uma pausa de programa ou principiava ou acabava a emissão. Como fez rir e sorrir e voltar a rir o seu som a tocar na memória tão presente.

Vejo-os ir. O jornalista com o gravador à tiracolo com os fios do microfone a tombar de lado e o recepcionista com seu olhar cativante e simpático. Tinha feito parte da promessa ao Mar...
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Inez Andrade Paes, natural de Pemba - Moçambique e residente em Portugal é também, além de poetisa, artista plástica e escritora.
Alguns de seus trabalhos podem ser apreciados na net aqui:

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