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7/25/12

Recortes - Moçambique: a maldição da abundância?

25/7/2012 15:32,  Por Boaventura de Sousa Santos

A “maldição da abundância” é uma expressão usada para caracterizar os riscos que correm os países pobres onde se descobrem recursos naturais objeto de cobiça internacional. A promessa de abundância decorrente do imenso valor comercial dos recursos e dos investimentos necessários para o concretizar é tão convincente que passa a condicionar o padrão de desenvolvimento económico, social, político e cultural.

Os riscos desse condicionamento são, entre outros: crescimento do PIB em vez de desenvolvimento social; corrupção generalizada da classe política que, para defender os seus interesses privados, se torna crescentemente autoritária para se poder manter no poder, agora visto como fonte de acumulação primitiva de capital; aumento em vez de redução da pobreza; polarização crescente entre uma pequena minoria super-rica e uma imensa maioria de indigentes; destruição ambiental e sacrifícios incontáveis às populações onde se encontram os recursos em nome de um “progresso” que estas nunca conhecerão; criação de uma cultura consumista que é praticada apenas por uma pequena minoria urbana mas imposta como ideologia a toda a sociedade; supressão do pensamento e das práticas dissidentes da sociedade civil sob o pretexto de serem obstáculos ao desenvolvimento e profetas da desgraça. Em suma, os riscos são que, no final do ciclo da orgia dos recursos, o país esteja mais pobre econômica, social, política e culturalmente do que no seu início. Nisto consiste a maldição da abundância.

Depois das investigações que conduzi em Moçambique entre 1997 e 2003 visitei o país várias vezes. Da visita que acabo de fazer colho uma dupla impressão que a minha solidariedade com o povo moçambicano transforma em dupla inquietação. A primeira tem precisamente a ver com a orgia dos recursos naturais. As sucessivas descobertas (algumas antigas) de carvão (Moçambique é já o sexto maior produtor de carvão a nível mundial), gás natural, ferro, níquel, talvez petróleo anunciam um El Dorado de rendas extrativistas que podem ter um impacto no país semelhante ao que teve a independência. Fala-se numa segunda independência. Estarão os moçambicanos preparados para fugir à maldição da abundância? Duvido.

As grandes multinacionais, algumas bem conhecidas dos latino-americanos, como a Rio Tinto e a brasileira Vale do Rio Doce (Vale Moçambique) exercem as suas atividades com muito pouca regulação estatal, celebram contratos que lhe permitem o saque das riquezas moçambicanas com mínimas contribuições para o orçamento de estado (em 2010 a contribuição foi de 0,04%), violam impunemente os direitos humanos das populações onde existem recursos, procedendo ao seu reassentamento (por vezes mais de um num prazo de poucos anos) em condições indignas, com o desrespeito dos lugares sagrados, dos cemitérios, dos ecossistemas que têm organizado a sua vida desde há dezenas ou centenas de anos.

Sempre que as populações protestam são brutalmente reprimidas pelas forças policiais e militares. A Vale é hoje um alvo central das organizações ecológicas e de direitos humanos pela sua arrogância neo-colonial e pelas cumplicidades que estabeleceu com o governo. Tais cumplicidades assentam por vezes em perigosos conflitos de interesses, entre os interesses do país governado pelo Presidente Guebuza e os interesses das empresas do empresário Guebuza donde podem resultar graves violações dos direitos humanos como quando o ativista ambiental Jeremias Vunjane, que levava consigo para a Conferência da ONU, Rio+20, denúncias dos atropelos da Vale, foi arbitrariamente impedido de entrar no Brasil e deportado (e só regressou depois de muita pressão internacional), ou quando, às organizações sociais é pedida uma autorização do governo para visitar as populações reassentadas como se estas vivessem sob a alçada de um agente soberano estrangeiro.

São muitos os indícios de que as promessas dos recursos começam a corromper a classe política de alto a baixo e os conflitos no seio desta são entre os que “já comeram “ e os que “querem também comer”. Não é de esperar que nestas condições, os moçambicanos no seu conjunto beneficiem dos recursos. Pelo contrário, pode estar em curso a angolanização de Moçambique. Não será um processo linear porque Moçambique é muito diferente de Angola: a liberdade de imprensa é incomparavelmente superior; a sociedade civil está mais organizada; os novos-ricos têm medo da ostentação porque ela zurzida semanalmente na imprensa e também pelo medo dos sequestros; o sistema judicial, apesar de tudo, é mais independente para atuar; há uma massa crítica de acadêmicos moçambicanos credenciados internacionalmente capazes de fazer análises sérias que mostram que “o rei vai nu”.

A segunda impressão/inquietação, relacionada com a anterior, consiste em verificar que o impulso para a transição democrática que observara em estadias anteriores parece estancado ou estagnado. A legitimidade revolucionária da Frelimo sobrepõe-se cada vez mais à sua legitimidade democrática (que tem vindo a diminuir em recentes atos eleitorais) com a agravante de estar agora a ser usada para fins bem pouco revolucionários; a partidarização do aparelho de estado aumenta em vez de diminuir; a vigilância sobre a sociedade civil aperta-se sempre que nela se suspeita dissidência; a célula do partido continua a interferir com a liberdade acadêmica do ensino e investigação universitários; mesmo dentro da Frelimo, e, portanto, num contexto controlado, a discussão política é vista como distração ou obstáculo ante os benefícios indiscutidos e indiscutíveis do “desenvolvimento”. Um autoritarismo insidioso disfarçado de empreendorismo e de aversão à política (“não te metas em problemas”) germina na sociedade como erva daninha.

Ao partir de Moçambique, uma frase do grande escritor moçambicano Eduardo White cravou-se em mim e em mim ficou: “nós que não mudamos de medo por termos medo de o mudar” (Savana, 20-7-2012). Uma frase talvez tão válida para a sociedade moçambicana como para a sociedade portuguesa e para tantas outras acorrentadas às regras de um capitalismo global sem regras.

- Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal). Transcrição do "Jornal do Brasil".

4/14/08

Fome no mundo - Antevisão sinistra...

(Imagem original daqui)
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A "descoberta" recente(?) da alta a nível mundial de preços dos alimentos alarma as nações. Políticas, muitas vezes de cariz populista voltadas para a angariação de votos através da pobreza e ignorância humanas se vêm em perigo de frustar, a médio prazo, multidões e povos esfaimados que cobrarão inevitávelmente o preço a seus eleitos.
Tal era prevísivel pois o mundo é limitado e, sobrecarregado a cada dia por mais "gente" que vai nascendo imprevidentemente, sem planejamento nos grotões de pobreza, está sendo castigado sistemáticamente por desmatamento selvagem, poluição irresponsável, aquecimento global inconsequente, industrialização e consumismo exagerados, etç., etç. como demanda de toda essa "população" excessiva, de custo também alto em programas sociais consequentemente necessários e sustentados por impostos crescentes oriundos dum rol concentrado, propenso a rarear de contribuintes.
África será, lamentávelmente, por todas as suas fraquezas sociais, um dos primeiros continentes atingidos por essa onda gigantesca que se aproxima. Díficil será evitar...Mas há que correr contra o tempo... ...
Transcrevo abaixo o que acabo de ler na edição eletrónica do Jornal Folha de São Paulo/BBC-Brasil, deste final de tarde de domingo, a respeito:
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FMI E BIRD PEDEM AÇÃO URGENTE CONTRA ALTA ALIMENTAR
O presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, e o diretor do Fundo Monetário Internacional, Dominique Strauss-Kahn, defenderam neste domingo a adoção de medidas urgentes para conter a atual inflação de alimentos.
"Temos agora que colocar nosso dinheiro onde está a nossa boca, para que possamos colocar comida em bocas famintas", disse Zoellick, usando uma expressão idiomática da língua inglesa que significa algo como não ficar apenas no discurso, mas tomar uma ação.
Os comentários dos dois líderes foram feitos na entrevista coletiva que marcou o encerramento da reunião de primavera do FMI e do Bird, em Washington, neste domingo.
De acordo com Zoellick, o fato de o preço de alimentos ter dobrado nos últimos três anos poderá fazer com que 100 milhões de pessoas em países de baixa renda mergulhem ainda mais na pobreza.
O presidente do Banco Mundial lembrou que o Programa Mundial de Alimentos da ONU pediu que até o início de maio sejam feitas contribuições para que o órgão possa sanar seu rombo de US$ 500 milhões.
"Já há indicações de contribuições que chegam quase à metade da cifra exigida, mas não é o bastante. É crucial que governos confirmem seus compromissos o quanto antes e que outros também comecem a fazê-lo."
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INSTABILIDADE
O líder do Bird saudou o fato de que o elevado preço das commodities e seu impacto no crescimento e no desenvolvimento será um dos temas da reunião dos ministros das Finanças do G8, que será realizada em junho, no Japão.
"Mas, falando honestamente, a reunião do G8 será em junho. E não podemos esperar tanto assim."
Tanto Zoellick como Strauss-Kanh destacaram que a inflação poderá causar graves instabilidade políticas. No sábado, o diretor do fundo chegou a afirmar que a crise alimentar poderá levar a guerras em diferentes países.
"Ontem mesmo, nós vimos a queda do governo do Haiti", lembrou, Zoellick, comentando a queda do primeiro-ministro haitiano, Jacques Edouard Alexis, que perdeu seu cargo após uma série de protestos violentos contra a alta do preço de alimentos no país.
Zoellick destacou que o Bird destinou US$ 10 milhões ao Haiti e lembrou que o governo brasileiro também fez uma contribuição ao país caribenho.
O presidente do Banco Mundial lembrou, no entanto, que a contribuição emergencial do Bird exigirá uma "ginástica" para contornar trâmites burocráticos atualmente exigidos já que "muito do nosso dinheiro está alocado mediante determinadas fórmulas e categorias".
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ADAPTAÇÃO
A necessidade de adaptação também foi destacada pelo diretor do Fundo Monetário Internacional, Dominique Strauss Kahn, que afirmou que a atual crise obrigará o órgão a reestruturar algumas de suas "ferramentas financeiras" que não são apropriadas para lidar com crises como a atual.
Stauss-Kahn chegou a ironizar a maneira como o fundo é visto, muitas vezes associado à recomendação de políticas macroeconômicas duras e com um pesado custo social.
"Muitos podem se surpreender ao ver o diretor do FMI preocupado com crise de alimentos". Mas acrescentou: "Não se surpreendam, nós iremos destinar tempo, recurso e expertise para lidar com isso".
13/04/2008 - 20h42 - BRUNO GARCEZ da BBC, em Washington.
  • ONU - Uso de biocombustíveis se tornou um crime contra a humanidade - O GLOBO OnLine - 14/04/08, 13h00 - Leia o texto Aqui !