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8/24/13

Uma figura da História da Ilha e Vila do Ibo: JACOB MAMUDO (Bob)

Jacob Mamudo (Bob), há relativamente pouco tempo falecido (24 de Agosto de 2009), é ilustre filho e parte da história da Ilha do Ibo.
Até 1974, foi membro da Comissão Municipal local à qual prestou colaboração efectiva.
Amigo da terra que o viu nascer, respondeu sempre com prontidão e desinteressadamente, a todos os pedidos de ajuda feitos à época colonial pelas autoridades constituidas no concelho.
Para o recordar-mos, ficam aqui algumas imagens que consideramos documentos para a história da também histórica Ilha do Ibo e de Moçambique:
1970 - Visita de dois estudiosos, drs. Pierre Verin (francês) e Amaro Monteiro, antropólogos, linguístas, professores, pesquisadores da civilização malgaxe e de outras ilhas do Índico à Ilha Quisiva. Esta viagem de estudo acompanhada pelo Dr. Carlos Lopes Bento, administrador do Concelho do Ibo, só foi possível graças ao apoio logístico de Jacob Mamudo (Bob) também na foto.
 
Entrevista de Jacob Mamudo (imagem acima), vogal da Comissão Municipal do Ibo, concedida a 13 de Setembro de 1963 ao correspondente do jornal "Diário de Lourenço Marques" em Cabo Delgado, Jaime Ferraz Rodrigues Gabão, em consequência da ida de uma representação de Cabo Delgado a Lisboa, recebida pelo Dr. Oliveira Salazar.
A leitura do conteúdo da entrevista mostra calramente a dimensão e sentido da Pátria Portuguesa de então em relação às suas colónias.
(Clique nas imagens acima para ampliar)

Representação da Vila do Ibo, a Lisboa, em 1963 - Na foto está o Jacob Mamudo (Bob) com o estandarte da Vila do Ibo, entre outros participantes da representação de Cabo Delgado.

Histórico  de JACOB MAMUDO mais conhecido por BOB:
- Filiacao: Mamudo Agy Jacob e Luisa Zamith.
- Nasceu em 11/05/1927 na histórica vila do Ibo.

Desde 1959 que esteve a testa da firma comercial fundada no Ibo pelo seu pai em 1919, “Flor do Ibo” de Mamudo Agy Jacob.

Bob jogou a bola pelo Clube Desportivo do Ibo e  a sua actividade comercial incluia a venda de produtos alimentares, representações e agenciamentos de transportes maritimos (Companhia Nacional de Navegação), aéreos (Comag e TTA), banca (BNU - actual CGD), açucareira (Sena Sugar Estates) e também se dedicava à venda de peixe seco, percorria semanalmente, por terra e mar, centenas de quilometros desde o Ibo até Nampula.

Em 1975 mudou-se e transferiu a firma para Pemba, desta vez com maior destaque para venda, representação e distribuição de material de pesca (Equipesca), oleo alimentar e sabão (Companhia Industrial do Monapo) e açucar (Distribuidora Nacional do Açucar).

Devido a sua saude, encerra as actividades comerciais em 2006 e muda-se para Maputo, onde vivem sua filha, irmãs, cunhado e sobrinhos e pode ter melhor assistencia médica. Nesta altura a firma “Flor do Ibo de Mamudo Agy Jacob, Sucessor” devia ser a mais antiga firma comercial Moçambicana no norte ainda em actividade (87 anos).

Entre finais dos anos 80 e principio de 90, Bob e outros conterraneos seus nomeadamente Ernesto Silva (Simba), Candido Manuel Inacio (Kesso), Mussa Alimomade (Magaga), Leopoldino Costa e Jordãp Soares (Joda) todos já falecidos, e Issa Tarmamade  fundam a Associação dos Amigos da Ilha do Ibo (AAIIBO), cujo maior objectivo era de promover e tentar encontrar ou criar oportunidades que possibilitassem o renascer da esperança de desenvolvimento da Ilha do Ibo e neste caso concreto tiveram sempre o apoio dos srs. Antonio Simbine, Governador da Provincia de Cabo Delgado nessa altura e de Magido Ali, então Director da Industria Comercio e Turismo.

Também já se voltava a celebrar o “São Joao Baptista” no Ibo, 24 de Junho, anualmente, e realizavam-se excursões a partir de Pemba.

Anos mais tarde com a nomeação de Jose Pacheco (actual Ministro do Interior de Mocambique) para Governador de Cabo Delgado, a questão do Ibo voltou a ganhar interesse, tendo havido vários encontros entre o Governador Jose Pacheco e Jacob Mamudo para troca de ideias e impressões.

Hoje com os meios de comunicacão e de transportes existentes, ja estão criadas as bases para tornar o Ibo num destino turistico. O Ibo ja não dorme mais.

Em Julho e agosto de 2007, vai pela ultima vez à Europa, Inglaterra visitar o filho, nora e netos e Portugal visitar a filha e netos e tratamentos médicos.

Nessa viagem a Portugal teve o desejo de rever  amigos seus, elaborou uma lista da qual constavam os nomes de Carlos Bento, Carlos Soares, Rosario Dias, Barreira de Sousa e outros que não me lembro.

Infelizmente devido ao seu estado de saude nao concretizou esse desejo.

9/30/10

Moçambique - HISTÓRIA - A FORTALEZA DE SÃO JOÃO BAPTISTA DO IBO

A FORTALEZA DE SÃO JOÃO BAPTISTA DO IBO
A FORTALEZA DE SÃO JOÃO BAPTISTA DO IBO
MEMÓRIAS DAS ILHAS DE QUERIMBA.
FORTIFICAÇÕES MILITARES NA ILHA DO IBO, em CABO DELGADO - MOÇAMBIQUE por Carlos Lopes Bento.
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler. Link para formato "pdf" - http://www.youblisher.com/files/publications/10/55598/pdf.pdf)

Moçambique - HISTÓRIA - EPIDEMIA DE VARÍOLA NA ILHA/VILA DO IBO, ENTRE ABRIL DE 1883 E JANEIRO DE 1884

EPIDEMIA DE VARÍOLA NA ILHA/VILA DO IBO, ENTRE ABRIL DE 1883 E JANEIRO DE 1884
MEMÓRIAS DE CABO DELGADO
EPIDEMIA DE VARÍOLA NA ILHA/VILA DO IBO, ENTRE ABRIL DE 1883 E JANEIRO DE 1884
Por Carlos Lopes Bento.
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler. Link para formato "pdf" -http://www.youblisher.com/files/publications/10/55591/pdf.pdf)

9/06/10

De Porto Amélia a Pemba-Em busca da História! Documentos... 15

(Clique na imagem para ampliar e ler)

De Porto Amélia a Pemba-Em busca da História! Documentos... 14

(Clique na imagem para ampliar e ler)

5/04/10

Retalhos: De Porto Amélia a Pemba - Quem são os Makonde? - Parte 2

Do conhecimento das coisas belas nasce o desejo de as reproduzir...
A Arte Em Cabo Delgado - Máscara Maconde - Significado Litúrgico - As máscaras dos macondes traduzem muitos de seus anseios, usos, costumes tradições e também supertições. Os documentos estatuários da iniciação, tanto masculina como feminina, são de grande interesse etnográfico. É no povo Maconde que se encontra o melhor que a arte nativa Moçambicana pode apresentar neste aspecto. Se é certo que a obra retrata a imagem do sentir do artista, de tal modo que ambas se identificam tantas vezes como sendo a sua representação recíproca, com as máscaras litúrgicas nativas sucede outro tanto, visto ambas viverem essa simbiose mística. O artista só recebe a honrosa incumbência da manufatura das máscaras quando se julga e é julgado por todos em estado de pureza. O trabalho a que põe mãos é feito na clausura de sua oficina ou em lugar retirado, nunca sujeito à observação de quem quer que seja; resulta, assim sob o signo do máximo sigilo e segredo. Quando, dias depois, ultima as máscaras, eles e elas são um todo confundível, pois que o espírito representado na obra é o mesmo que se encontra na alma do artista. O mesmo elo os liga: a liturgia do culto. Não há duas máscaras iguais, nem mesmos padrões a caracteriza-las. Tanto as dimensões, como os motivos decorativos são sempre diferentes.

A sua configuração tanto pode ser dolicocéfala como braquicéfala. Cada máscara é pertença pessoal; não está sujeita a troca, venda ou cedência. Por morte, passa, como herança, aos sobrinhos uterinos.

Se já lhe não é atribuído o poder da virtude, ou julgado te-lo perdido em parte, a máscara é sepultada com ceromónias rituais. Ela compartilha nos atos que traduzem o contato do humano com o mundo dos mortos, e em outros quantos mais constituam ritos.

Entre os macondes há dois tipos de máscaras, representando, respectivamente, animais e homens (ou mulheres). As dos animais e dos homens destinam-se, geralmente, a criar climas artificiais de superstição, excitação colectiva e até pavor; têm o nome de “ lipico”. As máscaras que servem ás mulheres utilizam-se para as ceromónias de iniciação, danças, etc, e designam-se por “ natumbeiro”. São de madeira de uma só peça e cobrem toda a cabeça. Não permitem a visão, a não ser pela abertura da boca, para o que são feitas de maneira a ficarem bastante inclinadas para a retaguarda e a permitirem que os raios visuais passem por exata abertura. A posição da máscara faz levantar a cabeça, dando-lhe uma atitude de decisão e arrogância.

Como convêm aos intentos religiosos, sociais e folclóricos, é o passado que inspira o artista.

Nele todo o nativo encontra a fonte das suas energias físicas e espirituais. As feições escultóricas traduzem espíritos bons e maus, todos, porém, dignos de respeito e atenção. Veneração, nobreza, hilaridade, meditação, etc, tudo isso cabe nas várias expressões das máscaras, enriquecidas pela tatuagem, corte de cabelo, barba e outros motivos decorativos. As máscaras femininas distinguem-se por não serem terríficas e trazerem, em geral, adornos clânicos nas orelhas, nos lábios e no nariz; as suas expressões são suaves e dasanuviadas.
O conhecimento que temos da cirurgia plástica, corrente em muitos países, destinada não só a salvar acidentados ou mutilações ou cicatrizes terríveis, mas também com o fim de suprimir defeitos naturais ou reduzir as superfícies de peles ou carnes flácidas, leva-nos a encontrar explicação para a prática de certos povos nativos que se deixam tatuar ou mutilar em operações dolorosas, seguindo técnicas primitivíssimas.

A curiosidade parece satisfazer-se com analogia que, neste particular, os chamados povos cicatrizados e atrasados revelam.

Ora se nos nativos os desenhos caprichosos das tatuagens que incidem nos seios, peito, baixo ventre e coxas das mulheres podem pretender ter por fim realçar predicados femininos, o fato só por exceção é resultante de preocupações do embelezamento, pois a sua razão de ser baseia-se em valores muito mais complexos, se não transcendentes. Há verdadeiramente como que o mistério das tatuagens. Para o desvendar são necessárias observações e diligências aturadas.

Entre os nativos o conhecimento da vida obtém-se por um exame-prova que promove o adolescente à categoria de homem ou de mulher. É mais do que uma cerimônia, pois constitui um período de provação e promoção, considerado o mais importante da vida do nativo e que o leva da situação neutra, inclassificada, à de elemento da comunidade consciente e idónio. Só assim integrado, será mais uma peça pertencente ao corpo e espírito do clã.Trata-se de uma lei imutável que tem duração milenária, que ninguém discute e todos respeitam; que não pode ser profanada nem sequer pela inconfidência para com os estranhos da tribo e menos para com o europeu. Até mesmo entre si o assunto merece-lhes tal respeito que dele se abstêm de falar até ao momento necessário. O sacrifício da dor, e a sua aceitação, sem o menor gesto de protesto, promove-o à categoria de adulto. O ensinamento das dores é o preço de entrada para a sociedade. A recordação do sacrifício terá de perdurar, por isso é nas regiões mais sensíveis e dolorosas que há que suportar a operação.

A tatuagem, as mutilações e deformações associam-se ao ato de circuncisão, quando não tem lugar antes ou depois.

As cerimônias são antecedidas por provas de obediência, de coragem, de valor moral e físico. Mas todos estes aspectos deverão pertencer à mesma estrutura mística que anima e mantém sagrada a tradição. Trata-se de um padrão cultural, de iniciação nos mistérios da vida, que exige conhecimentos, os quais só podem firmar-se, segundo a ética nativa, pela renúncia, sacrifício, jejum, dor, etc. Daí as grandes manifestações festivas que têm lugar após a entrada na sociedade dos circuncidos.

Mas não é só na iniciação que se executam tatuagens e mutilações. Há graus sociais que exigem dos membros, que a elas pertencem, provas de sangue que servem a trazer presente aos olhares de todos, as insígnias desses cargos de privilégio. Assim acontece, por exemplo, aos grandes chefes tribais, e aos chefes menores. A par das tatuagens que recebem, aqueles chefes prestam também provas de resistência física e coragem moral. As credenciais são assim obtidas , delas fazendo parte igualmente, certos objetos, como a lança de autoridade, a catana, o bastão, etc.

Também para artífices ou cargos especializados se usa, por vezes, para os identificar, a tatuagem, bem como para os que se convertem aos islamismo, apostatando da lei consuetudinária. A configuração esquemática das tauagens varia, em geral, segundo o sexo e a parte do corpo onde incide. Obtém-se por picada ou pontuagem, escarificação, feitas por maio de agulhas, estiletes ou ganchos, empregando-se substâncias cáusticas e matérias corantes, à mistura com cinza, que serve, simultaneamente, para obter altos e baixos relevos, dar cor e desinfectar. O fogo é o agente geral que facilita e purifica a operação.

As tatuagens podem ser feitas em fases sucessivas, nomeadamente quando constituem revelação de identidade dos graus da escala social a que os operados são arvorados.

Os desenhos representam figuras geométricas de retângulos, losangos ou quadrados, curvas, retas, aspectos remiformes, cículos, cruzes, espinhas de peixe, etc.. As figurações naturalistas esquematizadas e estilizadas das tatuagens são exclusivas do povo maconde.

O Lagarto e o Crocodilo figuram entre os animais estilizados nelas representadas. Motivos mágicos como o do sardão, combinam-se, em valores decorativos, com os traçados geométricos já mencionados. A par de ornatos de fantasia há símbolos de fertilidade ou de procriação. Palmeiras estilizadas, molhos de mandioca, etc, ganham aspecto de valor artístico em numerosas tatuagens.
A máscara é um produto resultante do espírito tradicional e religioso do nativo. Com o rosto velado por ela, volta-se virtualmete, para o mundo dos antepassados, mundo de respeito e de virtudes, que se chama o mundo das sombras. Então a alegria irrompe dos corações dos presentes e as mais belas exteriorizações da dança e do canto têm lugar para grande satisfação dos sentidos. O bailarino maconde é a figura principal do Mapico. A máscara de madeira cobre-lhe a cabeça. Uma indumentária estranha, imprecisa, sempre diferente veste-lhe o corpo. Ela constitui o seu melhor atavio. As pernas são tapadas pór mais uma cobertura, assemelhando-se a meias, desde os pés até à coxa. Guizos suspensos ajudam, pelo som, a marcar melhor o ritmo. Em cada “Mapico” há vários dançarinos que ora dançam isolados, ora em conjunto. Os cantadores têm também a sua oportunidade de exibir-se e são numerosos entre os rapazes e os homens. Os chifres dos animais, longos e recurvados, servem de instrumento musical para o “Mapico”. Também se utilizam para outros fins de natureza utilitária, nomeadamente para transmissão de mensagens a distância. A sua presença nas danças e cantares como tubas, tem interesse decorativo e suscita apreço na assistência feminina. Para o “Mapico” não há necessidade de grandes preparativos. Todos são comparticipantes, com exceção, em geral, das mulheres. Deste modo, o passatempo distrai rapazes e homens. A mulher e a adolescente são espectadoras contemplativas, que não obstante, se deleitem com as habilidades artísticas dos homens. Durante a sessão há mudanças de papel. Os músicos passam a dançarinos, os dançarinos a cantores, etc.
A arte as estatuária maconde abre perspectivas de compreensão, entendimento e percepção geral a todo o povo do planalto. A mácara tem o seu significado sagrado, é só para os escolhidos do clã. Com ela não se brinca. A sua presença nos “mapicos” não constitui símbolo decorativo ou de entretenimento. Pelo contrário, a pequena estátua de ébano, pau rosa ou madeira branca ou vermelha, que sai das mãos do artista, essa é simples motivo de exteriorização do seu apreço e predileção por usos, costumes, de expressivas demonstrações de agrado e prazer material ou espiritual. Nasce do povo e ao povo se destina. Não é uma alfaia litúrgica, não reproduz o respeito e o culto dos mortos, não faz parte desse mundo implacável, místico, castigador ou dadivoso, mas sempre considerado secreto.

A estatueta é antes uma expressão de humanidade, de harmonia e de beleza formal.

O curandeiro, o mago, o adivinho são ali representados ao mesmo nível das coisas populares, como o homem a tomar café, ou a mulher que é representada a fumar cachimbo, a farinar cereais, a transportar água, a cozinhar, ou o animal em atitudes peculiares, sempre belas, isolado ou com seus filhotes.

Todos os motivos são tratados como espírito artístico, onde a perfeição e a beleza são predicados indespensáveis, indiferente ao julgamento do europeu, ou de outro povo nativo, só exigente consigo mesmo. Há uma determinate estético-erótica quando realça os dotes femininos, mas tal concepção não coloca em segundo lugar o valor da mulher como mãe e elemento indespensável na ordem e economia do lar.

A estilização faz parte do seu labor artístico, sem deformar ou tornar menos real as fihuras, antes lhes dando um todo belo, mais harmônico e sensíve, sem atingir a sobrenaturalidade ou o irrealismo.
BAILADO GUERREIRO

Gestos que parecem descoordenados, não obstante retratarem com fidelidade os movimentos febrilmente ritmados, aparentemente desconexos das danças macondes, que têm lugar durante os mapicos junto das sanzalas. Movimentos verdadeiramente musicais pela perfeita correspondência com os sons da orquesta.Quase pode afirmar-se que não há notas misicais, sem igual correspondência de gestos, desde os mais suaves, ondulantes, menos perceptíveis, os mais rápidos, lançados ou salteados.

Os braços desenham no ar sucessivas linhas quebradas, correspondentes às partes compreendidas entre as articulações do ombro, cotovelo e pulso. Parecem escrever e marcar compassos musicais. As esculturas são ricas na representação destes movimentos de dança de que as nossas, as modernas, são, muitas vezes, apagada ou esbatida cópia.
(Clique nas imagens acima para ampliar)

Fontes:
A arte em Moçambique - Alberto F. M. Pereira - 1966
Os Macondes de Moçambique - Jorge Dias
In - "Moçambique Arquivo Vivo" - grupo do MSN
Colaboração de Armando Silva - Cascais/Lisboa - Portugal

(Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

Retalhos: De Porto Amélia a Pemba - Quem são os Makonde?


QUEM SÃO OS MAKONDE ? - Os Makondes são um povo da África oriental, que habita 3 planaltos do norte de Moçambique e sul da Tanzânia. Têm como actividades principais, a agricultura e a escultura. Sendo apreciados mundialmente pelas suas belas máscaras e esculturas em madeira, que reflectem a sua estética e cultura ricas.

A maioria dos cerca de 1.260.000 Makondes mantêm uma religião tradicional embora parte da população seja hoje cristã.

Os Makondes são um povo Bantu provavelmente originário de uma zona a sul do lago Niassa – Na fronteira entre Moçambique, Malawi e Tanzania. A hipótese desta origem foi apurada a partir da análise de fontes escritas e orais, e é ainda reforçada por semelhanças culturais com o povo Chewa, que ainda hoje habita uma vasta zona a sul e sudoeste do lago Niassa, no Malawi e na Zâmbia.

Os Makondes teriam assim pertencido, em tempos remotos, a uma grande federação Marave, que teria iniciado a sua migração para nordeste, ao longo do vale do rio Lugenda, em tempos bastante longínquos.

Mantiveram-se muito isolados até tarde, pois só no século XX é que os portugueses, que na altura colonizavam Moçambique, conseguiram controlar as zonas por eles habitadas. Isto deveu-se à sua localização, protegida por zonas ingremes de difícil acesso e por florestas densas. O facto de os Makondes terem ganho uma imagem de violentos e irrascíveis, também ajudou ao seu isolamento.

Desta forma, conseguiram manter uma forte coesão cultural, que apesar de ter diminuido nos anos que se seguiram à chegada dos portugueses, ainda assim conseguiu resistir em vários aspectos. Também a religião tradicional se manteve dominante, tendo as conversões ao cristianismo começado apenas por volta de 1930.

Este povo tem grandes preocupações estéticas, que se podem observar não só nas máscaras e esculturas, mas em todo o tipo de objectos. Também na arquitectura das aldeias e caminhos de acesso, se nota um cuidado estético.

Todos os tipos de objectos são feitos com grande sensibilidade estética e demonstram um amor pela beleza, caixas de remédio e rapé, cachimbos, rolhas de garrafa, bilhas, potes e panelas de cerâmica, tambores, insígnias de poder, instrumentos rituais, etc.

Os Makondes, assim como muitos outros povos, dão muita importância aos ritos de passagem, sendo os mais importantes os ritos de iniciação masculina e feminina. E ligada aos ritos de iniciação masculina, está a mais importante dança dos Makondes, o Mapico, onde são usadas máscaras com o mesmo nome.

Esta dança é muito importante na vida dos Makondes de Moçambique, havendo uma aura de mistério e segredo rodeando a preparação das máscaras e a dança propriamente dita, sendo por exemplo importante que não se saiba a identidade do dançarino.

Para a dança, um jovem mascara-se de homem ou animal, vestindo panos e usando uma máscara Mapico na cabeça. Existem vários passos que o dançarino executa, sempre em sintonia com a música dos tambores, apresentando uma espécie de encenação teatral, que encanta e diverte todos os que assistem.

Depois de um extase de actividade por parte do dançarino, segue-se uma encenação de perseguição e fuga, entre o dançarino e um grupo de aldeões.

O Mapico é o centro das festas tradicionais, em que são realizadas as cerimónias de iniciação.

Depois da chegada dos portugueses às áreas Makondes, muito rapidamente as autoridades coloniais e os missionarios, se aperceberam do grande talento e técnica dos artistas, e usaram esse talento para satisfazer os seus interesses. Dando origem a esculturas de cristos e virgens por um lado, e bustos do ditador Salazar, do poeta camões, Alexandre Herculano, e de outras individualidades da história portuguesa, por outro. Também surgiram esculturas tipificadas, tais como: o fumador de cachimbo, o caçador, o lavrador, a mulher transportando água, a mulher pilando alimentos, etc.

O interesse por esta produção de esculturas foi tão grande que levou a uma maior organização da produção, com diversificação e criação de novos temas.

Este fenómeno mudou por completo o mundo do escultor Makonde, que passou de camponês que também esculpe, a um artista quase a tempo inteiro.

Apesar destas mudanças importantes e do impacto da cultura exterior na sociedade Makonde, a tradição continua a ter muita força e a enquadrar a vida dos artistas, que continuam a cumprir os seus deveres na sociedade tradicional.

Aconteceram grandes alterações económicas e sociais nas últimas décadas na sociedade Makonde, que no entanto tem conseguido adaptar-se relativamente bem às mudanças e manter um saudável equilibrio.
- Do sitio do Escultor Makonde Ntaluma.

Ntaluma é um escultor moçambicano que nasceu em Nanhagaia, distrito de Nangade, província de Cabo Delgado, Moçambique, no último ano da década de 60, num Sábado, com o calor do planalto, onde os homens se assustaram com as gargalhadas das parteiras tradicionais Makondes. Dando grande felicidade ao seu pai que estava muito ansioso.

Iniciou o seu trabalho de transmitir a sua mensagem através da madeira, em Novembro de 1990, no Museu de Etnologia de Nampula. Depois de ter recebido os segredos da escultura Makonde, do seu mestre Crisanto Bartolomeu Ambelikola.

Em 1992 chegou a Maputo onde, com um grupo de amigos, fundou a “Favana Grupo de Escultores Makonde”, no parque de campismo de Maputo. Em 1994 começou a ensinar escultura Makonde a moçambicanos e estrangeiros.

Em 2000, integrou a ASEMA - Associação de Escultores Makonde, que funciona no Museu Nacional de Arte de Moçambique.

Chegou a Portugal em 2002 onde começou a desenvolver com outros artistas, um intercâmbio de sensibilidades artísticas.

Em 2003 assumiu a responsabilidade da escola de escultura da ALDCI – Associação Lusófona para o Desenvolvimento, Cultura e Integração - Portugal, integrada na escola da multi-culturalidade.

Está representado em coleções particulares nos quatro cantos do mundo.

As Origens da arte: Quem não se lembra de alguma vez na vida ter visto uma escultura Makonde, que faz rodopiar as pessoas numa viagem que é de todos nós, numa reafirmação de que a arte está permanentemente nos corações de todas as latitudes.

A humanidade é uma parte da natureza com os seus fenômenos.

Para o escultor, uma imagem não é só um simulacro provido de qualidades vivas, é também uma forma de o homem manifestar o seu imaginário. Desde a idade da pedra que os nossos antepassados esculpem com as suas mãos, as formas naturais da terra.
 - Do sitio do Escultor Makonde Ntaluma.
Makonde - Um Povo repleto de cultura - (Titulo : Arte Makonde por Maria Mhaigue,data : 17/8/2004, Espaço Moçambique) - Estatuária Makonde Moderna - Do estilo moderno há que destacar o Estilo Shetani e o Estilo Ujamaa.

Nos anos 50, é significante um novo desenvolvimento da arte entre os Macondes, que foram para a Tanzânia e tomaram contacto com ideias políticas e sociais. Isto ajudou a alterar as suas consciências.

A escultura Maconde, deixa de ser apenas os objectos tradicionais que eram comercializados ao longo da costa do sul de Tanganyika.

Desde a independência, cabeças esculpidas de quase tamanho real têm aparecido demonstrando versatilidade, que pode ser retirado da imaginação do artista. As cabeças são de uma grande beleza e equilíbrio estético. Em vez de terem cabelo no topo, parecem seres animais e mitológicos a devorar-se simultaneamente.

É uma ilusão impressionante e profundamente dramática. São as preocupações e acontecimentos do dia-a-dia, expressados pelo simbolismo. Símbolos de fertilidade, imagens representativas de luta anti-colonial, o erotismo dos espíritos.

Estilo Shetani
No início dos anos 60 a escultura toma um carácter bizarro, naquilo que viria a ser conhecido como estilo Shetani. Desenvolveu-se entre os Macondes que viviam no exílio na Tanzânia, porque em Moçambique colonial a força da igreja católica proibiu os talhadores de trataram temas das suas tradições ancestrais e espíritos.
Mesmos os rituais como o Mapiko foram proibidos e reprimidos, desde que isto era visto como uma heresia pagã, nos termos dos valores cristãos impostos pelo o colonialismo.

Os Macondes das áreas ocupadas pelos portugueses continuaram a talhar essencialmente figuras realistas, embora umas fossem mais estilizadas do que outras.

O estilo Shetani revelou uma cosmogonia de seres e espíritos malignos que habitam a natureza e forças que o homem tem de enfrentar todos os dias.
A partir do ano de 66 este estilo começou a ganhar reconhecimento a nível mundial.

Shetani é uma palavra usada para traduzir os espíritos Nandenga da cosmogonia Maconde, que também é representada no Mapico.

Contudo é melhor descrito nos contos que são passados de boca em boca.

É um espírito mau que espalha a doença como o vento. Têm só uma perna, um braço, um dedo, um olho, e um cabelo.

No norte da Zambézia, é chamado o “espírito do Mato”.

A palavra Shetani pode ser usada ainda para descrever qualquer figura ou espírito não identificado, como animais de diferentes tamanhos, principalmente nocturnos e misteriosos.

Cada Shetani têm o seu próprio nome e ambiente geográfico. Alguns são das florestas, outros das planícies ou das aldeias. Uns têm prostitutas, e alguns foram trazidos pelos indianos ou pelos europeus.

Os Shetanis não explicam o mundo, mas com todas as suas fábulas ajudam a passar as dificuldades que podem ocorrer no dia-a-dia.

Em suma, eles têm um sentido simbólico, profundamente humano, criativo e estimulador para a imaginação.

Toda esta cosmogonia era expressada na escultura, com um sentido de grande equilíbrio e movimento.

Era uma representação eloquente do sofrimento, angustia e desespero, mostrava uma técnica notável em transformar a fantasia em escultura e expressar novas ideias que surgiam do contacto com outros povos e situações.

Artistas:

Bartolomeu Ambelicola
Nasceu no ano de 1939, Cabo Delgado, oriundo de uma família de escultores. Ainda em criança começa a esculpir fazendo parte da sua infância o convívio com os velhos mestres.

Com a luta armada cedo se passa para as zonas libertadas onde continua a desenvolver a sua arte.

Em 1978 vai residir para Nampula, mas em 1983 por motivos de sobrevivência regressa a Nandimba onde hoje vive como camponês. Tem obras suas na colecção do Museu Nacional de Arte e do Museu de Nampula.

Celestino Tomás
Nasceu em Miúla, Mueda, Cabo Delgado, em 1944, no seio duma família de grandes escultores. Teve como Mestre seu Tio Ndomessa André com quem se inicio verdadeiramente na escultura depois de ter frequentado durante dois anos a Missão de Lipelwa. Em criança já brincava esculpindo em paus leves e mandioca.

Foi emigrante na Tanzania de 1964 a 1972 onde continuou a esculpir tendo-se então instalado em Dar-es-Salam e depois em Arusha. EM 1975 regressa a Miúla e durante três anos faz a sua casa e dedica-se ao trabalho no campo. Em 1978 vai para Nampula numa tentativa de poder vir a dar continuidade à sua arte o que veio a concretizar, e onde se manteve até 1981, data em que se viu obrigado a regressar à sua terra, por questões de sobre vivênvia, vivendo hoje como camponês. Tem obra em colecções de vários países, tendo participado também em exposições colectivas em Moçambique como peçaas da colecção do Museu de Nampula.

Cristovão Alfonso
Nasceu em 1949 em Nampanha, Mueda, Cabo Delgado tendo ainda em criança emigrado para a Tanzânia, com os pais, donde regressa só em 1976, a Namaluco – Quissanga, transferindo-se em seguida para Nampula onde passa a viver. E é já em 1979 – com 30 anos de idade que se inicia na escultura, aprendendo com os seus familiares, entre os quais se conta seu irmão Jerónimo Dinhuassua já falecido.

Lamizosi Madanguo
Lamizosi conta 36 anos e nasceu em Miúla, Mueda, Cabo Delgado. Cedo seguiu a tradição familiar de ser escultor. São seus irmãos, Nkalewa Bwaluka e Cristiano Madanguo tendo já ele um filho a esculpir, Francisco Lamizosi.

Quando inicia os seus estudos, na Missão de Lipelwa, logo os tem que interromper dado o começo da Luta Armada. Iniciada esta, mantêm-se sempre nas Zonas Libertadas desenvolvendo aí a sua arte.

Periódicamente deslocava-se a Mtwata na Tanzânia onde vendia todas as suas obras.

Em 1978 vai para Nampula e integra-se na Cooperativa 16 de Junho, onde ainda hoje vai vivendo da sua arte.

Obras suas pertencem a museus nacionais e várias colecções provadas.

Miguel Valingue
Nasceu em Nanhagaia, Mueda, Cabo Delgado em 1953. Em 1964 entra para a escola primária, junto ao Régulo Likama, aderindo por essa altura também à Luta Armada, o que o leva a optar pelas Zonas Libertadas do Planalto de Mueda e a abandonar os estudos. Em 1968 vai para a Tanzânia com a família, começando em 1969, e tendo como Mestre se irmão Rafael Massude.
Até 1974 vive em Mtawara regressando no Governo de Transição a Mueda.

Em 1978 fica residência em Nampula e passa a fazer parte da Cooperativa 16 de Junho. Em 1986 vem para Maputo em busca de melhores condições de vida. Tentou entrar para uma cooperativa, mas constatou que aí só aceitavam artesanato em série. Hoje, trabalha por conta própria respeitando a sua arte. Tem várias obras nas colecções do Museu Nacional de Arte e do Museu de Nampula.

Nkabala Ambelicola
Nasceu em Miúla, Mueda, Cabo Delgado, em 1930 e como era natural do seu meio familiar, logo em criança abraçou a arte de esculpir em madeira. Pertencendo a uma grande família de escultores, ele tem como Mestres seu pai, Ambelicola Njeu, e seu tio, Kyakenia.

Logo após o massacre de Mueda adere à FRELIMO apoiando a Luta Armada por todos os meios ao seu alcance: desde o transporte de material de guerra à produção no campo, sem contudo abandonar a sua arte.

Quando da Independência sai de Nandimba onde se encontrava e vai para Nampula em busca de trabalho, fixando aí residência e passando a elemento da Cooperativa 16 de Junho.

Participou em várias exposições colectivas no exterior em Moçambique, tendo obras suas em várias colecções nacionais.

Nkalewa Bwaluka
ou Leo, como antigamente assinava as suas obras, nasceu em Miúla, Mueda, Cabo Delgado, em 1928. Pertence a uma família de grandes escultores e tem dois filhos que já o são: Machele Nkalewa e Nancheto Nkalewa. Quando era pequeno acompanhava o seu pai na feitura de máscaras Mapiko que deveriam ser usadas no final das cerimónias de iniciação, começando também com o pai a esculpir figuras humanas.

Em 1963 emigra para a Tanzânia passando a viver em Masunga, Mtwara, onde desenvolveu grande actividade, que depois enviava as peças para a Europa.

Em 1967 instala-se junto à Estrada de Moshi, esculpindo e vendendo aí os seus trabalhos.

Em 1976 regressa a Miúla, passa a Nampula e em 1978, por questões de sobrevivência regressa à sua terra onde hoje é caçador. Obras suas pertencem a museus nacionais e colecções particulares no estrangeiro.

Estilo Ujama
Nos meados dos anos 60, os escultores Macondes, tinham o estatuto de refugiados políticos, uma vez que o seu país estava ocupado pelo poder colonial.

Por esta altura um novo estilo de talhe aparece, o estilo Ujama.

O estilo Ujama embora tenha aparecido mais tarde do que o Shetani, na sua forma compacta é mais aproximado do tipo de talhe tradicional africano.

A base é esculpida bem relevo para representar a família, de forma realista nos corpos e caras, mantendo características típicas Macondes.

Na forma não compacta as figuras formam uma torre acrobática, captando o sentido de movimento expresso no estilo Shetani.

Artistas:

Kauda Simão
Nasceu em Idovo, Mueda, Cabo Delgado, em 1958. Oriundo de uma família de escultores. Ainda em criança começa a esculpur, mas logo no início da luta armada passa-se para as Zonas Libertadas vivendo e convivendo entre escultores mais velhos e em associação com estes.

Integrado na Luta pela Independência ele apoia tomando parte em alguns combates e carregando material de guerra. Reinicia a actividade de escultor em 1979, em Nampula.

Rafael Nkatunga
Nasceu em Ncaja Nasingusa, actual aldeia Litembo, Mueda, Cabo Delgado, em 1951. Tinha apenas um ano de idade quando acompanhouo seu s pais que emigraram para a Tanzânia, indo viver para Dar-es-Salam onde fez instrucção primária, começando então a trabalha como seu cunhado, Constantino Mpakulo, que considera ainda hoje o seu verdadeiro Mestre. EM 1968 instala-se junto à Estrada de Bagamoyo, onde começa a trabalhar, regressando a Moçambique em 1973, indo viver numa base da FRELIMO e passando a trabalhar no campo como a melhor forma de apoio à Luta Armada. Em 1975 volta a Mueda e retoma a sua arte.

Em 1977 fixa residência em Nampula onde trabalha ainda hoje.

Obras suas já participaram em várias exposições internacionais e estão representadas em várias colecções nacionais.
- Clique nas imagens acima para ampliar.

(Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

1/29/10

Retalhos da História de Moçambique - Ilha de Moçambique: Toponímia dos seus Bairros, em 1876

Por Carlos Lopes Bento(1)

A Câmara Municipal de Moçambique, em sessão de 31 de Maio de 1876, sob proposta do administrador de concelho, deliberou que a Cidade ficasse dividida em dois Bairros,- em 1857 em sete- sendo cada um deles composto das ruas, em seguida designadas:

1º Bairro de S. Domingos, compreendendo:
  • Campo de S. Gabriel
  • Rua de S. Sebastião
  • Rua de São Paulo
  • Travessa da Paz
  • Rua de S. Domingos
  • Travessa de S Domingos
  • Praia Grande
  • Largo da Alfândega
  • Rua da Alfândega
  • Adro da Misericórdia
  • Rua nova do Conselheiro Leal
  • Rua de Misericórdia
  • Largo do Teatro
  • Travessa do Teatro
  • Rua dos Baneanes
  • Travessa dos Baneanes
  • Rua da Sé
  • Travessa da Sé
  • Travessa de entre muros
  • Travessa do Poço
  • Travessa do Pombal
  • Rua das Amoreiras
  • Rua do Tesouro
  • Rua do Concelho
  • Travessa do Durão
  • Rua do Fogo
  • Travessa do Fogo
  • Rua de Missanga, a leste da Travessa da Missanga
  • Praia de Boavista
  • Largo da União
  • Travessa da Amizade
  • Travessa do Tesouro
  • Rua Fresca
  • Rua do Hospital
  • Travessa do Hospital
  • Rua da Fidelidade
  • Travessa das Hortas
  • Rua do Celeiro
  • Travessa da Saúde
  • Largo da Saúde
  • Bairro da Marangonha
  • Rua Formosa
  • Travessa do Cotovelo
  • Travessa do Brigadeiro
  • Rua do Arsenal
  • Travessa da Cadeia
  • Largos das Amoreiras.
2º Bairro do Concelho, compreendendo:
  • Travessa dos Fornos
  • Rua do Meio
  • Baixa das Pedreiras
  • Alto das Pedreiras
  • Caminho Novo
  • Estradas das Ferras
  • Travessa de Santo António.
Numa rápida análise, verificamos que continua a não existir, na toponímia loca, nomes relacionados com figuras portuguesas, políticas ou outras, e que ela está ligada à realidade local: eco-geográfica, socio-política e económica e ao domínio do sagrado.

Fonte: Edital da C.M.M., de 21 de Junho de 1876, in BO 26, de 26.6.1876, p.162.
(1) Antropólogo e Prof. Univ., que pesquisou e escreveu texto.
Almada/Portugal, 28.01.2010.

ANEXO QUE MOSTRA AS ALTERAÇÕES VERIFICADAS NA ANTROPONIMIA DA CIDADE DE MOÇAMBIQUE, ENTRE DE 1857 E 1876:
  • Adro da Misericórdia
  • Adro da Misericórdia
  • Alto das Pedreiras(1)
  • Bairro da Marangonha(1)
  • Baixa das Pedreiras(1)
  • Bazar Grande(2)
  • Caminho Novo
  • Caminho Novo
  • Campo de S. Gabriel
  • Campo de S. Gabriel
  • Esquina(2)
  • Estrada Bela(2)
  • Estradas das Ferras(1)
  • Largo da Alfândega(1)
  • Largo da Saúde
  • Largo da Saúde
  • Largo da União
  • Largo da União
  • Largo das Amoreiras(2)
  • Largo do Bazar(2)
  • Largo do Celeiro(2)
  • Largo do Teatro(1)
  • Largo dos Ferreiros(2)
  • Largos das Amoreiras(1)
  • Praia de Boa Vista
  • Praia de Boavista
  • Praia Grande
  • Praia Grande
  • Rua Central da Missanga( a leste da Rua da Missanga) (2)
  • Rua Central da Missanga( a oeste da Rua da Missanga) Elm
  • Rua da Alfândega(1)
  • Rua da Fidelidade
  • Rua da Fidelidade
  • Rua da Sé
  • Rua da Sé
  • Rua das Amoreiras
  • Rua das Amoreiras
  • Rua das Hortas(2)
  • Rua de Misericórdia
  • Rua de Misericórdia
  • Rua de Missanga
  • Rua de Missanga, a leste da Travessa da Missanga
  • Rua de S. Domingos(1)
  • Rua de S. Sebastião
  • Rua de S. Sebastião
  • Rua de São Paulo
  • Rua de São Paulo
  • Rua do Arsenal
  • Rua do Arsenal
  • Rua do Asilo(2)
  • Rua do Celeiro
  • Rua do Celeiro
  • Rua do Concelho
  • Rua do Concelho
  • Rua do Durão
  • Rua do Durão
  • Rua do Fogo(1)
  • Rua do Hospital
  • Rua do Hospital
  • Rua do Meio(1)
  • Rua do Pagode dos Baneanes(2)
  • Rua do Tesouro
  • Rua do Tesouro
  • Rua dos Baneanes
  • Rua dos Baneanes
  • Rua Formosa(1)
  • Rua Fresca
  • Rua Fresca
  • Rua Nova do Conselheiro Leal(1)
  • Travessa da Alfandega(2)
  • Travessa da Amizade
  • Travessa da Amizade
  • Travessa da Cadeia
  • Travessa da Cadeia
  • Travessa da Maragonha(2)
  • Travessa da Misericórdia(2)
  • Travessa da Paz
  • Travessa da Paz
  • Travessa da Praia da Boa Vista(2)
  • Travessa da Rua dos Baneanes(2)
  • Travessa da Saúde
  • Travessa da Saúde
  • Travessa da Sé
  • Travessa da Sé
  • Travessa das Flores(2)
  • Travessa das Hortas(1)
  • Travessa de entre muros
  • Travessa de entre Muros
  • Travessa de S Domingos(1)
  • Travessa de Santo António
  • Travessa de Santo António
  • Travessa do Asilo(2)
  • Travessa do Brigadeiro(1)
  • Travessa do Caminho Novo(2)
  • Travessa do Cotovelo
  • Travessa do Cotovelo
  • Travessa do Durão
  • Travessa do Durão
  • Travessa do Fogo(1)
  • Travessa do Hospital
  • Travessa do Hospital
  • Travessa do Pagode(2)
  • Travessa do Poço
  • Travessa do Poço
  • Travessa do Pombal(1)
  • Travessa do Teatro(1)
  • Travessa do Tesouro(1)
  • Travessa dos Baneanes(1)
  • Travessa dos Ferreiros(2)
  • Travessa dos Fornos
  • Travessa dos Fornos
  • Travessa do Pombal(2).
(1)- Novas designações em 1876.
(2)- Designações que faziam parte da antroponimia de 1857 e não fazem parte da de 1876
  • Post's anteriores deste blogue com temas históricos sobre Moçambique de autoria do Dr. Carlos Lopes Bento!

11/11/09

A SITUAÇÃO COLONIAL NAS ILHAS DE QUERIMBA OU DE CABO DELGADO - Senhorios, Mercadores e Escravos 2

(1742-1822)
Por Carlos Lopes Bento
(Continuação)

Os senhorios dispunham de um número variável de escravos, que podiam atingir as três centenas, de ambos os sexos, que se repartiam por escravos de cultura ou de subsistência, e escravos domésticos: os escravos de porta ou de quintal. Todos eles, normalmente, tinham um tratamento familiar. Excepcionalmente, por necessidades económicas do senhorio ou por mau comportamento, podiam tornar-se escravos de tráfico. Face às funções que desempenhavam, a renovação daqueles escravos fazia-se, preferencialmente, pelo processo de reprodução demográfica.

Entre os escravos domésticos, as escravas de quintal desempenhavam papel relevante não só como aias, mas também como preciosas auxiliares das donas, sinharas ou sás7, ilustres senhoras pertencentes à aristocracia local, a quem prestavam uma valiosa ajuda, tanto na satisfação dos seus caprichos e vaidades pessoais, como nos banquetes e convívios familiares. Nestas ocasiões, a ama vestia e enjoiava, ricamente, as suas dedicadas escravas que deste modo procuravam mostrar, publicamente, aos convivas, o status e a riqueza dos seus senhores.

Em 1820, após os saques dos sakalava8, terminados em 1817, as terras dos prazos estavam baldias e despovoadas e os senhorios sem possibilidades de as recuperar face ao crescente aumento do tráfico esclavagista e da sua internacionalização.

Os Portugueses encontraram nas Ilhas uma economia que tinha como base a policultura associada à criação de animais, a pesca e o comércio, acrescentando-se a estas actividades, entre outras artes, a tecelagem, a ourivesaria e a construção naval. Até ao século XVII as terras emprazadas produziam, abundantemente, milho, mapira, arroz, feijão, gergelim e cocos, cujos excedentes, embora escassos, serviam para abastecer a sempre carente Ilha de Moçambique. Para além deste produtos exportavam, para aquela Praça, cauri, âmbar, tartaruga, mauna, madeiras, marfim e escravos.

Com as invasões omanistas, no último quartel do séc. XVII, o desenvolvimento da colonização europeia no continente americano, a queda de Mombaça, em 1729, e a consequente perda do domínio português em territórios litorálicos situados a norte de Cabo Delgado, a presença francesa nas costas de Moçambique e os ataques desferidos contra o território, entre 1796 e 1817, por corsários franceses, por alguns chefados makhwa vizinhos e por invasores sakalava, vindos de Madagáscar, o sector primário entrava em crescente decadência e o modo de vida dos habitantes das Ilhas iria ser profundamente alterado, cada vez mais motivados para a actividade mercantil.

O aparecimento de frequentes crises alimentares no território, como resultado da interacção dos vários factores referenciados, seriam resolvidas pela agricultura suaíli praticada a norte de Cabo Delgado, com a ajuda dos denominados Mouros da Costa, que trocavam marfim e escravos por produtos alimentares, especialmente, gado bovino e arroz.

Para a abordagem aprofundada e sistemática das trocas comerciais foi necessário conhecer o quadro de trocas comerciais internacionais onde tal comércio estava inserido e os princípios económicos vigentes impostos pelas várias potências europeias aos territórios que dominavam. Para a sua concretização, começou-se, primeiro, por examinar como se processava a articulação dos estabelecimentos comerciais costeiros da África Oriental no complexo comercial do Oceano Indico, para depois se encontrar respostas, concretas e objectivas, para um significativo número de interrogações relacionadas com:

- as estratégias, políticas e meios de acção delineadas pelas autoridades portuguesas para se introduzirem no milenário sistema comercial índico e para enfrentarem a concorrência de Árabes, Suaílis e Indianos, nem sempre cooperante e pacífica;
- a funcionalidade das estruturas impostas para alcançar tais propósitos e das suas implicações sobre as realidades sócio-culturais inseridas no dito sistema comercial, particularmente, a das Ilhas e as das terras continentais que lhes ficam geograficamente mais próximas, então, sob o domínio de autoridades políticas independentes;
- os vários tipos de comércio em que as Ilhas estavam envolvidas - marítimo costeiro e com o interior -, e relativamente, a cada um deles, o enquadramento normativo, os circuitos, os comerciantes e outros agentes intervenientes comerciais, os produtos transaccionados, os processos de troca e os meios de pagamento utilizados.

À chegada das suas primeiras armadas à Índia, os Portugueses constataram, por um lado, estar a África e a Ásia, há muito, interligadas por um imbricada rede de relações comerciais servida por um conjunto de circuitos, principais e secundários, destinados a escoar, entre si, produtos de importação e de exportação. Por outro, verificaram a existência de um mercado costeiro pautado por um grande volume de trocas, servido por uma típica e multivariada navegação à vela, ritmada pelas monções, estações do ano e correntes marítimas, que assegurava os fluxos de mercadorias entre os dois continentes. Entre as principais rotas encontrava-se uma que ligava Cambaia e outros portos da Índia aos portos africanos de Mogadíshio, Mombaça, Melinde e Quiloa e uma outra que destes portos se dirigia para os portos de Aden, Zanzibar, Ilha de Moçambique, Angoxe e Sofala. Para além destas rotas existia uma rede de vias ou circuitos comerciais, de natureza secundária, onde se integravam os portos de escala do território, que serviam de base à navegação de cabotagem, essencial, à sobrevivência de centenas de povoações da costa leste de África.


Para defender os interesses da coroa portuguesa, ameaçados por outras potências coloniais europeias, em 1761, para além de reforçar a proibição do comércio a estrangeiros e se conceder a liberdade de comércio a todos os portugueses, Lisboa dá à Praça de Moçambique o estatuto de centro ou empório de todo o comércio, tanto o vindo da Ásia, como o proveniente da Europa e da América. Mas tais medidas não tiveram sucesso e levaram ao desenvolvimento de um sempre crescente comércio clandestino ou de contrabando.


As insistentes ordens para o Capitão das Ilhas, para que não se permitisse a entrada a navios estrangeiros na área da sua jurisdição, demonstram bem o significativo incremento do comércio clandestino e quanto era frágil a acção das autoridades portuguesas face às condições ecológicas existentes e aos importantes interesses dos vários intervenientes (moradores, árabes, mouros da costa e franceses e por vezes as próprias autoridades) envolvidos no complexo processo comercial, que teve como palco a parte norte do território moçambicano.


As fracas condições demográficas e a pouca eficácia das estruturas político-militares, administrativas e económico-financeiras, com que se defrontavam aquelas autoridades, conduziriam a um permanente confronto e conflito entre os agentes de duas estruturas comerciais distintas: uma, multi-secular, instalada e consolidada com as suas regras próprias, adequadas às diferentes condições ambientais e sócio-culturais e anterior ao século XVI; a outra, aquela que os responsáveis pela colonização portuguesa implantaram, com base nos circuitos existentes, impondo-lhe, contudo, algumas alterações que se relacionavam com a navegação, o pagamento de direitos aduaneiros, a restrição do número de intervenientes no processo comercial e a introdução de novos produtos.


As duas estruturas funcionariam em paralelo, cabendo à primeira o predomínio quase absoluto, sempre dominada pelos comerciantes árabes e suaílis/mouros da costa, a que se juntariam, no primeiro quartel do século XVIII, comerciantes franceses e ingleses. Os mercadores das Ilhas, onde se incluíam, por vezes, as principais autoridades civis e militares e alguns frades dominicanos, embora participassem, algumas vezes, na segunda, integravam a maioria do seu negócio no seio da primeira estrutura.


Entre todos agentes, caberia papel de relevo aos mercadores da Costa de Zanzibar e dos demais portos do norte, os denominados Mouros da Costa, que, apesar dos entraves colocados pela autoridades portuguesas, nunca deixariam de extrair das Ilhas e terras firmes, próximas do litoral e do interior, marfim, ouro e escravos, que, depois, através das principais cidades suaílis da costa leste de África, se integravam no comércio a longa distância.


Com a intensificação do tráfico esclavagista, verificada a partir da terceira década do século XVIII, no qual estavam envolvidos Árabes, Mouros da Costa, Franceses, Portugueses e Chefes africanos, acentuou-se a importância dos diversos portos, particularmente, os litorálicos desta parte norte do território de Moçambique, que continuaram a servir de entrepostos comerciais e de locais de descanso das tripulações, de elos de ligação entre o comércio marítimo - local, regional e de longo curso - e o comércio com o interior - local e a longa distância.


Através dessa rede de pequenos portos, aliás, seguros pela protecção que recebiam das ilhas adjacentes, passava toda a importação-exportação dos variados bens, de múltiplas proveniências e destinos. Além dos portos insulares da Querimba, Ibo e Matemo, merecem especial atenção os ancoradouros ou portos de Funzi, Mossimboa, Messano, Samouco, Quissanga, Arimba, Sito e Tari, situados nas terras firmes. De todos eles, as autoridades portuguesas, por falta de estruturas de apoio e de uma fiscalização efectiva e eficiente, apenas controlavam e com dificuldades, o porto do Ibo.

Do conjunto de homens de negócio que integrava esta vasta teia de relações comerciais, faziam parte os mercadores das Ilhas, cuja actividade se estendia à Macuana. As longas distâncias, as condições ecológicas adversas e as restrições na circulação de pessoas e bens impostas pelas autoridades políticas africanas de cada região, eram obstáculos a vencer por todos os que pretendiam mercadejar nas terras do sertão africano.

Estes mercadores, com a ajuda do seu prestígio social, proveniente da ascendência familiar e dos cargos que desempenhavam, sempre propiciadores de grandes benefícios materiais e sociais e aproveitando, ainda, a dupla herança cultural que eram portadores (afro-suaíli e europeia), conseguiam, através de alianças de parentesco e de clientela, introduzir-se, com alguma facilidade, no seio dos diferentes sistemas sócio-políticos e económicos, onde tinham necessidade de exercer a sua actividade, que, deste modo, se estendia até às terras do interior, servindo de elemento de ligação entre as sociedades costeiras e as sociedades africanas do interior. Este seu comportamento levou a permanentes situações de conflito com as autoridades portuguesas que não aceitavam de bom grado situações de ambiguidade: ser autoridade, civil ou militar e ao mesmo tempo prestar ajuda e negociar com mercadores estrangeiros que praticavam o contrabando (Árabes, Mouros da Costa e Franceses).


No comércio Ilhas/interior/Ilhas, que ganhou relevância com o crescente aumento da economia esclavagista, participavam os mouros da costa, os moradores do território, ajudados pelos adimos e escravos e os régulos independentes da Macuana, directamente ou através dos seus enviados.


Dado o significado das mercadorias - fazendas, armas, escravos, ouro e marfim -, que circulavam em tão vasto e diversificado espaço - na investigação levada a cabo procurou-se dar respostas a múltiplas e pertinentes interrogações: Quem eram os responsáveis pela circulação das mercadorias entre o litoral e o interior? Qual o papel de cada um dos agentes intervenientes no processo? Onde, com quem, o quê e como se trocava? Com que estruturas e meios e em que épocas do ano se realizavam as trocas? Por que processos se obtinham os produtos vindos do interior? Como procediam os comerciantes que do interior vinham comerciar no litoral? Pacificamente ou pela violência? Que problemas se colocavam, no processo, aos comerciantes que do litoral se dirigiam para o interior e tinham de atravessar territórios de formações políticas independentes do domínio português? Que soluções encontravam para os resolver? Qual a intervenção das autoridades portuguesas nas trocas comerciais com o interior? Que impacto tiveram estas trocas sobre as diferentes realidades sócio-culturais intervenientes no processo?


Era com a ajuda dos moradores negociantes e dos comerciantes mouros da costa e árabes que as mercadorias desembarcadas nos portos do território passavam às terras continentais adjacentes. Os Franceses estavam menos envolvidos nessa tarefa, limitando-se o seu comércio, quase exclusivamente, às povoações da costa, especialmente, às insulares.


Ao invés do que acontecia com os dois mais importantes e próximos - Moçambique e Quiloa -, os diferentes portos das Ilhas não eram servidos, directamente, por qualquer rota de comércio internacional a longa distância. A falta de uma estrutura de tal envergadura, comprovada pelos estudos realizados, até ao presente, sobre o comércio do interior da África Central e Oriental e o seu litoral, iria influenciar o modo de comerciar e o fluxo de mercadorias circulantes entre o litoral e o interior desta parte do território africano, balizados pelos rios Lúrio e o Rovuma.


Os vários agentes envolvidos no tráfico de homens procuravam, em primeiro lugar, obter o máximo de proveitos nos seus negócios, expectativas, que nem sempre eram concretizadas. Múltiplos factores, em interacção, pesavam sobre os resultados finais da actividade de cada mercador, destacando-se entre outros:

- o preço de compra dos escravos, que dependia das leis da oferta e da procura, do sexo, da idade, da sua etnia e do seu estado físico;
- as distâncias a percorrer entre os locais de compra e os locais de destino;
- as múltiplas dificuldades que se colocavam durante e ao longo desse percurso, nomeadamente, autorizações para se abrirem caminhos, fugas, roubos e outras violências;
- o tempo de demora nos portos a aguardar compradores; e
- a alimentação, vestuário e outros bens destinados a manter a vida, a saúde e o estado físico dos escravos, indispensáveis para valorizar a oferta na altura da sua venda nos portos de destino.


Chegado ao local do interior mais vantajoso, escolhido com todo o cuidado, o mercador contactava com o chefe da povoação e, em breve, começavam a chegar os vendedores com os seus escravos. Iniciava-se, então, um processo moroso com um exame minucioso da mercadoria relacionado com o sexo, a idade, cor da pele, defeitos e estado de saúde.


Salvo raras excepções, a escolha dos escravos ficava limitada a faixas etárias muito específicas, que deviam englobar, tão somente, indivíduos sadios, capazes de fornecer uma força de trabalho vigorosa e lucrativa.


Depois de observados, com todo o rigor, os escravos expostos no mercado, seguia-se o demorado negócio, muito fraseado, tipificado por padrões muito próprios, em que o tempo-horário tinha pouco ou nenhum significado económico. Concluída a transacção e depois de colocadas gargaleiras a quase todos os escravos, para evitar fugas, iniciava-se, por etapas diárias, a viagem de regresso a casa. Após aqui chegarem, recebiam cuidados especiais para melhorar os seu estado físico e serem vendidos por preços mais elevados. Os principais compradores destes escravos eram os comerciantes franceses que, quase sempre, clandestinamente, e em aberta colaboração com as autoridades locais, terão, entre 1742 e 1822, adquirido nos portos das Ilhas, em troca de arroz, patacas, armas e pólvora, para cima de 70 000 escravos, que terão transportado para as ilhas Maurícias, em cerca de 300 embarcações e pelos quais terão pago mais de um milhão de patacas. Estima-se, por outro lado, que os mercadores árabes e mouros da costa terão carregado, no mesmo período, nas 5 dezenas de pangaios ou dalos cerca de 500 escravos/ano, com destino à Ilha de Moçambique e aos portos índicos situados a norte e a leste de Cabo Delgado.


Os preços de cada escravo foram variáveis ao longo do tempo, dependendo não só das leis da oferta e da procura, mas também das categorias e das características dos escravos relacionadas com o sexo, a idade, a compleição física, a etnia, a religião e a ocupação. Até 1780, o custo de cada escravo adquirido para embarque oscilava entre os 24 e 100 cruzados, subindo depois para preços compreendidos entre os 100 e 300 cruzados. Um mercador podia comprar, no interior, um escravo "cafre" por 40 cruzados e depois vendê-lo, nas Ilhas, aos comerciantes franceses por 80 ou 90.


As patacas provenientes, sobretudo, das Maurícias dadas em troca de escravos não permaneciam, durante muito tempo, nas mãos dos mercadores do território, pois, com elas, compravam panos/fazendas e velório que vinham da Índia e produtos alimentares em Moçambique e aos Árabes e Mouros da Costa. Esta moeda metálica espanhola, que valia 6 cruzados, fazia parte de um sistema triangular que englobava as Maurícias( Maurícia e Reunião), os portos de escala Ilhas que exportavam escravos, cauri e marfim e a Índia( Bengala, Surrate, Goa Damão e Diu) donde provinham as fazendas sortidas, o velório sorteado de várias cores e outras bugigangas, com as quais se trocavam escravos, ouro e marfim, nas terras do interior.


O crescente aumento do tráfico esclavagista, em que os chefes africanos tiveram papel preponderante, esteve na génese de algumas pequenas chefados ou chefaturas, sediadas nas terras firmes próximas dos prazos do coroa estabelecidos entre o rio Rovuma e a grandiosa baía de Pemba, como os de Maroro, Mutuga, Malela e Marihé. E mais para o interior o de Mugabo. Os seus chefes controlavam comerciantes e fazendas, marfim e armas, além de outros bens de prestígio, que circulavam pelas terras da sua jurisdição.


Para apoiar os seus desígnios coloniais e a defender os seus interesses económicos ameaçados por mercadores estranhos às Ilhas, as autoridades portuguesas criaram várias estruturas político-administrativas:

- uma capitania-mor e a nomeação regular dos seus titulares;
- o reforço da guarnição militar;
- um corpo auxiliar de milícias;
- três fortificações militares: S José, S.João Baptista e Santo António;
- um corpo de autoridades administrativas auxiliares; e
- uma vila com câmara e tribunal.


As novas estruturas contribuiriam, especialmente, para fortalecer o prestígio e o poder da elite local, cujos membros, a partir do último quartel do séc. XVIII, passariam a intervir, mais activamente, nos diversos domínios da administração colonial, ocupando os seus mais elevados cargos.


Estas novas formas organizativas vieram acentuar a clivagem social existente na situação colonial entre as diversas categorias de indivíduos. Neste processo de diferenciação social, um pequeno grupo de habitantes, que podemos denominar de elite - a maior parte deles filhos da terra -, cada vez com mais poder social e político, passou a monopolizar as recompensas ou vantagens que a situação colonial oferecia, ficando a restante população maioritária delas carente.


Na parte inferior da pirâmide social encontravam-se os escravos, seguindo-se-lhes, em plano superior, os colonos, designadamente, os adimos que estavam ligados à exploração da terra, mas dependentes dos foreiros. Vinham depois os artesãos, os pequenos mercadores, os empregados civis e militares das categorias mais baixas da cadeia hierárquica e as autoridades mouriscas e os dignatários islâmicos. A um nível mais alto estavam situados os médios e grandes comerciantes, os oficiais inferiores da Guarnição Militar, oficiais do Regimento de Milícias menos graduados, sargentos-mores e escrivães da Feitoria e da Câmara. De imediato os oficiais superiores com menos graduação e oficiais do Regimento de Milícias mais graduados e foreiros sem outros desempenhos, e oficiais da Câmara. Nas posições seguintes estavam situados os capitães-mores das terras firmes, os foreiros que simultaneamente desempenhavam funções de oficiais superiores do referido Regimento, os oficiais mais graduados da Guarnição, o feitor, o juiz e presidente da Câmara e o mestre de campo. E, finalmente, no topo da pirâmide social encontrava-se o Governador, símbolo da soberania real e do domínio português nas Ilhas.


A implantação de novas estruturas político-administrativas destinada a consolidar o domínio colonial português geraria, aqui e ali, situações conflituosas de alguma gravidade e agravaria as relações entre os detentores do poder político e as autoridades religiosas- os frades Dominicanos -, encarregadas da missionação do território. Os conflitos de jurisdição eram frequentes e alguns frades, pelas suas práticas desviantes, tornaram-se indesejáveis no território.


As autoridades coloniais portuguesas também tiveram que se confrontar com as rebeldias, desobediências e "alevantamentos" dos filhos da terra, designadamente foreiros e mercadores, que reconheciam a autoridade dos governadores e dos seus auxiliares, apenas nos casos em que as suas ordens não contrariassem os seus negócios e interesses.


Mas situação colonial, não só teve de enfrentar os vários problemas de natureza interna, como também outros de natureza externa consubstanciados nos ataques desferidos contra o território e sua população pelos corsários franceses, pelos vizinhos Makhwa e pelos invasores Sakalava de Madagáscar.


Pelo seu impacto interno e externo, são de salientar os prejuízos humanos, morais e materiais causados pelos Sakalava que atingiram uma dimensão muito difícil de calcular. Segundo dados das fontes documentais portuguesas admite-se que entre 1500 e 2000 pessoas (livres e escravas), terão sido feitas prisioneiras e embarcadas para Madagáscar. Os animais domésticos - gado bovino e caprino - roubado terá atingido os dois milhares e os mantimentos centenas de toneladas.


A presença intercalada dos Sakalava, durante cerca de 17 anos, teve fortes implicações na demografia, cultura, organização social e economia do território, especialmente, no sector primário e no relacionamento, quer entre os seus diferentes grupos étnicos , quer com as várias autoridades suaílis das Ilhas índicas suas vizinhas e as autoridades Makhwa das terras firmes, que, algumas vezes, puseram de lado, as suas rebeldias e desobediências e, momentaneamente, cooperaram com as autoridades portuguesas.

As incursões malgaxes vieram realçar as contradições existentes no seio da situação colonial, destacar as forças antagónicas que se agitavam no seu interior e as dificuldades sentidas pelas autoridades portuguesas para imporem o seu poder político-administrativo e económico e para fazerem cumprir, por parte da sociedade civil, as suas normas.

Terminados os ditos conflitos armados, que causaram profundas alterações na estrutura e no funcionamento das instituições coloniais, a situação no território caracterizava-se, em 1822, por:

- uma fraca densidade populacional;
- uma distribuição espacial irregular da população, concentrada especialmente na ilha do Ibo;
- uma economia que assentava basicamente no comércio clandestino de escravos e de produtos alimentares dominado pelos Mouros da Costa, que a partir da saída dos Franceses de cena e da paralisação parcial da rede administrativa colonial do território, passariam a controlar toda a actividade comercial e a difundir os seus valores religiosos com grande à vontade entre as populações das terras contactadas, tanto do litoral como do interior.

A natureza insular do território, factor mais de repulsão do que de atracção e de desenvolvimento, as fracas possibilidades de sobrevivência - assentes basicamente no comércio - e a falta de horizontes e perspectivas futuras, levariam ao êxodo dos filhos da terra menos aventureiros e com mais posses económicas. Ao longo do tempo foram, com as famílias, abandonando as suas terras, fixando-se em locais mais seguros e promissores, como a ilha de Moçambique, outras vilas da Capitania-Geral, a Índia e o Reino. Os mais ousados e menos afortunados ficaram e continuaram a ajudar os Portugueses a permanecer e a perpetuar o seu domínio colonial, graças a uma política concreta, espontânea, de miscigenação, adaptação, integração e convívio pluri-étnico, respeitadora dos diferentes valores humanos das sociedades afectadas pelo fenómeno da colonização.

O estudo realizado vem confirmar que as políticas de contemporização, acomodação, coabitação e miscigenação, postas em prática, mais do que o resultado de acções planeadas pelo poder político colonial, constituíram uma superior adaptação ao meio, uma criação original de solidariedade comunitária, um produto da necessidade de sobrevivência e resolução, em comum, dos problemas que enfrentavam colonizadores e colonizados, embora os antagonismos e os conflitos dos respectivos interesses. Concretamente, a prática conjugada de tais políticas teve como resultado a manutenção da situação colonial, mesmo nos períodos mais críticos, designadamente durante os golpes desferidos do exterior, a qual, a partir do 2º quartel do século XVIII, iria servir de suporte ao intenso tráfico esclavagista que se desenvolveu em Moçambique e em toda a costa índica de África, no qual as Ilhas e terras firmas e os seus moradores tiveram uma participação muito activa.

Durante os cerca de 80 anos, tal o tempo que abarca a tese apresentada, continuou, embora mais atenuadamente, relativamente a períodos anteriores, o processo de interpenetração e de síntese das culturas em presença (suaíli, mwani, makhwa, makonde, yao, portuguesa e francesa), com trocas recíprocas entre elas, embora menos profundas em relação à cultura europeia/portuguesa.

A concretização do projecto de investigação levado a cabo vem confirmar, por um lado, as potencialidades e a fecundidade da informação oferecida pela documentação escrita, quando articulada com os dados recolhidos directamente no terreno sempre que se pretende compreender e interpretar, em termos de processos ecológicos e sócio-antropológicos, o sentido dos factos sociais de um determinado período histórico e a riqueza, diversidade e o significado da vida humana em diferentes contextos e as suas vicissitudes temporais e espaciais. Por outro lado, realça, apesar das diferenças sócio-culturais, económicas e religiosas existentes, e das situações de conflito e de violência, por vezes geradas em tais situações, o convívio, a solidariedade e a coabitação, no mesmo espaço, entre os membros dos diversos grupos étnicos, com modos de vida e credos religiosos diferenciados e até antagónicos, que integravam a realidade humana, constituída pelas Ilhas e terras adjacentes.

Finalmente, o estudo concretizado, para além do contributo que possa representar para o aprofundamento do conhecimento sobre estas formas específicas de vida em comum e as inter-relações que se estabeleceram entre a África e a Europa e o papel que neles teve o Oceano Indico, constitui uma preciosa achega não só para desmistificar as ideias-fantasma relacionadas com os processos de colonização e descolonização, como também para ultrapassar o sentimento de culpa ainda persistente entre os europeus relativamente aos seus antigos domínios coloniais, ideias que em nada ajudam o novo relacionamento entre as antigas metrópoles e os novos países independentes libertados da situação colonial.

7 -Mulheres mestiças da elite local, de rara beleza, ficando conhecidas por brancas do Ibo. Para mais pormenores vidé BENTO, op, cit. p. 77.

8 - Povos de Madagascar que, entre 1800 e 1817, saquearam, por várias vezes o território.Ver BENTO, op. cit. II Vol. pp 592 e seguintes que faz uma análise profunda sobre as várias invasões e sobre as suas implicações na situação colonial.

9 -BENTO, op.cit. p.575 e segts, Vol II.