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6/16/14

Mueda (Cabo Delgado - Moçambique) - 16 de Junho de 1960 - O Massacre...

16 de Junho - ANIVERSÁRIO DO MASSACRE DE MUEDA EM CABO DELGADO - MOÇAMBIQUE - PORQUÊ O SILÊNCIO CONVENIENTE? Data outrora tão badalada, nem o NOTÌCIAS (on line) - (orgão 'oficioso' patrocinado pelo do poder em Moçambique, acrescento eu) de hoje, a ela se refere. Porque será? - Fernando Gil - MACUA DE MOÇAMBIQUE.
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A verdade, honestidade, coerência e frontalidade nunca envergonham nem têm preço. Só assim se aprende com o passado e se poderá acreditar no futuro. Do "Moçambique Para Todos" de 15/06/08 transcrevo:
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E continua-se a mentir despudoradamente!
"Para o deputado Casimiro Huate, da bancada da Frelimo, o 16 de Junho é símbolo da resistência dos moçambicanos contra o colonialismo português. Segundo afirmou, o massacre de Mueda de 1960 é ponto mais alto da recusa do regime colonial do direito do povo moçambicano à autodeterminação e independência.
“Os moçambicanos estavam cansados da opressão colonial, das barbaridade e crueldades do regime colonial. Por via pacífica, exigiram ao administrador colonial português em Mueda a independência, mas a resposta massacre. Os moçambicanos sempre pautaram pelo diálogo, mas o regime colonial sempre negou”, disse, acrescentando que o 16 de Junho foi o elemento catalisador da consciência de que a independência só podia ser conquistada por via armada.
Casimiro Huate afirmou que os jovens devem saber valorizar as obras dos heróis moçambicanos, as conquistas da independência nacional, demonstrando o seu patriotismo e cidadania com boas obras. Segundo o deputado, as almas e o sangue de mais de 500 moçambicanos que naquele foram barbaramente assassinados em Mueda só estarão descansadas e valorizado quando todos os moçambicanos, em particular os jovens, trabalharem em prol do desenvolvimento do país e da consolidação da unidade nacional. Questionado sobre a promoção do desenvolvimento em locais históricos, como é o caso de Mueda, que neste momento se ressente da falta de água e energia eléctrica, Casimiro Huate afirmou que o mês passado na Assembleia da República, o Governo falou do programa visando o abastecimento de água em Mueda, bem como de outras acções ara benefício da população local.
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Ao senhor deputado e a todos os historiadores de Moçambique:
- Vejam tudo sobre este acontecimento aqui !
Resta-me acrescentar que, ainda nos anos 60, Mueda e o planalto dos macondes beneficiavam de abastecimento de água. Mais de 30 anos após a independência, porque não terão?
Fernando Gil 
  • O video "Pidjiguiti e Mueda-6º Episódio" - YouTube - aqui !
  • Post's anteriores deste blogue sobre a série "A Guerra" - aqui 1, aqui 2, aqui 3 e aqui 4 !

11/27/10

A Ilha do IBO e a História: Café do Ibo ganha medalha de ouro... em 1906


UMA PÉROLA DE MOÇAMBIQUE - O AFAMADO CAFÉ DO IBO GANHA MEDALHA DE OURO EM LISBOA - Por Carlos Lopes Bento(1).

Considerando o contributo e a mais valia que o saboroso e aromático café do Ibo poderá dar à divulgação do norte de Moçambique, designadamente, de Cabo Delgado e das Ilhas de Querimba, achei oportuno divulgar alguns interessantes dados, extraídos das minhas fichas de leitura e bibliográficas, relativos à sua produção e consumo, nos séculos XIX e XX.

Durante a minha estadia, em Cabo Delgado, de 1967 a 1974, e, especialmente, na ilha do Ibo, onde residi de 1969 a 1972, tive o privilégio de saborear o delicioso café do Ibo, e de o oferecer a muitas centenas de visitantes, nacionais e estrangeiros, que, então, a visitaram, sendo por todos muito apreciado.

O cafezeiro continuava, ainda, na década de 70 do século passado, a crescer ao ritmo natural, - que até se desenvolvia nos solos pedregosos de coral, existentes na parte insular do território -, merecendo poucos ou nenhuns cuidados por parte das populações do distrito, embora algumas tentativas tivessem sido feitas para alterar a situação.
Foi nesse sentido que autoridades portuguesas do Reino procuraram, nos finais do século XVIII, passar da recolecta à cultura do cafezeiro, de modo a introduzir o café no comércio com Lisboa, facto que acarretaria grandes benefícios, tanto para o Reino, como para as Colónias.

De modo a promover e a animar a plantação do café nas Ilhas de Querimba, a Provisão real de 2/3/1800, determinava que, anualmente, delas fossem remetidas 10 arrobas do melhor café, obrigando-se, para tanto, "cada morador e agricultor a plantar tantas árvores, proporcionalmente ao terreno que possuir, persuadindo-os que isto poderá a vir a ser, em pouco tempo, um ramo de comércio, muito útil aos moradores”.

Em 1803 foram enviadas, para o Palácio Real de Queluz, 3 arrobas e 18 arráteis de café das Ilhas remessas que continuariam até 1808, data em que seriam suspensas, pelas dificuldades da sua aquisição nas terras firmes.

Embora se tenham plantado algumas machambas de cafezeiros tanto na parte insular, como continental do território, os resultados, em 1810, ainda não eram visíveis, por vários motivos: a pouca idade dos cafezeiros plantados, que ainda não produziam; as incursões dos Sakalava, que perturbaram essa campanha; e pouco interesse dos agricultores por essa cultura, cujos benefícios imediatos não eram comparáveis, por exemplo, à cultura do coqueiro.

No sentido de ultrapassar todas as dificuldades, uma nova Provisão real, de 1810 recomendava todo o interesse das autoridades para incrementar a cultura do cafezeiro e outros produtos agrícolas, que pudessem constituir-se objectos de exportação e compensar-se os de importação.

As tentativas para introduzir, nas Ilhas e terras firmes, uma agricultura orientada para uma economia de mercado, redundariam em completo fracasso.

Nos meados do século XIX, o governador das Ilhas, Jerónimo Romero, presta-nos as seguintes informações sobre a produção de café:- São escassas as colheitas de café na ilha do Ibo; no Lumbo, margens do rio Cariamacoma achava-se café silvestre; nas margens do rio Lúrio encontram-se espessas matas de cafezeiros silvestres; Em Tungué, as margens do rio Meninguene são ricas em café do mato.

- Era somente na ilha do Ibo e proximidades do rio Cariamacoma que se fazia a cultura de algum café por um ou outro morador curioso, pois, os demais, não davam importância nem se dedicavam a tão útil cultura. Deste modo o cafezeiro produzia, espontaneamente, como qualquer outra planta do mato, sendo a sua apanha dificultada por eles se acharem entre matos cercados de arvoredo e pelo risco dos animais ferozes existentes nestas paragens.

- Então as maiores colheitas de café faziam-se na Ilha do Ibo (12 arrobas), em Criamacoma ou Lumbo (14 ar.), em Fragane (14 ar.), próximo da Quissanga, e em Bringano (10 ar.), a sul da ilha de Querimba.

- Os preços praticados eram, no Ibo, de 5 a 6$000 réis a arroba e o que saía para a ilha de Moçambique poderia atingir os 7$000 réis.
Em 1902, o Governador dos Territórios da Companhia do Niassa Ernesto Jardim de Vilhena dava conta que, no Ibo, anexa à propriedade urbana, nomeadamente, nos quintais os moradores plantavam os seus cafezeiros.

Três anos depois, em 31 de Julho de 1905, Governador dos mesmos Territórios, João dos Santos Pires Viegas, escreveu algumas notas sobre o café, do seu distrito, enviado para a Exposição Colonial de Algodão, Borracha, Cacau e Café.(Abril a Maio de 1906), realizada, na sua sala Algarve, pela Sociedade de Geografia de Lisboa:

“O café dos Territórios da Companhia do Nyassa, geralmente conhecido por “café do Ibo”, tem qualidades de preferência muito superiores a muitas variedades das nossa colónias, mas quase sempre passa despercebido, atendendo à sua quase nula exportação, e esta devido ao nulo desenvolvimento que os filhos do Ibo e de Querimba, senhores de enormíssimos tratos de terreno no litoral, dão ao cultivo do cafezeiro.

Hoje o cafezeiro nasce, cresce, produz e morre, sem que alguém pense no amanho da terra, sem que o limpem ou cuidem renová-lo na época própria.

Não só não o cultivam, como não procuram tirar daqueles que existem e cuja maior parte espontaneamente surgiu da terra, convenientemente o seu produto.

Inteiramente verde, a formar-se ainda, o proprietário colhe-o sacudindo as árvores ou batendo os ramos com varas, seca-o, ligando pouca atenção às propriedades que ele poderia ter se a maturação se deixasse fazer e fosse completa, e isto para que o preto não o roube.

Ainda assim o café da ilha do Ibo é mais saboroso e superior em qualidade a outro qualquer dos Territórios, porque sendo fácil vigiar a propriedade, só é colhido na época própria e algum é seco e arrecadado segundo os preceitos aconselhados.

Nestas condições, em terreno próprio, entre altos coqueiros, que pouca sombra lhe dão ou entre acácias e macieiras bravas, que lhes roubam o espaço, os cafezeiros encontram-se em quase todas as circunscrições dos Território aquém do rio Lugenda.

O seu preço varia segundo as necessidades que o indígena tem de dinheiro; e assim não é difícil encontrar pretos pelas ruas do Ibo, na Quissanga e no litoral, a oferecerem-no à venda a 150 e 200 réis. O seu preço ordinário, porém, é de 300 réis o quilo, quando bem seco e limpo. O café da “Vista Alegre”, Ibo, o melhor talvez dos Territórios, tem sido vendido a 500 réis, em anos de colheita fraca.

A produção, em relação ao tratamento que o cafezeiro recebe, é grande, mas a sua aparência desagrada, pela pequenez do seu grão, comparada a outras qualidades; contudo o café é apreciado e apetecido pelo seu aroma delicioso e pelo seu sabor.

É afamado o “café do Ibo”, porém poucas pessoas o conhecem, além daquelas que têm permanecido ou passado pelos Territórios e pelo distrito de Moçambique, e ainda aquelas que no Reino têm relações nesta parte desta nossa África.

Nos Territórios da Companhia do Nyassa não tem consumo outro café.

Encontra-se café, em quantidade, não só em todo o litoral como nas margens do M´Salo, Naquidunga e Pequeue, no concelho de Mocimboa, nas encostas das serras Muare e M´chibala, serras que formam um garganta onde se acha estabelecida a sede do concelho do Medo, no Mualia.

Os Territórios da Companhia do Nyassa concorrem à exposição da Sociedade de Geografia de Lisboa com nove amostras de café:

- Quririmisi, Quiriamacoma, Olumbua, Ibo, do concelho do Ibo.
- Tandanhangue, Memba, do concelho de Quissanga.
- Naquidunga, do concelho de Mocimboa.”

Salienta ainda o dito Catálogo uma nova espécie de Café, o Coffea Ibo, de Frohner, assim caracterizado:


“ Dos cafés, além dos tipos Coffea Liberica e Coffea Arábica, especializaremos um espécie nova, o Coffea Ibo, de Frohner, apresentado pela Companhia do Nyassa, e que, pela pequenez do seu grão alongado, semelhante mais ao bago do trigo do que o do café ordinário. Cultivado com esmero, deve por certo produzir um produto que alcançará boa cotação no mercado, pelas suas qualidades aromáticas.”

Relativamente ao CAFÉ, a Companhia do Niassa foi distinguida com o Diploma de medalha de ouro.

O cafezeiro florido, de extrema beleza, também poderá, futuramente, constituir mais um factor de atracção turística a ter em consideração no desenvolvimento sócio-cultural de Cabo Delgado e de Moçambique.

Bibilografia: VASCONCELOS, Ernesto de, Exposição Colonial de Algodão, Borracha, Cacau e Café.(Abril a Maio de 1906), CATÁLOGO. Lisboa, Sociedade de Geografia de Lisboa, 1906, p. 104.

(1) - (colaborador do ForEver PEMBA) - Doutor em Ciências Sociais pelo ISCSP, Univ. Técnica de Lisboa. Antigo administrador colonial. Foi presidente da C. Municipal do Ibo, entre 1969 e 1972. Antropólogo e prof universitário, continua a ser um dedicado amigo das históricas Ilhas de Querimba, que continua a investigar de maneira sistemática e a divulgar as suas inquestionáveis belezas. Neste trabalho, de modo a evitar o plágio, tão usual no nosso tempo, apenas se indica um autor. Para os interessados, desde que o solicitem, poderei fornecer outros elementos bibliogáficos que lhe serviram de base.

  • Demais posts deste blogue onde se encontram trabalhos do Dr. Carlos Lopes Bento - aqui !
O AFAMADO CAFÉ DO IBO GANHA MEDALHA DE OURO EM LISBOA
Uma Pérola de Moçambique
O afamado Café da Ilha do Ibo ganha medalha de Ouro em Lisboa
Por Carlos Lopes Bento 
(Dê duplo click com o "rato/mouse" para ampliar e ler. Link para formato "pdf" http://www.youblisher.com/files/publications/12/69933/pdf.pdf)

5/06/10

Retalhos: De Porto Amélia a Pemba - Como foi a Expansão Portuguesa em Moçambique

Brasil - Arquivo Nacional - Uma imensa fonte de pesquisa !
Como foi a Expansão Portuguesa em Moçambique - Fabiano Villaça dos Santos

Os portugueses chegaram a Moçambique em 1498 e a administração colonial foi instalada três anos mais tarde, ficando o território dependente do Estado da Índia até 1752. Em 1569, Moçambique foi elevada à condição de capitania-geral, englobando a região de Sofala e a do Monomotapa. A ocupação de Moçambique se iniciou em 1507, contudo, segundo o historiador Luiz Felipe de Alencastro, a penetração portuguesa em Moçambique foi muito frágil, sobretudo se comparada à conquista e à ocupação de Angola, na costa ocidental da África.

Durante boa parte da colonização portuguesa, Moçambique desempenhou a função de entreposto comercial e de ponto de apoio para os navios com destino ao Oriente. Com relação ao desenvolvimento interno da colonização, de acordo com Luiz Felipe de Alencastro, os portugueses praticamente não interferiram no processo produtivo da região, além de não conseguirem reorientar em benefício próprio os circuitos de comércio local, o que corrobora a posição estratégica de Moçambique na carreira da Índia. As trocas permaneceram voltadas para o Norte da África e para o Leste, em direção ao Golfo Pérsico, onde regiões como Omã adquiriam grande quantidade de escravos.

Para Charles Boxer, a penetração portuguesa no território de Moçambique também foi dificultada, até o século XVIII, pela insalubridade verificada nas regiões costeiras da África e da Ásia. A correspondência oficial entre Lisboa e Goa, de 1650 a 1750, relata a preocupação das autoridades com o escasso contingente de portugueses reinóis no Oriente e com as altas taxas de mortalidade na região, incluindo Moçambique como parte do circuito indiano. Tal situação parece não ter se alterado depois de 1750, pois, em 1799, o vice-rei conde de Resende sugeriu o envio anual de vadios e voluntários do Rio de Janeiro para povoar diferentes regiões africanas, como Moçambique.

Outras dificuldades enfrentadas pela administração metropolitana em Moçambique, bastante comuns nos domínios coloniais portugueses, relacionavam-se à ação dos funcionários régios. Charles Boxer atentou para as constantes queixas presentes na correspondência oficial e extra-oficial, sobre o descuido na aplicação da justiça em lugares distantes, como Moçambique, Macau e Goa. Problema recorrente, levou a Rainha dona Maria I a publicar um alvará, em 14 de abril de 1785, com o objetivo de coibir abusos cometidos por governadores e ouvidores da capitania de Moçambique, tais como a cobrança indevida de donativos e a realização de transações comerciais particulares com rendimentos da Real Fazenda. O alvará previa penalidades que iam da perda do cargo ao pagamento de indenizações pelos culpados de tais abusos.

Quanto ao tráfico de escravos, a região do Congo-Angola supriu grande parte da demanda de mão-de-obra durante o período colonial. O fluxo de escravos de Moçambique, em especial para o Rio de Janeiro, foi pequeno e irregular até o início do século XIX, havendo, no entanto, referências a iniciativas de negociantes desta praça, engajados no circuito de Moçambique, Sena e Goa, para instalar uma companhia de comércio de gêneros e escravos africanos, em 1744. Algumas décadas antes, em 1719, uma ordem de d. João V enviada ao governador-geral do Estado do Brasil, d. Sancho de Faro e Sousa, determinava uma alteração emergencial na rota do tráfico de escravos do Atlântico para a baía de Lourenço Marques, no sul de Moçambique, em virtude dos ataques de navios holandeses aos portugueses na costa ocidental da África. Essas medidas demonstram que, até o final do século XVIII, o tráfico de escravos da África Oriental ainda não havia se consolidado.

A participação mais efetiva da África Ocidental no fornecimento de escravos para o Rio de Janeiro declinou entre 1795 e 1811, ano em que Manolo Florentino verificou um crescimento da oferta de cativos oriundos de Moçambique. Esse crescimento se explica, em termos mais amplos, pela Abertura dos Portos, em 1808, que favoreceu o aumento do número de expedições para Moçambique a fim de resgatar escravos. Nesse movimento, ganhou destaque o porto de Quilimane. Para o porto de Salvador, outro importante mercado de escravos da colônia, a demanda de escravos permaneceu sendo suprida pela região do Congo-Angola. O porto do Rio de Janeiro, entretanto, não monopolizava o recebimento de africanos de Moçambique. Houve reivindicações de comerciantes do Pará, envolvidos no tráfico de escravos em diferentes regiões africanas, dentre as quais Moçambique, na última década do século XVIII, para obter isenção do pagamento de direitos (impostos) por um certo período de tempo, demonstrando que outros portos coloniais eram abastecidos de cativos da África Oriental.

A regulação do tráfico de escravos, independente da região fornecedora, não escapou às diretrizes reformistas da política colonial portuguesa. Para manter o controle sobre o contingente de cativos transportados de Moçambique e outros mercados africanos, foram organizados os termos de contagem de escravos, elaborados após o recolhimento do imposto sobre os escravos na alfândega, em que se atestava o número de escravos embarcados na África e os que chegavam à América, deduzidos os mortos durante a viajem, que não eram poucos, ou logo após o desembarque no porto de destino. Em 13 de junho de 1802, um termo de contagem de escravos provenientes de Moçambique no navio Ninfa do Mar, por exemplo, acusou a chegada de 227 escravos vivos e 228 mortos, ao porto do Rio de Janeiro.

As autoridades pareciam estar atentas quanto ao cumprimento das medidas de registro dos escravos, como demonstra a referência a uma devassa realizada em 1812, no bergantim Esgueira, pela morte de numerosos africanos vindos de Moçambique, conforme indicou um ofício expedido ao juiz do crime do Rio de Janeiro. Instruções anteriores de d. Rodrigo de Sousa Coutinho ao vice-rei, conde de Resende, determinavam um rígido controle sobre as rotas dos navios negreiros. Em carta de 12 de dezembro de 1798, o secretário de Estado da Marinha e Ultramar tratou do extravio de escravos quando os navios que os transportavam precisavam fazer baldeação. Para evitar tal prática, d. Rodrigo de Sousa Coutinho recomendou que se fizesse uma lista com o dia da saída, o nome dos mestres das embarcações e o número de escravos transportados.

O tema do tráfico de escravos aparece como o mais recorrente quando se pensa em África, ocidental ou oriental. Moçambique, como outras regiões africanas, a exemplo de Angola e Benguela, também foi local de degredo. Os inóspitos e “hostis” domínios africanos receberam réus da Inconfidência Mineira condenados ao degredo em Moçambique e Angola, como indica a correspondência do vice-rei, conde de Resende, para a Corte, de 29 de abril de 1792, em que se registra também a condenação à pena capital de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.

Segundo Charles Boxer, no século XIX Moçambique foi afetada pela conjuntura européia das invasões napoleônicas, que motivaram a transferência da Corte portuguesa para a América e a sua longa permanência no Rio de Janeiro. Entre 1805 e 1825, Portugal teria abandonado suas colônias asiáticas e africanas, contexto em que se insere a Independência do Brasil. Ainda de acordo com Charles Boxer, idéias sobre o desenvolvimento de Angola e Moçambique como forma de compensar a separação do Brasil foram cogitadas, mas não ocorreram imediatamente à Independência da colônia americana. Em razão das desordens internas de Portugal, inseridas no período que se abre como o do “vintismo, e porque o tráfico de escravos ainda “absorvia as energias” tanto de Angola como de Moçambique, novas diretrizes da Coroa portuguesa para reformular a exploração do que restou de seu Império colonial não foram produzidas instantaneamente, uma vez que Portugal só reconheceu a Independência do Brasil em 1825.

Para o estudo da África Oriental, os fundos documentais do Arquivo Nacional que apresentam indicações freqüentes sobre Moçambique, especialmente acerca de sua posição estratégica na carreira da Índia e do tráfico negreiro, são: Negócios de Portugal, Secretaria de Estado do Brasil, Relação da Bahia, Ministério do Império, Diversos Códices – SDH, Secretaria de Governo da Capitania do Pará e Polícia da Corte.
-  Texto extraído do portal "Arquivo Nacional" - Brasil.

HISTÓRIA E "ESTÓRIAS" - CHAI - 25/09/1964 - A VERDADE E A HISTÓRIA...!
Alguém escreveu - "Procurar a verdadeira história e espírito africano implica recorrer a toda a herança de conhecimentos que, ao longo dos tempos, foram transmitidos de geração em geração, do mais velho ao mais novo, do narrador ao ouvinte.
Trata-se da própria tradição oral que, através de cantos, danças, lendas, mitos, contos, provérbios, rituais e enigmas, transmite o próprio conhecimento e a escola da vida. A tradição oral constitui, por isso, todo um património que faz parte de uma cultura viva. E só conhecendo as suas raízes culturais e civilizacionais, é possível a um povo identificar-se como Povo".

Depoimento de Tó Alves em 25 de Setembro de 2003 no "Bar da Tininha da Yahoo":

"Completam-se hoje* às 21:00 de Moçambique (20:00 em Portugal) 39** anos do primeiro ataque (oficial) da Frelimo e sua guerra de libertação do país.
Foi no Chai, a norte de Macomia a escassos 10Kms do rio Messalo.
Tinha 8 anos, estava lá, assim como os meus pais, não morri... nem ninguém morreu de ambos os lados, e lembro-me de quase tudo.
Tudo se resumiu a 2 rajadas de metralhadora (uma de cada lado).
Demorou 1 ou 2 minutos e depois foi a fuga dos atacantes.
A minha mãe lembra-se que nesse dia à tarde, andou uma pessoa desconhecida ali nas lojas no Chai e com umas ligaduras na perna ou no pé. Andou umas 2 horas a "passear-se" pela localidade. Veio-se a saber mais tarde que essa pessoa desconhecida andou a fazer o reconhecimento da zona.
A data, hoje em dia, é comemorada em Moçambique como Dia das Forças Armadas."
*25 de Setembro de 2003;
**40 neste ano de 2004;
- E o que se fala na net a respeito do dia 25/09/1964: http://www.macua.org/chai25092003.htm;
- Publicado no sitio "Pemba" em 09/2004.

Retalhos da mente ou do meu pensamento...!
 ... Datas que se comemoram mundo afora, salientando a dimensão histórica de heróis ou mitos da guerra e da violência.

Salientaremos algum dia a dimensão histórica das vítimas inocentes de todas as guerras ?...

Morte, sempre morte, só morte, o silêncio da vida ou a inexplicável apologia do direito à violência que soma e resulta neste conturbado, desequilibrado globo terrestre que temos hoje!

Como ontem ou como sempre, novas, insensíveis, minoritárias, egoístas elites ressurgem "chafurdando" no deleite do poder conseguido ambiciosa, desesperada e despudoradamente num vale-tudo de mentiras, promessas e imposições que desprezam, desrespeitam o ser humano, a natureza, a vida.

Elites econômicas hipócritas ilhadas em castelos de ostentação, tal qual sanguessugas famintos de coimas e impostos que recheiam, atulham seus bolsos e cofres.

Elites burlescas acoitadas em grotescas castas pseudo-intelectuais, em cômicos feudos pseudo-democráticos de segregação social (similar ou pior que a racial) isolados atrás de grades, fossos, muros, cercas eletrificadas tentando impedir a vinda avassaladora, inevitável de povos-multidões-desesperados-sem-raça enganados, revoltados, famintos, desiludidos e destruidores !

Até quando teremos datas de violência e de luto ?

Até quando a hipocrisia do discurso fácil e o apetite do poder embebedarão mentes e suplantarão o direito de viver ou existir com dignidade em liberdade fraterna, solidária e justa?

Vivemos esperando dias melhores... dias que não deixaremos mais para trás...!
- Jaime Luis Gabão,  publicado no sitio "Pemba" em 09/2004.

(Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

Retalhos: De Porto Amélia a Pemba - Homens que fizeram... Adelino Coelho !

Breve apontamento sobre (nosso saudoso Amigo) Adelino Coelho, feito por seu filho António Coelho e relatando a epopeia que era, nos anos 50, o desbravar das "picadas" de Cabo Delgado:
Em 58/59, o meu pai fazia as carreiras: Porto Amélia - Montepuez - Porto Amélia (bi-semanal - desde 1954) e Porto Amélia- Mocimboa- Porto Amélia (bi-semanal, também desde 1958). Esta, via Metuge - Napuda - Mahate - Mussomer Quissanga - Tandanhangue - (de novo Quissanga e Mussomero) - Panguia-Macomia - Mucojo - Quiterajo - (passagem do batelão do rio M'Salo) - Marere, era uma via que acompanhava quase todo o litoral.

Quando em 1959 um ciclone tremendo arrazou Mocimboa da Praia e afetou todo o litoral de Cabo Delgado, a estrada ficou intransitável. Como curiosidade, nesse dia o meu pai refugiou-se do mau tempo na casa do amigo Teixeira Gomes (Popote) em Macomia.

Tão intransitável e por tanto tempo ficou, que a carreira não mais se pode efetuar.

Entretanto começou a guerra e, pior ainda, não mais se reatou.

Quando foi asfaltada a estrada para Macomia, (via Silva Macua - Muguia - Moja) havia já um mínimo de segurança e recomeçou a circular por esse itinerário, mas só até Macomia, abandonando o itinerário do litoral.

O meu pai manteve-se pelo itinerário do interior e à medida que a estrada foi sendo asfaltada foi acompanhando, primeiro até ao Chai e por fim até Mocimboa da Praia.

Um abraço. E, se coisas há que gosto de partilhar, são as recordações. Mais a mais quando de amigos se trata.

Ah ! E desculpa a falta de alguns acentos agudos ( no a, i, e u ), mas este teclado é "chinamarquês" e não permite.

Um abração,
Tó Coelho
- Publicado em Junho de 2001 no sítio Pemba.
  • ADELINO COELHO - Antigo residente de Porto Amélia, hoje Pemba, que se destacou pelo pioneirismo na implantação do transporte público em autocarros em toda a província de Cabo Delgado, entre inumeras dificuldades e carências operacionais à época, já que não existiam estradas asfaltadas nem as comunicações eram fáceis. Faleceu em 28 de Março de 2003 em Portugal.
Imagens de Porto Amélia:
 (Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

10/15/09

Moçambique - A Ilha


A Ilha de Moçambique é uma cidade insular situada na província de Nampula, na região norte de Moçambique, que deu o nome ao país do qual foi a primeira capital. Devido à sua rica história, manifestada por um interessantíssimo património arquitetónico, a Ilha foi considerada pela UNESCO, em 1991 Património Mundial da Humanidade.

Actualmente, a cidade é um município, tendo um governo local eleito. De acordo com o censo de 1997, o município tem 42 407 habitantes, e destes 14 889 vivem na Ilha.
O seu nome, que muitos nativos dizem ser Muipiti, parece ser derivado de Mussa-Ben-Bique, ou Mussa Bin Bique, ou ainda Mussa Al Mbique, personagem sobre quem se sabe muito pouco, mas que deu o nome (na 2ª versão) a uma nova universidade, sediada em Nampula.
... ...
A exportação de escravos era o principal comércio da ilha, tal como a do Ibo mas a Independência do Brasil em 1822, que era o principal destino deste comércio, voltou a deixar a ilha no marasmo. O golpe final foi a passagem da capital da colónia para Lourenço Marques, em 1898. Depois da abertura do porto de Nacala, em 1970, a ilha perdeu o que restava da sua importância estratégica e comercial.
- Fonte de Dados: Youtube-Captomente.

8/26/09

TROVOADA NA SERRA - Um apontamento do último Administrador Colonial da Gorongosa.

Trovoada na Serra - Uma lição da História de Moçambique que deve ser lida com atenção e percebida pelos jovens moçambicanos de hoje:

""...Com efeito, revejo-me, menino e moço, na Quissanga e Porto Amélia, onde muito amei alguém que então tratava por "miúda"; revejo-me, brincalhão, nas praias de Uimbe e de Mecúfi; explorador nas florestas de Nangade...""
  • Leia em formato "pdf" Trovoada na Serra, na íntegra - Aqui!
Acrescento: Sugestionado por Amigo, transcrevo post do "Moçambique Para Todos" já publicado em 26/02/2007 mas sempre atual, onde, na ótica de JOSÉ DO ROSÁRIO ROSA, último administrador colonial e a última autoridade portuguesa no então Concelho da Gorongosa com sede em Vila Paiva de Andrada, nos relata detalhadamente, com ínicio em 1973 até à independência de Moçambique, a transição nada fácil, conturbada, dramática da Administração local para a Frelimo.
Lendo-se com tempo e atenção este trabalho do Administrador José do Rosário Rosa terminado em Novembro de 1995, poderemos entender um pouco da História recente de Moçambique, o drama e sacrífício de milhares de moçambicanos e portugueses envolvidos nessa já célebre "descolonização exemplar" que não assegurou mínimamente seus bens e vidas, entregou Moçambique por conveniência, fraqueza ou pressões internacionais a um único partido despreparado, quando outros movimentos pró independência exisitiam, além de podermos perceber melhor figuras e situações que nos trazem até ao atual Moçambique, inundado de contradições sociais e pobreza que envolvem a maioria da população não ligada, por várias formas, aos quadros do partido Frelimo ainda no poder.

8/05/09

Mudando de assunto: Ilha de Moçambique... Conhece?

Histórica e bela, esquecida ao relento do tempo, inspira agora, entre ruínas altivas e por ruas estreitas onde se imaginam em "requichós" copiados das Índias, turistas, poetas e musas transportados a idílicos passeios e romances que o passado conta... ... E quanto Passado e História essa Ilha de Moçambique não tem para contar?... ...

Diz a Wikipédia - A Ilha de Moçambique é uma cidade insular situada na província de Nampula, na região norte de Moçambique, que deu o nome ao país do qual foi a primeira capital.

Devido à sua rica história, manifestada por um interessantíssimo património arquitetónico, a Ilha foi considerada pela UNESCO, em 1991 Património Mundial da Humanidade.

Actualmente, a cidade é um município, tendo um governo local eleito. De acordo com o censo de 1997, o município tem 42 407 habitantes, e destes 14 889 vivem na Ilha.

O seu nome, que muitos nativos dizem ser Muipiti, parece ser derivado de Mussa-Ben-Bique, ou Mussa Bin Bique, ou ainda Mussa Al Mbique, personagem sobre quem se sabe muito pouco, mas que deu o nome (na 2ª versão) a uma nova universidade, sediada em Nampula.

A Ilha tem cerca de 3 km de comprimento e 300-400 m de largura e está orientada no sentido nordeste-sudoeste à entrada da Baía de Mossuril, a uma latitude aproximada de 15º02’ S e longitude de 40º44’ E.

A costa oriental da Ilha estabelece com as ilhas irmãs de Goa e de Sena (também conhecida por Ilha das Cobras) a Baía de Moçambique. Estas ilhas, assim como a costa próxima, são de origem coralina.

Arquitectonicamente, a Ilha está dividida em duas partes, a "cidade de pedra" e a "cidade de macuti", a primeira com cerca de 400 edifícios, incluíndo os principais monumentos, e a segunda, na metade sul da ilha, com cerca de 1200 casas de construção precária. No entanto, muitas casas de pedra são igualmente cobertas com macuti.

A Ilha de Moçambique está ligada ao continente por uma ponte com cerca de 3 km de comprimento, construída nos anos 60(que nos consta estar a passar por processo de reforma).

Quando Vasco da Gama chegou, em 1498, a Ilha de Moçambique tornara-se uma povoação swahili de árabes e negros com seu xeque, subordinado ao sultão de Zanzibar e continuava a ser frequentada por árabes que prosseguiam o seu comércio de séculos com o Mar Vermelho, a Pérsia, a Índia e as ilhas do Índico.

Onde na Ilha é hoje o Palácio dos Capitães-Generais, fizeram os portugueses a Torre de São Gabriel no ano de 1507, data em que ocuparam a Ilha, construindo a pequena fortificação que tinha 15 homens a proteger a feitoria nela instalada.

A Capela de Nossa Senhora do Baluarte, construída em 1522 na extremidade norte da ilha, a mais próxima da Ilha de Goa, é o único exemplar de arquitectura manuelina em Moçambique.

Em 1558 principiou a construção da Fortaleza de S. Sebastião - totalmente com pedras que constituíam o balastro dos navios, algumas das quais ainda se vêem na praia próxima - que só terminou em 1620 e é a maior da África Austral. Esta fortaleza era muito importante, porque a Ilha tinha-se tornado o entreposto da permuta de panos e missangas da Índia por ouro, escravos, marfim e pau preto de África, e era da Ilha que partiam todas as viagens comerciais para Quelimane, Sofala, Inhambane e Lourenço Marques e os árabes não queriam perder os privilégios comerciais que tinham adquirido ao longo dos séculos.

Para além dos portugueses outros concorrentes europeus apareceram na corrida pelo controlo das rotas comerciais. Os franceses conseguiram assumir o papel de intermediários do negócio da escravatura para as ilhas do Índico, os ingleses começavam a controlar as rotas de navegação nesta região e s holandeses tentaram a ocupação da Ilha em 1607-1608 e, não o conseguindo, devastaram-na pelo fogo.

A reconstrução da vila foi difícil, uma vez que o governo colonial não existia senão para cobrar impostos e estava muito mais interessado nas terras de Sofala - na Zambézia tinham-se institucionalizado os Prazos da Coroa, e o desenvolvimento do comércio do ouro naquela região leva a que a Ilha perca a sua primazia. Então, os cristãos decidiram fundar na Ilha uma Santa Casa da Misericórdia que funcionaria como Câmara Municipal, para a defesa dos cidadãos e da terra, até 1763, ano em que a povoação passou a Vila. Esta viragem resultou da decisão do governo colonial em separar a colónia africana do Estado da Índia e criar uma Capitania Geral do Estado de Moçambique baseada na Ilha, em 1752.

A vila voltou a prosperar e, em 1810 é promovida a cidade. A exportação de escravos era o principal comércio da ilha, tal como a do Ibo mas a Independência do Brasil em 1822, que era o principal destino deste comércio, voltou a deixar a ilha no marasmo.

O golpe final foi a passagem da capital da colónia para Lourenço Marques, em 1898. Depois da abertura do porto de Nacala, em 1970, a ilha perdeu o que restava da sua importância estratégica e comercial.

  • Outros link's na Wikipédia - Aqui!

Segundo nos consta existe intenção com iniciativas já em andamento por parte do governo de Moçambique e com apoio internacional, para recuperação dessa magnífica ilha e de seu valioso património histórico. É muito bom que isso aconteça. Entretanto, a ilha já vai oferecendo condições modelares de hospedagem para quem a deseje visitar, como por exemplo a casa de hóspedes "Terraço das Quitandas".

4/09/09

HÁ 140 ANOS: COMITIVA DA RAINHA DE ANJOANE CHEGA AO IBO.

(Imagem original daqui)

Pelo seu interesse histórico e sócio-político, recordo, hoje, a chegada à ilha do Ibo, no dia 6 de Abril de 1869, da Raínha da ilha de Anjoane(1) e da sua comitiva. A noticia é-nos dada pelo então governador, interino, de Cabo Delgado, Romão Gomes Duro - ofício nº 42, de 7 do dito mês - dirigido ao Secretário Geral de Moçambique, que reza assim:

"IIImo snr. Digne-se V.Exª levar ao conhecimento do Ex.mo snr Governador Geral, interino, desta Província, que, ontem à noite, chegou, a este porto, um pangaio trazendo a seu bordo a Raínha de Anjoane e um Príncipe seu cunhado, com grande comitiva.

Que hoje os mandei cumprimentar a bordo e fazer-lhe os oferecimentos do estilo e que eles vieram a terra, memos a Rainha e me visitaram, aceitando a casa que lhes ofereci, dizendo-me que se demorariam 6 ou 7 dias.

Que à vista disto lhes mandei fornecer o que eles precisassem segundo os seus costumes."

De realçar o habitual acolhimento dos visitantes pelas anfitriãs autoridades coloniais portuguesas, e o seu respeito pela sua cultura e estilo de vida.
- Por Carlos Lopes Bento(2), Lisboa, Abril de 2009.

  1. A ilha de Anjoane faz parte do arquipélago do Cômoro, situado no Canal de Moçambique, a leste de Cabo Delgado.
  2. Antropólogo e prof. Univ.

- Outros trabalhos de Carlos Lopes Bento:

  • As Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado - Aqui!
  • Para a História do Ensino em Moçambique - Parte 3 - Aqui!
  • Para a História do Ensino em Moçambique - Parte 2 - Aqui!
  • Para a História do Ensino em Moçambique - Parte 1 - Aqui!
  • Post's do ForEver PEMBA para a consulta em "Pesquisas" sobre Carlos Bento, Quirimbas, Ibo, História de Cabo Delgado - Aqui!
  • E, por Jeronymo Romero: Supplemento á memoria descriptiva e estatistica do districto de Cabo Delgado - Aqui!

1/15/09

HÁ 150 ANOS, EM CABO DELGADO, PREVENIA-SE EPIDEMIA DE COLÉRA ASSIM:

Manchete de hoje: Cólera mata em Cabo Delgado - A província de Cabo Delgado registou até ontem três óbitos vítimas da cólera, confirmada semana passada, depois de terem sido notificadas diarreias agudas desde meados de Dezembro passado. Enquanto isso, em Machaze, Manica, foram confirmados como sendo cólera, os casos de diarreias acompanhadas de vómitos, que provocaram nas últimas 24 horas um óbito... ...(leia a matéria na íntegra aqui - "Notícias-Maputo").

E, enquanto a epidemia de cólera tenta avançar por todo o Moçambique, diz-nos o historiador e colaborador deste blogue, Dr. Carlos Lopes Bento(1):

PROBLEMAS DE ONTEM E DE HOJE: - MEIOS DE PREVENÇÃO CONTRA A EPIDEMIA DE CÓLERA VERIFICADA, HÁ 150 ANOS, EM MOÇAMBIQUE.

No momento em que cólera está, novamente, a ameaçar Moçambique, é pertinente recordar o que passou, no longínquo ano de 1859, e algumas das medidas preventivas tomadas pela Junta de Saúde para combater a epidemia que, então, atingiu não só o distrito da Capital de Moçambique, sedeada na Ilha do mesmo nome, e terras firmes fronteiriças, como também o distrito de Cabo Delgado.

Para prevenir a epidemia e atenuar os seus maléficos efeitos, as Autoridades Coloniais de então, através da Junta de Saúde de Moçambique, tornaram públicas, em 5 de Fevereiro de 1859, importantes medidas:

“INSTRUÇÕES POPULARES ACERCA DOS MEIOS DE PREVENIR A COLERA-MORBUS DE O COMEÇAR A TRATAR ANTES DA CHEGADA DO FACULTATIVO.

A Junta de Saúde da Província de Moçambique faz público o seguinte:

Tendo aparecido na Cidade, desde o dia 3 do corrente, alguns casos do Cólera-Morbus epidémico, e precisando esta doença ser tratada, logo no período da invasão, pela sua tendência a uma marcha rapidamente fatal, a todos interessa tomar conhecimento das seguintes instruções.
1.°- O cólera não é doença contagiosa, não se comunica pelo contacto; pode-se, portanto, sem receio dar às pessoas afectadas todos os cuidados, que o seu estado reclama.

2.°- O cólera propaga-se por infecção, e está provado que a acumulação de indivíduos doentes, ou mesmo sãos, em lugares húmidos, estreitos, mal arejados, faltos de asseio, pode favorecer consideravelmente a intensidade da doença, e a sua propagação pela vizinhança.

3.°- As Autoridades competentes têm providenciado e continuam a trabalhar para tornar efectivos o asseio e limpeza das casas, das ruas, e dos quintais, mas os particulares por interesse próprio da sua família e escravos, devem espontaneamente empregar todos os meios para que a limpeza, principalmente, em seus domicílios seja sempre perfeita.

4.°- Os resfriamentos rápidos, as indigestões, o uso de maus alimentos, são causas determinantes do cólera. Às pessoas abastadas é suficiente lembrar-lhes isto, mas, acerca dos escravos, convém que os senhores velem para que eles fiquem de noite agasalhados e cobertos, e não ao ar livre; que se não deixem esfriar descansando de repente ao ar livre quando acabam de trabalhar ou carregar, e estão cobertos de suor; que não comam logo depois de um trabalho fatigante; e finalmente fazer algum sacrifício para que os alimentos sejam de boa qualidade.

5.°- Durante as epidemias do cólera é preciso dar toda a atenção a qualquer pequeno desarranjo das funções do estômago, e dos intestinos.

Qualquer pessoa afectada de dores do estômago, de cólicas, de diarreias, deverá primeiro que tudo, e posto que os sintomas sejam ligeiros, dar muita atenção à natureza dos seus alimentos, diminuir-lhes a quantidade, ou mesmo pôr-se em dieta, conforme a urgência; devera evitar a fadiga, o frio, a humidade, agasalhar-se, cingir o ventre de flanela, e tomar infusões ligeiras de chá da índia, chá de marcela ou de erva cidreira.

Havendo diarreia é de decidida vantagem o uso( para pessoas adultas) de doze a dezasseis gotas de laudano liquido de Sydenham, para dividir em quatro doses ; e tomar durante o dia em agua açucarada. Para crianças o laudano só deve ser aconselhado por Facultativos.

Estes incómodos das vias digestivas são muitas vezes os sintomas precursores do cólera por isso nunca devem ser desprezados, e da prontidão com que a eles se aplicam os meios fáceis e simples de que falámos, resulta o evitar-se com muita probabilidade um ataque formal da doença.

6.°- Se os conselhos, mais higiénicos do que médios, acima indicados não bastam para fazer parar os desarranjos observados; se a diarreia persiste, se a dor aumenta, e principalmente se sobrevêm vómitos, calafrios, resfriamento dos pés, das mãos, e do corpo em geral, ou se os mesmos sintomas se declaram, repentinamente, sem algum sinal precursor, como aqui na Cidade se tem observado em algumas pessoas, então deve fazer-se o seguinte — deitar imediatamente o doente em uma cama quente entre cobertores de lã; colocar tijolos quentes, sacos de areia quente ou botijas de água quente aos seus pés, pôr-lhe panos quentes sobre o estômago e sobre o ventre; fazer fricções nos membros e à espinha dorsal com sacos de areia quente ou com flanela embebida em licores espirituosos, como álcool, aguardente, álcool-canforado, ou aguardente com pimenta; fazer tomar, de meia em meia hora, ele intervalo ou ainda mais vezes, bebidas quentes tónicas e aromáticas, como chá, marcela, calumba; na epidemia actual, em que o resfriamento caminha rapidamente, tem-se tirado proveito do uso de alguns copos de genebra ou aguardente boa, dados em pequenos intervalos, e acompanhados cada um duma pitada de pimenta redonda; outras pessoas têm dado a pimenta em cozimento quente e bem açucarado, alternado com a genebra ou com o chá de calumba. Ao mesmo tempo põem-se sinapismos nas pernas, nos pés e nos braços para reaver o calor, e evitarem-se todas as causas de resfriamento. Havendo diarreia dão-se pequenos clisteres de agua de arroz, de alteia, ou linhaça, aos quais convirá algumas vezes juntar oito ou dez gotas de laudano (nas pessoas adultas); podem repetir-se os clisteres persistindo a diarreia.

Quando aos sintomas precedentes se juntar dores de cabeça, cãibras nos membros, a persistência ou invasão do frio em uma grande extensão do corpo, se a língua se torna fria, os olhos encovados, a pele azulada na face e nas mãos das pessoas brancas, estes indícios de maior gravidade da doença não devem fazer desprezar o emprego dos meios acima indicados, mas pelo contrario devem obrigar a aplicá-los com mais energia e perseverança até à chegada do Facultativo ou à remessa rápida do doente bem agasalhado para o hospital.

As pessoas que derem os primeiros cuidados não devem desanimar mesmo quando eles pareçam não produzir grande. melhora no estado do doente.

O fim que se tem em vista obter é fazer voltar o calor ao doente, restabelecer a circulação e os movimentos do coração; e algumas vezes só no fim de muito tempo se obtém este resultado. É pois indispensável continuar sem interrupção o emprego dos meios indicados, até que se tenha chegado a reproduzir o calor natural, que é o indício de uma reacção em geral favorável.

Estabelecida a reacção, convém animá-la com bebidas aromáticas ligeiras, se ela se conserva em grau moderado, e combater a diarreia por meio dos emolientes e do laudano, e os vómitos, por meio dos aromáticos e dos ácidos. Se a reacção é exagerada, se se desenvolve grande estado febril, são indicados os emolientes, as bichas e alguma sangria. Mas neste caso convém que o doente ou em casa, ou no hospital seja tratado por Facultativo.

Finalmente, a Junta julga do seu dever declarar que, por enquanto, quase todos os casos se tem dado em pessoas mal alimentadas e mal vestidas; mais uma razão para dar atenção aos preceitos higiénicos; e que desde o dia 4 do corrente se preparou no Hospital Militar uma enfermaria isolada, onde têm sido e continuarão a ser recebidos os indigentes e escravos.

Está-se também providenciando para a abertura de um Hospital provisório, que será aberto ao público se o número de doentes aumentar.
Moçambique, 5 de Fevereiro de 1859.
= António Justino de Faria Leal, Presidente interino.
= Joaquim Franscisco Colaço, Vogal.”

Meses mais tarde, o Governador-Geral João Tavares de Almeida, no discurso que fez, em 3 de Outubro de 1859, por ocasião da abertura da Sessão da Junta Geral da Província de Moçambique, ao abordar o problema da Saúde Pública, prestou sobre o assunto, a seguinte informação:

“No mês de Fevereiro deste ano, manifestou-se nesta Cidade o terrível flagelo do Cólera-morbus. Em poucos dias passou ele ao continente; e tanto em uma, como noutra parte, produziu assoladores estragos, atacando e fazendo numerosas vítimas, sem distinção de idade, nem de sexo, principalmente na classe dos escravos.

Houve sérios receios de que a epidemia se propagasse aos outros Distritos, mas felizmente não sucedeu assim. Somente o distrito de Cabo Delgado, sofreu os terríveis efeitos desta moléstia, desde 16 de Fevereiro até 10 de Abril do corrente ano.

Para maior, desgraça o Distrito não tinha facultativo algum, nem desta Cidade se lhe puderam mandar, porque só se soube a notícia da invasão da epidemia quando já tinha acabado.

Segundo as estatísticas já publicadas, o número de falecimentos durante o período da epidemia foi, nesta Cidade e parte do seu Distrito, de 749 pessoas. Consta porém que a mortalidade foi considerável em Sancul, e na Quintangonha, de cujos lugares não foi possível colher suficientes dados, e esclarecimentos. No lbo a mortalidade não foi menor e consta dos mapas remetidos terem falecido 967 pessoas.

Durante estas criticas circunstâncias que, neste Distrito, duraram até meados de Abril, adoptaram-se todas aquelas medidas que estavam ao alcance da administração, não só para debelar a epidemia, como para evitar que ela se propagasse aos outros Distritos, que a Providencia, felizmente, preservou de tão terrível e destruidor flagelo.

Com esta epidemia alguns proprietários sofreram graves perdas, e é de justiça dizer que todos fizeram em favor dos seus escravos aqueles sacrifícios, que as circunstâncias exigiam, e que a caridade ordenava.

Ao cólera sucederam algumas outras moléstias, que costumam ser o cortejo forçado de quase todas as epidemias de qualquer natureza que sejam e o estado da saúde pública ressentiu-se, por algum tempo, deste grande transtorno das condições higiénicas do país. Finalmente, as moléstias ordinárias do clima continuaram a predominar, com um carácter menos grave, mas com certa intensidade mesmo nesta época do ano, em que quase sempre o número dos atacados das febres diminui sensivelmente.”

Segundo dados publicados no Boletim Oficial, morreram, na Cidade de Moçambique, devido à terrível doença, mais de 700 pessoas, assim distribuídas, por etnias: 47 europeus, 11 asiáticos, 12 naturais, 1 chinês, 35 mujojos, 52 pretos livres, 8 pretos libertos e 541 pretos escravos.

Quanto à Vila do Ibo, faleceram, entre 16 de Março e 26 de Abril de 1859, 962 pessoas, assim distribuídas: 126 livres, 21 libertos e 815 escravos. O dia de maior mortalidade foi o dia 20 de Março, com 60 perdas.(2).

Não se apresenta números relativamente a Fevereiro e parte de Março.

Monte de Caparica-Portugal, 15.1.2009,
Carlos Lopes Bento(1).

(1) - Antropólogo e Professor Universitário.
(2) - Todo o conteúdo do presente texto faz parte de um contexto próprio, que deverá não ser esquecido na sua leitura e interpretação. Toda a informação aqui apresentada foi extraída das minhas fichas de leitura e fará parte de um novo trabalho, em vias de conclusão, sobre as Ilhas e demais terras Cabo Delgado.

  • Outros textos do Dr. Carlos Lopes Bento neste blogue - Aqui!

1/12/09

Retalhos da História de Cabo Delgado: As Quirimbas em finais do século XIX e a decadência do Ibo.

Depois de um período de alguma prosperidade na passagem do século XVI para o século XVII, em que havia 11 ilhas habitadas e algum comércio, sucedeu o período da decadência portuguesa no Ìndico e a perda de Mombaça, a intensificação do tráfico da escravatura na região e as ilhas Quirimbas entraram em declínio.

De acordo com o comandante Leotte do Rego, em meados do século XIX só 4 ilhas do Arquipélago das Quirimbas eram habitadas: Ibo, Quirimba, Mefunvo e Matemo.

"Algumas dessas ilhas foram habitadas, em tempos mais ou menos remotos; o solo era cultivado; e ainda hoje por lá existem ruínas das antigas edificações, na maior parte conventos. De facto, n'essas regiões, os estabelecimentos portuguezes reduziam-se a isso.
O antigos colonos, pouco numerosos, e em pouca segurança na costa, fundavam as feitorias nas ilhas, de preferência ao continente, onde os indigenas os não deixavam em paz."(*79)

Informa, ainda, que "de todos aquelles estabelecimentos, apenas hoje existe o Ibo; os outros foram devastados por uma horda de Sakalaves, do Madagascar que, por 1837, saindo da sua ilha, infestaram as Comores, passaram às Querimbas e parece que à própria costa de Cabo Delgado.
Na ilha Quiziva, existem as ruínas de uma casa e cisterna ainda com água; na Macalue, os alicerces de um edifício; na Amiza, as paredes de uma ermida, que foi também hospicio dos jesuitas; no Namego um poço com água salobra."

A consolidação da soberania portuguesa na região e a criação de Porto Amélia e Palma, como também de Mocimboa da Praia alguns anos depois, não foram suficientes para atrair de novo as populações das ilhas, enquanto o Ibo entrava em decadência.

Em meados do século XIX, quando a vila do Ibo florescia e já era a capital das Quirimbas, tinha 2422 habitantes, cerca de 20 casas e 400 palhotas, um governador e um posto da alfândega. O forte de S. João Baptista estava fortificado com 17 canhões e era guarnecido por uma companhia de infantaria, enquanto os dois fortins dipunham de 13 peças.

Em 1859 escrevia Lopes de Lima, citado por João Loureiro, que "há no centro da povoação um passeio público, simetricamente arruado com árvores frondosas, tendo numa extremidade a igreja matriz e na outra a nova residência do governador".(*80)

Na segunda metade do século XIX as autoridades portuguesas procuraram definir as suas fronteiras a norte da costa moçambicana até à foz do rio Rovuma e a presença naval tornou-se gradualmente mais frequente.

Porém, o comandante Augusto Castilho depois de recordar os portos e desembarcadouros existentes entre as ilhas do arquipélago e entre elas e a costa, diz que "é muito fácil fazer-se contrabando em muitos deles, pois nada impede que um pangaio venha da Índia carregado de fazendas e vá desembarcá-las em qualquer ponto, visto ser quase nula a nossa fiscalização".(*81)

A fiscalização da extensa costa de Cabo Delgado em 1884, segundo Augusto Castilho, "é feita por dois objectos fluctuantes, um pouco parecidos com navios, construídos ali por um zeloso governador, official de infantaria, muito conhecedor de legislação militar.
Um d'esses objectos a que chamam hiate, a quem deram o nome de Mello Gouveia, e que traz içada a flâmula, virou-se quando o lançaram ao mar, e para conseguirem que tivesse estabilidade e podesse ir até Moçambique, tiveram que lhe encher o porão de pedras e peças velhas.
O outro objecto fiscalizador, que chamam chalupa Andrade Corvo, pouco peior é do que o precedente. O que vale para que os tripulantes de ambos estes pseudo-navios não andem constantemente com o credo na boca, é em primeiro logar serem elles mouros e por conseguinte incrédulos, e em segundo logar passarem a maior parte do tempo(os objectos) em concertos na praia.
Parece-me que o governo devia ser coherente, e assim como creio que não consentiria que um official da marinha dissesse missa, também devia severamente prohibir que um official de infantaria se atrevesse a construir navios. Emquanto os dois ex-ministros quem quiseram honrar, já há muito que deveriam ter querellado da supposta honra."

No seu projecto de orçamento das receitas e despesas da província de Moçambique, António Enes propunha no relatório que apresentou ao governo em 1893, a instalação da administração pública no concelho do Ibo, onde se incluiam a colocação de comandantes militares no Ibo, Palma e Mocimboa, além de outros agentes públicos no concelho do Ibo, como um delegado de saúde, farmacêutico e enfermeiro, um juiz da comarca, uma delegação da fazenda, uma alfândega, missionários e professores da instrução primária nas freguesias do Ibo e Quirimba e, ainda, delegados da capitania dos porto no Ibo, Palma e Mocimboa.

Em finais do século XIX a recém formada Companhia do Niassa estabeleceu a sua sede no Ibo, a administração foi instalada e a vila cresceu. Para além da igreja matriz e do forte que então só tinha 15 peças de artilharia e que no interior dispunha de alojamento para 300 homens, surgiram novos edifícios, como a Intendência do Governo, o Tribunal da Comarca, a sucursal do Banco Nacional Ultramarino, o Teatro Iboense, várias agências de navegação, sete consulados estrangeiros e escritórios de advogados.(*82)

Em 1904, o comandante Leotte do Rego referia que a vila do Ibo dispunha de "grande número de habitações regulares, distribuídas em 10 ruas, com 25 ou 30 edifícios de alvenaria, com um andar e terraço vasto, com mais de 400 casas de madeira, barradas por fora e por dentro caiadas, cobertas de folhas de palmeira a que os naturais chamam macuta. No centro da povoação há um grande jardim público, simetricamente arruado, tendo as árvores mais frondosas da ilha; e junto dele fica, de um lado, a igreja matriz, e, do outro, a residência do governo. Nos arredores da vila não há mais de 300 ou 400 palhotas, mal construídas, mas alinhadas".(*83)

*79 - Leotte do Rego, Op. cit., p. 19.
*80 - João Loureiro, Postais Antigos da Ilha de Moçambique & Ilha do Ibo, p. 12.
*81 - Augusto Castilho, Relatório acerca de alguns portos da província de Moçambique, p. 51;
*82 - João Loureiro, Op. cit., p. 12.
*83 - Leotte do Rego, Op. cit., p. 90.

--> Continua.

O autor:
Adelino Rodrigues da Costa entrou para a Escola Naval em 1962 como cadete do "Curso Oliveira e Carmo", passou à reserva da Armada em 1983 no posto de capitão-tenente e posteriormente à situação de reforma. Entre outras missões navais que desempenhou destaca-se uma comissão de embarque realizada no norte de Moçambique entre 1966 e 1968, onde foi imediato da LGD Cimitarra e comandante das LFP Antares e LFG Dragão.Especializou-se em Artilharia, comandou a LFG Sagitário na Guiné, foi imediato da corveta Honório Barreto, técnico do Instituto Hidrográfico, instrutor de Navegação da Escola Naval, professor de Navegação da Escola Náutica e professor de Economia e Finanças do Instituto Superior naval de Guerra. Nos anos mais recentes foi docente universitário, delegado da Fundação Oriente na Índia e seu representante em Timor Leste. É licenciado em Sociologia (ISCSP), em Economia (ISEG), mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação (ISCTE) e membro da Academia de Marinha.

O livro:
Título - As Ilhas Quirimbas - Uma síntese histórico-naval sobre o arquipélago do norte de Moçambique;Edição - Comissão Cultural da Marinha;Transcrição da publicação "As ilhas Quirimbas de Adelino Rodrigues da Costa, edição da Comissão Cultural da Marinha Portuguesa, 2003 - Capítulo 11, que me foi gentilmente ofertado pelo Querido Amigo A. B. Carrilho em Pinhal Novo, 26/06/2006.

- Do mesmo autor neste blogue:

  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 1 - Aqui!


  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 2 - Aqui!


  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 3 - Aqui!


  • Retalhos da História de CABO DELGADO - O nascimento de Mocimboa da Praia - Aqui!


  • Retalhos da História de CABO DELGADO - Zanzibar e a escravatura nas Quirimbas - Parte 1 - Aqui!


  • Retalhos da História de CABO DELGADO - Zanzibar e a escravatura nas Quirimbas - Parte 2 - Aqui!


  • Retalhos da História de CABO DELGADO - Zanzibar e a escravatura nas Quirimbas - Parte 3 - Aqui!


  • Retalhos da História de CABO DELGADO - A Ilha do Ibo - Aqui!

- Outros post's deste blogue que falam do Ibo e região, com textos e documentos do também historiador e profundo conhecedor do Arquipélago das Quirimbas e de Moçambique, Dr. Carlos Lopes Bento - Aqui, aqui, aqui!

11/28/08

Retalhos da História de Cabo Delgado: A Ilha do Ibo - Imprecisões comentadas pelo Dr. Carlos Lopes Bento, parte 4.

O ForEver Pemba vem publicando há algum tempo com muita satisfação, tentando contribuir para que a verdadeira História de Moçambique seja conhecida com isenção e limpa de cores políticas inconvenientes ou parciais, dividido em post's periódicos, trabalho do Capitão-Tenente da Marinha Portuguesa Adelino Rodrigues da Costa escrito em seu livro "As Ilhas Quirimbas - Uma síntese histórico-naval sobre o arquipélago do norte de Moçambique", edição da Comissão Cultural da Marinha Portuguesa.

O último post de 13/11/08, "Retalhos da História de Cabo Delgado: A Ilha do Ibo." mereceu por parte do Dr. Carlos Lopes Bento, antropólogo e prof. universitário, profundo conhecedor do Arquipélago das Quirimbas além de Amigo e colaborador deste blogue radicado em Lisboa, o seguinte complemento que visa somar informações e continuamos daqui:

PARA A HISTÓRIA DAS FORTIFICAÇÕES DE CABO DELGADO, MOÇAMBIQUE
Por Carlos Lopes Bento(Antropólogo e professor universitário)

Continuando...
... ...haver a preocupação de confirmar ou desmentir os factos que serviram de base aos seus trabalhos, aceitando-os sem grandes cuidados de crítica e de análise, como verdadeiros.
Estes são alguns dos dados, produto de uma investigação aprofundada sobre as fortificações da Ilhas de Querimba, sujeitos a alterações sempre que novas pesquisas os infirmem.
Julgo que está justificada a sua divulgação.

BIBLIOGRAFIA
ARQUIVO HISTÓRICO ULTRAMARINO
* Códice 1310 - Registo de Instruções (...) e de todas as cartas e mais papéis de serviço que este governo escreveu para os portos de Sena, Quelimane, Sofala, Inhambane, Ilhas de Cabo Delgado e Goa (1753-1756), p.p. 135 e segts..
* Códice 1312 - Sinopse das nomeações e promoções da Administração Civil e Militar (1753-1761).
* Códice 1321 - Copiador de Cartas (1760-1767).
* Códice 1322 - Copiador de Cartas (1760-1778).
* Códice 1352 - Registo dos termos de posse, cartas e ordens do Cap. Gen. de Moç. para o Cap.-Mor das Ilhas (1768-1796).
* Códice 1355 - Registo de portarias, patentes, provisões, cartas de sesmaria, alvarás e alguns treslados de bandos.
* Códice 1427 - Registo de correspondência com as Ilhas de Cabo Delgado (1828-1848), p.p. 161.
* Códice 1474 - Registo do termo de criação da Alfândega e Alvará dos direitos da mesma.
* Códice 1475 - Livro dos registos oficiais do feitor das Ilhas de Cabo Delgado e Balanço Anual da sua receita e despesa (1787-1810), p.p. 170.
* Códice 1477 - Registo do Regimento da Alfândega e de correspondência oficial (1785-1817).
* Códice 1478 - Registo de correspondência oficial do Cap. Gen. de Moç. enviada aos capitães comandantes das Ilhas de Cabo Delgado (1786-1821), p.p. 170.
* Documentação Avulsa de Moçambique - 2ª Secção


Manuscrita
Nº 513 - Plano e perfil da Fortaleza que o IIImº e Exmo. Snr. Governador, Capitão General de Mossambique, António Manuel de Melo e Castro, mandou fazer na Ilha do Ibo, Capital das de Cabo Delgado, que dezenhou por ordem do mesmo Snr. o Cappitão da Primeira Companhia de Granadeiros da Praça de Mossambique António José Teixeira Tigre (c. 1791).
Nas 524-525 - Planta do forte velho da Ilha do Oybo, Capital das de Cabo Delgado/Planta A (tem legenda, c. 1791).
Nº 560 - Planta/Da Fortaleza/De São João da Ilha/do Oibo, com Legenda/levantada em Maio de 1817/Pelo Capitão de Artilharia/António Francisco/de Paula e Hollanda Cavalcanti. [Petipé de] 30 braças [e de] "30 pés"; D. 367x236; MS; Color; Av.


Impressa
Nº 181 - Planta do Forte Velho da Ilha do Ibo, Capital de Cabo Delgado. 0,245x0,390, colorida. Ver Ofício do Governador António Manuel de Melo e Castro, datado de Moçambique, 22/8/1791. Enc. VIII.
Nº 183 - Planta da Fortaleza de São João da Ilha do Ibo. Levantada em 1817, pelo Capitão de Artilharia António Francisco de Paula e Hollanda Cavalcanti. 0,368x0,495, colorida.
Nº 184 - Planta da Fortaleza de São João do Ibo das Ilhas de Cabo Delgado. Tirada em 6/7/1831 e oferecida à Correcção do Governador e Capitão General da Capitania de Moçambique Paulo José Miguel de Brito. 0,330x0,330.

NOUTROS ARQUIVOS E BIBLIOTECAS
BOCARRO, António - "Descrição das Ilhas de Querimba". In Fortalezas Portuguesas de África, B.N., Códice 11057, fls. 12 e 13.
BOTELHO, José Justino Teixeira - "O Naturalista Manuel da Silva e as suas Excursões Científicas a Moçambique nos Fins do Século XVIII". In Separata do Boletim da Segunda Classe da Academia das Ciências de Lisboa. Coimbra, 1927.
- "A Primeira Carta Orgânica de Moçambique". In Boletim da Academia das Ciências de Lisboa. Lisboa, Nova Série, Vol. I, 1929-1930, Outubro, p.p. 24-32.
- História Militar e Política dos Portugueses em Moçambique, da Descoberta a 1833. Lisboa, Centro Tipográfico Colonial, 1834, 2 Vols..
GALVÃO, Henrique e SELVAGEM, Carlos - Império Ultramarino Português - Monografia do Império. Lisboa, Empresa Nacional de Publicidade, 1953, Vol. IV, p. 440.
MONTEIRO, Fernando Amaro e VERIN, Pierre - "Sites et Monuments de Madagascaret de l'Océan Indian - Notes sur Ibo, Ville du Mozambique attaquée par les Sakalava". In Bulletin de Madagascar, Octobre/Novembre, 1970, nas 293 e 294, p.p. 187-189, mapa e foto.
REGO, Jaime Daniel Leote do - Guia de Navegação do Canal de Moçambique. Lisboa, I.N., 1904.
REIMÃO, Gaspar Ferreira - Roteiro da Navegação e Carreiras da Índia, com os seus Caminhos, e Derrotas, Sinais ... (25/3/1600), tirado do que escreveu Vicente Rodrigues e Diogo Afonso, pilotos antigos, agora novamente acrescentado, por Gaspar Ferreira Reimão ... piloto-mor destes Reinos de Portugal. Lisboa, B.N., Códice 1333, 1612 e A.G.C., 2ª Edição, Códice 1939.
SOUSA, A. Gomes e - "As Ilhas Quirimbas". In B.S.E.M., Ano XXIX, nº 122, Maio/Junho, 1960, p.p. 127-478.
TORRES, José de Castelo Branco Ribeiro - "Resenha Histórica do Regulado da Arimba". In Moçambique - Documentário Trimestral, nº 5, 1936, p.p. 123-127.
- "As Ilhas de Quirimba". In Moçambique - Documentário Trimestral, nº 12, Outubro/Dezembro, 1937, p.p. 107-111.
- "Os Portugueses e as Ilhas de Querimba". In Moçambique - Documentário Trimestral, nº 15, Julho/Setembro, 1938, p.p. 71-85.
Moçambique- Documentário Trimestral, nº 8, Outubro/Dezembro, 1963, p.p. 83-88.
REGO, Jaime Daniel Leote do - Guia de Navegação do Canal de Moçambique. Lisboa, I.N., 1904.
VERIN, Pierre - "Observations Preliminaires sur les Sites du Mozambique".In AZANIA, Vol. V, Dar-es-Salam, Azania, 1970, p.p. 184-188, 1 mapa.

Retalhos da História de Cabo Delgado: A Ilha do Ibo - Imprecisões comentadas pelo Dr. Carlos Lopes Bento, parte 3.

O ForEver Pemba vem publicando há algum tempo com muita satisfação, tentando contribuir para que a verdadeira História de Moçambique seja conhecida com isenção e limpa de cores políticas inconvenientes ou parciais, dividido em post's periódicos, trabalho do Capitão-Tenente da Marinha Portuguesa Adelino Rodrigues da Costa escrito em seu livro "As Ilhas Quirimbas - Uma síntese histórico-naval sobre o arquipélago do norte de Moçambique", edição da Comissão Cultural da Marinha Portuguesa.

O último post de 13/11/08, "Retalhos da História de Cabo Delgado: A Ilha do Ibo." mereceu por parte do Dr. Carlos Lopes Bento, antropólogo e prof. universitário, profundo conhecedor do Arquipélago das Quirimbas além de Amigo e colaborador deste blogue radicado em Lisboa, o seguinte complemento que visa somar informações e continuamos daqui:

PARA A HISTÓRIA DAS FORTIFICAÇÕES DE CABO DELGADO, MOÇAMBIQUE
Por Carlos Lopes Bento(Antropólogo e professor universitário)

Continuando...

Como opção e em sua substituição, para segurança das Ilhas, bastaria proceder à instalação de "uma companhia com o seu capitão, condecorado com algum título", que, com a ajuda da gente da terra, teria capacidade para repelir qualquer ataque do inimigo. Havia a convicção de que os "paisanos cafres e mouros que são os mais poderosos" prestariam valiosa colaboração, que viriam a dar aos Portugueses em momentos decisivos, como, aliás, se verificaria, durante os ataques dos Franceses, em 1796 e Sakalava, a partir de 1800, por não desejarem sujeitar a sua liberdade ao domínio de outras nações que consideravam de cruéis.
As opiniões continuavam a divergir, e à tese dos que defendiam a não construção de uma fortificação, como meio de manter e conservar as Ilhas "debaixo do domínio português", juntava-se outra, segundo a qual seria suficiente, para fiscalizar o porto de desembarque, uma guarnição militar e o levantamento de "uma faxina, com parapeito de mar, de pedra, sobre o canalzinho que está na ponta da Ilha e de onde somente possam laborar 5 peças de calibre 18 e juntamente se arvorará um pau de bandeira".
A antiga ideia da construção de uma obra de defesa vem a ser concretizada quando da implantação, na ilha do Ibo, da nova capital das Ilhas, que teve lugar no ano de 1764. Assim o confirma a nova Câmara e seus vereadores:

Atestamos nós os vereadores da Câmara desta nova vila de São João do Ibo, capital das do Cabo Delgado, com os mais moradores abaixo assinados, em como, aos dezasseis do mês de Junho da era abaixo, chegou a estas Ilhas o Sr. Caetano Alberto Judicie sargento-mor de infantaria, com exercício na Praça de Moçambique, capital deste Estado e nele Comandante da Artilharia, vindo despachado em comandante destas Ilhas, o qual, logo em execução das ordens que trazia (...) estabeleceu em um bom terreno desta ilha do Ibo, a nova vila à qual deu o nome de São João do Ibo, dividindo o terreno em ruas e travessas de boa largura, pondo marcos nos ângulos em que as ruas encontram as travessas. Criou a nova Câmara, fez uma cadeia, de duas casas.
Levantou um pelourinho, tudo à imitação das melhores vilas do Reino, em uma boa praça e no melhor sítio da vila, eleito pelo povo que se achava presente, para a comodidade de todos. Além das referidas obras fez dois armazéns (...). Depois de que construiu um Forte em redentes a que deu o nome de Santa Bárbara (...) e logo junto ao Forte teve o honorífico trabalho e honra de arvorar a Bandeira de El-Rei ...(1).

As obras iniciadas depois de Junho de 1764, viriam a ser concluídas no mês de Dezembro desse mesmo ano.
Este pequeno forte que demora a SW da Ilha, junto ao porto de cabotagem e de pesca, construído de pedra, terra e cal, mede 3,49 m de altura, tendo de parapeito 1,50 m. Estava artilhado, em 1810, com 1 peça de calibre 3, 1 de calibre 4 e 1 de calibre 6, a que se juntava mais a artilharia de campanha (incapaz), constituída por 1 peça de calibre 2 e 2 peças de calibre 3. Nos meados do século XIX continuava guarnecido com 7 bocas de fogo, de ferro. Teve, com o decorrer do tempo, funções militares, de cadeia e de alfândega.
A informação documental recolhida é omissa quanto às razões da escolha de Santa Bárbara para designar o primeiro forte construído pelos portugueses nas Ilhas. Poder-se-ão ligar à data de finalização da obra, mês de Dezembro, que coincide com a festa em que se homenageia aquela Santa, celebrada em 4 de Dezembro ? ou terão alguma coisa a ver com o facto do Governador Caetano Alberto Júdice estar ligado à arma de artilharia, de que a dita Santa é protectora? ou a ambos os factos?. Para além de outras explicações que venham a ser dadas, admite-se serem os dois motivos apontados os principais responsáveis pela evocação do forte a Santa Bárbara, não pondo de parte qualquer tempestade com fortes trovoadas, surgida durante a construção que levasse ao pedido de intervenção daquela Santa.
A designação inicial dada a este forte foi efémera e não se encontra referida na documentação emanada de Moçambique para a Corte, referindo-se a Capitania Geral na sua correspondência para Lisboa apenas a "uma fortaleza com toda a artilharia necessária" ou "um reduto com 7 peças de artilharia". Nos anos posteriores à sua construção é conhecido por "forte do Ibo", "pequeno forte ou reduto" e "antigo forte" e, somente, a partir de Agosto de 1809 aparece a sua evocação a São José, que perdurou até aos nossos dias. Não existe, por agora, explicação para esta nova designação.

FORTALEZA DE SÃO JOÃO BAPTISTA

A total ruína e as fracas possibilidades de defesa que oferecia o forte de São José como consequência da sua má e irregular construção e implantação em terreno arenoso impróprio e das despesas avultadas exigidas para a sua restauração, aconselhavam a "fazer- se antes outro forte novo em terreno melhor para segurança da mesma construção como vantajoso para a defesa dessa Ilha e sua barra do que reparar-se a ruína do velho (...) V.M. proporá a construção de um novo forte no sítio vantajoso ...". No entanto, anos mais tarde, num novo contexto geo-político, o velho forte viria a ser reactivado.
De acordo com estes objectivos, o Governador das Ilhas escolheu o local, desenhou a planta(2) e propôs a construção de uma fortaleza em forma de pentágono regular.
As obras principiaram, em 25/5/1789, com a ajuda de oficiais, cabouqueiros e serventes, vindos de Moçambique e por "serventes e gente de picareta que eram soldados, adimos ou cafres forros, e escravos de alguns moradores e do dito Comandante Tigre, fazendo-se o seu pagamento em milho, aguardente, fato e dinheiro.
Estavam em vias de conclusão nos finais de 1794, embora existam 2 lápides (réplicas) situadas sobre a porta de armas e sobre o túnel de entrada, que apontam para data diferente. Na primeira pode ler-se: "Sendo Governador e Capitão General deste Estado o IIImo. e Exmo. Snr. António Manuel de Melo e Castro se fez esta fortaleza no ano de 1791", enquanto que na segunda: "O Capitão de Granadeiros António José Teixeira Tigre comandando estas Ilhas fez esta fortaleza no ano de 1791". Razões, manifestas e latentes, de ordem pessoal, profissional e política estarão na base desta diferença de datas.
Esta fortaleza, dedicada a São João Baptista, padroeiro da ilha do Ibo, denominação que em 1764 foi dada à Vila do Ibo, que passou a chamar-se “ Vila de São João do Ibo” foi construída em pedra talhada, extraída localmente, tendo no seu interior sido erguida uma capela militar que, depois de ali ser colocada a imagem daquele Santo, foi, convenientemente, ornamentada.
Demorando a NO da Vila, assenta em rocha firme, junto ao mar, mede 3,80 metros de altura e 1,36 metros de parapeito e cada uma das 5 estrelas do pentágono tem 50 metros de extensão. A sua área total é de 6400 metros quadrados.
Nos anos finais da sua construção, a "nova fortaleza", juntamente, com o "forte velho" dispunham das seguintes peças de artilharia: 2 de calibre 2; 6 de cal. 3; 3 de cal. 4; 1 de cal. 6; 8 de cal. 8; 2 de cal. 9; e 1 de cal. 12; num total de 23. Como pertenciam ao "forte velho" 10 peças restavam para a Fortaleza de São João Baptista 13, algumas delas em mau estado por já terem sido usadas em navios. Em 1810 estava equipada artilharia de vários calibres(3).
Ao onstruir-se esta fortaleza tinha-se pensado nos ataques dos inimigos vindos do mar, não se imaginando que um dia seria necessária também a defesa das ameaças provenientes da própria ilha do Ibo. Aconteceria com os Sakalava que, por terra, a partir da Ilha de Querimba, tentaram, mais de uma vez, tomá-la de assalto.

REDUTO DE SANTO ANTÓNIO

Na opinião do novo Governador das Ilhas José António Caldas, as alterações efectuadas no fortim de São José parecem não terem resolvido o problema da defesa da Capital do território, que continuava a ser nula "porque a fortaleza que aqui está não defende nem a entrada do porto nem a terra, apenas pode servir para recolher uma pequena parte de indivíduos da Vila".
De modo a atenuar estes graves inconvenientes e acalmar os moradores em pânico, construiu, numa primeira fase, para protecção da povoação "três redutos de estacas e faxina, com artilharia, que cruzam os fogos de um a outro e com a fortaleza e para esse efeito tirou da fortaleza 12 peças para as guarnecer e evitar os acontecimentos de 1808 em que tudo ficou reduzido a cinzas e nem a Igreja escapou"(4).
Não contente com este novo sistema, muito frágil, optou por tornar a sua construção mais sólida e definitiva. Como a segurança da Vila dependia de estar fortificado o passo em que se fez o reduto de Santo António, que era de estacas e de faxina, congemina um novo plano e informa o Capitão General ter consultado os habitantes da Vila, propondo-lhe que seria de grande utilidade e respeito fazer-se ali um forte de pedra e cal.

  1. A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 24, Doc. 84, Atestado de 25/12/1764. Assinado por 26 moradores, todos cristãos. A estas obras acrescentava o Cap. Gen. uma pequena igreja (Códice 1321, fls. 191, Carta de 20/8/1766, do Cap. Gen. para o Reino).


  2. Idem, Doc. Av. Moç., Cx. 63, Doc. 17, Carta de 20/5/1792, do Cap. das Ilhas para o Cap. Gen., em que se dá conta que foi encarregado de tirar plantas da fortaleza nova e da Ilha do Ibo, o Capitão Carlos José dos Reis e Gama, plantas que não se encontraram


  3. Idem, Ibid, Cx. 133, Doc. 48, Carta nº 440, de 31/7/1810, do Cap. das Ilhas para o Cap. Gen..


  4. A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 151, Doc. 101, Carta nº 541, de 3/12/1816, do Cap. das Ilhas José António Caldas para o Cap. Gen...

Por a Fazenda Real não dispor de verbas nem tão pouco haver autorização para a realização desta obra, a mesma população aprovou, prontamente, a diligência "concorrendo todos para esta obra" que teve início nos finais de 1818. A pedra talhada utilizada na dita obra veio de uma casa que se fez demolir, e que, no passado havia servido de cadeia pública da Vila.
A escolha da sua forma quadrada foi justificada pelo facto de ter de "defender 3 lados e outro também se precisa caso tenhamos a infelicidade do inimigo por algum descuido poder entrar". Esta pequena fortificação constituiria, nas palavras do Governador, uma flecha no intervalo da fortaleza e do forte que permitiria uma boa defesa para a ilha do Ibo, sem receio de poderem entrar os Sakalava.
A nova construção foi sancionada por Moçambique que incita o Governador José António Caldas que a planificou e mandou executar, "a concluir a obra no tempo de seu Governo para glória sua e benefício público, pois sua Magestade não deixará de remunerar este serviço".
Em estado de adiantamento nos princípios do ano de 1819 viria a ser dada como acabada nos meados desse mesmo ano quando o dito Governador Caldas terminou a sua primeira comissão.
Ainda que custeado pela população ficaram por liquidar 843 cruzados em dinheiro e 40 alqueires de milho, gastos no pagamento de pedreiros e serventes cativos, produto proveniente do rendimento da Alfândega, não remetido a Moçambique, mas, ilegalmente, depositado, por ordem do Governador, na mão de um particular, com o consentimento do respectivo Juiz.
Situado a SSE da Vila o reduto (em Kimwani =rituto por corruptela) de Santo António, sito na extremidade da Vila e perto da praia, está assente em pedra corálica, possuindo uma construção idêntica às duas outras fortificações. De forma quase quadrada, mede 16,75 metros de frente e 17,35 metros de fundo, rondando a altura da muralha 1,93 metros e o parapeito 1,43 metros. No centro do forte eleva-se um baluarte com a altura de 3,5 metros, com as dimensões de 7,58 metros de frente e 7,64 metros de fundo. Deste local, onde estava um mastro destinado a içar a bandeira real, se avistavam as embarcações a grande distância e se transmitiam as ocorrências, através de sinais, à residência do Governador.
No frontispício deste pequeno forte ainda se encontrava, em 1974, uma lápide cujos dizeres: "MANDADO FAZER EM 1847 POR T. V. N. FERRARI, GOV. DESTAS ILHAS", não estão de acordo com a realidade e terão induzido em erro muitos dos estudiosos que lhe dedicaram a sua atenção. Naquela data ter-se-ia procedido a grandes reparações, mas não à sua construção de raiz, realizada 30 anos antes, aproveitando-se o Governador do facto para se glorificar e perpetuar a sua memória. Em 1969 este reduto servia de cadeia civil (calabouço).
No que respeita às razões que terão levado à sua evocação a Santo António, os documentos compulsados são inteiramente silenciosos. Poder-se-ão ligar ao facto do Governador responsável pela sua construção ter chegado ao Ibo nas proximidades dos festejos populares (tomou posse em 21/6/1816), ao que parece celebrados, intensamente, pelos membros das Ilhas, ou ao facto das obras terem início próximo das festas de Santo António ou ainda ao facto do próprio Governador querer ligar o seu nome a este forte?. São três hipóteses que se levantam e deixam por comprovar.
A fortaleza de São João Baptista, o fortim de São José e o reduto de Santo António, estavam dispostos de forma estratégica, ficando cada um deles sediado nos vértices de um triângulo que continha a Vila de São João do Ibo, no seu interior.
Muitos estudiosos têm-se debruçado sobre estas três obras militares, construídas pelos Portugueses, mas nem sempre as datas da sua construção estão conformes com as evidências factuais. Há divergências em relação ao forte de Santa Bárbara, mais tarde de São José, à Fortaleza de São João Baptista e ao reduto de Santo António, o primeiro levantado em 1764, o segundo entre 1789 e 1795, e o terceiro, em pedra e cal, em 1818 e 1819. Teixeira Botelho assegura que "só em 1760 se construiu um forte na Ilha do Ibo"(1). Gomes e Sousa opina que a Vila do Ibo começou a ser fortificada em 1754 e tendo mais tarde, em 1791, sido construídos a fortaleza de São João Baptista, o forte de São José, em 1816, e o forte de Santo António, em 1847(2). Ribeiro Torres atesta que António de Melo e Castro (...) de 1756 a 1763, "constrói as duas fortalezas de São João e Santo António ..." (3). Leote de Rego fornece a indicação de que a fortaleza de São João Baptista foi construída em 1754 e reconstruída em 1791(4). Amaro Monteiro e Pierre Verin adiantaram as datas de 1791 para a edificação da fortaleza de São João Baptista e de 1847 para o do forte de Santo António(5). Estas discrepâncias de datas devem-se à falta de consulta sistemática das principais fontes documentais primárias e fontes documentais secundárias fidedignas e, ainda, ao facto de nem sempre ... ...

  1. Op. cit., Vol. I, p. 434.


  2. Op. cit., p.p. 136 e 137.


  3. Op. cit., p. 83.


  4. Op. cit., p.p. 90 e 91.


  5. Op. cit., p. 188.

- Continua em próximo post...