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7/18/08

Moçambique - Economia cresce... e a pobreza também!

A economia moçambicana cresce, o que é ou deveria ser natural num país jovem, em desenvolvimento, que possui riquezas naturais, vastos horizontes de progresso no campo turístico entre outros e vem recebendo apoio generoso e doações vultosas, práticamente a custo zero, da maioria dos Países da comunidade internacional.
O que já não é natural, preocupa e desperta a atenção é o crescimento simultâneo da pobreza, da desiguldade social, o que sugere que muitos estão empobrecendo enquanto elites minoritárias "recheiam as algibeiras", vivem desafogadamente, são beneficiadas por essa pujança económica muitas vezes propagada ao mundo e ao povo com interesses populistas e eleitoreiros!
Portanto, algo vai mal no País regido pelo Sr. Guebuza e pela Frelimo.
Transcrevo do "AngolaPress" de ontem:
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Maputo, 17/07 - A desigualdade social em Moçambique aumentou, apesar de o país ter registado nos últimos anos "um elevado crescimento económico", segundo disse hoje, em Maputo, o economista português Carlos Nuno Castel-Branco, na apresentação de um relatório da ONU. Castel-Branco foi escolhido pela representação da ONU em Maputo para apresentar o relatório de 2008 sobre "Crescimento, Pobreza e Termos da Parceria para o Desenvolvimento" nos Países Menos Desenvolvidos, elaborado pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). O documento, apresentado hoje em todo o mundo, avalia 50 países menos desenvolvidos, incluindo Moçambique e Angola, com base em critérios como o rendimento per capita, activos humanos e vulnerabilidade da economia. No tocante a Moçambique, a avaliação mostra que o país está entre os que têm registado "altas taxas médias de crescimento nos últimos anos", acima de 6,5 por cento, mas através de "um padrão de crescimento que não é nem sustentável nem inclusivo e muito desigual". A avaliação aponta o alumínio e gás, para Moçambique, como as principais alavancas para o acentuado crescimento económico registado, mas que não dão garantias de sustentabilidade. "No caso de Moçambique, grandes projectos como a fundição de alumínio da MOZAL quase não pagam impostos, empregam pouca mão-de-obra, repatriam os seus rendimentos e não ajudam no desenvolvimento social do país, apesar do peso que tem nas estatísticas sobre o crescimento económico", sublinhou Castel Branco. Caso a MOZAL tivesse com o Estado moçambicano as mesmas obrigações fiscais impostas a outros agentes económicos, o Orçamento do Estado, financiado em 50 por cento pelos doadores internacionais, duplicaria, frisou Castel-Branco. O carácter "instável e volátil" dos preços das matérias primárias, em especial as energéticas e matérias-primas para os bio-combustíveis, das quais dependem as nações pobres para crescerem, também tem influência na insustentabilidade dos modelos de desenvolvimento seguidos por muitos desses países, observa o documento. Outro elemento determinante no crescimento das economias menos desenvolvidas são os apoios da comunidade internacional, mas têm tido pouco impacto, devido à fraca capacidade dos países receptores em influenciar a afectação das ajudas às áreas prioritárias, lê-se no relatório. Devido ao pouco impacte social que "as altas taxas de crescimento económico" tiveram nos 50 países analisados, o relatório conclui que os modelos de desenvolvimento e crescimento seguidos por esses Estados falharam, impondo-se, por isso, a formulação de novos padrões. Essa nova visão deve incluir a diversificação da base produtiva, a apropriação das políticas de desenvolvimento por parte dos Estados receptores das ajudas internacionais e a aposta no desenvolvimento tecnológico e industrial, capazes de garantir uma estrutura económica mais competitiva. "As expectativas para todos os países são sombrias, agravadas pela actual conjuntura. (...) Os países mais pobres devem procurar caminhos diferentes dos que têm feito até agora, porque há bastante tempo que os actuais modelos são criticados", sublinhou Castel-Branco.

7/08/08

Luz e esperança no horizonte dos desfavorecidos - Os milagres do microcrédito no norte de Moçambique. - III

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui.)
...continuação:
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Água a 30 quilómetros.
Criança com malária deve molhar-se com a capulana, levar ao curandeiro ou ir ao hospital? A doença tem uma incidência de 40 por cento da população, mas só um por cento é letal. As possibilidades de a combater são testadas num teatro que um grupo de jovens de agentes comunitários de saúde apresenta para quem quer ver, junto ao centro de saúde da aldeia. Levar ao curandeiro?
"É melhor dar nome de cemitério, não é bom hábito."
A mensagem tem que passar através do teatro e da música. Ou ensinando, numa demonstração ao vivo, como se faz uma papa nutritiva para crianças com ingredientes que estão à mão: farinha de milho, amendoim, folhas verdes de feijão, açúcar, sal, ovo.
Mas estes grupos também têm uma intervenção mais personalizada: Celso Varinde, médico e director regional da fundação, explica que são estes jovens que vão a casa das pessoas conferir o boletim de vacinas, identificar sinais de malária ou de doenças sexualmente transmissíveis, ver como estão as mulheres grávidas, aconselhar os partos nas unidades de saúde. Só não administram medicação.
O centro de saúde de Bilibiza - pequenas salas de enfermaria e de consulta, maternidade e cinco pessoas chefiadas pela enfermeira Cristina - serve uma população de 14 mil pessoas, 3500 das quais são mulheres em idade fértil.
Em Moçambique, a cobertura dos cuidados de saúde é inferior a 50 por cento, por isso estes grupos de agentes comunitários são importantes.
Nos arredores desta aldeia, há quem tenha que andar 30 quilómetros para ir buscar água. Muitas vezes, tem que se ir num dia e voltar no outro com dois ou três baldes de água na mão. A captação de água é, por isso, o projecto a que neste momento as pessoas mais se entregam.
Na aldeia 25 de Setembro, a população juntou-se. "Fizemos um pedido para o posto administrativo de Bilibiza. Querem que a população também ajude. Vamos buscar água a dois quilómetros. Mas há quem vai buscar a 30 quilómetros, as mulheres e crianças é que vão buscar mais", explica o representante do comité local.
Este pequeno grupo trata da manutenção do furo ou do poço, da cobrança do dinheiro, da promoção de regras de higiene. A aldeia contribui com dois por cento, cerca de dois mil meticais (menos de 60 euros) por furo de água.
No distrito de Quissanga, há neste momento 13 novos furos a serem feitos, além de seis reabilitações e onze poços. Mas o projecto abrange um total de 40 furos, num investimento de cerca de 190 mil euros. No final, 144 mil pessoas terão uma fonte de água mais perto de si. "Estamos a ajudar no cumprimento dos Objectivos do Milénio", diz Celso Varinde.
Neste canto do mundo, lutar contra a adversidade e melhorar as condições de vida tem metas concretas.
Ibrahim, o motorista da fundação, nasceu a 30 quilómetros de Bilibiza, numa aldeia ainda mais interior. "Há 30 anos, nada disto estava no mapa."
- Extraído de PÚBLICO.pt - 06.07.2008 via Moçambique Para Todos.
  • Reportagem original com imagens (em formato pdf) - Aqui!

Luz e esperança no horizonte dos desfavorecidos - Os milagres do microcrédito no norte de Moçambique. - II

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...continuação:
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Quando chegou, Rahim Bangy começou por ir aos mercados, conhecer a cidade, falar com as pessoas. Uma prática que mantém: de 15 em 15 dias, das sete da manhã até ao anoitecer, procura passear pelos mercados, conversar com pessoas, visitar mutuários.
O programa não se auto-financia na totalidade. O que falta vem de uma organização norueguesa e do Imamato Ismaili, a instituição assente na autoridade do Aga Khan. A agência para o microcrédito é apenas uma das que fazem parte da Rede Aga Khan para o Desenvolvimento, que agrupa organismos de âmbito económico, desenvolvimento social e cultura, para áreas tão diferentes como turismo, indústria, finanças, ensino, microcrédito, cidades históricas.
Rahim Bangy entusiasma-se com os resultados do programa nas vidas das pessoas.
"Já estive no meio do mato, em sítios em que as pessoas ainda se cobrem com folhas. Nunca viram o mar, mas já ouviram falar do microcrédito. Queremos agora introduzir o financiamento a associações e grupos, porque o impacto será maior."
Está já em marcha o próximo projecto: transformar o programa num Microbanco Rural.
"As pessoas enterram o dinheiro, às vezes encontram-se sacos com dinheiro ou jóias. Há necessidade de a população poder guardar as poupanças."
Até ao final deste ano, o processo legal deverá estar terminado, para que em 2009 o banco possa começar a operar.
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20 filhos.
As placas do programa de microcrédito estão já presentes em muitos locais de Pemba. Faqui Saide Ali está entre pneus, jantes, velas, câmaras de ar. Pediu apoio em Fevereiro de 2007 para montar uma barraca de venda de peças de veículos. "Correu bem mesmo, estou a gostar, comprei uma casa." Falta um mês para acabar de pagar os 10 mil meticais.
"No bairro de Ingonane, Jamal Mbamela, 58 anos, tem uma mercearia com café. Teve 20 filhos de duas mulheres, morreram dois. Não consegue sustentar toda a gente: "Esta vida dá pouco." Mas os 50 mil meticais que pediu em 2004 permitiram melhorar as contas. O filho Abdul, 18 anos, a estudar contabilidade, é um dos que o ajuda.
O café de Lurdes Loureiro, 48 anos, à beira da praia do Wimbe, inovou com os combos - hambúrgueres com batata frita e refresco. E melhorou a vida dela e dos dois filhos que ainda vivem com ela.
Um juro de dois por cento ao mês, uma taxa de incumprimento residual.
Rahim Bangy pretende que tudo seja transparente com os beneficiários. Mas não quer ficar pela relação económica. O microcrédito prevê acções paralelas sobre a sida ou a malária. As mulheres são um alvo importante para o financiamento. São 20 por cento dos beneficiários, mas a meta é pelo menos 30 por cento.
"As noções de saúde e higiene passam melhor através das mulheres."
Esta será uma mensagem repetida pelos responsáveis dos projectos na ilha do Ibo ou na aldeia de Bilibiza, mas já lá chegaremos. "São mais cuidadosas com o próprio dinheiro, porque sabem que têm que alimentar os filhos.
"Até ao final deste ano, Rahim Bangy quer ter pronta um espaço, por detrás do escritório do programa, dedicado a passar a mensagem:
"Nos dias de reembolso, enquanto os mutuários esperam, queremos ter pessoas a falar de sida, malária, amamentação. Assim, ouvirão a mensagem e irão levando essas ideias para suas casas."
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O caderno de João Baptista.
Pode um homem conter toda a história de uma ilha?
João Baptista "tem tudo aí", num caderno escrito com caligrafia aprendida na escola primária. "Ibo é Ilha Bem Organizada", começa o "era uma vez" desta terra no meio do Índico.
Árabes à procura de escravos, depois os portugueses e as especiarias, aportaram ao Ibo.
Hoje, a ilha tem 8700 habitantes, vivendo sobretudo da pesca. Porventura atraídos pela magia do Índico, que neste arquipélago das Quirimbas se pinta de vários tons de azul e verde. Na rua principal da vila, ainda se adivinha a traça colonial das casas, mesmo com décadas de degradação e esquecimento."
Ibo foi governo da província, quando Porto Amélia, hoje Pemba, era simples aldeia.
Era ali o palácio onde está a pensão; tivemos aqui o Banco Nacional Ultramarino, cadeia civil, a fábrica de sabão de Filipe e António Veríssimo, uma fábrica de fósforo, jornais. Foi sítio importante", regista o caderno.
Por João Baptista, cachecol da selecção portuguesa de futebol ao pescoço, passaram duas mulheres (a primeira morreu), doze filhos e 42 administradores coloniais.
"Eu estava no gabinete deles, aproveitava para apontar isto. Eu é que sabia tudo, eu era daqui." Hoje, João Baptista diz que o Aga Khan é que está "a ajudar muito a ilha". O ano passado conheceu-o, quando o líder dos muçulmanos ismailis visitou a ilha.
Elsa Rodolfo, administradora da ilha, confirma a "diferença palpável", desde que as instituições do Aga Khan estão no Ibo: "Anos atrás havia focos de fome, agora já não." Os miúdos já vão à escola - mesmo as raparigas, o que não acontecia antes por uma questão cultural. "Agora, vêem que a mulher pode estudar e ter emprego: já há uma administradora, uma directora de educação..."
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Moedas com 100 anos.
O desejo de Rahim Bangy, de alargar o apoio a grupos e associações, tem também já experiências na ilha do Ibo. A Associação dos Viveiristas do Ibo, presidida por Vita Tuaibo, máquina fotográfica a tiracolo, é uma das beneficiárias.
Criada em 2006, com 19 membros (nove são mulheres), a associação teve um empréstimo de 80 mil meticais (quase 2300 euros).
Alface, couve, batata doce, tomate, laranjeiras, cajueiros crescem numa machamba de 800 metros quadrados. Construir o escritório, usando uma técnica tradicional para a argamassa, é a tarefa imediata. Jason Morenikeji, de ascendência anglo-nigeriana, explica que a forma de construção do telhado permite aproveitar a água da chuva para sistemas de irrigação e canalização.
Ourivesaria Moderna é o nome de uma associação de artesãos. As mãos encurtam-se para pegar nas finas pontas de prata, trabalhando a filigrana com pequenas espátulas, alicates, fios e arames. É uma arte tradicional que vem do tempo dos árabes, explica Susan Esteves, responsável pela ligação com as associações locais. Brincos, colares, pulseiras, anéis que nascem da criatividade de Sufo Sufo, 52 anos, e dos restantes 13 membros da associação (quatro são mulheres). Rendilhados, entrelaçados, floreados vendidos a turistas de passagem, com preços variados, consoante a origem do metal: moedas antigas fundidas ou prata pura.
Na Associação Fortaleza, onde se faz um trabalho semelhante, os 25 artesãos mostram algumas das moedas. Ali estão as efígies do rei D. Carlos ou da República, datadas de 1891, 1899, 1915...
O trabalho das duas associações já permitiu sucessos pessoais. Manlide Amade, da Associação Fortaleza, diz que o artesanato em prata possibilitou construir casas, comprar motorizadas, bicicletas, celulares... E teve sucesso internacional: um comprador da África do Sul fica com uma parte da mercadoria e exporta para a Europa; em 2007, os artesãos levaram peças para uma feira internacional no Maputo. Um êxito e quatro mil dólares, a terceira maior receita bruta da feira.
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Afastar os elefantes.
O piripiri pode ser uma arma contra os elefantes. Há um problema para os agricultores de Bilibiza, no interior da província de Cabo Delgado, 200 quilómetros a norte de Pemba, e das aldeias vizinhas: os elefantes e os macacos destroem grande parte das culturas, porque homem e animais ocupam o mesmo espaço. Com a criação do Parque Nacional das Quirimbas, em 2001, cerca de 250 mil pessoas (60 mil famílias) ficaram sujeitas a regras mais estritas de relação com o ambiente. Truque para evitar o flagelo provocado pelos animais: cultivar piripiri junto das plantações agrícolas. "Sabemos que o piripiri provoca irritação nos elefantes", diz Lebreton Saah Nyambe, camaronês, técnico de desenvolvimento rural, há cinco a trabalhar com a Fundação Aga Khan em Pemba.Contudo, o piripiri não é solução definitiva. "O único sucesso é a produção em bloco", machambas colectivas vigiadas rotativamente pelos agricultores da aldeia. Para afugentar os elefantes basta fazer barulho. Assim, a vigilância por turnos permite atenuar o problema. Com os macacos, é mais fácil: depois da escola, as crianças entretêm-se a lançar-lhes pedras.
A introdução de culturas mais precoces é outro caminho. O milho de ciclo curto pode colher-se em 90 dias, antecipando a chegada dos animais à procura de água e comida. Hoje, as machambas colectivas envolvem já 21 mil famílias, o objectivo, até 2010, é chegar às 25 mil. Em 2001, começou-se com dez aldeias, hoje há 147 a participar neste projecto.
Bilibiza mantém o céu em estado puro. As estrelas afagam-nos o olhar. Mas a vida é dura, secas extremas e inundações destrutivas são problemas frequentes.
Para produzir riqueza, também a criação de gado caprino é apoiada. Desde Outubro de 2002, em 40 aldeias, a fundação entregou três cabritos, duas fêmeas e um macho, a dez famílias por aldeia. Cada uma das famílias beneficiadas deu depois outros três cabritos a novas famílias. Os 600 cabritos entregues transformaram-se em mais de 1700 cabeças. Do mesmo modo, é incentivada também a conservação das culturas em celeiros.
Na Escola Agrária de Bilibiza há alunos a concluir a debulha do milho. Esta segunda campanha deverá dar dez a quinze toneladas de milho, talvez para o ano a escola já possa vender excedentes. A escola é uma das instituições que começou a trabalhar com o programa Pontes para o Futuro, criado pela fundação em 2006. São duas as componentes: apoiar a liderança emergente através de bolsas de estudo (154 já atribuídas, em áreas como a agricultura, saúde materno-infantil, ensino, turismo, informática, contabilidade, gestão) e o fortalecimento institucional.
Sifer Rodrigues, bolseira de 18 anos, no 3º ano da escola, está a acabar um relatório sentada na cama - a maior parte dos 550 alunos estão em regime de internato, só vão a casa nas férias. Recebe 200 meticais (cerca de seis euros) de bolsa por mês. "É muito, permite ajudar a família, posso comprar sabão..."Marcelo Soverano, 39 anos, responsável do programa Pontes para o Futuro, diz que o desafio é transformar agora a escola básica numa escola média (equivalente aos 8º, 9º e 10º ano de escolaridade), melhorando ao mesmo tempo as estruturas para os estudantes.
- Continua acima... - (extraído de PÚBLICO.pt - 06.07.2008 via Moçambique Para Todos.)

Luz e esperança no horizonte dos desfavorecidos - Os milagres do microcrédito no norte de Moçambique.

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06.07.2008, António Marujo, em Pemba - Os projectos de microcrédito promovidos pela rede Aga Khan no norte de Moçambique permitem reparar sapatos para vender em segunda mão, trazer água a crianças que andavam quilómetros para a obter. Algumas destas coisas fazem-se com uma centena de euros apenas.
Primeira de uma série de reportagens que publicaremos ao longo desta semana.
Na Ilha do Ibo, perto de Pemba, norte de Moçambique, Ancha, 30 anos e uma filha de 14, é uma das 15 mulheres da Associação de Floristas, criada com apoio de microcrédito.
Está a lavar e secar folhas de mangueira para os arranjos que se tornarão colares, bolsas, coroas. É a vida mais florida?
"Não tinha rádio, na minha casa, já tenho; não tinha brincos e já comprei. Há muitas coisas que estou a comprar. Primeiro comprei brinco, estou a comprar pratos."
O financiamento pedido por Saraiva Morossene Saguate, 40 anos, foi "um aleluia" na vida dele. Saguate trabalha em Pemba, nos serviços de emigração, mas o salário não chegava para a família - que inclui sobrinhos.
"Os meus filhos estudam na base disto aqui" e aponta para uma moagem que montou num barracão ao lado de casa.
Momade Buana tem um problema numa das pernas que não lhe permitia andar muito. Com 45 anos, já quase não podia trabalhar: a bicicleta, comprada com um pequeno financiamento, permite-lhe agora ir todos os dias para a fortaleza construída pelos portugueses na ilha do Ibo, em 1791. Com outros 24 colegas da Associação Fortaleza, faz peças em prata. E já teve bónus: "Comprei um rádio, um relógio."
Alifa Bakar, 42 anos, ri mais do que fala. É vendedora de bebidas e capulanas, de novo em Pemba. Ao lado dos panos coloridos, admite que, sem o empréstimo, não poderia ter os três filhos a estudar.
Irage Amisse, 38 anos, tem quatro filhos cujos estudos são garantidos pelo negócio da sua mercearia que, à noite, vira bar e discoteca. E há ainda os sapatos lavados e vendidos em segunda mão de Assime Chale, os desejos de Rahim Bangy ou o olhar perspicaz de Carlos Matiquite.
Há pequenos nadas que podem trazer toda a esperança do mundo a algumas vidas. Na província de Cabo Delgado, que faz fronteira com a Tanzânia, a Rede Aga Khan para o Desenvolvimento tem operado essa transformação através de duas das suas agências. Em Pemba, isso é feito pela Agência Aga Khan para o Microcrédito, na ilha do Ibo a responsabilidade é da Fundação Aga Khan. No caso da agência, são 400 mil dólares (mais de 250 mil euros) distribuídos em pequenos financiamentos, que têm permitido a criação de pequenos negócios.
Empréstimo de 170 euros - A mudança, para Amisse Chale, 34 anos, já é grande. É vendedor de sapatos em segunda mão no mercado do bairro Natite, no centro de Pemba, definido por algumas ruas de edifícios em tijolo e cimento. Fora dali, predominam os bairros de palhotas, vários deles com vista para a larga baía de Pemba. Na cidade, vivem cerca de 160 mil habitantes. Casado, com três filhos, Amisse Chale vendia calçado na rua. Agora, o cliente pode circular entre as prateleiras e escolher diferentes modelos de sandálias, sapatilhas, chinelos ou sapatos. Como novos: "Vêm sujos, de nem saber que marca é. Começamos por lavar. Depois de lavar é que distinguimos o preço: esse é de 500, 600..."
Pediu emprestados seis mil meticais (à volta de 170 euros) e com isso comprou um espaço para uma barraca no mercado.
"Pedi, paguei, já pedi um segundo empréstimo de dez mil e um terceiro de mais nove mil; agora estou a pensar num novo empréstimo de 20 mil para criação de galinhas, pintos. Assim estou avançando com a minha vida."
Amisse já deu emprego a seis pessoas, a quem paga perto de 90 euros. O dinheiro ainda chega para que a mulher, com 27 anos, possa completar o 12º ano.
No bairro Cariocó, a moagem de Saraiva Saguate permite-lhe sustentar um pouco melhor os nove filhos e sobrinhos - ficou a tomar conta deles quando um irmão morreu. Um vizinho acaba de chegar com um saco de 30 quilos de milho para moer. Pagará 30 meticais. Se fosse comprado e moído por Saguate, o milho custaria entre oito a dez meticais o quilo. "O milho tem procura, porque é o nosso pão." Hoje, por ser domingo, é o filho que coloca os grãos na máquina para a "farinhação". Durante a semana, três empregados a dois mil meticais cada garantem o serviço.
A casa de Saguate são duas, com um pátio no meio, onde há mangueiras, bananeiras e cocos - para consumo próprio, às vezes para vender. Algum lixo, um sofá velho num dos terraços térreos. A moagem está colocada num pequeno anexo.
Saguate quer comprar agora uma máquina de descasque de arroz e outra de pilar o milho. Irá bater de novo à porta do microcrédito. A primeira vez que ouviu falar do programa "foi um aleluia". Ganha oito mil meticais (230 euros) no emprego, pouco mais que um salário mínimo. Pediu dez mil. "Consigo pagar e tenho ficado com alguns trocos."
Carlos Matiquite, 29 anos, é o supervisor do programa, a trabalhar com o microcrédito há quatro anos. E, nesta curta visita, já percebeu que tem que ter cautelas especiais na concessão de um novo empréstimo a Saraiva Saguate. Para garantir que o dinheiro é aplicado para desenvolver a actividade e não apenas em comida para a família extensa.
"É por essas razões que se fazem muitas conversas com os mutuários, antes de conceder os empréstimos, para avaliar quando custa a máquina, que água e luz se pode gastar, quanto se pode ganhar", diz Rahim Bangy, responsável pelo programa de microcrédito de Pemba.
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Banco rural.
Rahim Bangy tem um desejo: "Quero ver Pemba cheia de placas." Depois de ter deixado o cargo de director-geral numa empresa em Luanda, em Janeiro de 2006, Rahim está muito contente com a experiência. Apesar da realidade que o cerca: o analfabetismo de 70 a 80 por cento da população, dez por cento de gente infectada pelo HIV/sida na província (a nível nacional, chega aos 16 por cento), um salário mínimo inferior a 50 euros.
Mesmo assim, a decisão de trocar a baía de Luanda pela de Pemba "foi provavelmente a melhor opção" que Rahim tomou nos últimos anos, diz.
"Como muçulmano ismaili, é um orgulho trabalhar para a rede. É estar mais perto dos ideais traçados por sua alteza [o Aga Khan, líder espiritual dos ismailis] das suas linhas orientadoras, da ética e de poder fazer a diferença no dia-a-dia. Também cresci e fico feliz por assistir à evolução de centenas de pessoas que hoje vivem melhor e sonham com mais.
"Rahim é um dos 35 muçulmanos ismailis de Pemba - na comunidade religiosa é o kamadia saheb, segundo ministro de culto. Cabo Delgado, província que tem Pemba como capital, é dominado pelo islão sunita, como todo o norte do país. Mas o microcrédito não olha à cor religiosa.
- Continua acima... - (extraído de PÚBLICO.pt - 06.07.2008 via Moçambique Para Todos.)

2/15/08

A África emergente onde o Brasil vai lucrar bilhões...

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Interessante artigo de Lena Pinheiro publicado na revista "Isto É - Dinheiro - Caderno Economia" (Brasil) de 08/02/08:
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A ÁFRICA ESTÁ BOMBANDO. E O BRASIL VAI LUCRAR BILHÕES.
O continente cresce acima da média dos emergentes, atrai investimentos e muitas empresas brasileiras estão atentas ao despertar desse grande mercado.
A região não costuma estar no radar de grandes bancos de investimentos nem pertence ao BRIC, bloco criado pela Goldman Sachs para indicar os países emergentes mais promissores – entre eles, o Brasil. Muitas vezes, é lembrada apenas por epidemias, guerras civis ou massacres étnicos. Só que essa é a velha África, historicamente marginalizada pelo Ocidente. Há uma outra que se desenvolve num ritmo alucinante, sendo liderada por Angola, que cresceu 25% em 2007. Na média, o PIB da África vem avançando cerca de 5% ao ano, desde 2004. As exportações, puxadas por minérios e petróleo, têm crescido 28% ao ano e vários países, com fartos superávits comerciais, estão colocando em marcha grandes programas de investimento na área de infra-estrutura. As empresas brasileiras, naturalmente, estão atentas ao despertar da África. Na semana passada, executivos da Camargo Corrêa estavam em Moçambique finalizando o contrato para a construção de uma das maiores usinas hidrelétricas da região, a Mphanda Nkuwa, um projeto orçado em US$ 3,2 bilhões. “Há um forte ciclo de desenvolvimento ocorrendo na África e o Brasil está aproveitando essa maré via investimentos diretos e exportação”, analisa o empresário Roberto Giannetti da Fonseca, diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp.
Os investimentos brasileiros na região têm contado com apoio oficial. Ao anunciar uma linha de crédito de US$ 1 bilhão para Angola, no fim do ano passado, o presidente Lula afirmou que o Brasil deve “ter uma participação mais forte” na região. Já na iniciativa privada, o trabalho é intenso. A Petrobras e as construtoras Camargo Corrêa e Norberto Odebrecht investem juntas bilhões de dólares no continente para garantir presença em suas mais importantes obras. A identificação cultural e lingüística facilita a aproximação. Na Norberto Odebrecht, onde a África já é a terceira maior fonte de receita, com peso de 13,77%, um dos projetos que mais chama a atenção é a construção do Terminal de Contêineres de Doraleh, no porto de Djibuti. A obra de US$ 300 milhões une trabalhadores de 16 nacionalidades, dentre brasileiros, africanos e indianos. “Por muito tempo, o Ocidente não soube como tratar a África”, diz Roberto Dias, diretor da construtora. “A China os colocou no colo e isso fez o Brasil finalmente acordar.”
A maior estatal nacional, a Petrobras, é uma das maiores investidoras na região, com planos de aplicar US$ 1,3 bilhão somente em Angola e na Nigéria até 2012. Angola, vale dizer, já produz mais petróleo do que o Brasil e é sócia da Opep, a organização dos países exportadores.
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PIB DE US$ 1,2 TRILHÃO JOGA LUZES SOBRE O CONTINENTE ESQUECIDO.
Se os investimentos diretos estão em alta, a balança comercial está igualmente favorável. Dados de 2006, indicam um recorde na corrente de comércio entre Brasil e África, de R$ 32,3 bilhões, uma evolução de 153% em relação ao ano anterior. A complementaridade das economias explica parte do avanço, mas o crescimento da classe média local é, de fato, o grande motor da expansão brasileira em países como a África do Sul. Conhecida como “Black Diamonds”, a classe média sul-africana cresceu 30% no ano passado e consome cerca de US$ 25 bilhões anualmente.
“Esse grupo está demandando como nunca celulares, automóveis e outros bens de consumo”, afirma o professor da Unicamp, Adalto Roberto Ribeiro. Só na região metropolitana de Campinas, o número de empresas que passaram a exportar para algum país africano saltou de 63, em 2001, para 131, em 2007. O melhor é a qualidade. “Nossa pauta de exportações para lá é basicamente de manufaturados”, diz Maria Paula Velloso, diretora da Apex, a agência de promoção às exportações, que encabeça projetos para que essa boa maré esteja também ao alcance de pequenos e médios empresários brasileiros.
Lena Pinheiro - Isto É - Dinheiro.