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Segundo Luis M. Viana do Diário de Notícias - Lisboa, RETORNADOS - Vivem-se vidas inteiras sem conhecer o desespero. Mas esse sentimento rude, amargo, foi partilhado em 1975 por centenas de milhares de portugueses em Angola sobretudo, em Moçambique, na Guiné (até em Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor), cidades inteiras de pessoas felizes, prósperas, esperançosas, com uma absurda confiança no futuro, viram-se de repente sem vida social, sem emprego, sem casa, com o dinheiro congelado nos bancos e um terrível sentimento de perigo em relação às suas vidas e às da sua família.
Segundo Luis M. Viana do Diário de Notícias - Lisboa, RETORNADOS - Vivem-se vidas inteiras sem conhecer o desespero. Mas esse sentimento rude, amargo, foi partilhado em 1975 por centenas de milhares de portugueses em Angola sobretudo, em Moçambique, na Guiné (até em Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor), cidades inteiras de pessoas felizes, prósperas, esperançosas, com uma absurda confiança no futuro, viram-se de repente sem vida social, sem emprego, sem casa, com o dinheiro congelado nos bancos e um terrível sentimento de perigo em relação às suas vidas e às da sua família.
O desespero tem espinhos, alguns aguçados, e os seus bicos empurram as pessoas para o abismo. Em 30 de Junho, em Luanda, um grupo de 2500 residentes em Angola anunciou que, não conseguindo obter passagens aéreas ou marítimas para Lisboa, tencionava fazer a viagem até Portugal por via rodoviária, atravessando oito mil quilómetros de países africanos no sentido sul-norte ao longo de 90 dias.
A caravana motorizada esteve organizada para ser constituída por 200 camiões e 500 automóveis particulares, sendo os suprimentos destinados a 15 camiões-frigoríficos com capacidade para transportar 30 toneladas de alimentos cada um.
Alguns veículos foram transformados em oficinas móveis para fazer face à inclemência do trajecto e um dos organizadores, Guilherme dos Santos, fez contactos formais com a Cruz Vermelha Internacional e com a Comissão das Nações Unidas para os Refugiados para, na medida do possível, ajudarem essa travessia das selvas, savanas e desertos do continente africano.
Acabaram por não avançar para esse louco caminho para a morte.
Mais a sul, porém, houve traineiras a largar de Porto Alexandre, cheias de gente, em direcção a Portugal, onde chegaram, com muita sorte, sem males de maior.
Outros barcos de pesca artesanais cruzaram o Atlântico para despejarem no Brasil "retornados" que, afinal, não retornaram a Portugal.
E quase todos os que puderam escaparam por terra em direcção à África do Sul, e a outros países limítrofes, em alguns casos viajando com máquinas de obras públicas que iam aplainando os acidentes do caminho.
"O que dominou o primeiro tempo da chegada foi uma grande confusão na cabeça das pessoas", recorda Rui Pena Pires, sociólogo das migrações e, também ele, retornado de África.
"Mais do que a revolta, as pessoas tentavam perceber como é que se poderiam instalar em Portugal. A fase da revolta veio depois".
Na quantidade tremenda de gente que desaguou em Portugal aconteceu de tudo.
Uma pequena minoria tinha acautelado o seu património e preparado o seu regresso a Portugal. Outra minoria - precisamente aquela que mais tinha a perder com a independência das colónias uma vez que perdera os laços com a metrópole - nunca acreditou no pior desfecho, não preparou coisa nenhuma e veio sem nada, absolutamente nada para além da roupa que trouxe no corpo.
A larga maioria, essa, conseguiu trazer alguma coisa, pouca, mas suficiente para o espectáculo dos caixotes que inundou o cais e o aeroporto de Lisboa.
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Jovens, portugueses.
Com a descolonização, em 1975, abre-se em Portugal o ciclo da imigração, não só com o repatriamento de meio milhão de portugueses radicados nas colónias, mas também com o início de uma migração africana que, ao contrário do repatriamento, teve continuidade até aos dias de hoje.
Do número de retornados recenseados pelo INE em 1981 61% são oriundos de Angola, 34% de Moçambique e apenas 5% das restantes colónias.
Quase dois terços desses retornados nasceram em Portugal (63%), embora esta proporção se inverta nas camadas mais jovens - 75% dos menores de 20 anos eram naturais das colónias.
É muito curiosa a distribuição da origem dos retornados nascidos em Portugal 32% eram naturais do Norte, 36% do Centro e 20% da região de Lisboa.
Os distritos de Lisboa e Porto são os que maior número de pessoas enviou para África (12% e 11%, respectivamente), seguidos por quatro distritos do Nordeste: Viseu, Bragança, Guarda e Vila Real - é aliás com esta migração para África que se inicia o grave problema demográfico que hoje afecta o interior norte do País.
A estrutura por idade e sexo da população repatriada era, em 1981, significativamente diferente da do conjunto da população portuguesa.
Há um predomínio ligeiro da população masculina, 53% são homens, em praticamente todas as classes de idades e um forte peso da população jovem 64% dos retornados tinham menos de 40 anos.
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Os "tinhas".
Quando começou a fazer trabalho de campo com retornados, Rui Pena Pires frequentou algumas reuniões de retornados no princípio dos anos 90. E encontrou os grupos dos ressentidos, dos ainda inconformados com a desgraça de há 15 anos, muito limitado e circunscrito. Eram "os tinhas" (como lhes chamavam todos os outros com irónica condescendência), os que estavam sempre a dizer "eu tinha", "eu tinha"..."
A partir de 1975 as pessoas não tiveram mais tempo para pensar e foram obrigadas a começar a trabalhar de uma forma um pouco mais dura do que o normal para recomeçar tudo de novo", recorda o sociólogo das migrações.
"Foi a melhor coisa que podia ter acontecido se tivessem entrado numa lógica de reclamar e esperar por indemnizações ainda hoje, 30 anos volvidos, haveria situações complicadas de integração".
Sucedeu o contrário, porém.
Os retornados revelaram-se como um grupo com competências muito acima da média da sociedade portuguesa e rapidamente se disseminaram pela sociedade, em vez de se constituírem como uma sociedade colectividade delimitada.
É muito interessante ouvir hoje os retornados falarem das relações entre si "É como companheiros de escola que se encontram passados uns anos e falam sobre a vida do liceu. Quando as pessoas se encontram e acabam por descobrir que são retornados, há logo ali uma relação de afectividade, há um elo comum, resultante de uma desgraça que compartilharam. Depois começam a contar como cada um evoluiu, o que significa que o que é importante já não é o ponto de partida, mas o de chegada, o que interessa é onde se está, onde se chegou".
In - Diário de Notícias.
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Falta acrescentar que até hoje, o desgaste emocional, o sofrimento, os prejuízos morais e materias, a saúde abalada, as mortes, todo o tipo de crimes e a situação dramática vivenciados por milhares de famílias portuguesas e africanas "pulverizadas" atualmente por Portugal e por esse mundo afora e que atravessaram essa fase triste da descolonização portuguesa em África, não foram devidamente justiçados nem compensados. Pelo contrário: Os tais "heróis de barro" responsáveis por essa vergonha, continuam impunes, arrogantes, gabarolas e sorridentes. Descolonizar era necessário. Mas não dessa forma insana, indigna, caloteira !
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A não perder:
Reportagem - RETORNADOS - RDP ÁFRICA - 19/02/2008 - Escute aqui !
In "Moçambique Para Todos" - (Para evitar sobreposição de sons, não esqueça de "desligar" a "ForEver PEMBA FM" no lado direito do menu deste blogue.)
Realmente a "descolonização exemplar" será sempre uma das maiores verginhas da nossa história recente.
ResponderEliminarFelizmente, o meu pai teve o bom senso de sair de Angola em 1973 antes da catátrofe final.
Bom fim de semana!