7/21/09

Buscando no tempo lá pelo Douro: Memórias dos bombeiros em Poiares com os Salesianos

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Em atenção aos "vareiros" que nos lêm e visitam por esse mundo virtual afora, alguns post's irei trazendo de um outro blogue ("Escritos do Douro") onde se fala do Douro em Portugal, da cidade de Peso da Régua, de sua história e cultura, de personagens que marcam e dão exemplo e de outras coisas mais que não só da "vinha e do vinho do Porto", de Pemba e Moçambique...:

O que mais conta na memória do presente retrato, com este grupo de garbosos bombeiros da Régua, impecavelmente fardados a rigor, constituído pelo Chefe Joaquim Laranja, José Melo, Joaquim Espírito Santo - o grande Trovão - e o António Monteiro, é o seu acto de generosidade em benefício da Congregação dos Salesianos: um peditório, realizado em Poiares, em 10 de Novembro de 1963, destinado a angariar fundos para a construção de um moderno Seminário.

Assim, relembra-nos ainda o ambiente do princípio dos trabalhos, com as máquinas por perto, o olhar das crianças no desfile, numa jornada de caridade e solidariedade organizada para ajudar na obra da grande família salesiana, que tem como seu patrono o São João Bosco.

Os bombeiros da Régua, entendo o seu dever cívico, fizeram-se representar na sua força, enviando os seus melhores homens do Corpo Activo e as suas viaturas mais antigas, como o carro de fogo Buick, onde foram afixados dois cartazes com estes simples apelos: “Pedimos, Construímos e Repartimos” e “ O Vosso Pouco Representa Muito”.

Os generosos bombeiros que aqui recordamos, com nostalgia, contribuíram de forma exemplar nessa recolha de donativos necessários para se começasse a edificar o novo Seminário. Este destinava-se a substituir o velho e antiquado, sem condições que, desde 1924, funcionava na casa paterna do Arcebispo Primaz de Braga, o reguense D. Manuel Vieira de Matos, que generosamente tinha doado à instituição.

A construção do novo Seminário de Poiares iniciou-se em 21 de Outubro de 1962. Nesse dia, foi solenemente benzida e lançada a primeira pedra. Dizem os escritos desse tempo que foi um dia festa para a população da freguesia. Estiveram presentes o Vigário Geral da Diocese, Monsenhor Libânio Borges, em representação do Bispo da Diocese de Vila Real que se encontrava no Concílio Vaticano II, o Dr. Manuel dos Santos Carvalho, governador civil do distrito, o Dr. Rui Machado, Presidente da Câmara da Régua e o Padre Armando da Costa Monteiro, Provincial dos Salesianos. Havia na assistência muito povo da freguesia e das freguesias vizinhas que não deixou de participar e apoiar a iniciativa. A banda de música do Colégio de Izeda animou as ruas de alegria, enquanto se ouviram muitos foguetes, para assinalar a importância da data.

Em 1975, depois de um longo interregno nas obras, os salesianos haviam abrir as portas aos alunos do novo Seminário, designado do Sagrado Coração de Jesus, que em 1982 se passaria a chamar de Colégio Salesiano de Poiares. Mas tarde, o antigo seminário foi restaurado e transformado numa obra social, sob a gerência dos salesianos, dedicada à memória do arcebispo e em benefício do povo da freguesia: Centro Social D. Manuel Vieira de Matos.

Os bombeiros da Régua sempre colaboraram nas causas sociais organizadas por outras instituições de solidariedade social, desportivas, culturais e educativas da sua cidade.

Em certos momentos da sua história, foram até os primeiros a ajudar os pobres e os mais desfavorecidos da sociedade reguense. Com frequência, era habitual organizarem à sua conta espectáculos musicais e recreativos, nas suas instalações, com o objectivo de reunirem alimentos e roupas para entregarem aos mais desvalidos, ao que sabemos foram sempre muitos, como aconteceu no “Sarau Infantil”, realizado na noite de 22 de Abril de 1950, em “benefício dos pobres”.

No mundo em que vivemos, cada vez mais desumanizado, o papel dos bombeiros volta a ganhar mais sentido ético e uma maior dimensão social na nova ordem.

Se neste nosso mundo se encontrassem mais Reinos Maravilhosos - que sempre houve e haverá como nos revela o poeta Miguel Torga - a vida poderia ser mais generosa para com quem precisa de ajuda para apenas viver condignamente.

Acreditem que, só mesmo nesse lugar é que existem os verdadeiros homens e as mulheres de bem, de uma generosidade e doação que é levada ao sacrifício da sua própria vida, disponíveis para acudir e ansiosos por socorrer apenas sob o lema humanitário: Vida por Vida.

Para melhor se entender os gestos desses seres especiais, recordamos um belo texto escrito em 2006 pelo Dr. Manuel Prazeres, antigo Presidente da Federação dos Bombeiros do Distrito de Vila Real e da Associação Humanitária Cruz Verde, que sublimemente exprime as ideias seguintes:

“Contrariamente ao Reino Maravilhoso que Torga, de forma tão sublimada nos descreve, o Reino Maravilhoso que eu pretendo exaltar não fica no alto de Portugal, nem, como os ninhos nem no mais alto das árvores. Este, de que vos falo, dissemina-se por todo este nosso país, do lugar mais recôndito à urbe mais moderna, e encontra-se por aí, mesmo à mão de semear, por forma a tornar-se sempre mais acessível e a que a lonjura não o torne absolutamente nada impossível a quem dele, a cada passo, necessita.

O reino Maravilhoso de que vos falo é feito de homens e mulheres de bem, de uma generosidade e doação por vezes levada ao sacrifício da própria vida, que, nas suas horas vagas, vestem a sua farda de trabalho e se apresentam na sua outra casa: prontos para aprender, disponíveis para acudir, ansiosos por socorrer.

A sua família maior é o seu semelhante e a sua obstinação é a vida e os bens de todo um Povo que, há séculos, nele confia a sua salvaguarda.

Este mar de pedra que primeiro vislumbramos – a sociedade egoísta em que vivemos – faz parte do seu mundo, mas não é, definitivamente, o seu mundo. O seu mundo é, tão simplesmente, um coração aberto, humano, generoso, solidário.

E de nada vale interrogar esse grande oceano megalítico, porque o nome invisível ordena: Vai. Salva. Socorre, Ajuda.

Tal como no Reino Maravilhoso de Torga se ordena, entre, sem qualquer preocupação de saber quem é, também neste reino de que vos falo alguém o pergunta. Não interessa…é o que menos interessa…

Ouve-se apenas o som estridente da sirene. Sente-se um calafrio. Que chamamento, oculto e silencioso, desperta aquele impulso pronto e contido?

É, como se uma qualquer força misteriosa e divina, naquele momento, injectasse nas entranhas daqueles corpos força desmedidas que humanamente jamais poderiam conter. Fiéis à sua própria vontade, e em obediência estrita ao juramento feito, honrado sempre a divisa que a bandeira deste Reino Maravilhoso obstinadamente ostenta: Vida por Vida.

Embora haja muita gente que diga que não, sempre houve e haverá Reinos Maravilhosos neste Mundo. O que é preciso, para os ver e merecer, é que os olhos não percam a virgindade original diante da realidade e, depois, o coração e razão não hesitem."

Entrem agora, sem pressas algumas, no reino maravilhoso de Poiares. Caminhem devagar pela aldeia vinhateira que fica no cimo de uma esplendorosa montanha duriense, envolvida numa harmoniosa paisagem de socalcos de vinhas, a descerem pelas suas íngremes encostas até à foz do rio Corgo ou até as margens do rio Douro, mas sem antes passarem à porta do novo Colégio dos Salesianos, visitarem a singela Capela da Senhora da Graça, contemplarem as velhas ruínas de um casarão que já foi o Convento da Ordem dos Templários, junto à Igreja Matriz, mandado construir antes de 1225, onde se pode olhar à entrada da Casa da Comenda uma cruz em granito, com 900 anos de história.

Nada melhor do que fazerem uma paragem obrigatória…em Poiares.

Deixem-se envolver na magia dos seus amanheceres e na poesia dos encantos que se avistam desse lugar: “O Douro...bem lá em cima, ele encosta-se com força à base das montanhas, para as segurar. Depois esfrangalha-se nos bicos das rochas franzinas para cair num novo sono e deixar-se envolver nos lençóis da sua antiga pousada”.

Vão ver que não se arrependem…!
- Peso da Régua, Julho de 2009, José Alfredo Almeida.

- Outros textos publicados neste blogue sobre os Bombeiros Voluntários de Peso da Régua e sua História:

  • As vidas que não se esquecem nos Bombeiros - Aqui!
  • Os bombeiros de escritório - Aqui!
  • Bombeiros Semi-Deuses - Aqui!
  • As "madrinhas" dos Bombeiros - Aqui!
  • A benção da Bandeira - Aqui!
  • Comandante Lourenço de Almeida Pinto Medeiros: Fidalgo e Cavaleiro dos Bombeiros da Régua - Aqui!
  • A força do voluntariado nos Bombeiros - Aqui!
  • A visita do Presidente da Républica Américo Tomás - Aqui!
  • Uma formatura dos Bombeiros de 1965 - Aqui!
  • O grande incêndio dos Paços do Concelho da Régua - Aqui!
  • 1º. de Maio de 1911 - Aqui!
  • Homens que caminham para a História dos bombeiros - Aqui!
  • Desfile dos veículos dos bombeiros portugueses - Aqui!
  • Os bombeiros no velho Cais Fluvial - Aqui!
  • O Padre Manuel Lacerda, Capelão dos Bombeiros do Peso da Régua - Aqui!
  • A Ordem Militar de Cristo - Uma grande condecoração para os Bombeiros de Peso da Régua - Aqui!
  • Os Bombeiros no Largo da Estação - Aqui!
  • A Tragédia de Riobom - Aqui!
  • Manuel Maria de Magalhães: O Primeiro Comandante... - Aqui!
  • A Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • A cheia do rio Douro de 1962 - Aqui!
  • O Baptismo do Marçal - Aqui!
  • Um discurso do Dr. Camilo de Araújo Correia - Aqui!
  • Um momento alto da vida do comandante Carlos dos Santos (1959-1990) - Aqui!
  • Os Bombeiros do Peso da Régua e... o seu menino - Aqui!
  • Os Bombeiros da Régua em Coimbra, 1940-50 - Aqui!
  • Os Bombeiros da Velha Guarda do Peso da Régua - Aqui

Link's:

  • Portal dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua (no Sapo) - Aqui!
  • Novo portal dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • Exposição virtual dos Bombeiros Voluntários de Peso da Régua - Aqui!
  • A Peso da Régua de nossas raízes - Aqui!

7/20/09

Ecos da imprensa moçambicana: Administração da Justiça em Moçambique - Manchada de ineficiência e corrupção!

Canal de Moçambique - Ano 4 - N.º 865, Maputo, Segunda-feira, 20 de Julho de 2009: Administração da Justiça em Moçambique manchada de ineficiência e corrupção – aponta o Relatório do MARP sobre a avaliação do desempenho de Moçambique. E acrescenta que a questão da separação de poderes continua precária.

“O sistema legislativo judicial é ineficaz, fraco e desprovido de recursos”. “Infelizmente, a administração da justiça moçambicana é manchada pela ineficiência e pela corrupção, assim como pelo tratamento preferencial dos ricos em detrimento dos pobres” – Relatório do Mecanismo Africano de Revisão de Pares (MARP).

Maputo (Canal de Moçambique) – O acesso aos tribunais, o direito à defesa e à assistência jurídica são garantidos constitucionalmente. Contudo, “infelizmente, a administração da justiça moçambicana é manchada pela ineficiência e pela corrupção, assim como pelo tratamento preferencial dos ricos em detrimento dos pobres” – aponta o Relatório do Mecanismo Africano de Revisão de Pares, (MARP), na sua avaliação do país. Precisa igualmente que a questão de separação de poderes e autonomia dos poderes executivo, legislativo e judicial “está a enfrentar dificuldades em Moçambique”. “Isto resulta da estrutura constitucional que estabelece um sistema em que o Presidente é forte e poderoso, apoiado pelo executivo e, do outro lado, se encontra um sistema legislativo judicial ineficaz, fraco e desprovido de recursos”. Em conformidade com a prática em vigor nos países falantes da língua portuguesa, ainda de acordo com o relatório, o presidente tem poder de nomear o presidente do Tribunal Supremo e os presidentes do Conselho Constitucional e do Tribunal Administrativo, “cujo poder a Assembleia da República não está em condições de contestar”.

Os mecanismos com vista a garantir a responsabilização, a transparência e o controlo horizontal são limitados. Entre outras constatações ou entraves apontados pelo relatório do MARP, está o facto de na história política moçambicana “não haver registo de qualquer conflito institucional relevante entre os dois órgãos soberanos, o que dificulta a avaliação das alegações e das percepções de tentativa do poder executivo e legislativo de influenciar o judicial”.

Um outro impedimento que se coloca à boa governação e ao estado de direito – aponta o MAR – é o equilíbrio de forças instável que existe entre a Frelimo e Renamo. “O país e as suas estruturas políticas estão claramente divididos entre os baluartes de cada um dos partidos e a intolerância política é frequente”. Nesse contexto, constatou-se ainda que tanto na capital do país como nas províncias, as opiniões políticas não são expressas livremente. “Foi manifestado que a opinião de que a Assembleia da República não se sente manietada pela brecha existente entre os dois principais partidos, facto que contribui para a sua incapacidade de oferecer mecanismos credíveis de fiscalização e controlo a um executivo forte”.

Outras constatações negativas descritas no relatório em alusão, têm a ver com o facto de AR realizar as suas sessões em regime de tempo parcial e ter um número limitado de dias para a executar as suas funções de fiscalização. “O trabalho legislativo da Assembleia da República é feito dentro de um período de três meses (duas sessões no máximo de 45 dias cada), um máximo de 35 dias para o trabalho do eleitorado e 15 a 25 dias para as funções de fiscalização durante as quais os deputados são pagos”, escreve o relatório acrescentando que “durante o resto do ano (sete meses), os deputados têm de se desenvencilhar.

Os deputados da Frelimo na Assembleia da República têm melhores possibilidades pois são nomeados para conselhos de administração e comissões onde obtêm um rendimento adicional, mas tal não acontece com os deputados da oposição”.

Concluindo a esse respeito, aponta-se que os 15 a 25 dias por anos destinados ao trabalho de fiscalização “são terrivelmente inadequados. A explicação dada para o curto período de tempo atribuído às funções de fiscalização prende-se com constrangimentos de ordem financeira”.

Governo ignora Assembleia da República - Entretanto, tendo em conta as reclamações que inúmeras vezes têm sido avançadas pelos deputados da Frelimo e da Renamo, escreve documento, conclui-se que “o Governo não está a dar a devida atenção à Assembleia da República no contexto do orçamento do Estado”. E mais, refere-se que para um país como Moçambique, com enormes problemas de corrupção e de mecanismos inadequados de responsabilização, “não é desejável que a Assembleia da República tenha limitações na realização das suas funções de fiscalização devido à exiguidade de recursos financeiros”.

Um outro constrangimento que se coloca à eficácia da AR, “é o facto de ser nova como instituição democrática”.

Recomendações - Face às constataçõe anteriormente descritas, recomenda-se que Moçambique despolitize a nomeação de juízes de modo a proteger a integridade do poder judicial.

Deve ainda realizar “acções de formação do judicial e matéria de ética, responsabilização e transparência e garanta também que a Assembleia da República tenha o seu próprio orçamento, o qual deve ser aumentado com vista a um maior envolvimento”.

No relatório recomenda-se que se garanta ainda que o trabalho dos deputados da AR seja em tempo inteiro e que “se aumente o número de dias destinados à fiscalização”.

Recomenda-se também que se proceda de forma a “melhorar as capacidades da Assembleia da República através da formação dos deputados em matéria de análise das políticas e nas funções de fiscalização”.
- Escreveu Emildo Sambo.