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2/13/09

O NAVIO ENSOMBRADO - Um conto de Allman Ndyoko (Francisco Absalão)

(Clique na imagem para ampliar - Imagem ilustrativa original do ForEver PEMBA baseada na mixagem de diversas fotos)

Não havia em toda baia de Pemba a praia mais preferida pela minha malta, para a actividade lúdica, do que a Praia da Marinha. Ela ficava por trás do Quartel da Base Naval da Marinha e era muito calma e menos frequentado por banhistas por ter características impróprias ou menos atractivas para um merecido mergulho. Tinha águas quentes e cristalinas e um chão rochoso coberto por um tapete verde de algas e outras ervas marinhas. Aqui e acolá, quando a maré fosse baixa, via-se pequenas poças de água, onde peixes minúsculos e carangueijos vermelhos aguardavam a maré cheia. Já na orla marítima, o cenário era desolador: Búzios, areia grossa, montes de algas secas, ramais, folhas de árvores e frutos silvestres trazidos pela força das águas, da outra margem da cidade, no silêncio da noite, faziam parte do cenário oferecido naquele ponto da baia.

Para além disso, era frequente avistar grupos de mulheres pintados de mussiro e com lenços na cabeça pescando cardumes minúsculos com recurso às redes finas e outras apanhando ameijoas, ostras, carangueijos e caracóis marinhos que guardavam em bacias metálicas e floreadas cobertas de peneiras. Era igualmente frequente cruzar-se com pescadores simpáticos e humildes subindo e descendo às encostas da praia descalços, de tronco nú, trajando calções rotos pela acção contínua das águas do mar, chapéus de palha e empunhando remos, fios e redes de pesca, boías e, por vezes, o pescado.

De longe, ouvia-se o marulhar das ondas, via-se barcos à motor sulcando o mar e casquinhas à vela balançando e cortando impetuosamente as águas com os remos dos pescadores servindo de leme.

Já na parte superior da orla, desenhava-se um cenário diferente e belo, um tanto quanto, esverdeado e acinzentado composto por ervas, arbustos e plantas indêmicas que davam flores fechados e inchados, cor de rosa, que precionados estoiravam produzindo um barulho ligeiro muito apreciado pelos adolescentes da baia. Uma estrada asfaltada serpenteava a orla maritima ligando Paquitequete (rocha mãe da cidade de Pemba), Ingonane, Natite, Cariacó e Wimbe. Frontalmente ao mar, a natureza oferecia uma vista espectacular em que podia-se sentir o cheiro intenso do mar e vislumbrar, na outra margem da baia, as florestas de Ulonto, Bandari e um pouco de Metuge, para além de uma cadeia de pequenos montes no horizonte longínquo que desenhava-se horizontalmente desde à entrada da baia passando por Miéze e chegando a findar no cais local.

Como dizia, a preferência pela Praia da Marinha por parte da minha "legião" não se devia simplesmente à existência de inúmeras poças de agúa por onde podia-se soltar casquinhas de brinquedo artesanal e nem ao cenário oferecido do alto da estrada, mas sim à existência na margem daquela praia de uma flotilha da marinha de guerra avariada, desactivada e com o casco quase a cair de podre.

Este navio servia de sobremesa das nossas brincadeiras e era nele que aconteciam as nossas derradeiras brincadeiras, subindo ao convés, correndo por entre os corredores dos camarotes, acenando na claraboia, descendo à casa das máquinas, correndo com a mão passando na borda do navio e saltando do barlavento para o chão de areia grossa e branca como a neve, onde depois voltavamos a entrar para a casa das máquinas através de um pequeno orifício feito pelas águas do mar no casco da flotilha bem junto à hélice bronzeada que há muito resistia às investidas nocturnas do mar.

Uma certa tarde de Dezembro, após às nossas brincadeiras no mar, uma camada espessa de nuvens escuras cobriu inesperadamente o sol quando lentamente caia no horizonte colorindo o ambiente de um tom alaranjado. O céu ficou sinistro e rugiu vezes sem conta, como se do alto lançassem inúmeros tambores vazios que rolando rapidamente precipitavam-se para o outro lado da baia num percurso quase infindável.

- Vamos ao navio! – Disse Amur visivelmente dominado pelo medo do fenómeno que ocorria.
- Não. – Atalhou Saide e continuou. – Melhor é corrermos para casa...

Mal disse estas palavras, ouviu-se um forte ribombar do trovão acompanhado de um relâmpago assustador que corriscou os céus emitindo faíscas vivas que acabaram se lançando rapidamente na imensidão do azul do mar. Molhados pelas águas do mar da ponta dos pés aos cabelos, saímos correndo atrapalhados ao encontro de um abrigo no navio amigo. Entramos pela abertura junto à hélice, alcançamos a casa das máquinas e no meio da penumbra subimos ao convés passando por dois camarotes trancados. Já no convés, a chuva despenhou-se em catadupa sobre a baia criando má visibilidade no mar e na terra firme.

- Estamos tramados! – Disse alguém entre nós.
- Não se preocupem! – Disse-lhes em jeito de encorajamento. – Isto é simplesmente uma nuvem passageira.
- Espero que realmente as tuas palavras sejam reais. – Desabafou Saide encolhido nos seus vestes molhados.

A chuva caiu todo fim da tarde acompanhado de relâmpagos e rugidos de trovão. Longe da chuva abrandar-se, a noite fez-se presente com as trevas envolvendo lentamente o ambiente. O silêncio no navio tornou-se incómodo e a escuridão pesadíssima. De quando em vez, ouvia-se o ranger das portas dos camarotes e o bater constante e suave de uma chapa na zona entre a popa e a proa.

De súbito, ouviu-se um forte sapatear no corredor dos camarotes acompanhado de vozes imperceptíveis que se confundiam com humanas e animais de tipo gato selvagem. Ficamos atentos com os ouvidos apurados e muito medrosos sem saber o que fazer. De repente, o sapatear infinito e as vozes imperceptíveis cessaram e lá fora a chuva abrandou e a trovoada começou a ouvir-se longe.

- Vamos embora, gente. – Sugeriu Nuro sussurando. – Isto não é normal.
- Mas donde sairemos? – Quis saber Saide medrica.
- Há uma pequena escada no princípio do corredor que leva aos camarotes que sobe até ao mastro. – Respondi-lhe sussurando e mais ou menos tranquilo.
- Então o que esperamos? – Amur briu as mãos reforçando as palavras e prosseguiu. – Vamos devagar e sem barulho.

Iniciamos a marcha pé-ante-pé e instantes depois ouviu-se o som de arrasto de correntes metálicas no corredor acompanhado de uivos e gritos humanos de desespero. Paramos e dirigimo-nos à claraboia. Os sons metálicos, os uivos e os gritos prosseguiram já com muita intensidade seguido de um outro som de abrir e fechar a porta com impetuosidade. Ficamos com os corpos e cabelos arrepiados e no meio do escuro vimos vultos altos vestidos de branco movendo-se vagarosamente em nossa direcção. Num impulso imperceptível, Nuro forçou uma das vidraças da claraboia e caiu quebrada no chão do lado frontal do navio. Pendurou-se na abertura e com pouco esforço, devido ao seu tamanho, lançou-se à borda lateral esquerdo do navio, onde caiu e sentou-se contorcendo-se de dor. Rapidamente, todos emitamos desesperadamente a proeza do Nuro e já fora do convés saltamos em conjunto para o chão profundo e arenoso, onde em seguida saimos correndo em debandada subindo a encosta da praia e mergulhando no escuro através de um pequeno e cansativo atalho tortuoso que conduzia à estrada que serpenteava o litoral. Assim que alcançamos o asfalto todos ofegantes, imediatamente, atravessamos a estrada e sem olhar para atrás, corremos desesperados debaixo da chuva que não parava de pancadear-nos com os seus pingos doces que, atingindo-nos à cabeça, escorriam involuntariamente até a boca, onde eram imperceptivelmente sorvidos com gosto no meio daquela corrida involuntária. Entretanto, atravessamos o Quartel da Marinha correndo em diagonal e, com a velocidade quase de uma estrela candente, deixamos para atrás espaços baldios e arborizados e, sem dar em conta, derrubamos arbustos e capim alto. Contudo, transcorrido algum momento desembocamos, sãos e salvos, na estrada que separa os bairros de Ingonane e Paquitequete, onde paramos no meio da luz de um poste de iluminação pública e deitamos em conjunto os olhares para atrás todos exaustos e com a respiração arquejante.
- Allman Ndyoko, 05/02/2009.
- Extrato do livro: Contos de Infância Distante.

O Autor:

  • -Francisco Absalão;
  • -Nome artístico -Allman Ndyoko;
  • -Nasceu em 11 de Abril de 1977 na cidade de Pemba, província de Cabo Delgado em Moçambique;
  • -Residência actual - Maputo;
  • Breve biografia - Nasceu em Pemba no não muito longinquo ano de 1977. De pais originários do sul de Moçambique, residiu em Pemba de 1977 a 1990 quando foi residir para Maputo onde trabalha e tenta prosseguir os estudos (ciências sociais).

Leia também:

  • "O Incêndio" - Um conto de Allman Ndyoko (Francisco Absalão) publicado no ForEver PEMBA em 23 de Janeiro de 2009 - Aqui!
  • "O Suicídio" - Um conto de de Allman Ndyoko (Francisco Absalão) publicado no ForEver PEMBA em 02 de Junho de 2008 - Aqui!
  • "A Origem - Ou como surgiu o povo Makonde", texto de Francisco Absalão publicado no ForEver PEMBA em 29 de Março de 2008 - Aqui !
  • "O Turbilhão Lendário", texto de Francisco Absalão publicado no ForEver PEMBA em 24 de Outubro de 2007 - Aqui !
  • "O Nó Sagrado", um conto de Allman Ndyoko (Francisco Absalão) - publicado no ForEver PEMBA em 19 de Março de 2008 - Aqui !

12/10/08

Retalhos da História de Cabo Delgado: Breves notas sobre a população do Distrito de Cabo Delgado em 1858.

Por Carlos Lopes Bento (1)

No ano em que Pemba, (antiga Porto Amélia) está a comemorar os seus 50 anos de elevação a cidade, entendi, como forma de lhe prestar homenagem, bem como a todos aqueles que, de algum modo, contribuíram, através dos anos, para o seu engrandecimento, trazer a público alguns dados sobre a população, que há 150 anos povoava o distrito de Cabo Delgado e como se distribuía geograficamente.

Segundo a informação fornecida pelo então Governador interino João da Cunha Carvalho, relativa ao ano de 1858, o distrito estava dividido em sete Capitanias, a saber:
Estas sete capitanias, duas insulares- Ibo e Querimba- e cinco situadas, junto à costa marítima, em terras firmes ou continentais, de que faziam parte 34 núcleos populacionais, eram habitadas por 23 361 pessoas, distribuídas por 9.776 fogos, das quais 11.996 eram do sexo masculino e 11 365 do sexo feminino. Este total de população incluía: “indígenas, livres e libertos, europeus, asiáticos e escravos”. Com excepção da do Ibo, nas restantes Capitania existia como autoridades locais: 1 capitão-mor, 1 sargento-mor e 1 cabo das terras, que era o chefe de polícia.

As capitanias mais povoadas eram a de Quissanga, com 8.749 habitantes e a do Ibo, com 5.448.

Situavam-se próximas uma da outra, sendo a primeira a principal porta entrada e de saída do comércio da Vila do Ibo.

Estas duas povoações tinham mais do dobro da população total do distrito, seguindo-se a de Mocimboa situada mais a norte.

A capitania mais a sul e mais próxima da baía de Pemba era a de Arimba, situada a sul da de Querimba.

Geograficamente, de sul para norte, existiam as capitanias de: Arimba, Querimba, Ibo, Quissanga, Olumbua, Pangane e Mocimboa. Daqui se deduz que, então, o Distrito de Cabo Delgado tinha como limites: a norte, Mocimboa e a sul, Arimba. Para além deles, encontravam-se as “Terras sujeitas ao governo de Régulos”:

- A norte, tínhamos, defronte da ponta denominada Cabo Delgado, a povoação de Tungue, um pouco a norte da baía do mesmo nome, que era habitada por Suaílis e Mujojos, dependentes politicamente do Sultão de Tungue, Amade Sultane.

- A sul, situava-se a baia de Pemba em redor da qual dominavam os régulos Said-Aly, Mugabo, Motica e Mazeze, entre outros, estendendo-se a jurisdição deste até ao rio Lúrio, limite sul do território do distrito de Cabo Delgado.

Quanto à origem étnica e religião da população, as informações fornecidas em 1858, apenas, se referem às ilhas do Ibo e de Querimba: Na primeira estavam incluídos: 11 europeus, 3 filhos de Goa, 23 gentios entre batiás e baneanes e na segunda, 3 europeus.

Anos antes, em 1855, o governador Jerómino Romero, - responsável pela instalação da Colónia Agrícola de Pemba, verificada a partir de 1857, na sua obra “Memória Acerca do Distrito de Cabo Delgado” - fornece-nos alguma informação sobre a população, livre e escrava, do seu Distrito, que incluía cristãos, mouros, baneanes e batiás.

Numa simples análise dos dados fornecidos em 1855 e 1858 verifica-se uma grande diferença nas frequências relativas à totalidade da população do Distrito, que, num diminuto espaço de tempo, passou de 6.607 para 23.361 habitantes. Ela deverá estar relacionada com a aplicação da Portaria nº 315, de 15.10.1855, que estabeleceu o Registo Civil em Moçambique, determinando “a inscrição de todos os habitantes da cada circunscrição administrativa e se note com toda a regularidade o movimento da população de todos os pontos de vista”. No seu artº 1º determinava-se que:

“Todo o chefe de família formulará, segundo um modelo que deverá ir receber da autoridade, uma relação nominal de todas as pessoas, de qualquer condição que sejam, das quais se compuser a sua família, no dia 31 de Dezembro do corrente ano, designando a sua respectiva idade, religião, estado, ocupação, &, como irá mencionado no mesmo modelo, a qual relação entregará à competente autoridade no dia 1º de Janeiro de 1856, ou nos dias imediatos segundo a distância a que estiver a sua morada”.

Aqui deixo estas breves notas para que as gerações mais novas, de Moçambique e de Portugal, conheçam mais alguns dos traços da sua História comum.
(1)- Prof. univ. e antropólogo.

  • Post's deste blogue sobre "Retalhos da História de Cabo Delgado" onde se incluem trabalhos do Prof. Carlos Lopes Bento, entre outros - Aqui!

10/31/08

Retalhos da História de CABO DELGADO - Zanzibar e a escravatura nas Quirimbas - Parte 2

(Continuação daqui.)

Oficialmente, Portugal já proibira em 1761 a importação de escravos no reino e nas Ilhas e, na época em que o tráfico se acentuou na costa oriental africana, o poder português no oceano ìndico declinava, pelo que não havia condições nem meios para controlar essa atividade, já proíbida pela legislação portuguesa de 1836.

No segundo quartel do século XIX, depois de ultrapassada a prolongada crise por que passara o país com as invasões francesas e a guerra civil, o governo português passou a enviar navios militares para Moçambique com a missão específica de reprimir o tráfico da escravatura e, frequentemente, as autoridades moçambicanas armaram navios apresados que utilizaram no combate ao tráfico.

O combate ao tráfico da escravatura intensificou-se então, com particular incidência nas zonas de Angoche e ilha de Moçambique, mas também na área do arquipélago das Quirimbas, como se verifica por alguns registos mais acessíveis.

A corveta Relâmpago, por exemplo, que antes era a barca brasileira Maria da Glória que fora apresada em 1840 por ser negreira, apreendeu no ano seguinte em Lourenço Marques o brigue D. Manuel de Portugal e o patcho Paquete da Madeira, por serem negreiros.(54)

Também o brigue Caçador Africano, que provávelmente era um negreiro apresado nesse ano de 1841, permaneceu na costa moçambicana entre 1841 e 1844 com a missão de perseguir o tráfico de escravos.(55)

O brigue D. João de Castro(56) chegou a Moçambique em Setembro de 1841 e permaneceu regularmente na costa moçambicana até 1855, empenhado na repressão do tráfico da escravatura e em outras missões, tendo apresado em 1842 na área de Quelimane a barca brasileira Inês, por ser negreira.

Em 26 de Julho de 1845 fundeou "entre as ilhas Quirimbas e terra firme", perto de um brigue suspeito de se empregar no tráfico de escravos. "Um oficial enviado a bordo verificou que o navio, além de estar abandonado, dispunha o necessário para o transporte de escravos, a saber: caldeira, grande número de par de machos, mais de 200 pipas de água e muito mantimento".(57)

O comandante mandou que um oficial de 14 praças dele tomasse posse. Não existiam a bordo nem papéis, nem bandeiras e, no porão, foi encontrado um letreiro dourado com o nome de Montevideo, pelo que se presumiu que o navio era brasileiro. Na madrugada seguinte, o comandante mandou dois escaleres apreender as embarcações do negreiro que se achavam em terra. Os negreiros defenderam-se a tiro, pelo que o oficial regressou a bordo sem trazer a lancha do brigue, porque se achava muito arruinada.

Em Março de 1847 o brigue D. João de Castro apresou o brigue americano Commerce of Providence por andar no tráfico negreiro entre Quelimane e Moçambique e, em Novembro, apresou em Angoche o brigue americano Magoum.

Em Setembro de 1843 o brigue Conde de Vila Flor saíu de Lisboa para Moçambique sob o comando do 1º tenente Pedro Loureiro Pinho, a fim de ser integrado na Estação Naval e ser utilizado na repressão do tráfico, nos termos do tratado de 3 de Julho de 1842 para a completa abolição da escravatura.(58)

Em Agosto de 1845 saiu para o Ibo e depois para a baia de Pemba, onde capturou três pangaios por suspeita de serem negreiros, além de diverso armamento.

No dia 9 de Agosto, um dos pangaios capturados que fora baptizado com o nome de Pemba, largou com 24 homens sob o comando do 2º tenente Jerónimo Romero, "a correr os portos do Norte em que se suspeitava haver barcos no tráfico de escravos".

O Pemba regressou à baía de Pemba no dia 1 de Outubro, entregando "157 dentes de marfim com o peso de 85 arrobas e 25 arráteis".(59)

No dia 24 de Novembro, na baía de Pemba, largaram duas lanchas do navio, comandadas pelo 2º Romero e pelo guarda-marinha António Maria Guedes.

Quinze minutos depois de desembarcarem e começou imediatamente um tiroteio, de que resultou a morte de um grumete. No dia seguinte, o brigue Conde de Vila Flor e o brigue inglês Mutine que chegara à baía, fundearam junto à praia onde se fizera o desembarque do dia anterior.

Alguns dias depois, no dia 9 de Dezembro, com o brigue Conde de Vila Flor fundeado no Ibo, saíram 3 lanchas com uma força militar para a ilha Matemo, regressando algumas horas depois com 51 escravos. No dia 11 de Dezembro, o 2º tenente Romero desembarcou "para tomar o governo das ilhas de Cabo Delgado, por ordem do governador-geral".

No dia 19 de Janeiro de 1846 o 2º tenente Romero saiu do Ibo com 30 homens em duas lanchas para "averiguar se existiam escravos na ponta Pangane e ilha de Macaloe", conforme informações que recebera. (60)

Em 28 de Novembro de 1846 o bergantim Tejo cruzava a costa e "tomou um pangaio suspeito de traficar em escravos, fundeado no Ibo no mesmo dia"(61), enquanto a escuna Infante D. Henrique apresou um negreiro sardo nas proximidades de Angoche.

Outro navios, como por exemplo as escunas 4 de Abril e Voador, assim como a corveta Infanta Regente, estiveram envolvidas na repressão do tráfico da escravatura em Moçambique por volta de 1850.
--> Continua...

*54 - António Marques Esparteiro, Trés Séculos no Mar, Vol. XV, p. 82.
*55 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol. XIX, p. 94.
*56 - O brigue D, João de Castro foi construído em Damão em 1841 e, inicialmente, chamava-se Gentil Libertador. Em Agosto de 1841 partiu para Moçambique comandado pelo 2º tenente Jerónimo Romero.
*57 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol XIX, p. 96.
*58 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol XIX, p. 25.
*59 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol XIX, p. 28.
*60 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol XIX, p. 29.
*61 - António Marques Esparteiro, Op. cit., Vol XVIII, p. 143.

O autor:
Adelino Rodrigues da Costa entrou para a Escola Naval em 1962 como cadete do "Curso Oliveira e Carmo", passou à reserva da Armada em 1983 no posto de capitão-tenente e posteriormente à situação de reforma. Entre outras missões navais que desempenhou destaca-se uma comissão de embarque realizada no norte de Moçambique entre 1966 e 1968, onde foi imediato da LGD Cimitarra e comandante das LFP Antares e LFG Dragão.Especializou-se em Artilharia, comandou a LFG Sagitário na Guiné, foi imediato da corveta Honório Barreto, técnico do Instituto Hidrográfico, instrutor de Navegação da Escola Naval, professor de Navegação da Escola Náutica e professor de Economia e Finanças do Instituto Superior naval de Guerra. Nos anos mais recentes foi docente universitário, delegado da Fundação Oriente na Índia e seu representante em Timor Leste. É licenciado em Sociologia (ISCSP), em Economia (ISEG), mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias de Informação (ISCTE) e membro da Academia de Marinha.

O livro:
Título - As Ilhas Quirimbas - Uma síntese histórico-naval sobre o arquipélago do norte de Moçambique;Edição - Comissão Cultural da Marinha;Transcrição da publicação "As ilhas Quirimbas de Adelino Rodrigues da Costa, edição da Comissão Cultural da Marinha Portuguesa, 2003 - Capítulo 11, que me foi gentilmente ofertado pelo Querido Amigo A. B. Carrilho em Pinhal Novo, 26/06/2006.

- Do mesmo autor neste blogue:

  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 1 - Aqui!
  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 2 - Aqui!
  • Retalhos da História de Pemba - A Companhia do Niassa e a fundação de Porto Amélia - Parte 3 - Aqui!
  • Retalhos da História de CABO DELGADO - O nascimento de Mocimboa da Praia - Aqui!
  • Retalhos da História de CABO DELGADO - Zanzibar e a escravatura nas Quirimbas - Parte 1 - Aqui!

- Em breve neste blogue:

  • A Ilha do Ibo;
  • As Quirimbas em finais do século XIX e a decadência do Ibo.

10/18/08

PEMBA é cidade hà 50 anos. Parabéns PEMBA!

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui.)

Um pouco da História de Pemba no dia do aniversário de sua elevação a cidade:

""Abandonada a região de Pemba pelos portugueses, e mais tarde praticamente pelos povos macuas da regedoria Muária, alguns baneanes e mouros ocuparam-na nos finais da década de 1880 sob a chefia de um tal malgache chamado “Muenhe Amade”, fundador da povoação do mesmo nome em Pampira.

Instituída a Companhia do Niassa esta manda, 4 anos mais tarde, ocupar a baía, tomando em consideração o então notável desenvol­vimento comercial dos territórios a Sul de Quissanga bem como a necessidade de controlar o comércio do sertão.

Por outro lado, porque o posto militar criado em Pemba há mais de um ano havia permitido um clima de boas relações com os régulos e consideradas garantidas as condições de segurança, é instituído o Concelho de Pemba com sede na povoação de Pampira.

Assim o comandante do posto militar de Pemba é nomeado chefe do Concelho em acumulação com as anteriores funções.

Projectara a companhia magestática a construção de uma linha férrea que ligasse Pemba ao Niassa no intuito de monopolizar o tráfico de Tanganica /Niassalândia:
"O caminho de ferro de Pemba ao Niassa chamará a meio caminho a mercadoria que for descendo pela boca de Chire, inclusive a que, por ventura proceda da própria bacia do Congo. Hoje que à nossa com­panhia foram concedidos os territórios, será pratica­da a ligação ferroviária do lago com a excelente baía de Pemba, realizando-se assim não só um desideratum da moderna civilização mas também o caminho que será o único e incontestado para o grande co­mércio da África"(12). Esperava-se que Pemba pudesse ser o porto para o abastecimento do carvão do Medo e do Itule, bem como madeira, metais, nomea­damente o ferro e o cobre e ainda o marfim entre outros artigos originários de zonas do interior.

Para o lisonjeio de Coutinho (13):
"... a explêndida baia de Pemba - está entre aqueles dois empórios comerciais (Zanzibar e Moçambique) em excepcionais condições geográficas numas cir­cunstâncias tais que aproveitadas convenientemen­te, lhe chamarão o que lhe pertence de direito, e pertence de facto o exclusivo do tráfico do Tanganica-Niassalândia”.

Por outro lado, Pemba a um dia das Comores poderia daí receber a borracha, a cera, a copal, a urzela, o marfim e peles.

É ainda a finais do século passado, mais concretamente em 1899 que a companhia do Niassa contrata Gilbom Spilsbury (delegado do Conselho da Administração da Companhia) para uma expedição militar para avaliar as possibilidades de desenvolvimento dos territórios de Cabo Delgado e Niassa mas o facto de se pretender atingir zonas mais para o interior Pemba foi nesse projecto relevada para segundo plano.

Porque se pretendia reabilitar o processo de desenvolvimento de Pemba num momento em que a povoação estava ameaçada ao isolamento devido ao internamento de comerciantes e indígenas no interior para fugir à alçada da autoridade colonial (14) ela é inicialmente considerada terra de terceira ordem e são dispensados de direitos e emolumentos de portos aos vapores que para ali fazem carreiras regulares, nos primeiros anos do nosso século.

Também na primeira década de 1900 é criada em Porto Amélia no ano de 1908 uma escola de sexo masculino denominada "António Centeno” nome de um Administrador de Companhia em Portugal, no qual logo se matricularam 14 alunos dos quais 2 europeus, 1 branco natural, 6 mestiços e 5 negros. (15)

Dados estatísticos da população de Porto Amélia em 1908 indicam haver nessa altura 18.604 habitantes, sendo 18.498 negros, 50 asiá­ticos, 26 europeus e 17 brancos naturais. (16)

Em 1909 é ocupado todo o concelho de Porto Amélia.

A finais de 1917 desembarca em Porto Amélia uma expedição militar inglesa para colaborar com o exército português na luta contra os alemães no decurso da primeira Guerra Mundial.

Foi esta expedição que, aproveitando as condições da lagoa existente na planície de Natite, colocou uma bomba de água e um pequeno sistema de abastecimento de água canalizado.

Como memória dos militares ingleses tombados durante a 1ª Guerra Mundial, ainda hoje se pode ver no cemitério de Pemba uma zona com as suas sepulturas que o governo de Sua Magestade Britânica mandava visitar periodicamente, deslocando navios de guerra com oficiais que no local procediam às cerimónias na presença do capelão do Navio. Este cemitério particular esteve durante longos anos à responsabilidade de Carlos Delgado da Silva.

Pelo Decreto nº 16.757 de 20 de abril de 1929, foram retirados à Companhia do Niassa os poderes de administração dos territórios concedidos em 1894, tomando o Estado posse dos mesmos a 27 de Outubro do mesmo ano. Foi assim restabelecido o Distrito de Cabo Delgado, na Província do Niassa com sede em Porto Amélia, deixando assim esta povoação de estar agregada ao Distrito de Niassa.

Para o período a que nos referimos duas reclassificações sucessivas para o terreno de Porto Amélia têm lugar na sequência da restrutu­ração que se inicia em 1930. A primeira verifica-se a 11 de Janeiro desse mesmo ano classificando-a em 1ª ordem e a outra em Agosto seguinte descendo-a para 2ª alegadamente por se encontrar tal como o Ibo criada à data da passagem dos territórios para a administração portuguesa com aquela ordem.

Em 1936 é aprovada a planta de modificação da vila de "Porto Amélia, Concelho e Distrito do mesmo nome, província do Niassa" (17), constituída inicialmente por 232 talhões para em 1941 entrar em vigor uma portaria delimitando a zona urbana e a suburbana.

Um bairro económico constituído por 16 blocos de aproximadamente 50/80 metros é criado no Cariacó em Porto Amélia no ano de 1943.

Ainda nesse mesmo ano e tomando em conta a necessidade de autonomizar o município da vila e dotá-la de poderes mais amplos em vista do desenvolvimento local é concedido o foral de Porto Amélia.

Em 1953 determinou o Secretário Provincial, Eng. Pinto Teixeira, em nome do Governador Geral, comandante Gabriel Teixeira empreender a construção de um cais acostável para navios de grande porte, obra que viria a ser inaugurada a 26 de Janeiro de 1957 com a acostagem inaugural do paquete "Angola".

Foi só com a materialização desta obra que Porto Amélia inicia a sua arrancada ao desenvolvimento. Assim constata-se que o movimento de mercadorias eleva-se de cerca de 40 mil para 48 mil toneladas aproximadamente.

A Vila de Porto Amélia é elevada à categoria de cidade a 18 de Outubro de 1958.

Contudo o desenvolvimento esperado talvez nunca tenha passado de sonhos e pequenas iniciativas. Um jovem da cidade em 1971 desa­bafava numa entrevista a um jornal:

"... É pena Porto Amélia ser muitas vezes esquecida, pois se podia fazer mais por ela e só os seus ver­dadeiros habitantes é que a podem desenvolver e engrandecer, mas nenhum deles é Onassis ou Rockfeller” (18).

Pemba... A solidão da sua simplicidade parece tão natural quanto a sua beleza e destino à sorte do acaso...""

- Do Livro "Pemba - Sua gente, mitos e história, 1850 a 1960" Por Luis Alvarinho que também se baseou em documentação do Arquivo Hist. de Moçambique, B.O. e Boletim da C. do Niassa, entre outros: O embrião que veio dar origem à actual cidade de Pemba, data de 1857, como parcela da Colónia 8 de Dezembro, fundada por Jerónimo Romero e dissolvida 5 anos depois por diversos problemas de organização e adaptação dos colonos.Porto Amélia ascende a vila por portaria de 19 de Dezembro de 1934. É elevada à categoria de cidade em 1958 pelo decreto-lei de 18 de Outubro-G.G. da Província.''.

  • A Biblioteca do Macua - Aqui!

4/29/08

Ecos da imprensa moçambicana - Nunca é demais repetir: Baía de PEMBA...a mais bela entre as belas !

Baia de Pemba- Maior beleza natural do mundo !
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Maputo - A baia de Pemba, Província de Cabo Delgado, é considerado pela UNESCO como uma das maiores atracções turísticas do mundo o reconhecimento surge na sequência da candidatura desta baia ao titulo de património da humanidade ao clube das melhores baias do mundo, património da UNESCO, na qual sagrou se uma das maiores belezas naturais do mundo, o que lhe conferiu ingresso àquele organismo mundial.
A candidatura da baia de Pemba foi apresentada no passado mês de Outubro no Brasil, concretamente na praia da rosa, agora património da UNESCO, por uma equipa constituída pelo presidente do Município de Pemba, Agostinho N’tauli e representantes da Associação dos Naturais e Amigos de Cabo delgado, um evento que participaram representantes de 25 países interessados na promoção de turismo e das belezas naturais das baias.
De acordo com o Presidente do Município de Pemba o ingresso da baia no clube das mais belas baias do mundo afigura se uma entrada triunfal na medida em que, não só traz vantagens para a baia, mas sim para todo o País, sobretudo na promoção do turismo.
Apontou serem algumas vantagens que o clube pode trazer para a baia e coincidem com os desafios que o Conselho Municipal de Pemba apostou no Plano de Desenvolvimento da daquela cidade que são, nomeadamente, a promoção do turismo mundial, preservação do ambiente, promoção e conservação da cultura local, conservação e manutenção do estado natural das baias, defesa dos corais - espécies marinhas em via de extinção no mundo.
Refira se que aquela baia ja vinha lutando para o seu ingresso neste clube desde o ano 2002 junto da Associação dos Naturais e Amigos da Província de Cabo Delgado, actualmente conhecida por Cabo Delgado em Movimento.
Daniel Paulo
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Alguns post's anteriores sobre a bela Baía de Pemba:
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 1 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 2 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 3 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 4 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas...5 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas II - 18OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas III- Histórias e lendas - 20OUT2007 - Aqui !
  • Ecos da Imprensa Moçambicana - Pemba e o turismo... - 28ABR2008 - Aqui !

12/06/07

Pemba - A praia do Wimbe ameaçada...

(Imagem daqui)
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A Praia do Wimbe corre riscos
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A Praia de Wimbe, na província de Cabo Delgado, está perante ameaça de poder vir a sofrer problemas de natureza ecológica, segundo alerta em comunicado de imprensa recebido na nossa Redacção, Christian Zeininger, Director da Faculdade de Gestão de Turismo e Informática da Universidade Católica de Moçambique, que abriu as suas portas em Pemba no ano 2002.
O comunicado observa que apesar das iniciativas de colocar Pemba como a terceira maior baia na lista das 100 praias mais belas do mundo, a Praia de Wimbe pode enfrentar em poucos anos dificuldades da natureza ecológica, devido a descarga descontrolada das águas sujas e das quantidades de lixo produzida pela população crescente.
“A contaminação já hoje é visível com as algas e o lixo a aumentar na praia”, diz Christian Zeininger, Director da Faculdade de Gestão de Turismo e Informática da Universidade Católica de Moçambique, citado pelo comunicado.
E, acrescenta, “com as grandes intenções na área de turismo não se pode esperar com a sensibilização e o envolvimento da população local como parte integrada nos desenvolvimentos turísticos”.
A fonte refere que a Faculdade de Gestão de Turismo e Informática da UCM, em Pemba, está neste momento a preparar os seus primeiros setenta e um graduados em Licenciatura de Gestão de Turismo e deseja-se, que os trabalhos de pesquisa elaborados pelos estudantes podem dar algumas pistas para endereçar melhor as questões da participação das comunidades para o seu benefício e os seus deveres.
No entanto, salienta que o tema não acaba somente em produzir estudos.
Cada parceiro tem uma responsabilidade de agir com uma visão de proteger e conservar os “nossos” recursos.
É neste âmbito que a UCM está actualmente a construir 12 casas para professores de estilo “lodge”, usando materiais locais, nomeadamente pedras, areia, madeira e macuti e instalar uma solução de saneamento biológico em consultoria com o ECOSAN, uma iniciativa em colaboração com a Universidade Técnica de Viena, Áustria.
O AUTARCA - 05.12.2007 - Fonte "Moçambique Para Todos"

10/24/07

O TURBILHÃO LENDÁRIO - Uma prosa acontecida em Pemba !

(Aqui, imagem de autoria do artista gráfico italiano Piero "Ingonane" que residiu em Pemba de 1989 a 1999)
Nada de melhor nos terá acontecido, naquele ano, do que as nossas férias na baia de Pemba, no norte do país.
Eu e o mano Beto haviamos passado de classe e o kôta prometera, logo nos primeiros dias do ano, umas férias na casa do avô Omar, em Paquitequete .
Assim que ficamos de férias na escola partimos de Maputo para Pemba, de autocarro, na companhia da tia Awa que viera nos buscar à capital.
A viagem fora cansativa mas, ao mesmo tempo, divertida, desde o terminal do TSL, na Avenida das FPLM , até ao controle de Pemba, no bairro de Mahate.
Dali partimos de táxi com destino a casa do avô Omar, no bairro de Paquite, como os pembenses lhe chamam, onde ficariamos quinze dias a gozarmos as férias por entre o marulhar das ondas do Índico.
Enquanto nos dirigíamos para a cidade, que distava uns quilómetros, o taxista ia-nos amostrando a paisagem dominada, principalmente, por embondeiros e algumas árvores menos frondosas e arbustos vulgares.
Do Alto-Gingone, um bairro periférico do aeroporto local, vimos a “esteira” azul do mar deitada manjestosamente ao longo da baia, parecendo um enorme anzol feito de água.
Mas, para o lado direito da estrada que nos conduzia, emergia uma nova cidade próxima da faixa de areia branca que ladeia quase toda a cidade: era a famosa praia do Wimbe, um enorme potencial turístico da região norte do país.
No entanto, pouco tempo depois desembocámos na cidade e passámos pela artéria principal do bairro de cimento.
Enquanto o carro deslizava na estrada asfaltada, vimos de longe os bairros de Cariacó, Natite e Ingonane e, mais tarde, rumamos pela marginal até ao bairro costeiro de Paquitequete, na zona de Kumilamba, onde o táxi parou em frente da casa de um dos vizinhos do avô; descemos, caminhando depois por uma rua estreita que nos levou direitos ao destino.
Ao chegarmos, fomos recebidos com alegria e, dos familiares e vizinhos, recebemos apertos efusivos de mão, à moda dos makimuanes.
Sentado na esteira de palha, na companhia do mano Beto e de outros garotos curiosos que se aproximaram ao chegarmos, pus-me a contemplar a casa que era feita de pau-a-pique, rebocada com matope e coberta de macuti .
O quintal era de bambú suportado por diversas estacas sólidas provenientes de Ulonto, lá na outra margem da cidade.
Depois de todo o cerimonial que um visitante merece, não aguentei mais: ergui-me da esteira e fui para a frente da casa, onde fiquei olhando para o mar azul e ouvindo o som das ondas misturado com o som dos búzios.
Durante muito tempo fiquei ali imóvel e boquiaberto, vendo ao longe pequenas embarcações à vela, pescadores puxando redes carregadas de peixe, barcos a motor transportando passageiros para o Ibo, Mocimboa da Praia, Quirimbas e outros pontos da Província.
Depois de um tempo, deitei o olhar para a margem onde me encontrava e fiquei apreciando a beleza das ondas e assistindo ao espectáculo dos carangueijos que, espantados pelo marulhar das ondas, fugiam em debandada ao encontro dos seus esconderijos que raramente falhavam.
Entretanto, a minha tranquilidade naquele sítio não tardou a chegar ao fim.
Um garoto aproximou-se interrompendo a minha concentração na observação da natureza e, com uma ponta de timidez, informou-me:
- Precisam de ti.
- De mim? – Interroguei-o sem desviar o olhar do mar.
- Sim.
- Aonde?
- Lá no quintal.
- E quem precisa de mim? – Quis eu saber, olhando os seus olhos.
- Avô Omar. – Replicou ele, desviando o olhar.
- Voltou?
- Sim. – Sorriu. – Faz um tempo.
Saí dali e fui até ao quintal. “escoltado” pelo miúdo, que não parava de me lançar olhares furtivos, e, ao chegar, saudei o avô e fiquei conversando com ele desde o rpincípio da tarde até ao anoitecer.
Passados alguns dias e após termos pedido autorização ao avô, eu e mano Beto, e outros garotos do bairro, fomos à praia brincar.
Era sábado; a praia estava repleta de banhista e os pescadores ainda não tinham voltado do mar.
Ficámos na margem apanhando búzios, construíndo castelos de areia, perseguindo caranguejos, brincando com garrafas-azuis e ajudando os pescadores a puxar as redes e a tirar da água os pequenos barcos à vela.
Foi neste dia que ouvi dos nossos novos amigos a lenda do turbilhão Nunumuana, que fica a algumas milhas da Baía de Pemba.
Fiquei curioso e ao mesmo tempo cheio de medo.
Naquele dia não saí de noite para ver o mar sob o luar e muito menos para contar quantos segundos passam entre o acender alternado dos faróis das rochas de Ingonane e Ulonto.
Um certo dia, estando eu na companhia do avô Omar a pescar na zona portuária da baía, interroguei-o acerca da veracidade da misteriosa lenda que corria de boca em boca entre os garotos pembenses.
Ele garantiu-me a veracidade da história e prometeu contar-me tudo, noutro dia, porque a história era longa e complicada.
Os dias foram passando, um atrás do outro, e todas as noites ouvíamos histórias diversas contadas pelo avô, mas, curiosamente, o kôta não se lembrava de contar a história do turbilhão.
Nisto, numa certa noite de luar, décimo terceiro dia da nossa estada em Pemba, a curiosidade obrigou-me a pressioná-lo a contar a história prometida, pelo que o velho me respondeu:
- Tudo bem. Eu vou contar, já que insistes tanto.
Acendeu um tabaco, fumou em silêncio com o olhar perdido num ponto indefinido, como se estivesse a pensar em algo guardado nas profundezas da sua memória, sorriu perceptívelmente fazendo animar a sua face sulcada de profundas rugas e, por fim, começou a narrar a história.
- Reza a lenda que foi há muitos anos, muitos anos mesmo – Repetiu com firmeza, a ponto de acordar o mano Beto que já apanhara uma soneca. – que um barco transportando uma terrível curandeira e seus ajudantes naufragou, numa zona a algumas milhas da nossa costa, e o naufrágio matou todos os ocupantes.
- Ninguém se salvou? – Quis eu saber, curioso.
- Ninguém! – Disse, meneando a cabeça e pegando, ao lado do tronco onde estava sentado, numa “ exportação ” de nipa , que de seguida levou aos lábios, e bebeu um golo pelo gargalo.
Depois de pousar a garrafa no chão, avivou a fogueira que ardia no centro da roda humana, feita de miúdos do bairro ávidos de ouvir histórias antigas transmitidas oralmente de geração em geração, e em seguida continuou:
- Daí, os náufragos transformaram-se em fantasmas ferozes, a ponto de consiguirem, com a ajuda de um turbilhão acompanhado de ventos tempestuosos, imobilizar um navio enorme. A partir daquele dia, todos os peixes da baía passaram a ser deles e, quem pescasse à noite, era frequente deparar-se com fantasmas recolhendo redes e libertando peixes das redes e dos anzóis. Foi nessa época que o peixe, o alimento principal dos nativos, começou a escassear e os pescadores passaram a morrer em massa, vítimas de misteriosos ventos fortes.
Estremeci, escutei o som do mar e olhei em redor do quintal iluminado pela lua que derramava a sua luz sobre todos os bairros da cidade.
Depois, apurei os ouvidos e fiquei ouvindo a história que o avô contava, gesticulando e falando num tom de voz carregado de uma miscelânia de emoção e terror.
- Então, os nativos da baía reuniram-se para resolver o problema e, para tal, chamaram o curandeiro Amisse que, com a ajuda dos ancestrais, conseguiu falar com a curandeira náufraga. Durante o diálogo ela proibiu a pesca nocturna, o uso da rede de malha fina, e o derramamento de líquidos estranhos nas águas e, além disto, ordenou que todos os barcos que passassem pela zona do turbilhão atirassem para o mar alimentos diversos, de preferência carne fresca, como forma de pagar tributo pelos peixes apanhados na baía. Estes alimentos serviam para alimentar os peixes nas profundezas do mar, para melhor se reproduzirem e crescerem saudáveis.
O kôta tossiu três vezes interrompendo a locução; bebeu um trago da sua “primeirinha”, e prosseguiu:
- Quem não obedecesse ao que Nunumuana dissera, uma gigantesca massa de água que se revolve rapidamente cobri-lo-ia imediatamente e, se se tratasse de um barco naufragaria, e os seus ocupantes transformar-se-iam em fantasmas imortais e, depois, ocupar-se-iam de vigiar o mar e impôr a ordem quando se julgasse conveniente.
O velho fez uma pausa.
Puxou do tabaco enrolado num pedaço de papel de caqui, e aspirou voluptosamente o fumo que invadiu temporariamente o espaço da roda feito pelos miúdos que o escutavam com paciência e manifesto interesse.
Depois, enterrou na areia a ponta acesa do cigarro e logo voltou ao fio da história:
- Na verdade, após a cerimónia com o curandeiro, toda a gente passou a respeitar e a cumprir rigorosamente o que Nunumuana dissera e, em consequência disso, os peixes multiplicaram-se na baía, as mortes dos pescadores diminuíram drasticamente, e os nativos e outros habitantes passaram a viver felizes.
O Kôta calou-se e fez-se um silêncio absoluto durante o qual pude ouvi-lo a ressonar como um contrabaixo desafinado.
Olhei para os garotos à minha volta, vi que ainda se achavam atentos como mochos e, por fim, tossi propositadamente.
O velho assustou-se, acendeu novamente o tabaco que havia enterrado na areia e libertou uma grande fumaça que o fez tossir vezes sem conta.
Após um tempo bebeu de uma só vez a sua “ primeirinha ”, entoou em Kimuane uma canção sobre a lenda e, por fim, ergueu-se e começou a dançar enquanto o acompanhavamos em côro, batendo palmas.
Dois dias depois, eu e o mano Beto tomámos o autocarro de volta para Maputo, onde chegámos ao terceiro dia.
Passada uma semana, um impulso não me deixava e, consequentemente, impeliu-me a escrever estas linhas como forma de imortalizar a lenda e dar a conhecer a toda gente como os pembenses passaram a valorizar e a preservar o mar e os seus recursos.
O Turbilhão Lendário por Francisco Absalão - In Blocos OnLine
  • Biografia de Francisco Absalão segundo o "Blocos On Line" - O nome artístico é: Allman Ndyoko. Nasceu em 11 de Abril de 1977 em Pemba, província de Cabo Delgado -Moçambique. Residência actual: Maputo.

10/18/07

BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas...II

(Imagem original daqui)
A mais bela do mundo?
Jerôme Bignon é o francês que está à frente da robusta, mas menos conhecida organização que agrupa as baías mais belas do mundo, uma espécie de magnatas que ao mesmo tempo que defendem o usufruto das condiçoes naturais e turísticas que a natureza oferece nas costas marítimas, fazem-no igualmente para que tal não resulte na destruição do ambiente e por aí vão, de ano a ano, descobrindo mais locais do mundo que reúnam os requistos que o clube defende.
O Clube das Mais Belas Baías do Mundo é uma agremiação que vai para lá da beleza genuína das baías. Comporta outros requisitos muito rigorosos, sobretudo em relação àquilo que os homens fazem da natureza, o ecossistema marinho ou terrestre e a candidatura de qualquer baía ao clube, é sempre seguida de muitos “lobies” que noutros casos são dirigidos pelos governos e até utilizando vias diplomáticas.
A baía de Pemba, candidata a partir do dia 6 deste Outubro, não precisou de se apresentar pela mão do Governo, mas sim, via sociedade civil, a partir de um trabalho que já vinha sendo feito, há cerca de ano e meio, que encontrou acolhimento no “Cabo Delgado em Movimento”, uma organização dos naturais e amigos daquela provincia setentrional do nosso país.
Quando chegámos a Imbituda, na madrugada do dia 6, precisamente na Praia do Rosa, os moçambicanos que haviam ido preparar o terreno encontravam-se a reler os documentos que traziam e que à tarde do mesmo dia seriam apresentados ao Quarto Congresso do Clube das Mais Belas Baías do Mundo, em forma de candidatura.
Era preciso usar todos os meios disponíveis e ao alcance para convencer os seus constituintes.
Ia ser apresentada ao clube a baía de Pemba, uma das maiores do país, provavelmente uma das mais profundas e amplas do mundo, que chega a atingir cerca de 52 metros de profundidade, com uma área aproximada de 150 quilómetros quadrados, com uma diversidade de ecossistemas, como estuários, mangais, tapetes de ervas marinhas, praias arenosas e rochosas, recifes de corais e terras húmidas.
Moçambique levou para o Brasil a população de Pemba, heterogénea, como é, através de pequenas obras de arte e cultura dos macua, maconde e muani, junto às suas religiões, a sua gastronomia e disse aos congressistas que 30 porcento dos habitantes de Pemba são dependentes de recursos costeiros.
Foi necessário dizer ao mundo, através do Clube das Mais Belas Baías que a de Pemba, há muito que é admirada, tal como há muitos anos Coutinho escreveu dizendo tratar-se duma espléndida baía que está entre aqueles dois empórios comerciais (Zanzibar e Moçambique) em excepcionais condições geográficas e em circunstâncias tais que aproveitadas convenientemente, terão o exclusivo tráfico do Tanganhica-Niassalândia.
A delegação moçambicana ao Congresso das Mais Belas Baías do Mundo foi dizer tudo sobre Pemba.
Que estando em Moçambique o seu clima é obviamente tropical e que a temperatura anual do ar é de cerca de 25 graus centígrados, um clima que sofre a influência da zona de baixas pressões equatoriais, com prevalência de ventos monsónicos de Nordeste durante o Verão no sul e norte e ventos de Sudoeste durante o Inverno, no sul.
A equipa técnica da apresentação da candidatura ficava durante largas horas incomunicável, com o Dr. Kwasi Agbley, sempre a ensaiar e do outro lado o general Alberto Chipande, presidente da Associação dos Naturais e Amigos de Cabo Delgado, usando o tacto diplomático de que não se lhe conhecia, desdobrava-se em contactos com as delegações de países que já têm as suas praias no Clube das Mais Belas do Mundo.
“Havemos de conseguir, todos estão do nosso lado” dizia amiúde Alberto Chipande, sempre que o “Notícias” se aproximava dele para lhe “medir a temperatura”, cada vez que o tempo se aproximava do acto esperado.
Agostinho Ntauale, presidente do Município de Pemba, que trazia da sua cidade uma mala enorme de objectos de arte e diversa documentação sobre a baía candidata, foi quem abriu a apresentação, pedindo que se distribuissem aos congressistas as pastas que continham a informação relevante sobre a baía.
Afinal, eram pastas forradas de capulanas de diferentes cores, com esferográficas guarnecidas de pau-preto e outros tipos de madeira.
Foi a primeira sensação de que se estava perante um país diferente!
Ntauale solicitou aos presentes para não perderem a oportunidade de chegar à baía de Pemba para se certificarem do que os documentos diziam, nomeadamente que se tratava duma porção de terra que é bela desde a sua existência, mas que não se encontrava no clube, simplesmente porque situações adversas fizeram com que Moçambique só mais tarde se apercebesse da sua existência.
Muito lacónico, apresentou a delegação moçambicana, tendo salientado o nome do general Chipande, a quem pediu para que se dirigisse aos presentes.
Igualmente de poucas palavras, este não escondeu o facto de ter sido, por muito tempo guerrilheiro, durante a luta e libetação de Moçambique e aproveita esse facto para aliá-lo à necessidade de fazer um turismo sustentável, não destruidor, que respeite a natureza, um dos ditames mais presentes no Clube das Mais Belas Baías do Mundo.
“Nós que estivemos durante muito tempo no mato, como gurrilheiros, na luta pela nossa independência nacional, sabemos quanta importância tem a natureza, que não pode ser destruída em nome do turismo ou do desenvolvimento” disse, aplaudido.
Entrementes, Alberto Chipande acabou sendo invadido por abraços dos congressistas, que se estenderam à toda delegação moçambicana, a quem depois se lhe distribuiu os certificados de participação no quarto congresso.
“Já recebemos e dentro de algum tempo havemos de seguir os trâmites normais para a apreciação da candidatura de Moçambique” garantia Jêrome Bignon, presidente do Clube Mundial das Mais Belas Baias.
José Roberto Martins (Beto), presidente do município (prefeito) de Imbituda, onde se localiza a Praia do Rosa, que acolheu o congresso, disse falando ao “notícias” que “faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para que Moçambique, através da baía de Pemba, se junte a este clube”.
Portugal, que já tem a baía de Setúbal no clube, falou através do seu chefe da delegação manifestando a sua predisposição em apoiar Moçambique, e falando à nossa Reportagem disse: acho que Moçambique tem belas praias, melhores do que esta onde estamos reunidos, por isso não vejo qual vai ser a dificuldade de aceitar a sua candidatura e eventual aprovação.
Quando quisemos saber do chefe da delegação portuguesa a razão da candidatura de Setúbal em detrimento da mais famosa baia do Algarve, respondeu: Algarve está completamente ocupada, está toda construída, não temos hipóteses de juntar a sua beleza à necessidade de defender o ambiente.
TAREFA SEGUINTE É DOS RESIDENTES DE PEMBA
Era o momento em que tudo de bom devia ser dito.
Que oferece aos turistas um leque de opções que vão desde as danças tradicionais música contemporânea, passando pelo teatro, prática de desporto e mesmo um animado carnaval.
Que o porto de Pemba começa a ser um ponto de referência para cruzeiros internacionais.
No cais são recebidos por qualificados guias turísticos que lhes proporcionam uma agradável visita à cidade.
Por seu turno, o Aeroporto Internacional de Pemba recebe turistas vindos dos quatro cantos do mundo.
Actualmente, tem ligações directas com o aeroporto de Nairobi, Quénia, Dar-Es-Salaam, na Tanzania e Joanesburgo, África do Sul, esperando-se que brevemente seja ampliado para aumentar as opções dos visitantes.
Estes factos podem, entretanto, não ser suficentes se a metalidade das populações locais não mudar quanto ao seu posicionamento em relação à natureza e uma das importantes formas de conservação da diversidade marinha e costeira é a criação de áreas de protecção.
Os consultores avançam em estratégias mais efectivas de protecção da saúde da baía de Pemba e o incremento da consciência, percepção e uso adequado dos recursos, para o que propõem o desenvolvimento de campanhas de protecção da baía para além da advertência aos turistas sobre artigos a comprar aos vendedores.
Aqui pretende-se chamar à atenção dos turistas a não adquirirem produtos de venda ilegal, como seja artigos produzidos na base de carapaças de tartarugas ou corais, entre outros.
O presidente do Conselho Municipal de Pemba, abordado para se pronunciar à volta da aceitação da candidatura da baía do seu município disse que o passo seguinte é sensibilizar o país em geral e os residentes de Pemba, em particular, sobre quanta responsabilidade recai sobre si, imediatamente a seguir, com vista a fazer com que definitivamente a baía conste da lista das mais belas do mundo.
“Temos que fazer muito nos próximos tempos vamos ser visitados pelo presidente do Clube das Mais Belas Baías do Mundo. Ele vem confirmar o que dissemos na nossa apresentação. Teremos que tornar a presença dele em momento de festa. A população de Pemba, terá que voltar a manifestar a sua hospitalidade e carinho com os seus hóspedes. Estamos a entrar para uma fase de prova da nossa própria seriedade”.
Agostinho Ntauale acredita que o seu mandato vai encerrar com a vitória que vai significar a colocação de Pemba naquele grupo de baías mais belas do mundo.
Há muitos interesses em jogo, desde o facto de o clube ser reconhecido internacionalmente como robusto do ponto de vista económico, como pelo prestígio que goza, como fundamentalmente o facto de as baias mais belas poderem ser consideradas pela UNESCO locais a conservar e, em face disso, serem futuramente declaradas Património da Humanidade.
Alberto Chipande disse que os moçambicanos, particularmente os naturais de Cabo Delgado e, sobretudo os residentes da cidade de Pemba, são chamados a vencer mais esta batalha, numa nova frente, de luta pelo desenvolvimento.
“Esta é outra frente que temos que vencer. A tal independência económica que a politica sempre pretendeu trazer também passa por estas iniciativas. A “CD em Movimento” vai se empenhar para que isso dê certo. Temos que ter a importância que temos, que representamos, mas com coisas concretas”.
PEDRO NACUO - Maputo, Quinta-Feira, 18 de Outubro de 2007:: Notícias

8/22/07

A bela e o monstro - Turismo agrava custo de vida da população de Pemba.

Maputo-Segunda-feira 20 de Agosto de 2007, a TribunaFAX N°531-O custo de vida, na Baía de Pemba, capital de Cabo Delgado, está cada vez mais elevado, tornando-a numa das cidades mais cara do País, senão a mais cara, com os munícipes a apontar o dedo acusador ao sector turístico, que, neste momento, está a dominar o mercado local.
Os preços praticados na maioria dos estabelecimentos comerciais, casas de lazer, mesmo no mercado informal, chegam a se tornar o dobro e/ou triplo do praticado noutras capitais províncias, incluindo a Capital, com a alta de preços a abranger todo tipo de produtos, locais e importados.
A Baia de Pemba é rica em mariscos, com peixe de varias espécies, camarão, lula, até lagostas. Contudo, estes recursos, apenas, são consumidos por pessoas de maior poder financeiro, como são os casos de dirigentes e turistas, com os nativos a viverem de sobras.
“Você pode ir à praia para comprar peixe directamente aos pescadores, mas os preços são altos. Eles sabem que se você não comprar, há quem pode, os turistas, que, a qualquer preço, adquirem. Por isso, contribuem, grandemente, para o aumento do custo de vida”, desabafou
P. José, funcionário do Aparelho de Estado.
“Os preços dos produtos, sobretudo, no mercado informal, são variáveis. Nos estabelecimentos comerciais são razoáveis, visto existirem fiscalizações regulares”, disse, frisando que “quando o cliente se apresenta de carro ou de mota, o preço sobe, mas quando vai a pé, o mesmo desce. As pessoas aliam o facto de Pemba ser uma cidade turística para alimentar oportunismo e especulações nos preços dos produtos”.
Como alternativa, grande parte dos munícipes vêem-se obrigados a fazer compras na chamada Capital do Norte, Cidade de Nampula, que dista a mais de 410 quilómetros de estrada, num percurso de, sensivelmente, seis horas de tempo.
“Mesmo em Nampula, a vida é
cara, mas é relativamente melhor, em relação a Pemba”, disse, ajuntando que os operadores comerciais deveriam ter em mente, que para além de turistas, existem populações desfavorecidas, que dormem sem que tenham comido, “grande parte dos munícipes têm baixa renda. Eles não deviam avaliar o preço em função do cliente, como tem acontecido”.
T. Jemuce disse estar a pouco menos de três meses a trabalhar numa instituição pública, transferido de Maputo, sendo natural da província de Sofala. A primeira constatação que teve foi a alta de preços praticados no mercado local. A sustentar a afirmação, frisou que um electrodoméstico chega a custar o triplo do preço que custa em Maputo.
“Uma geleira que custa pouco mais de 6 mil meticais em Maputo, em Pemba está a 17 mil meticais. Preferi mandar vir a minha geleira e outros electro-domésticos de Maputo para cá,
pagando apenas cerca de 6 mil meticais que pagar 17 mil”, conta.
Frisou que, apesar de estar há pouco tempo, na Baía de Pemba, prefere fazer suas compras na Cidade de Nampula.
“É longe, mas é preferível”.
NN

6/12/07

PEMBA - SUA GENTE, MITOS E A HISTÓRIA - Parte 3

Por Luis Alvarinho - (Continuação daqui)
V.
OS PASSOS PARA A OCUPAÇÃO COLONIAL
Nomeado Governador do distrito de Cabo Delgado, o Iº Tenente d'Armada Portuguesa, Jerónimo Romero, comandando a escuna de guerra "Angra" larga do Tejo com 60 colonos (homens e mulheres) a 21 de Junho de 1857 com destino a Pemba para ali edificar uma colónia com gente branca. De origem minhota, os colonos voluntariaram-se e uma subscrição popular conseguiu uma colecta de cerca de 2 milhões de reis para tal empresa.
No "Suplemento à Memória Discriptiva dos Territórios de Cabo Delgado" Jerónimo Romero ao referir-se à sua tomada de posse a 22 de Outubro como Governador de Cabo Delgado salienta que deu a conhecer a todos os presentes:
"os bons desejos do Governo de Sua Magestade que pacificamente se ocupasse a bahia de Pemba e ali se fundasse uma colónia europeia, sem que para isso fosse necessário empregar a força armada e muito menos incomodar ou prejudicar os moradores do Distrito com especialidade os régulos".
Foram então encarregues os capitães-mor das terras firmes e o de Querimba para conferenciarem com Said Ali, enquanto que o de Quissanga e o respectivo cheique para tratar com o sultão Mugabo.
Em ambos os casos foram enviados presentes levados da corte como se pode ler, por exemplo, na carta enviada por Romero ao régulo Said Ali, datada de 26 de outubro de 1857:
"Amigo nesta ocasião tenho grande prazer em man­dar uma comissão para vos cumprimentar da parte do Governo de Sua Magestade El-rei de Portugal e de vos remeter um barril de aguardente que o Go­verno vos manda em signal de amisade. Elle deseja estabelecer no território desaproveitado das margens dessa bahia uma colónia com gente do reino e jun­tamente tem em vista tratar amisade com todos, por cujo motivo está disposto a conceder-vos uma gra­duação militar e um ordenado que será pago em cada mês ... também vos será requisitada alguma gente para o serviço da colonia, a qual será paga todas as semanas em fazendas ou conforme se combinar..." (4)
Os enviados regressaram ao Ibo poucos dias depois trazendo respostas satisfatórias, apesar de certas reservas:
"Ilmo. Sr. Muito estimarei a saúde de V.S., o desejo que sempre gose a mesma saúde e boas aventuras. Também recebi um officio de V.S., e um barril de aguardente, de tudo fiquei entregue pelo capitão - mor, igualmente de outro papel que me entregou o sr. Figueira: enquanto a minha resposta nada mais tenho a dizer do que quando vier junto com o capitão-mor, trataremos porque o seu officio não me deixou desagradável, e por isso não há duvida nenhuma entre mim e V.S.- Deus guarde a V.S. - Mussage -5 de Novembro de 1857. Ilmo. Sr. Governador Civil, Jerónimo Romero.- Regulo Said Ali. (5)
Se apesar do cepticismo de Said Ali a carta deixa transparecer alguma confiança não menos verdade é a prudência e até mesmo honesti­dade da parte do régulo Mugabo:
“Ilmo. Sr. - Governador estimarei que ao receber desta esteja no goso d'uma perfeita saúde acompanhado de imensas felicidades.
Quando mandei fazer esta achava-me bom, graças a Deus e fiquei certo do conteúdo dela, a qual estimei muito por ter V.S. como meu amigo, e vizinho na povoação de gente branca que pretende fazer nas minhas terras. Mas se V.S. intenta isso para me apanhar e depois, fazer-me mal, isso não é bom, tanto porque os Mezungo sempre foram meus amigos e tratei com elles amisade, como também não ser justo que me tirem as minhas honras, mas certo da amisade de V.S., conte commigo nestas terras, pois sendo eu o régulo mais poderoso que tudo me está subordinado, estou no caso de tratar com V.S. Lá está o meu genro Andique, e os régulos Mugona, Nahea e o Mutica a fim de se encontrarem com V.S., para o que já tenho as minhas recomedaçóes; mas com tudo isto é preciso que V.S. tenha a bondade de se encontrar commigo quando puder ser e quando combi­nemos, pois tudo espero que se fará na melhor amisade e união. - Sou de V.S. muito obediente - Regulo Mugabo - Maiava 9 de Novembro de 1857". (6)
Com o fim de ocupar a baía, Jerónimo Romero manda seguir para Pemba 2 batéis com 3 oficiais e parte da força militar estacionada no Ibo.
Os militares tentaram desembarcar na ponta Miranembo mas não conseguiram devido ao mau tempo e por a costa ser cortada a pique o que os obrigou a entrar na baía, escolhendo a área de Nuno - hoje Paquiteque - então desabitada.
Aí construíram logo um barracão para lhes servir de albergue e arrecadação do material.
A "Angra" que havia chegado à Ilha do Ibo a 20 de outubro parte 11de Novembro para Pemba, onde arribou 12 horas depois, trazendo consigo Jerónimo Romero, o vigário da Ilha do Ibo e alguma tropa. A eles se juntaram alguns militares enviados da Ilha de Moçambique no “19 de Maio" - outro navio de guerra - que transportava os materiais necessários à instalação da colónia. Jerónimo Romero sentira seu sonho realizado:
"... pelas 5 horas da tarde entrava a mesma escuna embandeirada com arco por entre as duas pontas que formam a magestosa baía de Pemba.” (7)
A 12 de Novembro o Governador de Cabo Delgado desembarca ao largo da baía acompanhado de alguns oficiais e força militar, tendo sido recebido pelo régulo de Mussange - Said Ali - e sua gente.
Depois de conferenciar com Said Ali, Jerónimo Romero e comitiva regressam ao navio para aguardar a delegação enviada pelo régulo Mugabo o que veio a verificar-se decorridos 5 dias, podendo assim lavrar-se o respectivo termo de "vassalagem":
"Aos dezessete dias do mês de Novembro do anno de nascimento de Nosso Senhor Jesu Christo de 1857, achando-se perante o Governador do distrito de Cabo Delgado, o capitão-mor das terras firmes e mais pessoas a bordo da escuna guerra "Angra", em Pemba, foram recebidos os enviados do régulo Mugabo, o secretario Andique, e outros, os quais vindos com officios do régulo, e aucturização do mesmo, se lavrou o presente termo, e se concordou amigavelmente - que estas terras pertencentes ao régulo Mugabo ficam pertencentes à coroa portugueza, e todos os indivíduos, indigenas ou não indigenas, são de hoje por diante súbditos obedientes e cidadãos portugueses - que ao regulo Mugabo lhe será concedido pelo Governo de Sua Magestade El-rei o posto de capitão-mor das terras de Mugabo, com o vencimento mensal de 4$000 reis e também se concederá a graduação honorifica de sarjento-mor ao regulo Mutica e de ajudante ao secretario Andique - que o regulo Mugabo fica responsável pela boa união e amisade, porque se devem tratar os colonos como se fossem verdadeiros indigenas - que o regulo Mugabo por via dos seus enviados, declara, que está altamente satisfeito, e todos os indigenas da mesma forma satisfatória porque tem sido tratado pelo actual Governador, e por ter dirigido estes negócios, pro­curando o bem estar e dignidade de todos - que, qualquer questão, ou milando que houver para o futuro entre os colonos e indigenas será decidido pelo Governador do Distrito e o regulo Mugabo, sendo os portadores da correspondência o sargento-mor, e mesmo o ajudante; mas sendo milando grande e de consideração ou não concordando a 1a auctoridade acima mencionada, em tal caso ficará dependente a sua resolução do Governador Geral desta provincia como chefe superior, e delegado de Sua Magestade-que para a nova colónia se escolherá o terreno onde não haja maxambas, afim não se fazer mal a pessoa alguma..." (8)
Este documento foi ainda assinado por mais dez individualidades, assentando-se assim os princípios gerais de organização política e jurídica da "Colónia de Pemba”, tendo sido escolhida a região de Muguete (hoje Muaguide) nas terras do cheique Macesse (ou Mazese) para a sua instalação a Oeste da baía e a uma distância aproximada de uma légua do ponto de desembarque o que os levaria cerca de 50 minutos de percurso a pé.
Três razões fundamentais os levaram a preferir a região de Muguete: a primeira deveu-se ao facto de somente ali terem então conseguido encontrar nascentes com água doce em abundância; segundo porque aparentava prestar-se perfeitamente para o estabelecimento de uma colónia agrícola que era seu objectivo e terceiro porque estando mais próximo a povoados locais os produtos eram mais baratos.
A política de conceder graduações militares aos chefes tribais na ocupação de Pemba foi seguida pelo rei D. Pedro V.
Assim, o Governador de Cabo Delgado empossa alguns deles a 16 de Fevereiro seguinte, numa cerimónia realizada em Mussange na presença do capitão-mor das terras firmes, oficiais do estado maior, parte da companhia de infantaria do Ibo, o destacamento da ilha de Moçambique, a guarnição da Angra, o Comandante e mais praças do iate 19 de Maio, o régulo Said Ali e outras individualidades de sua regedoria:
"... nestas circunstancias o Governador de Cabo Delgado declarou, que vinha mandado pelo Gover­nador Geral da provincia para entregar as patentes de capitão-mor de Mussange ao Regulo Said-Ali de sargento-mor ao Lingoa Said-Ali, e d'ajudante a Bacar Bun Adudalla, ... na mesma ocasião se entregou a bandeira portuguesa ao Regulo Said-Ali, a qual foi içada diante de todo o auditório... declarando (o ré­gulo) (9) na mesma ocasião, que de futuro elle e toda a sua gente se consideravam como súbditos fieis de Sua Magestade Fidelissima ..." (10)
A 26 de Fevereiro do mesmo ano num acto idêntico realizado na povoação do régulo Macesse foram entregues pelo Governador Romero diplomas e bandeiras aos enviados do sultão Mugabo.

VI.
A COLÓNIA DE PEMBA
O comando da colónia foi nomeado a 5 de Janeiro do ano seguinte, 1858, quando o Governador de Cabo Delgado destaca os alferes Neutel Correia Mesquita para fiscal das Obras Públicas e João Guilherme para fiscal às ordens da colónia.
O fabrico local de alguns materiais de construção constitui prioridade começando-se por ensaiar a manufactura de tijolos e telha de argila com bons resultados e por isso aplicados às construções e residências que foram sendo feitas. É também construído um poço com excelente água potável do qual os navios igualmente se serviam para a sua aguada dado ser ali o único sítio com lagoas doces.
Foi depois aberta uma outra estrada que veio a ligar Pampira à ponta Miranembo para onde Jerónimo Romero havia transferido cerca de metade do contingente dos colonos e parte da força militar, por reco­nhecer a zona como propícia à agricultura mas, contudo, sem água potável.
Romero denominou esta parcela da "Colónia de Pemba” situada em Muguete de "Estabelecimento da Bahia de Pemba".
Miranembo era então desabitada e foi ali onde Romero tomou co­nhecimento das principais pontecialidades e riquezas da zona tais como o pau preto localmente conhecido pelo nome de “mepinga” (segundo o autor) bem como a aromática madeira de sândalo (“sapaua”), cafezeiro silvestre (“ngenre-ngenre”), a árvore do maná (suco resinoso bastante doce usado na alimentação em substituição do açúcar) e a raiz de um arbusto com a designação de “namaoere” com proprie­dades medicinais. Dessa raiz diz o Governador de Cabo Delgado:
“... os indigenas esfregam sobre uma pedra molhada em agua doce para assim extrair uma goma com que fomentam o peito às mulheres, curando por desta forma as inflamações e as dores e promovendo abun­dância de leite." (11)
Uma outra planta foi também identificada em Miranembo com o nome namonge de onde os naturais extraiam uma fibra muito usada na fabricação de redes e linhas de pesca.
A finais de 1858, cerca de ano após a formação da colónia reconhece o fundador desta a necessidade de fortificar as duas pontas à entrada da baía de Pemba.
A primeira e, no entanto a única, a ser construída foi a ponta Miranembo, edificando-se com pedra e cal locais, um fortim que mais tarde passou a designar-se de “Jerónimo Romero” em sua homenagem.
Os campos mostraram-se férteis em Muaguide e as sementes de hortaliça, legumes e cevada que tinham sido cultivados logo no primeiro ano deram prova disso.
Um destacado autor da época de nome Maria Bordalo considerava urgente a colonização efectiva daquele novo e pequeno estabeleci­mento para não correr o risco de "definhar como as demais feitorias da costa, e ter-se-á gasto muito dinheiro".
O mesmo se pode dizer do Estabelecimento de Miranembo na Baía de Pemba que em progresso conseguiu competir com a sua congénere em Muaguide.
No entanto, a grossa invernada que se verificou logo no primeiro ano, o incêndio que se registou no estabelecimento de Muguete, as crises de adaptção dos colonos ao clima tropical, as febres que mataram muitos deles, que nem enfermeiro tinham senão um curioso em primeiros socorros foram razões suficientes para grande quantidade de dissabores.
A fixação dos colonos à região tornava-se não um sonho mas ne­cessidade de sobrevivência, a “africanização” dos minhotos foi inevitável, estreitando aparentemente as relações com os régulos e os indígenas e em pouco tempo a colónia voltou a florescer.
Mas os revezes anteriores não tinham passado, quando uma campa­nha (segundo Romero) de calúnias é lançada com vista a denegri-lo, mesmo já fora do exercício das suas funções, pois havia sido exonerado a finais de 1858.
Desinteligências entre Jerónimo Romero e o Governador geral sem­pre as houveram. Refira-se o caso da retirada, quando havia apenas 3 meses da formação da colónia, da escuna Angra cedida por D. Pedro IV para o apoio exclusivo da colónia, por determinação do Governador Geral alegando a necessidade de a usar em tarefas de extrema importância.
Foi também o caso que até o levou inclusivamente ao tribunal da corte por ter aprisionado no Ibo um negreiro francês. Mas Romero saiu ileso do veredicto.
Enquanto isto, começam-se a quebrar as relações com os indígenas que possivelmente cansados da submissão e exploração lançam-se em hostilidades contra os colonos.
Estes e outros factores foram definhando cada vez mais a colónia até que o governador interino em exercício em Cabo Delgado decide extingui-la em 1862, fazendo-se recolher os colonos à ilha do Ibo.
Nada mais restou desta tentativa de colonização da zona senão o "Forte Romero", listado como monumento nacional por portaria de 3 de Abril de 1943.


VII.
A OCUPAÇÃO COLONIAL DEFINITIVA
Abandonada a região de Pemba pelos portugueses, e mais tarde praticamente pelos povos macuas da regedoria Muária, alguns baneanes e mouros ocuparam-na nos finais da década de 1880 sob a chefia de um tal malgache chamado “Muenhe Amade”, fundador da povoação do mesmo nome em Pampira.
Instituída a Companhia do Niassa esta manda, 4 anos mais tarde, ocupar a baía, tomando em consideração o então notável desenvol­vimento comercial dos territórios a Sul de Quissanga bem como a necessidade de controlar o comércio do sertão.
Por outro lado, porque o posto militar criado em Pemba há mais de um ano havia permitido um clima de boas relações com os régulos e consideradas garantidas as condições de segurança, é instituído o Concelho de Pemba com sede na povoação de Pampira.
Assim o comandante do posto militar de Pemba é nomeado chefe do Concelho em acumulação com as anteriores funções.
Projectara a companhia magestática a construção de uma linha férrea que ligasse Pemba ao Niassa no intuito de monopolizar o tráfico de Tanganica /Niassalândia:
"O caminho de ferro de Pemba ao Niassa chamará a meio caminho a mercadoria que for descendo pela boca de Chire, inclusive a que, por ventura proceda da própria bacia do Congo. Hoje que à nossa com­panhia foram concedidos os territórios, será pratica­da a ligação ferroviária do lago com a excelente baía de Pemba, realizando-se assim não só um desideratum da moderna civilização mas também o caminho que será o único e incontestado para o grande co­mércio da África" (12).
Esperava-se que Pemba pudesse ser o porto para o abastecimento do carvão do Medo e do Itule, bem como madeira, metais, nomea­damente o ferro e o cobre e ainda o marfim entre outros artigos originários de zonas do interior.
Para o lisonjeio de Coutinho (13):
"... a explêndida baia de Pemba - está entre aqueles dois empórios comerciais (Zanzibar e Moçambique) em excepcionais condições geográficas numas cir­cunstâncias tais que aproveitadas convenientemen­te, lhe chamarão o que lhe pertence de direito, e pertence de facto o exclusivo do tráfico do Tanganica-Niassalândia”.
Por outro lado, Pemba a um dia das Comores poderia daí receber a borracha, a cera, a copal, a urzela, o marfim e peles.
É ainda a finais do século passado, mais concretamente em 1899 que a companhia do Niassa contrata Gilbom Spilsbury (delegado do Conselho da Administração da Companhia) para uma expedição militar para avaliar as possibilidades de desenvolvimento dos territórios de Cabo Delgado e Niassa mas o facto de se pretender atingir zonas mais para o interior Pemba foi nesse projecto relevada para segundo plano.
Porque se pretendia reabilitar o processo de desenvolvimento de Pemba num momento em que a povoação estava ameaçada ao isolamento devido ao internamento de comerciantes e indígenas no interior para fugir à alçada da autoridade colonial (14) ela é inicialmente considerada terra de terceira ordem e são dispensados de direitos e emolumentos de portos aos vapores que para ali fazem carreiras regulares, nos primeiros anos do nosso século.
Também na primeira década de 1900 é criada em Porto Amélia no ano de 1908 uma escola de sexo masculino denominada "António Centeno” nome de um Administrador de Companhia em Portugal, no qual logo se matricularam 14 alunos dos quais 2 europeus, 1 branco natural, 6 mestiços e 5 negros. (15)
Dados estatísticos da população de Porto Amélia em 1908 indicam haver nessa altura 18.604 habitantes, sendo 18.498 negros, 50 asiá­ticos, 26 europeus e 17 brancos naturais. (16)
Em 1909 é ocupado todo o concelho de Porto Amélia.
A finais de 1917 desembarca em Porto Amélia uma expedição militar inglesa para colaborar com o exército português na luta contra os alemães no decurso da primeira Guerra Mundial.
Foi esta expedição que, aproveitando as condições da lagoa existente na planície de Natite, colocou uma bomba de água e um pequeno sistema de abastecimento de água canalizado.
Como memória dos militares ingleses tombados durante a 1ª Guerra Mundial, ainda hoje se pode ver no cemitério de Pemba uma zona com as suas sepulturas que o governo de Sua Magestade Britânica mandava visitar periodicamente, deslocando navios de guerra com oficiais que no local procediam às cerimónias na presença do capelão do Navio. Este cemitério particular esteve durante longos anos à responsabilidade de Carlos Delgado da Silva.
Pelo Decreto nº 16.757 de 20 de abril de 1929, foram retirados à Companhia do Niassa os poderes de administração dos territórios concedidos em 1894, tomando o Estado posse dos mesmos a 27 de Outubro do mesmo ano. Foi assim restabelecido o Distrito de Cabo Delgado, na Província do Niassa com sede em Porto Amélia, deixando assim esta povoação de estar agregada ao Distrito de Niassa.
Para o período a que nos referimos duas reclassificações sucessivas para o terreno de Porto Amélia têm lugar na sequência da restrutu­ração que se inicia em 1930. A primeira verifica-se a 11 de Janeiro desse mesmo ano classificando-a em 1ª ordem e a outra em Agosto seguinte descendo-a para 2ª alegadamente por se encontrar tal como o Ibo criada à data da passagem dos territórios para a administração portuguesa com aquela ordem.
Em 1936 é aprovada a planta de modificação da vila de "Porto Amélia, Concelho e Distrito do mesmo nome, província do Niassa" (17), constituída inicialmente por 232 talhões para em 1941 entrar em vigor uma portaria delimitando a zona urbana e a suburbana.
Um bairro económico constituído por 16 blocos de aproximadamente 50/80 metros é criado no Cariacó em Porto Amélia no ano de 1943.
Ainda nesse mesmo ano e tomando em conta a necessidade de autonomizar o município da vila e dotá-la de poderes mais amplos em vista do desenvolvimento local é concedido o foral de Porto Amélia.
Em 1953 determinou o Secretário Provincial, Eng. Pinto Teixeira, em nome do Governador Geral, comandante Gabriel Teixeira empreender a construção de um cais acostável para navios de grande porte, obra que viria a ser inaugurada a 26 de Janeiro de 1957 com a acostagem inaugural do paquete "Angola".
Foi só com a materialização desta obra que Porto Amélia inicia a sua arrancada ao desenvolvimento. Assim constata-se que o movimento de mercadorias eleva-se de cerca de 40 mil para 48 mil toneladas aproximadamente.
A Vila de Porto Amélia é elevada à categoria de cidade a 18 de Outubro de 1958.
Contudo o desenvolvimento esperado talvez nunca tenha passado de sonhos e pequenas iniciativas. Um jovem da cidade em 1971 desa­bafava numa entrevista a um jornal:
"... É pena Porto Amélia ser muitas vezes esquecida, pois se podia fazer mais por ela e só os seus ver­dadeiros habitantes é que a podem desenvolver e engrandecer, mas nenhum deles é Onassis ou Rockfeller” (18).
Pemba... A solidão da sua simplicidade parece tão natural quanto a sua beleza e destino à sorte do acaso...
NOTAS
1. O Boletim da Companhia do Niassa de 30 de Junho de 1914 informa: "O Boletim deixou de publicar-se nos meses de Abril e Maio em consequência do ciclone que assolou Porto Amélia em 12 de Abril determinando profundas perturbações em todos os serviços. O presente número refere-se ao aos meses de Abril, Maio e Junho".
2. Recorde-se que em Zanzibar (Tanzânia) existe uma ilha chamada Pemba. Há quem relacione o nome da cidade de Pemba em Moçambique com aquela ilha.
3. Planeamento e integração económica da provinda de Moçambique, nº 13, Colecção Estudos, 1970.
4. Jerónimo Romero, op. cit.
5. Jerónimo Romero, op. cit.
6. Jerónimo Romero, op. cit.
7. Jerónimo Romero, op. cit.
8. Jerónimo Romero, op. cit.
9. O parênteses é nosso.
10. Jerónimo Romero, op. cit.
11. Jerónimo Romero, op. cit.
12. João D'A. Coutinho, Do Niassa A Pemba - Os Territórios da Companhia do Niassa, 1893.
13. João D’A. Coutinho, op. Cit.
14. Ernesto Vilhena, Relatórios, 1905.
15. Boletim da Companhia do Niassa.
16. Boletim da Companhia do Niassa.
17. Boletim Oficial.
18. Jornal "Diário de Moçambique", 3/12/1971
Luís Alvarinho
Maputo, Maio de 1991
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