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ERA UMA VEZ
- Escrevi este poema a pensar nas crianças Moçambicanas que estão a ser levadas para a África do Sul:
ser mulher
bastou-me
para ficar presa a uma nuvem como recordação do meu único momento de infância
levaram-me pela mão pequenina dizendo que era bonito o lugar onde ia com cores diferentes que meus pés pisariam marcando minhas alegrias e eu sorria
levaram-me pela mão pequenina com um punho cerrado de rebuçados
e eu alegre sorria
levaram-me pela mão pequenina para um sítio escuro e em cada passo deixei a alegria
no chão o brilho da prata dos rebuçados que eu queria
levaram-me pela mão onde a solidão não é segura
levaram-me pela mão e socaram meu peito
rasgaram meu vestido novo com as cores das flores que eu mais queria
única referência da família
e eu chorei
levaram-me pela mão e deram-me homens
que me disseram para acreditar e chamar-lhes tios
homens que usaram meu vestido para lavar meu sangue misturado nas pequeninas flores pintadas
e eu gemia em agonia
levaram-me pela mão e eu não queria
eu chorei no chão
jazia envolta em flores que um dia queria
sou mulher e olho-te a ti outra
mulher que por companhia me levaste um dia
e me deixaste na mão de imundos
sou hoje mulher e peço a quem me lê que o diga
estou presa
estou presa a uma nuvem que me trouxe até Deus
velo por ti criança que no chão vermelho de sangue recolhes as tuas flores
as apertas no peito para sonhar o único momento em que nossas mãos se tocam
é-te devolvida a luz do dia e se mistura numa correria entre campos de mapira
7 de Março de 2008
Inez Andrade Paes - In blog " Arte de Inêz Andrade Paes".
- Escrevi este poema a pensar nas crianças Moçambicanas que estão a ser levadas para a África do Sul:
ser mulher
bastou-me
para ficar presa a uma nuvem como recordação do meu único momento de infância
levaram-me pela mão pequenina dizendo que era bonito o lugar onde ia com cores diferentes que meus pés pisariam marcando minhas alegrias e eu sorria
levaram-me pela mão pequenina com um punho cerrado de rebuçados
e eu alegre sorria
levaram-me pela mão pequenina para um sítio escuro e em cada passo deixei a alegria
no chão o brilho da prata dos rebuçados que eu queria
levaram-me pela mão onde a solidão não é segura
levaram-me pela mão e socaram meu peito
rasgaram meu vestido novo com as cores das flores que eu mais queria
única referência da família
e eu chorei
levaram-me pela mão e deram-me homens
que me disseram para acreditar e chamar-lhes tios
homens que usaram meu vestido para lavar meu sangue misturado nas pequeninas flores pintadas
e eu gemia em agonia
levaram-me pela mão e eu não queria
eu chorei no chão
jazia envolta em flores que um dia queria
sou mulher e olho-te a ti outra
mulher que por companhia me levaste um dia
e me deixaste na mão de imundos
sou hoje mulher e peço a quem me lê que o diga
estou presa
estou presa a uma nuvem que me trouxe até Deus
velo por ti criança que no chão vermelho de sangue recolhes as tuas flores
as apertas no peito para sonhar o único momento em que nossas mãos se tocam
é-te devolvida a luz do dia e se mistura numa correria entre campos de mapira
7 de Março de 2008
Inez Andrade Paes - In blog " Arte de Inêz Andrade Paes".
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- Inez Andrade Paes, natural de Pemba - Moçambique e residente em Portugal é também, além de poetisa, artista plástica e escritora. Alguns de seus trabalhos podem ser apreciados na net aqui:
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