9/30/07

MEMÓRIAS DE CABO DELGADO. ACHEGAS PARA O ESTUDO DO MUNICIPALISMO EM MOÇAMBIQUE - II

A CÂMARA DA ILHAS DE CABO DELGADO. POSTURAS E REGULAMENTOS
Por Carlos Lopes Bento[1]
1ª PARTE
[1] - Antigo administrador colonial. Foi presidente da C. Municipal do Ibo, entre 1969 e 1972. Antropólogo e prof universitário, continua a ser um dedicado amigo das históricas Ilhas de Querimba, que continua a investigar de maneira sistemática e a divulgar as suas inquestionáveis belezas.
.
Continuação daqui.
.
Foi, realmente, nesta data, que teve lugar a nomeação dos primeiros oficiais para a Câmara da "Vila de Querimba" instituída na ilha do Ibo, a saber:
· Juiz Ordinário - Caetano Alberto Júdice
· Vereador mais velho - Manuel Carrilho
· 2º Vereador - Domingos Diogo Baptista
· 3º Vereador - Domingos de Campos
· Procurador do Concelho - António José de Miranda, que também serviria de Tesoureiro
· Escrivão - João de Meneses[1],.
[1]- A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 24, Doc. 21, Provisão de 26/5/1764.
.
De realçar que a maioria destes ilustres autarcas nomeados eram filhos do Ibo.
Depois da posse, serviriam os seus empregos pelo período de um ano. O juiz prestava juramento perante o Capitão-General e os outros nomeados perante aquele juiz.
O novo Capitão-Mor e Governador, Caetano Alberto Júdice, encarregado de fazer no Ibo, a capital das Ilhas[1], chegou àquela ilha em 16 de Junho e a 26 do mesmo mês a nova Câmara já estava em funcionamento.
A 25 deste mês, "o juiz ordinário e vereadores da Câmara da Vila de São João do Ibo"[2] agradeciam ao Capitão-General a criação da nova Câmara das Ilhas de Cabo Delgado e a sua nomeação, ao mesmo tempo que atestavam a sua obediência às Leis do Soberano Fidelíssimo Rei de Portugal e às ordens emanadas de Moçambique.
Nesta sua 1ª mensagem, também davam, orgulhosamente, notícia pública do sentimento dos munícipes das Ilhas de Quirimba:
Da mesma sorte todos os moradores, assim cristãos, como mouros e cafres, ficavam tão satisfeitos que para esta Câmara se mandam confessar mil vezes obrigados e agradecidos a tão grande mercê que alcançaram em se estabelecer nestas Ilhas uma Câmara por meio da qual esperam conseguir entre todos uma completa união e que seja a justiça administrada com inteireza sem atenção de pessoa alguma como Deus e el-rei manda[3].
No final do primeiro meio ano de mandato, a Câmara inventariava as principais obras públicas realizadas:
Atestamos nós os vereadores da Câmara desta nova vila de São João do Ibo, capital das do Cabo Delgado, com os mais moradores abaixo assinados, em como, aos dezasseis do mês de Junho da era abaixo, chegou a estas Ilhas o Sr. Caetano Alberto Judicie sargento-mor de infantaria, com exercício na Praça de Moçambique, capital deste Estado e nele Comandante da Artilharia, vindo despachado em comandante destas Ilhas, o qual, logo em execução das ordens que trazia (...) estabeleceu em um bom terreno desta ilha do Ibo, a nova vila à qual deu o nome de São João do Ibo, dividindo o terreno em ruas e travessas de boa largura, pondo marcos nos ângulos em que as ruas encontram as travessas. Criou a nova Câmara, fez uma cadeia, de duas casas.
Levantou um pelourinho, tudo à imitação das melhores vilas do Reino, em uma boa praça e no melhor sítio da vila, eleito pelo povo que se achava presente, para a comodidade de todos. Além das referidas obras fez dois armazéns (...). Depois de que construiu um Forte em redentes a que deu o nome de Santa Bárbara (...) e logo junto ao Forte teve o honorífico trabalho e honra de arvorar a Bandeira de El-Rei ...[4].

[1]- A.H.U., Códice 1321, fls. 191, Carta de 20/8/1766, do Cap. Gen. para o Reino. A escolha da ilha do Ibo como capital deveu-se ao facto de ela oferecer mais condições defensivas.
[2]- A escolha de São João Baptista como padroeiro da nova vila, que se manteve até aos nossos dias, estará ligada à sua fundação, que teria lugar a 24 de Junho, dia daquele Santo, ou em data muito próxima, compreendida entre 16 e 25 do mesmo mês.
[3]- A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 24, Doc. 43, Carta de 25/6/1764, da Câmara para o Cap. Gen.. Este, por Carta de 23/2/1765 (Códice 1322, fls. 18v), remete para o Reino certidões das várias Câmaras já criadas em Moçambique, entre elas a relativa à das Ilhas, lamentando a falta de moradores que se verificava na maior parte destes domínios.
[4]- A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 24, Doc. 84, Atestado de 25/12/1764. Assinado por 26 moradores, todos cristãos.(em "Anexos") A estas obras acrescentava o Cap. Gen. uma pequena igreja (Códice 1321, fls. 191, Carta de 20/8/1766, do Cap. Gen. para o Reino).

Continua...
Investigação e texto de Carlos Lopes Bento

Templos e Espaços Sagrados das Ilhas de Querimba:

Quem é o Dr. Carlos Lopes Bento ? aqui
Mais trabalhos de Carlos Lopes Bento em
http://br.geocities.com/quirimbaspemba/

MEMÓRIAS DE CABO DELGADO. ACHEGAS PARA O ESTUDO DO MUNICIPALISMO EM MOÇAMBIQUE

A CÂMARA DA ILHAS DE CABO DELGADO. POSTURAS E REGULAMENTOS
Por Carlos Lopes Bento[1]
1ª PARTE
[1] - Antigo administrador colonial. Foi presidente da C. Municipal do Ibo, entre 1969 e 1972. Antropólogo e prof universitário, continua a ser um dedicado amigo das históricas Ilhas de Querimba, que continua a investigar de maneira sistemática e a divulgar as suas inquestionáveis belezas.
.
Da sua criação à instalação
Para fazer face ao estado de ruína total em que se encontrava o governo civil e económico de Moçambique e doutros portos e, por nestes lugares, não haver, nem quem administrasse na primeira instância a justiça às partes, nem quem tivesse a seu cargo o cuidado do bem comum do povo, Instruções de 1761[1], determinavam que, a ilha de Moçambique e os portos e povoações de Quelimane, Sena, Tete, Zumbo, Manica, Sofala, Inhambane e Ilhas de Querimba, fossem erigidas em vilas, sujeitas ao Ouvidor de Moçambique, as quais ficariam a beneficiar de todos os privilégios concedidos às vilas do Reino.
Mandavam, ainda, as mesmas Instruções que fossem eleitos um juiz ordinário, três vereadores, um procurador do concelho, um escrivão e mais oficiais da câmara, entre as pessoas mais idóneas, na forma da Ordenança do Livro 1º, Título 67, servindo todos debaixo dos Regimentos que faziam parte da dita Ordenação.
Os senadores das Câmaras, presentes e futuros, obrigavam-se a administrar a justiça dos povos e a distribui-la, sem distinção de pessoas, a todos os que a tivessem a seu favor, fossem "mouros, gentios, cafres e outros semelhantes"
[2].
Do novo governo civil e económico das Câmaras a estabelecer, afirmava-se, adviriam resultados de muita utilidade: os habitantes das vilas e seus termos ficariam "reduzidos" à sociedade civil, os vários cultos dos países por ela dominados seriam absorvidos, num tempo mínimo, pela Religião dominante e, finalmente, "os gentios e cafres pelas Câmaras civilizados"
[3] aumentaria, significativamente, o número dos cristãos. Pensava-se, euro e etnocentricamente, na intensificação de uma política de assimilação das populações colonizadas e na sua integração na cultura de matriz europeia, considerada como superior.
Cabiam às Câmaras, entre outras, as seguintes funções específicas:
·administrar e defender os interesses do povo, procurando assegurar a vida, honra e bens das pessoas;
·aprovar, alterar e revogar Regimentos e Posturas, que faria respeitar, que regulavam matérias como: limpeza, sanidade e higiene públicas, circulação de animais;
·defender a população contra animais nocivos;
·conceder autorizações para pesos e medidas, mercados, estabelecimentos comercias e vendedores ambulantes;
·passar licenças para construção de novos edifícios;
·fixar de preços de venda de produtos;
·fixar feriados públicos e autorizar procissões religiosas;
·e cuidar do fomento da agricultura e outras actividades.
Regulava-se, ainda, o funcionamento das Câmaras, que ficavam proibidas de se intrometer nas matérias e negócios da competência dos Generais do Estado, por cujas ordens se deviam de reger, cabendo-lhe observá-las, inviolavelmente.
Embora as ditas Instruções régias fossem datadas de 19/5/1761, as Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado apenas teriam foros de vila, com câmara municipal e tribunal, três anos mais tarde, ou seja em 26 de Maio 1764. Eis a Provisão que testemunha este facto histórico:

[1]- Idem., Doc. Av. Moç., Cx. 19, Doc. 63 e Códice 1322, fls. 104 a 106, Instruções Régias de 9/5/1761, artes 43° e 44°; BOTELHO, J. T., A Primeira Carta Orgânica de Moçambique, A.C.L., Nova Série, Vol. I, 1929-30, p. 28.
[2]- A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 19, Doc. 63 e Códice 1322, fls. 104 a 106, Instruções Régias de 9/5/1761, artes 43° e 44°; BOTELHO, J. Teixeira., A Primeira Carta Orgânica de Moçambique, A.C.L., Nova Série, Vol. I, 1929-30, p. 28.
[3]- Idem, Ibid, Regimento de 16/1/1763, cit..

Continua...

Investigação e texto de Carlos Lopes Bento

Templos e Espaços Sagrados das Ilhas de Querimba:

Quem é o Dr. Carlos Lopes Bento ? aqui

Mais trabalhos de Carlos Lopes Bento em http://br.geocities.com/quirimbaspemba/