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Autor - Carlos Lopes Bento.
Mais trabalhos de Carlos Lopes Bento aqui:
http://br.geocities.com/quirimbaspemba/
MEMÓRIAS DAS ILHAS DE QUERIMBA.TEMPLOS E ESPAÇOS SAGRADOS DAS ILHAS DE QUERIMBA.
ACHEGAS PARA O SEU ESTUDO.
Começarei pelos locais de enterramento dos moradores cristãos.
Como já foi salientado um pouco atrás, entre 1796 e 1798 foram feitos vários enterramentos, na Capela do Ibo, debaixo do coro, junto aos bancos, de acordo com o status social.
Para acabar com os danos que tal prática acarretava para a saúde pública, a Carta régia de 14/1/1801[1] proibia o enterramento de cadáveres em templos e igrejas, logo que, para o efeito, fossem construídos cemitérios. Em cumprimento desta disposição real mandava-se levantar um cemitério na ilha do Ibo.
O Governador das Ilhas[2] achava a providência de grande utilidade para as Ilhas em virtude dos templos existentes serem pequenos e existirem apenas dois onde se costumava fazer enterramentos(Quirimba e Ibo). De modo a obviar este inconveniente e cumprir aquela disposição legal, propunha a construção de dois cemitérios, um no Ibo e outro na Quirimba, em pedra e cal e não de madeira, material que exigia reparações anuais e permitia a entrada de animais nocturnos. Perguntava, ao mesmo tempo, quem suportaria as despesas com os materiais, que seriam de elevados montantes.
A resposta do Capitão General[3] era negativa ao determinar que os cemitérios deveriam fazer-se de madeira, o mais rapidamente possível e de maneira a evitar a entrada neles de animais. Por se tratar uma obra de interesse e benefício públicos caberia aos moradores contribuir com materiais e mão-de-obra escrava, uma vez que não haver cabimento para despesas extraordinárias.
Solicitava, ainda, aquela autoridade o envio de dados estatísticos anuais sobre o número de católicos que morriam e se enterravam nas igrejas e se havia probabilidades de aumentar o número de cadáveres de modo a poder "infeccionar os ares e causar epidemias, como acontece nas cidades populosas".
Desconhece-se se tais obras foram ou não concretizadas. Mas a construção de um pequeno cemitério, em 1846, junto à igreja do Ibo, dedicada a São João, pode levar a concluir pela negativa.
Os enterramentos tiveram lugar, primeiro, no interior da capela, depois na igreja e, posteriormente, naquele pequeno cemitério, ainda existente em 1974.
No último quartel do século XIX, mais precisamente em 1889, foi erigido o cemitério de Munawa para cristãos e não cristãos e na sua capela foi benzida em 1892 a imagem do Santo Africano Benedito, protector da gente escravizada.
Fig. XII- Cemitério de Munawa com a sua capela.
Crédito: Carlos Bento. 1972 e 1970.
Fig. XIII- São Benedito
Crédito Carlos Bento. 1970
São Benedito, descendente de escravos provenientes da Etiópia, nasceu em Itália, em 1562 e foi um grande defensor dos oprimidos e escravizados. É um Santo muito querido e popular no Brasil, entre as populações mais desfavorecidas.
A imagem deste Santo, toda pintada de preto, que foi benzida em 20 de Janeiro de 1892, encontrava-se na Capela do Cemitério de Munawa.
Em 1971, para a resguardar de cobiças alheias, foi depositada na Câmara Municipal do Ibo.
No interior do cemitério do Ibo encontravam-se belos jazigos e pedras tumulares, sinal de uma sociedade social e economicamente favorecida.(Fig. XII e XIV)
Fig.- XIV- Jazigo familiar
Crédito: Carlos Lopes Bento. 1970.
No exterior deste cemitério encontramos algumas campas, uma delas com dizeres em escrita oriental, que se julga com datas anteriores a 1889, onde teria havido um cemitério, vedado a madeira, que o tempo consumiu.
Fig.- XVI- Uma das campas mais antigas
Crédito: Carlos Bento. 1970
Para além deste cemitério público, e não muito longe dele, encontramos na Ilha do Ibo quatro pequenos cemitérios de família, construídos, no último quartel de século XIX.
Fig. XVII- Cemitério de família com lápide de mármore(Fig. XVIII). 1970
Crédito: Carlos Bento
Fig. XVIII. Lápide. 1970
Crédito: Carlos Bento
Fig. XIX- Cemitério de família 2. 1970
Crédito de Carlos Bento
Fig. XX- Lápide. 1970
Crédito de Carlos Bento
Fig. XXI- Cemitério de família 3. 1970
Crédito de Carlos Bento
Fig. XXII- Cemitério de família 4. 1970
Crédito de Carlos Bento
Para além dos cemitérios cristãos, existiam, ainda, na ilha do Ibo dois cemitérios maometanos e um crematório hindu, dos quais apresentamos imagens.
Fig. XXIII- Cemitério maometano destinado à população rururbana. 1970
Crédito de Carlos Bento
Fig. XXIV- Cemitério maometano destinado aos comerciantes da Vila. 1970
Crédito de Carlos Bento
Fig. XXV- Crematório hindu. 1970
Crédito de Carlos Bento
Numa 3ª parte serão abordados alguns dos problemas levantados à missionação das populações das Ilhas de Cabo Delgado.
Pesquisa e texto de: Carlos Lopes Bento, antropólogo e prof. universitário.
(CONTINUA)
[1]- Idem, Doc. Av. Moç., Cx. 92, Doc. 81 e Códice 1478, fls. 175v a 176v, Carta de 23/2/1802, do Cap. Gen. para o Cap. das Ilhas.
[2]- Idem, Códice 1478, fls. 176v, Carta nº 299, de 23/3/1802, do Cap. das Ilhas para o Cap. Gen..
[3]- A.H.U., Doc. Av. Moç., Cx. 93, Doc. 46 e Códice 1478, fls. 178, Carta de 21/5/1802.
Quem é Carlos Lopes Bento
Carlos Lopes Bento, nasceu em 1933, na aldeia de Mouriscas/Abrantes/Ribatejo/Portugal.
FORMAÇÃO ACADÉMICA
- 4ª classe na Escola Primária de Mouriscas.
- 2º.ano e 5º ano liceais no Colégio Infante de Sagres, em Mouriscas.
- 7º.ano liceal no Instituto de Santo António, em Castelo Branco.
- Doutorado em Ciências Sociais, Especialidade História dos Factos Sociais, pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, da Universidade Técnica de Lisboa.
- Licenciado em Ciências Antropológicas e Etnológicas pelo mesmo Instituto.
- Diplomado com o Curso Superior de Administração Ultramarina pelo antigo Instituto Superior de Estudos Ultramarinos.
ACTIVIDADE PROFISSIONAL E CIENTÍFICA
Viveu em Moçambique, por motivos profissionais, de 1961 até l974, onde desempenhou funções na Administração Civil, como Administrador de Concelho e Presidente de Câmara, e realizou pesquisa documental e trabalho de campo entre os povos makhwa de Murrupula e Mogincual, makonde de Mueda e mwani das Ilhas de Querimba e Pemba(Porto Amélia).
Antropólogo, Professor Universitário e Investigador em vários projectos de natureza sócio-politíca e de desenvolvimento em Portugal Continental e Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, designadamente, " A Reconversão da Pesca Artesanal, entre os rios Tejo e Sado- AspectosHumanos", comparticipado pela JNICT. Nos últimos anos coordenou o Projecto de I&D «A cozinha Tradicional na área do Pinhal Interior e do Vale do Tejo, num Processo de Mudança – Estudo Exploratório(meados do século xx).
Membro da Sociedade de Geografia de Lisboa, onde exerceu cargos de presidência, nas secções de Etnografia, Antropologia e História e, actualmente, faz parte dos seus Órgãos Directivos, e de vários centros de investigação ligados a África, onde tem apresentado dezenas de Comunicações.
Participação em muitas dezenas de eventos científicos- congressos, seminários, mesas redondas, ...- ligados a temáticas da sua especialidade.
ÁREAS CIENTÍFICAS DE INTERESSE
Actualmente, interessa-se pela Antropologia Africana-ritos de passagem, alimentação e contactos de cultura-, e no domínio da Antropologia Portuguesa pela cultura alimentar tradicional e pelos problemas relacionados com a mudança em comunidades rurais e piscatórias e em organizações empresariais, particularmente, turísticas e hoteleiras.
PUBLICAÇÕES
Entre a múltipla colaboração dispersa por livros e publicações periódicas, realçam-se os seguintes artigos publicados ou em prelo:
- A Póvoa do Varzim e o seu Passado - A sua Comunidade de Pesca no Limiar do Séc. XX (1978);
- Pescadores e Artes de Pesca - Aspectos da Actividade Piscatória nos rios de Lisboa e de Setúbal (1978 e 1979);
- O Trabalho de Campo na Antropologia e o Desenvolvimento (1982);
- Problemas dos Países em Transição - Algumas considerações sobre a posse e a exploração na terra da Madeira e suas implicações (1982);
- O Desenvolvimento das Pescas nas Costas do Algarve - Achegas para o Estudo do seu Passado(1984);
- A Cozinha dos Wamwani das Ilhas de Querimba / Moçambique (1984);
- O Desenvolvimento das Pescas nas Costas do Algarve - Achegas para o Estudo do seu Passado. Breves Considerações Finais (1986);
- A Pesca do rio Tejo. Os Avieiros: Que Padrões de Cultura? Que Factores de Mudança Sócio-Cultural? Que Futuro? (1987);
- O Desenvolvimento das Pescas nas Costas do Algarve - Achegas para o Estudo do seu Passado.-Ambiente, Tecnologia e Qualidade de Vida (1988);
- A Posição Geo-Política e Estratégica das Ilhas de Querimba. As Fortificações de Alguns dos seus Portos de Escala (1989);
- La Femme Mwani e la Famille. Étude Quantitatif des Quelques Comportements des Femmas de l’île d’Ibo (1990);
- As Companhas de Ceifeiros Ribatejanos no Alto Alentejo - Uma Forma de Organização Social Extinta(1991);
- Os Prazos da Coroa nas Ilhas de Querimba e a sua Importância na Consolidação do Domínio Colonial Português (1997);
- A Administração Colonial Portuguesa em Moçambique - Um Comando Militar em Mogincual, entre 1886 e 1921 (1999);
- Situação Colonial nas Ilhas de Querimba ou de Cabo Delgado - Senhorios, Mercadores e Escravos (Resumo da Tese de doutoramento) (2000);
- Contactos de Cultura Pós-Gâmica na Costa Oriental de África. O Estudo de um Caso Concreto(2000);
- A Ilha do Ibo: Gentes e Culturas-Ritos de Passagem (2001);
- A Antropologia da Alimentação em Portugal. - Um estudo concreto (2003);
- A Cozinha Tradicional na Área do Pinhal e o Desenvolvimento Regional - O Maranho como Prato Emblemático num Processo de Mudança (2003);
- A possessão em Moçambique - O Curandeiro N´kanga entre os Wamwuani do Ibo (1969 -74)(2003);
- A Antoponímia de Mouriscas, entre 1860 e 1910 (2005).