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12/15/08

Ecos da imprensa do Brasil - Crises na África afetam Moçambique.

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui.)

A "Globo.com" através de seu portal "G1" publica hoje (14) reportagem de Isis Nóbile Diniz-São Paulo, sobre Moçambique e o reflexo negativo das várias crises que acontecem em países africanos vizinhos, sobre a economia e saúde da sociedade moçambicana.
Começa assim:

""País africano encara problemas comerciais, sociais e de saúde. Conflitos em Zimbábue e República Democrática do Congo interferem.

Parecia um filme de guerra onde a cidade foi recentemente bombardeada. Quando o brasileiro Gabriel Borges caminhou pela primeira vez por Maputo, capital de Moçambique, reparou que os edifícios ainda traziam as marcas dos recentes conflitos vividos pelo país.

Se voltasse os olhos para outra direção, encontrava as praias paradisíacas que encantam turistas do mundo inteiro. Nas ruas, ele divide espaço com a população que tenta superar o medo da guerra e das doenças ainda iminentes. Moçambique - país de colonização, língua e clima semelhantes ao brasileiro - tenta se fortalecer como uma democracia ocidental. A nação irmã do Brasil, com cerca de 20 milhões de habitantes, é muito mais complexa do que aparenta. Cada solavanco dos países vizinhos pode prejudicar a nação. Atualmente, os problemas no Zimbábue e na República Democrática do Congo assustaram o lusófono. Os três países participam da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC). “Os conflitos nos afetam direta ou indiretamente, principalmente nas nossas ações de combate aos problemas fundamentais como à fome e à pobreza”, disse ao G1 Murade Isaac Miguigy Murargy, embaixador da República de Moçambique no Brasil.

Vizinho em guerra.
Gabriel Borges, 29 anos, diretor de arte, e Thais Chrystina, 24 anos, estagiária do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), mudaram-se em 2008 para Maputo. A aventura começou com uma oferta de emprego que Borges recebeu. Devido ao desafio, à familiaridade com a língua e à suposta semelhança cultural, os jovens apostaram no país africano. Além das diferenças culturais, atualmente convivem com os problemas decorrentes dos conflitos na região. ... ..."
- Devido à extensão da reportagem, leia a mesma na íntegra aqui!

  • Portal G1 - Aqui!
  • Galeria de fotos de Julien Lagarde: "Around the world" - Aqui!

4/29/08

Ecos da imprensa moçambicana - Nunca é demais repetir: Baía de PEMBA...a mais bela entre as belas !

Baia de Pemba- Maior beleza natural do mundo !
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Maputo - A baia de Pemba, Província de Cabo Delgado, é considerado pela UNESCO como uma das maiores atracções turísticas do mundo o reconhecimento surge na sequência da candidatura desta baia ao titulo de património da humanidade ao clube das melhores baias do mundo, património da UNESCO, na qual sagrou se uma das maiores belezas naturais do mundo, o que lhe conferiu ingresso àquele organismo mundial.
A candidatura da baia de Pemba foi apresentada no passado mês de Outubro no Brasil, concretamente na praia da rosa, agora património da UNESCO, por uma equipa constituída pelo presidente do Município de Pemba, Agostinho N’tauli e representantes da Associação dos Naturais e Amigos de Cabo delgado, um evento que participaram representantes de 25 países interessados na promoção de turismo e das belezas naturais das baias.
De acordo com o Presidente do Município de Pemba o ingresso da baia no clube das mais belas baias do mundo afigura se uma entrada triunfal na medida em que, não só traz vantagens para a baia, mas sim para todo o País, sobretudo na promoção do turismo.
Apontou serem algumas vantagens que o clube pode trazer para a baia e coincidem com os desafios que o Conselho Municipal de Pemba apostou no Plano de Desenvolvimento da daquela cidade que são, nomeadamente, a promoção do turismo mundial, preservação do ambiente, promoção e conservação da cultura local, conservação e manutenção do estado natural das baias, defesa dos corais - espécies marinhas em via de extinção no mundo.
Refira se que aquela baia ja vinha lutando para o seu ingresso neste clube desde o ano 2002 junto da Associação dos Naturais e Amigos da Província de Cabo Delgado, actualmente conhecida por Cabo Delgado em Movimento.
Daniel Paulo
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Alguns post's anteriores sobre a bela Baía de Pemba:
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 1 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 2 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 3 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 4 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas...5 - 11OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas II - 18OUT2007 - Aqui !
  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas III- Histórias e lendas - 20OUT2007 - Aqui !
  • Ecos da Imprensa Moçambicana - Pemba e o turismo... - 28ABR2008 - Aqui !

4/28/08

Ecos da imprensa moçambicana - Pemba e o turismo...

Construção em Pemba de hotéis de luxo.
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A baía de Pemba, na cidade de mesmo nome na província nortenha de Cabo Delgado foi convidada pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) para participar num concurso internacional para eleição das melhores baías do mundo.
O convite fica a dever-se pelo facto da mesma constar como uma das mais belas baías do mundo, uma vez que, para além da beleza em sí, apresenta uma diversidade cultural invejável e tem-se batido pela conservação dos espaços virgens e por manter a sua originalidade, segundo disse a jornalistas, sexta-feira passada, o presidente do município de Pemba, Agostinho Ntawala.
Ntawala disse que, Pemba esteve representada, em Outubro de 2007, no Brasil, num encontro durante o qual, uma vez mais, foi vincada a sua eleição para figurar na classe das baías mais belas do mundo, passando assim a ser a quarta no continente africano depois da Àfrica do Sul, Senegal e Cabo Verde que se vêm juntar a outras 26 dos restantes continentes.
É ainda no quadro da sua elevação que este mês de Maio de 2008, uma delegação de peritos da UNESCO irá deslocar-se a baía de Pemba para avaliar as condições apresentadas pelas autoridades moçambicanas e proceder à entrega do respectivo título de Património da Humanidade que lhe dá o direito de ser integrada no clube das baías mais belas do mundo, segundo ainda a fonte.
Uma das actividades de reconhecimento pela distinguição a serem desenvolvidas pela edilidade refere-se a construção de dois hotéis de cinco estrelas, com obras a arrancar em 2009 e várias outras infra-estruturas visando acolher o crescente número de turístas que têm-se deslocado a Pemba.
Presentemente, a baía recebe em média por ano cerca de 98 mil turistas entre nacionais e estrangeiros que contribuem para uma parte significativa das receitas do munícipio, segundo ainda Agostinho Ntawala, que, entretanto, não precisou o montante colectado.
Fernando Sidumo
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Alguns post's anteriores sobre a bela Baía de Pemba:
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  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas... 2 - 11OUT2007 - Aqui !
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  • BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas II - 18OUT2007 - Aqui !
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4/09/08

Moçambique 1980 - Operação Produção ...

(Imagem original daqui)
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Encontrei hà pouco na net sobre a injustificável, preconceituosa e aviltante "Operação Produção":
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Omar Ribeiro Thomaz-historiador e antropólogo fala sobre a Frente de Libertação de Moçambique e sobre os campos de reeducação que existiram no país por volta de 1980:
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"... ... Há uma série de lideranças africanas que vão se destacar tentando construir uma opção à Frelimo, e que serão classificados como inimigos, tais como Joana Simão e Uria Simango, entre outros. Eles foram enviados para um campo de prisioneiros no Niassa, ao Norte de Moçambique e ali morreram. ... ..."
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Em um processo difícil, de guerras entre brancos e negros, nativos e colonizadores, Moçambique conseguiu sua independência em 1975, mas o período de transição foi marcado pela instituição de medidas impopulares que deixaram cicatrizes em boa parte da população.
O historiador e antropólogo Omar Ribeiro Thomaz, da Universidade Estadual de Campinas, voltou recentemente de uma de suas viagens a Inhambane, uma província de Moçambique, onde tem acompanhado um grupo de pessoas que foram levadas pela Frelimo – Frente de Libertação de Moçambique, na década de 1980 - para trabalhar em campos que abrigavam pessoas tidas como desocupadas, inúteis, indesejadas, pelo governo e que, então, deveriam ser reeducadas, a partir do trabalho braçal no campo. Esse projeto, denominado Operação Produção, foi uma das medidas adotadas. Nesta entrevista, Thomaz dá uma idéia do contexto histórico em que essas ações acontecem e fala um pouco sobre o destino das pessoas que passaram pela Operação Produção.
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ComCiência - Em seu trabalho o senhor trata dos deportados no período pós-colonial em Moçambique, pessoas que eram levadas dos centros urbanos para os campos de reeducação criados logo após a independência. O que o senhor tem descoberto pelas narrativas dessas pessoas? A atuação da Frelimo marca realmente uma ruptura entre o período colonial e o pós-colonial?
Omar Ribeiro Thomaz - A primeira coisa a dizer é que trabalho com a idéia de deportado, mas as pessoas que passaram por essa experiência se dizem raptadas. Em alguns contextos elas de fato foram seqüestradas pela Frelimo ou pela Renamo (Resistência Nacional Moçambicana) durante a guerra civil. Eu uso o termo deportação, que não é o termo que o Estado da Frelimo usava, para me referir às pessoas que eram enviadas para os campos, fossem os de reeducação ou os de trabalho. E uso o termo raptados para aqueles que foram seqüestrados durante a guerra civil, por parte da Renamo, que era o movimento que se opunha ao governo da Frelimo, e que compunha a maior parte de seu exército com jovens que pegavam nas ruas, sem consultar os pais e sem nenhum processo formal. Isso era um rapto, um seqüestro. As pessoas que eu entrevistei diziam: “fomos raptadas”. Elas faziam uso do mesmo termo que se usa para falar das pessoas que foram raptadas efetivamente pelos exércitos, quer da Renamo, quer da Frelimo, que muitas vezes usava do mesmo expediente.
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ComCiência – Em que contexto surgiram os campos de reeducação?
Thomaz – O contexto é o da guerra de independência de 1964 a 1974. Em abril de 1974, a Revolução dos Cravos em Portugal acabou ditando uma certa disponibilidade dos portugueses para negociar com a Frelimo que, na prática, tinha também uma vitória militar, pois os movimentos de libertação africanos estavam ganhando as guerras em Moçambique, Guiné Bissau e Angola. A Frelimo já sinalizava a formação de um regime de natureza revolucionária, marxista-leninista, e mesmo sem clareza do que estava por vir, a maioria da população branca, criada na sociedade colonial fascista portuguesa – cerca de 200 mil pessoas, que moravam em Moçambique – não se mostrava disposta a viver uma revolução ou sob um regime de maioria negra, onde não pudessem manter privilégios. Nesse período, de muitos conflitos entre brancos e negros nas cidades, boa parte dessa população branca abandona o país rumo a Portugal. Alguns permaneceram, mas procuraram sabotar iniciativas do regime que se instalava. Outros eram apenas suspeitos de sabotagem. A esses, sendo portugueses, era aplicada uma punição: tinham 24 horas para abandonar o país e podiam levar 20 quilos de bagagem. Essa medida ficou conhecida como o 20-24 e aconteceu com uma certa freqüência nos anos posteriores aos acordos entre a Frelimo e Portugal e após a independência, em junho de 1975. Logo após o estabelecimento dos acordos entre Portugal e a Frelimo – em 7 de setembro de 1974 – ocorreu o início de uma série de expedientes de ordem administrativa que vão dar origem ao que posteriormente vão se chamar de campos.
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ComCiência - Que expedientes foram esses?
Thomaz – A primeira coisa foi eliminar o habeas corpus. Foi criado um regime de exceção, conferindo à Frelimo ou a órgãos ligados ao regime, poderes extraordinários no tratamento de pessoas acusadas de sabotadoras, ou que teriam um comportamento moral inadequado – mulheres suspeitas de prostituição, indivíduos alcoólatras, pessoas consideradas vadias ou ligadas ao tráfico. Essas pessoas foram enviadas para o que foi chamado de campos de reeducação, pois deveriam ser re-socializadas pelo trabalho. Deveriam trabalhar na roça, que se chamam machambas e, nesse processo, deveriam aprender os princípios do marxismo-leninismo e os da construção do homem novo. Para esses campos eram levadas também pessoas consideradas suspeitas ou que teriam conexão com o antigo regime colonial, colaboradores da polícia política portuguesa, ou régulos, que eram as autoridades tradicionais atreladas ao funcionamento do Estado colonial. Também eram levados indivíduos acusados de curandeirismo e feitiçaria e os Testemunhas de Jeová. Isso porque o novo regime pretendia superar não apenas o colonialismo, mas também o obscurantismo e o tribalismo. Portanto os régulos, os curandeiros e os feiticeiros seriam representantes do obscurantismo e do tribalismo que segundo uma análise das elites da Frelimo teriam promovido, em conjunto com os portugueses, o sistema colonial fascista que tinha perdurado em Moçambique por tanto tempo.
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ComCiência – A esse processo deu-se o nome de Operação Limpeza?
Thomaz - A Operação Limpeza foi implantada ainda em 1974. Já existiam os acordos entre o Estado português e a Frelimo, mas pouca clareza sobre o futuro do país, e muitos rumores. A população branca estava muito assustada, inclusive porque ocorreram dois dias de enfrentamento violento entre brancos e negros, em Lourenço Marques, atual Maputo, nos dias 7 de setembro e 21 de outubro. Foram dias muito difíceis. No 7 de setembro há um levante branco. A população branca se organiza e dá um golpe de Estado, tentando promover uma independência branca em Moçambique. Ela fracassa, mas nesse enfrentamento ocorreram muitas mortes, sobretudo de negros, porque as milícias brancas saíam matando nas ruas. E no dia 21 de outubro, em um enfrentamento no centro da cidade, militares portugueses matam um adolescente e provocam um outro levante da população branca com a morte de negros, mas dessa vez de brancos também. Esse processo fez com que aqueles que estavam dispostos a permanecer, resolvam sair do país com medo.
Nesse processo a Frente estabeleceu novas medidas, em acordo com as tropas portuguesas, a começar pela eliminação do habeas corpus. Iniciou-se então o que eles chamam de Operação Limpeza no centro da cidade de Lourenço Marques (atual Maputo). Isso ocorreu porque havia uma percepção, por parte de Samora Machel e de parte da Frelimo, de que uma cidade colonial como Lourenço Marques era forçosamente corrupta do ponto de vista de seus costumes, ou seja, uma cidade imoral, onde a mulher seria corrompida pela prostituição, e o homem africano, pelo álcool. Lutar contra o colonialismo significava também lutar contra esse tipo de comportamento. Na Beira a coisa foi assim também. Mulheres que usavam minissaia ou pintura nos olhos eram presas acusadas de prostituição, e levadas para algum desses campos. Em 12 de novembro de 1974, dia em que se desencadeia a Operação Limpeza, cerca de 142 mulheres foram enviadas para campos não se sabe onde. Elas simplesmente foram colocadas em caminhões e levadas embora. A prisão de mulheres suspeitas de prostituição foi recorrente em anos subseqüentes. E na Operação Produção também. Uma das senhoras que eu entrevistei, que foi vítima da Operação Produção, foi acusada de prostituição por ser mãe solteira.
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ComCiência - E quantos eram esses campos de reeducação?
Thomaz - Não se sabe ao certo o número desses campos, mas tenho algumas estimativas a partir da documentação encontrada em arquivos do Departamento do Estado Americano. Calculo que, no final da década de 70, havia entre 20 mil pessoas – sem contar os 10 mil Testemunhas de Jeová – que foram enviados para a reeducação. A Operação Produção afetou entre 50 e 100 mil pessoas só na cidade de Maputo. Em Inhambane e na cidade da Beira, a Operação Produção foi marcante também. Um grande número de pessoas foi levado da cidade para os campos, sem nenhuma notificação prévia, julgamento, ou apresentação de provas. A maioria dos campos se concentrava na região do Niassa , e o Estado da Frelimo usava o termo colonização para falar dessa operação. A idéia era tirar o excesso populacional da cidade e levar para regiões vazias, mas não foi só nessa região.
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ComCiência - Mas havia outro tipo de campo também, para prisioneiros políticos.
Thomaz - Sim. Outras pessoas foram enviadas a campos de prisioneiros políticos; aqueles indivíduos, claramente inimigos do regime, que no período em que já se sinalizava a independência cometeram o grande equívoco de se aliar aos portugueses. Há uma série de lideranças africanas que vão se destacar tentando construir uma opção à Frelimo, e que serão classificados como inimigos, tais como Joana Simão e Uria Simango, entre outros. Eles foram enviados para um campo de prisioneiros no Niassa, ao Norte de Moçambique e ali morreram.
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ComCiência - A Operação Produção tinha o objetivo de reeducar os delinqüentes, ociosos, mas tinha também uma função de gerar renda para o país?
Thomaz - A idéia era essa. Existia um expediente punitivo, mas havia uma idéia de fundo de produzir para as pessoas e para o país. No campo que eu trabalhei, por exemplo, eles produziam abóbora, feijão, vários gêneros alimentícios, só que não ganhavam. Era um trabalho escravo, e as pessoas viviam em condições inaceitáveis, muitos não agüentavam. Mas temos que perceber que isso tudo acontecia em meio a um caos que se instaurava no país. O primeiro ponto é a saída dos portugueses que foi bastante complicada porque eles controlavam o aparelho produtivo e burocrático do país. Eles controlavam as escolas e tudo mais. Um exemplo que eu sempre dou é que em 1974 havia 300 maquinistas em Moçambique e desses, somente um era negro. A saída dos profissionais brancos seja médico, burocrata, professor, maquinista, gerou um caos econômico no país, que precisava ser reorganizado.
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ComCiência - Sobre o seu trabalho com as famílias seqüestradas pela Operação Produção, como eles têm vivido depois do abandono dos campos?
Thomaz - No caso da região de Inhassune, eles têm as machambas, essas roças, e graças à Dona Ester, uma senhora que tinha muita experiência em comércio, anterior à Operação Produção, eles organizaram um mercado que se tornou um entreposto de produtos onde os camponeses vendem e encontram mercadorias importantes como óleo, sabão, açúcar, sal, e produtos para sua alimentação em geral. É uma vida bastante digna, não é uma vida miserável.
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ComCiência – E eles arrendam essas roças?
Thomaz - Até hoje a questão de terras é complicada, porque não existe propriedade privada em Moçambique. As machambas comunais não existem mais, foram abandonadas e essas pessoas que ficaram, fazem uso dessas terras abandonadas, reconstruíram suas vidas em torno disso, mas a terra pertence ao Estado. O que pertence às pessoas são as benfeitorias que forem feitas na terra, o que dá direito ao usufruto dessa terra. Para promover algum tipo de desapropriação de terras seria preciso contar com um mínimo de cumplicidade, de legitimidade por parte de algum setor da população. Não é qualquer um que vai tirar a população dali. No período logo após a independência, a Frelimo gozava de imensa legitimidade. Tinha ganhado uma guerra contra uma potência colonial européia, tinha apoio e simpatia da maioria da população moçambicana e do congresso nacional. Hoje em dia, a Frelimo e o governo não contam com o apoio da comunidade internacional, de quem dependem, que são os doadores, que prestam auxílio ao país, e nem têm apoio total da própria população.
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ComCiência - Quais são as reivindicações dessas pessoas que foram raptadas, levadas para os campos de produção?
Thomaz - As reivindicações não são claras. De forma geral, querem o reconhecimento do sofrimento pelo qual passaram. Existe a idéia de que “nós sofremos, foi um sofrimento injusto”, ou seja, “fui injustamente acusado de improdutivo, quando eu não era improdutivo, durante anos eu não tive vencimento” – salário – “e agora eu não tenho reconhecimento, nem um pedido de desculpas”. É muito interessante, conversando com eles, percebemos que não queriam dinheiro, uma indenização, a casa de volta. O que eles gostariam é que o atual presidente de Moçambique, Guebuza, fosse a Inhassune e pedisse perdão, pedisse desculpas pelo que aconteceu. Imagino eu que eles espram um reconhecimento público.
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ComCiência – Essas pessoas não falam em voltar para suas casas, para as cidades de onde vieram ou foram tiradas?
Thomaz - Não, eles consideram que houve uma ruptura. Afirmam claramente que há uma vida antes e uma depois da Operação Produção. Mais de uma vez falaram: “eu não recuperei a minha vida e não vou recuperar nunca”.
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ComCiência - Eles têm medo de sofrer esse tipo de agressão novamente?
Thomaz - Têm. Isso também repetem com freqüência, que não gostariam que isso ocorresse outra vez. O que indica que acreditam que existe essa possibilidade.
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ComCiência – Qual o papel dos intelectuais no processo de libertação de Moçambique e para dar visibilidade aos problemas do país? Essas histórias sobre os seqüestros, por exemplo, chegam ao grande público?
Thomaz – Sim, essas histórias são claras, mas não há uma história oficial do país. A Frelimo se nega a dar qualquer depoimento sobre a morte dos líderes políticos, mas não se tem um silêncio da parte do Estado. Algumas vezes eles fazem referência às lideranças. Mas todo mundo fala, a população comenta o tempo todo. E os intelectuais viveram esse período. No final da década de 80, o editor do principal jornal do país, Notícia, era o Mia Couto. Mas cuidado! Temos que entender que a Frelimo não é um bloco. Dentro do partido havia tendências, oposições, como hoje. Havia pessoas que olhavam a Operação Produção com verdadeiro horror. Há uma concentração de movimentos literários em Moçambique e essa intelectualidade nasce comprometida com a produção do país. Até hoje o compromisso deles – escritores, poetas, professores universitários – com o país é uma coisa extraordinária. Com maior ou menor encanto. Muitos sonharam que a revolução promoveria o fim da pobreza, e isso não aconteceu, o que gerou uma certa amargura. Mas se vê uma ligação muito forte dos intelectuais com toda a história do país.
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ComCiência - Você diria que Moçambique é um país democrático?
Thomaz – O país tem uma imprensa livre, muito mais livre que muitos outros países, comparável à África do Sul. Tem uma universidade livre também, onde é possível discutir praticamente todos os problemas com bastante liberdade, tem livre circulação, as pessoas podem sair e voltar. Tem eleições periódicas, que são mais ou menos honestas. O que não significa que não tenha conflitos, que não haja corrupção, crimes políticos. A questão é até onde chegam as instituições. A esmagadora maioria da população está no campo, não tem acesso a benfeitorias como água, luz. Para essas pessoas a palavra democracia não faz o menor sentido.
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ComCiência – Essa é uma história da África que deveria constar do ensino que se propõe para o Brasil?
Thomaz - O ensino da história da África é obrigatório hoje no Brasil, em diferentes níveis de ensino o que exige um esforço historiográfico sério, o que implica incorporar o trabalho de autores africanos e africanistas que estão trabalhando seriamente para recuperar uma história recente. Acho que temos que tomar cuidado no sentido de tratar apenas de uma África mitológica. Podemos tratar disso também, e é legítimo que os movimentos negros reivindiquem uma África mitológica. Mas, existe uma lei que tem que ser levada a sério e isso quer dizer não tentar fazer uma história de mocinho e bandido. A história da África é complicada, como de qualquer outro contexto. E não tem uma história da África, são histórias da África, são histórias nacionais e também regionais.
Por Simone Pallone In Com Ciência - SBPC/Labjor - Aqui !

4/04/08

Ronda pela net - Campos de reeducação: O silêncio cúmplice de Cavaco Silva...

Por José Pinto de Sá no blog "2+2=5" de 04/04/08, publicado por Armando Rocheteau às 21:12:
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De visita a Moçambique, Cavaco Silva perdeu uma excelente oportunidade de servir para alguma coisa. Além de descomprometido com a “esquerda”, tinha ainda a vantagem de ter pela frente a pessoa certa para tratar de um assunto que há décadas ensombra a história conjunta de Moçambique e de Portugal, a tal história do “cheiro a terra molhada e a temperos exóticos” (traduza-se: cheiro a cadáver e a trampa em geral). O dito assunto (os campos de reeducação, lembram-se?) é um dossier que continua por fechar. Aliás, continua por abrir. Cavaco podia tê-lo feito agora, é só lhe ficava bem. Teria dado uma excelente lição aos seus predecessores de esquerda. Mas não. Faltaram-lhe tomates, ou interesse, ou vontade política. Sucede que houve Operação Produção. Sucede que milhares de moçambicanos foram detidos e degredados sem qualquer julgamento. Sucede que na onda foram também muitos portugueses, e que, até hoje, nunca houve um sinal de arrependimento, um pedido de desculpas, ou uma reabilitação pública, já para não falar de indemnizações mais que justificadas. Armando Guebuza, actualmente Presidente da República de Moçambique, era na altura ministro do Interior, e foi o mentor do cambódjico processo, responsável directo por milhares de detenções sem culpa formada, e, pelo menos, centenas de mortes. Quer dizer: a pessoa certa para reabrir os arquivos, e informar de uma vez por todas quantos portugueses foram na leva, quais os seus nomes, qual o destino que tiveram, e, na pior das hipóteses, onde param os seus ossos. É chato, é macabro, mas há famílias e amigos que gostariam de ver este assunto arrumado. Pela minha parte, exijo a reabilitação da memória do anti-fascista e anti-colonialista português Virgílio David da Silva Faustino, meu grande amigo e companheiro de exílio, detido e deportado sem culpa formada. Sem culpa nenhuma, aliás. Cavaco optou pelo silêncio, e quem cala consente. É pena. Os moçambicanos, afinal as principais vítimas do monstruoso “processo reeducativo”, apreciariam por certo outra atitude do PR português, já que há muito aguardam em vão pela reabilitação dos seus “reeducandos”. Guebuza tem as mãos manchadas de sangue. Nada de estranho num dirigente africano, daqueles que o Ocidente patrocina e sustenta no poleiro. Só que, neste caso, também há sangue português, e Cavaco, se pretendia ser de facto o presidente de todos os portugueses, tinha obrigação de não se calar. Mas calou-se. Se existe de facto algo em comum entre Portugal e Moçambique não é o Eusébio nem o seu marisco favorito. Se existe um passado comum, é esse, o da tirania. E se existe um futuro comum, passa pela liquidação efectiva de heranças como a Operação Produção. O resto é demagogia, paternalismo e cobardia perante a História. O resto é m..r..a, em resumo.
  • Leia o texto original na íntegra Aqui !

2/15/08

A África emergente onde o Brasil vai lucrar bilhões...

(Clique na imagem para ampliar)
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Interessante artigo de Lena Pinheiro publicado na revista "Isto É - Dinheiro - Caderno Economia" (Brasil) de 08/02/08:
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A ÁFRICA ESTÁ BOMBANDO. E O BRASIL VAI LUCRAR BILHÕES.
O continente cresce acima da média dos emergentes, atrai investimentos e muitas empresas brasileiras estão atentas ao despertar desse grande mercado.
A região não costuma estar no radar de grandes bancos de investimentos nem pertence ao BRIC, bloco criado pela Goldman Sachs para indicar os países emergentes mais promissores – entre eles, o Brasil. Muitas vezes, é lembrada apenas por epidemias, guerras civis ou massacres étnicos. Só que essa é a velha África, historicamente marginalizada pelo Ocidente. Há uma outra que se desenvolve num ritmo alucinante, sendo liderada por Angola, que cresceu 25% em 2007. Na média, o PIB da África vem avançando cerca de 5% ao ano, desde 2004. As exportações, puxadas por minérios e petróleo, têm crescido 28% ao ano e vários países, com fartos superávits comerciais, estão colocando em marcha grandes programas de investimento na área de infra-estrutura. As empresas brasileiras, naturalmente, estão atentas ao despertar da África. Na semana passada, executivos da Camargo Corrêa estavam em Moçambique finalizando o contrato para a construção de uma das maiores usinas hidrelétricas da região, a Mphanda Nkuwa, um projeto orçado em US$ 3,2 bilhões. “Há um forte ciclo de desenvolvimento ocorrendo na África e o Brasil está aproveitando essa maré via investimentos diretos e exportação”, analisa o empresário Roberto Giannetti da Fonseca, diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp.
Os investimentos brasileiros na região têm contado com apoio oficial. Ao anunciar uma linha de crédito de US$ 1 bilhão para Angola, no fim do ano passado, o presidente Lula afirmou que o Brasil deve “ter uma participação mais forte” na região. Já na iniciativa privada, o trabalho é intenso. A Petrobras e as construtoras Camargo Corrêa e Norberto Odebrecht investem juntas bilhões de dólares no continente para garantir presença em suas mais importantes obras. A identificação cultural e lingüística facilita a aproximação. Na Norberto Odebrecht, onde a África já é a terceira maior fonte de receita, com peso de 13,77%, um dos projetos que mais chama a atenção é a construção do Terminal de Contêineres de Doraleh, no porto de Djibuti. A obra de US$ 300 milhões une trabalhadores de 16 nacionalidades, dentre brasileiros, africanos e indianos. “Por muito tempo, o Ocidente não soube como tratar a África”, diz Roberto Dias, diretor da construtora. “A China os colocou no colo e isso fez o Brasil finalmente acordar.”
A maior estatal nacional, a Petrobras, é uma das maiores investidoras na região, com planos de aplicar US$ 1,3 bilhão somente em Angola e na Nigéria até 2012. Angola, vale dizer, já produz mais petróleo do que o Brasil e é sócia da Opep, a organização dos países exportadores.
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PIB DE US$ 1,2 TRILHÃO JOGA LUZES SOBRE O CONTINENTE ESQUECIDO.
Se os investimentos diretos estão em alta, a balança comercial está igualmente favorável. Dados de 2006, indicam um recorde na corrente de comércio entre Brasil e África, de R$ 32,3 bilhões, uma evolução de 153% em relação ao ano anterior. A complementaridade das economias explica parte do avanço, mas o crescimento da classe média local é, de fato, o grande motor da expansão brasileira em países como a África do Sul. Conhecida como “Black Diamonds”, a classe média sul-africana cresceu 30% no ano passado e consome cerca de US$ 25 bilhões anualmente.
“Esse grupo está demandando como nunca celulares, automóveis e outros bens de consumo”, afirma o professor da Unicamp, Adalto Roberto Ribeiro. Só na região metropolitana de Campinas, o número de empresas que passaram a exportar para algum país africano saltou de 63, em 2001, para 131, em 2007. O melhor é a qualidade. “Nossa pauta de exportações para lá é basicamente de manufaturados”, diz Maria Paula Velloso, diretora da Apex, a agência de promoção às exportações, que encabeça projetos para que essa boa maré esteja também ao alcance de pequenos e médios empresários brasileiros.
Lena Pinheiro - Isto É - Dinheiro.

11/10/07

A ÁFRICA de Sebastião Salgado.

Sebastião Salgado e a natureza intocada - Em um novo livro sobre três décadas de reportagens na África, o fotógrafo brasileiro revela imagens impactantes da fome, das guerras e a transição de seu olhar dos grandes dramas humanos para a natureza.
Foi plantando árvores na Mata Atlântica que Sebastião Salgado despertou para fotografar a natureza.
Em trinta anos de carreira retratando o sofrimento humano, ele virou embaixador da Unicef, ganhou dez prêmios internacionais e foi consagrado como um dos fotógrafos mais importantes do mundo.
Essa semana, Salgado lançou no Brasil o livro África, com suas primeiras fotos de natureza.
As imagens mostram que ele ainda é capaz de surpreender também pela técnica de fotografar em preto e branco.
De sua fazenda em Minas Gerais, onde coordena um projeto ambiental, ele falou a ÉPOCA sobre sua relação com o continente africano, a questão ambiental e seu último grande projeto: o Gênesis.
Leia a íntegra do texto de Juliana Arini com a entrevista de Sebastião Salgado, aqui .

10/20/07

BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas...III História e Lendas.

(Clique na imagem para ampliar - Foto retirada do álbum de "Andre M. Pipa")
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A Baía de Pemba
A baía de Pemba, a 13o 00’ Sul e 40o 30’ Este da costa de África, é vulgarmente considerada a terceira maior do mundo, sendo a primeira a de Guanabara no Brasil seguida da de Sidney na Austrália.
As suas águas ondeando tons, ora azuis ora verdes, apresentam-se mansas em dias de bom sol e agradável tempo mas também escarpadas, rugindo de encontro aos rochedos ou regalando pela areia quando os ventos sopram furiosos do Sul.
Este ventos mais conhecidos na região por “kussi” originam, não raras vezes centros depressionários bastante fortes do tipo tropical que arrasam quase por completo a cidade.
O mais antigo temporal que a documentação disponível nos pôde recordar data de 18 de Dezembro de 1904 que causou vários danos assim como levou ao afundamento um pequeno vapor e um iate.
É feita referência nessa altura à falta de faróis ao largo da baía, sendo o único o da ponta Said Ali que, para além de ter somente 6 milhas de alcance e não 9 como indicavam as cartas de então, não era aconselhável aos navios que passassem no alto mar.
Outro grande temporal devasta Pemba em 1914, destruindo pratica­mente todas as habitações e provocando grandes embaraços aos serviços da Companhia.
Estes ciclones assolam de tempos a tempos a região de Pemba, tendo o mais recente ocorrido em 1987.
Em sua extensão a baía de Pemba atinge os valores de 9 milhas de Norte a Sul e 6 de Leste a Oeste, perfazendo um perímetro de 28 a 30 milhas.
Mas não só por isso ela goza de tal fama como também pela pro­fundidade do canal de acesso e do porto, com sondas que variam entre 60-70 metros na entrada e 10-40 na parte média, para atingir os 25 metros no fundeadouro junto ao cais diminuindo em direcção á costa.
A sua entrada é, pois, franca a qualquer tempo e hora, podendo nela penetrar à vontade navios até cerca de 6 metros de calado.
No entanto, devido a alguns perigos isolados formados por rochas e bancos de coral, é necessária a pilotagem para os navios de alto mar.
A boca de entrada a partir da qual é feita a pilotagem é delimitada a Norte pela ponta Said Ali e a Sul pela ponta Romero, havendo actualmente farolins em ambos os lados.
Desaguam na baía alguns pequenos rios sendo o maior o Meridi cuja foz desemboca nas proximidades do baixo Mueve.
A baía de Pemba constitui, sem dúvida, um porto natural bastante seguro e, apesar de tudo, abrigado dos temporais regionais, tendo sido qualificado por Elton - Cônsul britânico em Moçambique a finais de 1890 - como "O melhor desde Lourenço Marques a Zanzibar”.
Alguns autores supõem que a baía de Pemba possa ter tido uma origem vulcânica, baseando-se no facto de ali se encontrar com abundância a "pedra pomes" própria de rocha vulcanizada.
Mas a sua constituição calcária e não basáltica vem a contradizer tal suposição.
Das origens do nome pouco mais se sabe do que as escassas informações recolhidas da tradição oral, algumas das quais baseadas em lendas, e deve tomar-se em consideração que a designação de Pemba para nome da região não foi a única ao longo dos tempos.
Em anos muito recuados da nossa história a baía de Pemba era frequentada apenas por alguns pescadores malgaches e swahilis que em suas pequenas lanchas e pangaios arrecadavam o alimento sem nunca ali se fixarem.
Conta então uma antiga lenda que por essa altura uma de tais embarcações apanhadas por um temporal naufragou tendo como sobrevivente uma mulher que se viu obrigada a procurar algum refúgio nas proximidades da baía.
A mulher importante (“nuno” em língua local ) conseguiu sobreviver e montar ali a sua guarita.
Naturalmente conotada a "Nuno" pelos pescadores como "mensageira divina" demonstrando que a zona poderia ser perfeitamente habitada, ela fê-los seguir o seu exemplo.
Nasce a zona de Nuno pelo qual foi conhecido por longos anos o actual bairro do Paquitequete.
Mais tarde viria a anexar-se a esta designação a expressão “pampira” (no sitio da borracha) em virtude da grande quantidade da árvore da borracha que no local nascia espontaneamente.
A região servida pela baía de Pemba foi também já conhecida por Mambe expressão que pode simultaneamente significar quantidade e longitude.
Embora certos autores relacionem “mambe” à baía de Pemba, a região a que a administração colonial designa por esse nome se situa mais a norte, no distrito de Macomia.
Uma outra tradição oral refere que um europeu, em data também não precisa, proveniente de Zanzibar faz desembarcar na baía os indígenas que o acompanhavam e, estes, vendo-se assaltados por grandes enxames de moscas gritavam dizendo “pembe” que em swahhili significa mosca.
Teria sido mambe, pembe ou outra a origem da expressão "Pemba" no território moçambicano, certo é que ela figura nas primeiras cartas inglesas como "Pembe Bay”.

10/18/07

BAÍA DE PEMBA - A mais bela entre as belas...II

(Imagem original daqui)
A mais bela do mundo?
Jerôme Bignon é o francês que está à frente da robusta, mas menos conhecida organização que agrupa as baías mais belas do mundo, uma espécie de magnatas que ao mesmo tempo que defendem o usufruto das condiçoes naturais e turísticas que a natureza oferece nas costas marítimas, fazem-no igualmente para que tal não resulte na destruição do ambiente e por aí vão, de ano a ano, descobrindo mais locais do mundo que reúnam os requistos que o clube defende.
O Clube das Mais Belas Baías do Mundo é uma agremiação que vai para lá da beleza genuína das baías. Comporta outros requisitos muito rigorosos, sobretudo em relação àquilo que os homens fazem da natureza, o ecossistema marinho ou terrestre e a candidatura de qualquer baía ao clube, é sempre seguida de muitos “lobies” que noutros casos são dirigidos pelos governos e até utilizando vias diplomáticas.
A baía de Pemba, candidata a partir do dia 6 deste Outubro, não precisou de se apresentar pela mão do Governo, mas sim, via sociedade civil, a partir de um trabalho que já vinha sendo feito, há cerca de ano e meio, que encontrou acolhimento no “Cabo Delgado em Movimento”, uma organização dos naturais e amigos daquela provincia setentrional do nosso país.
Quando chegámos a Imbituda, na madrugada do dia 6, precisamente na Praia do Rosa, os moçambicanos que haviam ido preparar o terreno encontravam-se a reler os documentos que traziam e que à tarde do mesmo dia seriam apresentados ao Quarto Congresso do Clube das Mais Belas Baías do Mundo, em forma de candidatura.
Era preciso usar todos os meios disponíveis e ao alcance para convencer os seus constituintes.
Ia ser apresentada ao clube a baía de Pemba, uma das maiores do país, provavelmente uma das mais profundas e amplas do mundo, que chega a atingir cerca de 52 metros de profundidade, com uma área aproximada de 150 quilómetros quadrados, com uma diversidade de ecossistemas, como estuários, mangais, tapetes de ervas marinhas, praias arenosas e rochosas, recifes de corais e terras húmidas.
Moçambique levou para o Brasil a população de Pemba, heterogénea, como é, através de pequenas obras de arte e cultura dos macua, maconde e muani, junto às suas religiões, a sua gastronomia e disse aos congressistas que 30 porcento dos habitantes de Pemba são dependentes de recursos costeiros.
Foi necessário dizer ao mundo, através do Clube das Mais Belas Baías que a de Pemba, há muito que é admirada, tal como há muitos anos Coutinho escreveu dizendo tratar-se duma espléndida baía que está entre aqueles dois empórios comerciais (Zanzibar e Moçambique) em excepcionais condições geográficas e em circunstâncias tais que aproveitadas convenientemente, terão o exclusivo tráfico do Tanganhica-Niassalândia.
A delegação moçambicana ao Congresso das Mais Belas Baías do Mundo foi dizer tudo sobre Pemba.
Que estando em Moçambique o seu clima é obviamente tropical e que a temperatura anual do ar é de cerca de 25 graus centígrados, um clima que sofre a influência da zona de baixas pressões equatoriais, com prevalência de ventos monsónicos de Nordeste durante o Verão no sul e norte e ventos de Sudoeste durante o Inverno, no sul.
A equipa técnica da apresentação da candidatura ficava durante largas horas incomunicável, com o Dr. Kwasi Agbley, sempre a ensaiar e do outro lado o general Alberto Chipande, presidente da Associação dos Naturais e Amigos de Cabo Delgado, usando o tacto diplomático de que não se lhe conhecia, desdobrava-se em contactos com as delegações de países que já têm as suas praias no Clube das Mais Belas do Mundo.
“Havemos de conseguir, todos estão do nosso lado” dizia amiúde Alberto Chipande, sempre que o “Notícias” se aproximava dele para lhe “medir a temperatura”, cada vez que o tempo se aproximava do acto esperado.
Agostinho Ntauale, presidente do Município de Pemba, que trazia da sua cidade uma mala enorme de objectos de arte e diversa documentação sobre a baía candidata, foi quem abriu a apresentação, pedindo que se distribuissem aos congressistas as pastas que continham a informação relevante sobre a baía.
Afinal, eram pastas forradas de capulanas de diferentes cores, com esferográficas guarnecidas de pau-preto e outros tipos de madeira.
Foi a primeira sensação de que se estava perante um país diferente!
Ntauale solicitou aos presentes para não perderem a oportunidade de chegar à baía de Pemba para se certificarem do que os documentos diziam, nomeadamente que se tratava duma porção de terra que é bela desde a sua existência, mas que não se encontrava no clube, simplesmente porque situações adversas fizeram com que Moçambique só mais tarde se apercebesse da sua existência.
Muito lacónico, apresentou a delegação moçambicana, tendo salientado o nome do general Chipande, a quem pediu para que se dirigisse aos presentes.
Igualmente de poucas palavras, este não escondeu o facto de ter sido, por muito tempo guerrilheiro, durante a luta e libetação de Moçambique e aproveita esse facto para aliá-lo à necessidade de fazer um turismo sustentável, não destruidor, que respeite a natureza, um dos ditames mais presentes no Clube das Mais Belas Baías do Mundo.
“Nós que estivemos durante muito tempo no mato, como gurrilheiros, na luta pela nossa independência nacional, sabemos quanta importância tem a natureza, que não pode ser destruída em nome do turismo ou do desenvolvimento” disse, aplaudido.
Entrementes, Alberto Chipande acabou sendo invadido por abraços dos congressistas, que se estenderam à toda delegação moçambicana, a quem depois se lhe distribuiu os certificados de participação no quarto congresso.
“Já recebemos e dentro de algum tempo havemos de seguir os trâmites normais para a apreciação da candidatura de Moçambique” garantia Jêrome Bignon, presidente do Clube Mundial das Mais Belas Baias.
José Roberto Martins (Beto), presidente do município (prefeito) de Imbituda, onde se localiza a Praia do Rosa, que acolheu o congresso, disse falando ao “notícias” que “faremos tudo o que estiver ao nosso alcance para que Moçambique, através da baía de Pemba, se junte a este clube”.
Portugal, que já tem a baía de Setúbal no clube, falou através do seu chefe da delegação manifestando a sua predisposição em apoiar Moçambique, e falando à nossa Reportagem disse: acho que Moçambique tem belas praias, melhores do que esta onde estamos reunidos, por isso não vejo qual vai ser a dificuldade de aceitar a sua candidatura e eventual aprovação.
Quando quisemos saber do chefe da delegação portuguesa a razão da candidatura de Setúbal em detrimento da mais famosa baia do Algarve, respondeu: Algarve está completamente ocupada, está toda construída, não temos hipóteses de juntar a sua beleza à necessidade de defender o ambiente.
TAREFA SEGUINTE É DOS RESIDENTES DE PEMBA
Era o momento em que tudo de bom devia ser dito.
Que oferece aos turistas um leque de opções que vão desde as danças tradicionais música contemporânea, passando pelo teatro, prática de desporto e mesmo um animado carnaval.
Que o porto de Pemba começa a ser um ponto de referência para cruzeiros internacionais.
No cais são recebidos por qualificados guias turísticos que lhes proporcionam uma agradável visita à cidade.
Por seu turno, o Aeroporto Internacional de Pemba recebe turistas vindos dos quatro cantos do mundo.
Actualmente, tem ligações directas com o aeroporto de Nairobi, Quénia, Dar-Es-Salaam, na Tanzania e Joanesburgo, África do Sul, esperando-se que brevemente seja ampliado para aumentar as opções dos visitantes.
Estes factos podem, entretanto, não ser suficentes se a metalidade das populações locais não mudar quanto ao seu posicionamento em relação à natureza e uma das importantes formas de conservação da diversidade marinha e costeira é a criação de áreas de protecção.
Os consultores avançam em estratégias mais efectivas de protecção da saúde da baía de Pemba e o incremento da consciência, percepção e uso adequado dos recursos, para o que propõem o desenvolvimento de campanhas de protecção da baía para além da advertência aos turistas sobre artigos a comprar aos vendedores.
Aqui pretende-se chamar à atenção dos turistas a não adquirirem produtos de venda ilegal, como seja artigos produzidos na base de carapaças de tartarugas ou corais, entre outros.
O presidente do Conselho Municipal de Pemba, abordado para se pronunciar à volta da aceitação da candidatura da baía do seu município disse que o passo seguinte é sensibilizar o país em geral e os residentes de Pemba, em particular, sobre quanta responsabilidade recai sobre si, imediatamente a seguir, com vista a fazer com que definitivamente a baía conste da lista das mais belas do mundo.
“Temos que fazer muito nos próximos tempos vamos ser visitados pelo presidente do Clube das Mais Belas Baías do Mundo. Ele vem confirmar o que dissemos na nossa apresentação. Teremos que tornar a presença dele em momento de festa. A população de Pemba, terá que voltar a manifestar a sua hospitalidade e carinho com os seus hóspedes. Estamos a entrar para uma fase de prova da nossa própria seriedade”.
Agostinho Ntauale acredita que o seu mandato vai encerrar com a vitória que vai significar a colocação de Pemba naquele grupo de baías mais belas do mundo.
Há muitos interesses em jogo, desde o facto de o clube ser reconhecido internacionalmente como robusto do ponto de vista económico, como pelo prestígio que goza, como fundamentalmente o facto de as baias mais belas poderem ser consideradas pela UNESCO locais a conservar e, em face disso, serem futuramente declaradas Património da Humanidade.
Alberto Chipande disse que os moçambicanos, particularmente os naturais de Cabo Delgado e, sobretudo os residentes da cidade de Pemba, são chamados a vencer mais esta batalha, numa nova frente, de luta pelo desenvolvimento.
“Esta é outra frente que temos que vencer. A tal independência económica que a politica sempre pretendeu trazer também passa por estas iniciativas. A “CD em Movimento” vai se empenhar para que isso dê certo. Temos que ter a importância que temos, que representamos, mas com coisas concretas”.
PEDRO NACUO - Maputo, Quinta-Feira, 18 de Outubro de 2007:: Notícias

9/07/07

Rui Paes (de Pemba) entrevistado pelo Expresso.

Rui Paes: pinto, como e durmo
Rui Paes, o pintor que ilustou um livro infantil de Madonna, fala de si, da sua vida e do seu trabalho:
Rui Paes estava sentado no chão da Galeria Municipal de Matosinhos, às voltas com um banco de madeira. «É como a Paixão de Cristo», sorriu. Dos pregos saía uma tinta avermelhada. «Isto interessa-me: a nossa inabilidade para o sangue», acrescentou. É este, então, o português que ilustrou o livro de Madonna. No I Simpósio Internacional de Pintura, realizado em Matosinhos, Rui Paes crucificava um banco de madeira. A entrevista começou ao contrário: foi o pintor que se atreveu ao diálogo. Esta foi a resposta à pergunta que não houve: Faço pintura mural e, porque tem de ser, procuro que as formas sejam correctas, ou, mais importante, que se adaptem ao espaço arquitectónico, porque senão a ilusão não funciona, contradiz-se e desfaz o efeito. A disciplina mental é importante. A exactidão tem uma disciplina mental. Utiliza um sistema que não é um sistema fixo, único, mas que se adapta às circunstâncias, como agora aqui, em Matosinhos. Eu vinha com uma ideia: a de que Matosinhos era uma cidade de pescadores, e tinha criado uma imagem em relação a essa ideia. Mas quando cheguei cá alterei completamente tudo, porque preferi começar a absorver aquilo que me foi dito, aquilo que vi e aquilo que percebi e transportar isso para a pintura. Em vez de forçar o meu tema e sobrepor a esse tema uma coisa extemporânea, decidi alterar a ordem: deixar que a cidade me dissesse o que quis dizer e que eu pusesse na tela aquilo que ela me quisesse dizer.
E o que é que a cidade lhe disse, até agora?
Imensas coisas. Fiquei espantado com a quantidade de lendas, com a religiosidade do sítio!
Como é que surgiu a ideia deste banco que estava a decorar? Disse-me que tinha a ver com a nossa inabilidade para o sangue.
Em Inglaterra, onde vivo, a religião oficial é mais despojada, com uma imagética muito mais despojada do que a nossa. Eles têm pavor àquelas imagens da tortura, àquela fase em que Cristo é sentenciado e castigado. Essas imagens não aparecem muito nas igrejas protestantes, também porque são muito mais austeras, muito mais limpas - em Inglaterra, sobretudo. Esse foi um dos aspectos que sempre me interessou muito na religião: o aspecto gráfico do sofrimento. E o sofrimento pode ser físico, emocional, intelectual. Somos quatro pintores, no encontro em Matosinhos e a cada um foi oferecido um banco pequenino de pinho para decorarmos. (Ainda por cima pinho, que é a ideia da madeira da cruz... embora eu não saiba qual foi a madeira usada na crucificação.) Eu gostei muito da Igreja do Senhor de Matosinhos. Gosto muito da arte do período barroco e, quando me foi sugerido que decorasse o banco, que o pintasse, não pude deixar de pensar nisso, no corpo branco de Cristo depois de torturado, depois de chicoteado. Esta é uma imagem que faz parte da pintura clássica. Achei que o banco só podia ser aquilo: símbolo mesmo da Paixão de Cristo e da entrega do pintor, da entrega do artista ao seu trabalho, que também é total.
Em que medida é que relaciona a Paixão de Cristo e essa entrega à arte? Não tem a ver com o sofrimento pelos outros...
Não, não, pelos outros nunca. É sempre por nós próprios, pelo nosso trabalho. Mas é o exercício de uma solidão absoluta. A pintura é o exercício da extrema solidão. E eu gosto de estar sozinho comigo, foi-me dada essa grande dádiva. O meu trabalho é o meu companheiro, e eu estou bem com ele. Fecho-me no ateliê e esqueço-me.
Como é a sua vida em Londres?
Divido o meu tempo entre Londres e o campo. Tenho um ateliê em Londres e um ateliê ao pé de Cambridge, onde passo muito tempo. Mas é uma vida assim: pinto, como e durmo. Hoje, faço muito menos jardinagem. Tenho andado desligado das plantas. Mas lá ponho umas camélias de vez em quando. É uma vida muito tranquila.
Ainda continua a pintura mural, a intervenção nos castelos?
Agora vou fazer um projecto com um colega inglês para um cliente de Munique. Inclui elementos de arquitectura e escultura de um castelo que o cliente tem, mas isto é para uma casa de cidade. Ele quer trazer para a cidade aspectos de paisagem, arquitectura e escultura da outra propriedade do campo, e o trabalho vai ser baseado nesse tema. De resto, tenho andado à volta do livro que estou a fazer para o São Carlos ver caixa e a desenvolver também ideias à volta de um cavalo que me apareceu há 20 anos, um cavalinho que encontrei em França, em Aix-en-Provence.
Conte-nos melhor essa história do cavalo.
Numa viagem que fiz, há 20 anos, apareceu-me um cavalinho branco no chão, numa ponte, e eu guardei-o sempre. Um dia, reencontrei-o e disse: isto está a querer dizer-me qualquer coisa. É um trabalho pessoal, uma brincadeira que estou a fazer e que me está a divertir muito. É este o projecto em que estou envolvido em termos de pintura de cavalete: desenvolver uma imagem ligada a conceitos, a palavras... É mais um jogo de língua e actividade. As palavras que estão escritas na tela definem a acção do cavalo. Elas não estão escritas foneticamente correctas, mas soam como a ideia que quero passar. Apetece-me brincar com os ingleses! Eu gosto muito de línguas. Gosto muito da língua inglesa, conheço-a bem, é irresistível. Gosto das palavras. Não leio tanto como gostaria. Escrevo algumas coisas. Não sou um estranho às palavras, mas acho que as palavras têm de ser as palavras exactas.
Que diferença sente entre pintar uma tela e pintar um interior, um muro?
É um bocado como a ilustração. As pessoas não entendem que um pintor é um pintor. Um pintor pinta. Pode fazer ilustrações para um livro, pode fazer pintura mural, pode fazer pintura de tela, pode fazer o que quiser. O que ele teve foi anos - seja de vida, seja de aprendizagem académica - que foram desenvolvidos à volta da pintura, do trabalho com tinta, com a expressão plástica. Por isso, eu estou a pintar sempre. Um músico e um pintor, nesse aspecto, não são muito diferentes. Um músico pode ser um intérprete e pode ser um compositor. O pintor também. Quando estou a ilustrar um livro, estou a seguir um guião, a interpretar um tema que me é oferecido, e estou a tentar alargar o espectro simbólico, significativo, do tema. Estou a interpretar, como um violinista poderá interpretar uma peça. Quando estou em frente a um cavalete, estou a compor. Mas continuo a trabalhar na mesma área.
É a diferença entre trabalhar uma imagem que é sua ou uma imagem de outra pessoa?
Que me é fornecida pelas palavras de outra pessoa. Se for o caso da pintura mural, é uma questão de orquestração. O pintor é um orquestrador. Eu orquestro quando faço pintura mural, porque tenho de incluir elementos que me são sugeridos, que me são exigidos, alguns. Tem de ter este aspecto, tem de ter aquele, não gosto de macacos, não faça um macaco a sorrir porque mete impressão...
No caso do livro da Madonna, o macaco foi uma das razões do encontro. Ouvi uma história que envolvia um macaco, a Madonna e o Rui Paes...
Sim, sim. [risos] A Madonna chegou a mim por causa de um castelo na Noruega, mas sobretudo por causa dos macacos que eu lá pintei. Quando me fizeram a proposta de pintar o «hall» de entrada, achei que, pelos elementos que a sala apresentava, o mais bonito era fazer uma coisa à chinesa do século XVIII, mas divertida. Quis fazer uma «singerie», uma macaquice. Os editores viram aquele trabalho no «New York Times» e pensaram: isto é uma possibilidade. Fizeram-me uma proposta, e eu fiquei muito interessado com o projecto. Quando a história chegou, pareceu-me difícil, mas li, reli e comecei a percebê-la. Emocionou-me, porque definia bem como é possível ser-se generoso, e entreguei-me ao projecto.
Como reagiu o seu filho quando lhe contou a novidade? Gostava de saber como é que se chega a casa e se diz que se vai ilustrar um livro da Madonna.
Eu pedi-lhe que ele adivinhasse. Disse-lhe que ia trabalhar com uma cantora mais da minha geração... Ele acertou à terceira.
Já o tinha em muito boa conta.
Ele é muito sóbrio. Ficou contente, mas é uma pessoa muito sóbria. Eu estava no Rio de Janeiro quando recebi a notícia de que a Madonna tinha dado o OK e devo dizer que dei pulos. Estava sozinho no quarto de hotel e fiz aquelas coisas que só se vêem nos filmes.
Nos filmes salta-se em cima da cama...
Exactamente! [risos]
Chegou a conhecer a Madonna?
Sim, mais tarde. Falámos ao telefone e na apresentação do livro apresentámo-nos um ao outro. Ela é uma mulher lindíssima, não tem nada a ver com as fotografias. Ao vivo, é uma pessoa muito bonita e tem uma aura muito boa, projecta uma luz clara.
Em que lugar é que se encontra hoje? De regresso ao figurativo?
Eu nunca deixei de pintar figurativo. Mesmo quando pintava as grandes telas vermelhas. Quando saí de Portugal, o meu processo de criação tornou-se cada vez mais limpo, mais despojado, mais austero. Quando tive oportunidade de, pela primeira vez na vida, pintar oito a dez horas, no mestrado, isso deixou-me inquieto. O projecto definiu-se a si próprio, mas foi um projecto de limpeza, ligado a uma certa espiritualidade. O despojamento da pintura indicava o processo do meu próprio despojamento. Passei os primeiros meses no Royal College a mandar embora do meu pensamento as pessoas que interferiam, as vozes que interferiam. Foi mesmo um processo de limpar.
Mas essas vozes...
Eram vozes portuguesas.
Tinham a ver com os mestres, com a sombra de outros criadores, ou eram vozes pessoais?
Era toda a gente. Quis libertar-me das interferências: limpar, coar, polir, até poder estar só comigo. Os primeiros meses do mestrado foram feitos assim, e a pintura acompanhou tudo isso. Acabei por pintar grandes áreas com contentores vazios dentro delas. Foi mesmo um processo de limpeza, de limpeza espiritual, emocional.
Lembra-se de como era antes de pintar? Lembra-se do processo?
A primeira pintura a sério que fiz foi quando tinha sete ou oito anos. Foi o Deus nas nuvens do Rafael, a guache. Havia um livro escolar que na contracapa tinha uma pintura cuja parte superior era Deus e as nuvens com dois anjinhos. Eu gostava tanto daquilo, e era assim que eu queria pintar!
Com essa pureza?
Assim, tão bem! [risos]
In- Expresso - Entrevista de Filipa Leal, Fotografia de Bruno Barbosa
Rui Paes nasceu em Moçambique (Pemba), em 1957. Terminou o Curso de Artes Plásticas da ESBAP em 1981. Em 1982 recebeu o Prémio Revelação Arús. Fez o mestrado em Pintura no Royal College of Arts como bolseiro da Gulbenkian. Foi premiado com uma bolsa da Beal Foundation, de Boston. Em 1990 realizou cinco Retratos Monumentais para os cenários de Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett, no Bayliss Theatre, em Londres. Tem executado pintura mural na Alemanha, Egipto, França, Inglaterra, Líbano, Noruega e Portugal. Vive e trabalha em Londres. Foi um dos convidados do I Simpósio Internacional de Pintura de Matosinhos. Ilustrou o livro infantil de Madonna Pipas de Massa e ultima as ilustrações para o livro O Fantasma Trezmelenas, de Alice Vieira, onde se conta às crianças a história do Teatro São Carlos.
Rui Paes no ForEver PEMBA - aqui-2 , aqui-3 , aqui-4 , aqui-5 , aqui-6 , aqui-7 , aqui-8 , aqui-9, aqui-10, aqui -11 e aqui-12

6/30/05

O vento do tempo...

Um mistério por decifrar - Um segredo bem guardado: O que se passou no Angoche? A 26 de Abril de 1971 o navio Angoche é encontrado à deriva na costa de Moçambique, sem vestígios dos seus 22 tripulantes e do seu único e não identificado passageiro, um mistério que persiste até aos dias de hoje. Segundo um relatório preliminar, de um agente da PIDE: «O navio Angoche levava material para a nossa Força Aérea, material sofisticado, essencialmente material explosivo, bombas para os aviões, etc, e creio que ia para Porto Amélia. Soubemos que o Angoche foi abordado em 23 de Abril de 1971 por um submarino da União Soviética e que os seus tripulantes foram levados para a Tanzânia, para a base central da Frelimo, Nachingwea e, mais tarde, executados... havia manchas de sangue em vários pontos do navio... fala-se que houve oficiais da Marinha Portuguesa, hoje oficiais generais, que estariam envolvidos nisso». Para adensar o mistério, o relatório oficial, detalhado e secreto, conservado na DGS-PIDE em Lisboa, desapareceu após o golpe militar Lisboeta de 25 de Abril de 1974. Do http://joaogil.planetaclix.pt/lou1.htm
Navio Angoche
Tipo - Navio de carga
Construtor - C.U.F. - Companhia União Fabril
Local construção - Estaleiro Naval da A. G. P. L. - Lisboa
Ano de construção - 1958
Registo - Capitania do porto de Lisboa, em 11 de Junho de 1958, com o número H 456
Sinal de código - C S A H
Comprimento fora a fora - 81,67 m
Boca máxima - 11,82 m
Calado à proa - 3,75 m
Calado à popa - 4,33 m
Arqueação bruta - 1.689,32 Toneladas
Arqueação Líquida - 884,10 Toneladas
Capacidade - 2.834 m3
Porte bruto - 1.543 Toneladas
Aparelho propulsor - Um motor diesel, de 6 cilindros, construído em 1957 por Klockner-Humboldt-Deutz A. G., em Colónia - Alemanha.
Potência - 915 cavalos
Velocidade máxima - 11,5 nós
Tripulantes - 39
Armador - Companhia Nacional de Navegação - Lisboa
DIÁRIO DE NOTÍCIAS – 21 de Maio de 1971
Conferência de Imprensa na S.E.I.T.
O DRAMA DO “ANGOCHE” – nem abordagem nem rapto
O caso do cargueiro “Angoche”: não houve abordagem nem rapto
O caso do navio costeiro “Angoche” foi alvo das atenções de um diário da capital e de uma emissora de Moçambique. As perguntas formuladas tiveram as respostas concretas que se se seguem:
- Confirma-se o último comunicado da Repartição do Gabinete do Governador-Geral de Moçambique dado a público em 13 do corrente.
Foi colocada a bordo uma forte carga explosiva que destruiu os órgãos vitais do navio e os meios principais de salvamento (baleeiras e jangadas).
Admite-se, como se diz no referido comunicado, que alguns tripulantes tenham sido vítimas da explosão. Ignora-se a sorte dos restantes, mas o exame pericial feito a bordo fez supor que tenham tentado salvar-se utilizando bóias e cintos de salvamento. Continuam a efectuar-se buscas quer em terra, quer no mar, com vista a detectar quaisquer vestígios de elementos da tripulação, até agora sem resultado.
As autoridades competentes tomaram as providências necessárias para, na medida do possível, se evitar, de futuro, outro caso semelhante.
O Comandante-chefe de Moçambique informou que vai estudar-se e pôr-se em vigor a protecção aos principais navios que operam na costa de Moçambique. Com efeito, foram reforçadas as medidas de vigilância e segurança já existentes na parte que é da jurisdição da Marinha.
Acerca das diligências diplomáticas efectuadas no sentido de se averiguar ao certo se a tripulação do “Angoche” foi levada para a Tanzânia, confirmou-se que têm sido feitas todas as possíveis, designadamente através da Cruz Vermelha Internacional, infelizmente sem qualquer resultado.
Até agora não há indícios de que os tripulantes do “Angoche” tenham sido transportados para qualquer país.”
Não houve, portanto, nem abordagem nem rapto. Quando o navio largou de Nacala, já levava a carga explosiva – uma bomba de plástico com mecanismo de relógio. - Fonte "ANGOCHE"