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5/04/10

Retalhos - De Porto Amélia a Pemba: FAROL MARINGANHA


HISTÓRIA DE PORTO ÀMELIA - FAROL MARINGANHA - IV A GENTE E A SOCIEDADE

A população de Pemba é bastante heterogénea, tendo para lá emi­grado do interior os macuas, os ngonis ou mafites e os macondes.

Do litoral, os nguja do Tanganica, os sacalaves do Madagáscar e os mujojos das Comores. A civilização europeia, particularmente a trazida pelos portugueses é também notória, já que ali a colonização assimilou grande parte da população, mesmo a não mista.

Nas regiões circunvizinhas à cidade de Pemba existiam já antes da ocupação pelos portugueses algumas povoações chefiadas por ré­gulos, sendo o principal o sultão Mugabo, seguido de outros como o Said Ali, Mutica, Macesse e o Mugona.

O Governador de Cabo Delgado que, em em 1857 foi incumbido de ocupar a região e aí formar uma colónia, faz especial referência ao "velho" Mutica que, à excepção dos outros, falava ainda a língua portuguesa e muito contribuirá para o sucesso das negociações.

Fortemente swahilizados estes régulos que se expressavam e escre­viam geralmente em árabe, edificaram sociedades semi-feudais cuja autonomia se manteve ao longo dos tempos, até mesmo hoje, con­tinuando a exercer grande influência e poder no seio da população, cujo principal credo é o maometanismo mesclado de antigas tradições fetichistas como em quase todas as regiões da província.

A estas autoridades de relações amigáveis e até mesmo honestas com outros povos em certas alturas, também não lhes faltaram momentos de agitação e saque.

Já em 1843 o cheique Macesse, que chefiava a região actualmente conhecida por Pemba-Metuge, revolta-se contra a submissão aos portugueses, expulsando a companhia militar portuguesa estacionada num navio à entrada da baía de Pemba. Como corolário do desenrolar destes acontecimentos o cheique Macesse devolve a bandeira por­tuguesa às autoridades coloniais nas mãos do ajudante de Arimba, José F. Carrilho e recusando-se a pagar qualquer espécie de tributo.

Salientam-se também as investidas feitas pelos régulos Mugabo, Said Ali e outros contra caravanas europeias no circuito de Quissanga, obrigando-as a uma rota que levaria a mercadoria antes para Porto Amélia.

Se por um lado isto viria a abrir um caminho para o desenvolvimento de Porto Amélia a finais do século XIX, não menos verdade é que o facto veio a onerar bastante o processo de embarque e desembarque da carga já que Quissanga comunicando mais directamente com o "medo" era o principal porto exportador de então para o comércio e tráfico “ajaua-meto”.

A maior parte dos régulos antes da segunda década do nosso século se submetiam, na cintura de Pemba, ao régulo Mugabo, cujas terras confinavam com as da "coroa do medo", estas chefiadas pelo pode­roso maravi Mualia, ora submetido ora sublevado aos portugueses.

O quadro etnológico da população de Pemba remonta-se principal­mente à fusão do grupo macua com castas muani, penetrados res­pectivamente a partir de Murrébue e Quissanga.

Embora de diferentes origens as populações de Pemba se subordi­navam ao régulo Muária também de origem maravi.

O regulado Muária nasce cerca de inícios dos anos de 1880 quando famílias como Heri e Bachir pertencentes ao mesmo clã atingindo a região do medo avançam em direcção ao litoral pela rota Chiúre/ Mecufi/Murrébue.

De acordo com a "rainha" Muamba Omar Ussofo mais conhecida por Nhanicuto e descendente dos Muária, a dinastia se inicia com um tal Heri l na região de Changa (Murrébue) nas terras do régulo Nampuipui.

À morte de Heri l sucede ao trono Heri II que, para não defrontar o régulo Nampuipui que lhe fizera guerra acusando-o de ocupação ilícita das suas terras e compromisso com os portugueses, foge e refugia-se em Pemba na área da Maringanha. Parte do clã seguiu para Quissanga.

O successor de Heri II foi Remane Bachir que viajando para a África do Sul, como era seu hábito levando consigo voluntários (de acordo com a fonte ) que para lá queriam ir viver, foi chamado para assumir o cargo e é nessa altura adoptado o cognome de "Muária" para o regulado que agora começava.

Muitas vezes se fala de Muária como tendo alguma relação de parentesco, de clã ou mesmo qualquer outra com o regulo Muália, o que é negado por Muamba Ussofo, mas pode sobreviver a ideia de auto-identificação com o poderoso e conterrâneo maravi das terras do medo.

Amad Ali, avô do régulo Remane Bachir, descobre a zona de Marindima em Pemba e mobiliza a sua família e a gente de Changa para a habitar, o que veio a acontecer.

No entanto, fugitivos aos ataques dos ngonis, que lançavam as suas investidas com armas de fogo e azagaias a partir do ponto da colina que cai a pique na região de Marindima, bem como pelo facto de ali não haver água potável, a população deixa a zona e vai fixar-se junto às lagoas de Natite.

É então que Remane Bachir manda limpar as áreas de Nuno e Ingonane para ser habitada colocando lá como chefes dois familiares seus, nomeadamente as rainhas Nhanicuto e Nhacoto.

Enquanto isto o régulo Remane Bachir Muária entrega o Wimbi ao chefe Namacoma e a região compreendida entre o Nanhimbe e Maringanha ao seu irmão capitão-mor Tagir Bachir.

Anra Bachir sucede a Remane no regulado Muária e tendo este morrido fica como sucessor o seu sobrinho Fadili Adi, seguindo-se - lhe o seu irmão Anli Mugola.

Durante o reinado de Anli Mugola, este entregou a zona do Cariacó ao chefe Amada Muária, já na década de 60 do nosso século, que ao ser preso pela Pide é substituído por Abdul Latifo Ncuo.

Para além das já citadas rainhas o Paquitequete teve ao longo dos tempos ate à independência de Moçambique outros chefes, no­meadamente Mussa Amad, Pira Anlaue, Said N’Ttondo, entre outros.

Das relações com as autoridades coloniais que, mesmo antes de ocupar a região mandavam anualmente um encarregado de cobrança do imposto, a velha Omar Ossofo relata que quando chegava tal enviado eram içadas três bandeiras portuguesas: uma na praia junto à ponta Romero, a outra à frente da residência do régulo Remane e a terceira no quintal deste.

A população para não pagar o imposto abandonava as suas casas e internava-se mais para o interior e o funcionário da administração colonial em acto de vingança queimava todas as residências, obri­gando a população a construir alpendres provisórios após a sua retirada.

Em língua macua “marapata” significa alpendre ou algo provisório, alcunha que a população deu ao dito funcionário.

Nessa altura a designação de Pemba limitava-se somente a uma pequena área, próximo à ponta Miranembo, onde o governador colonial Jerónimo Romero havia instalado o "Estabelecimento da Baia" e construído um fortim que a população de Muária usou como refúgio nas razias que os sacalaves levaram a cabo.

Embora fora dos parâmetros deste estudo mas para dar uma ideia mais ampla da distribuição territorial do regulado Muária podemos acrescentar que dados de 1970 indicam que o régulo Ntondo, ocupava em Porto Amélia uma área de 1.042 km2 (Paquitequete), seguido do propriamente chamado Muária em Natite com 264 km2, Namacoma no Wimbi com 504 km2, o Piripiri no Gingone chefiando uma área de 8 km2 e o Nansure do Cariacó a Changa com 230 km2. (3)

Considerando por outro lado que os portugueses recrutavam na região do medo os carregadores para as suas caravanas é óbvio que muitos deles em Pemba se foram fixando, o mesmo sucedendo à gente migrada das regiões costeiras.

Os conflitos tribais que sempre existiram entre ambas as etnias (e para um período mais curto também com os macondes) eram compensados pelas trocas comerciais, sobretudo o contrabando e tráfico de toda a espécie.

Apesar de Pemba ser zona costeira, provida de uma enorme baía, muito pouca gente se dedica hoje à pesca, absorvendo o sector pes­queiro apenas cerca de 200 pescadores (dados de 1987) que em suas casquinhas, lanchas e algumas pequenas embarcações fazem não mais que uma produção anual de 150 toneladas de pescado. É também verdade que a intensiva exploração ao longo dos tempos dentro e ao largo da baía, tornaram os recursos marinhos mais escassos.

De marinho típico é, por aquelas bandas, verem-se, nas vazantes das águas com bastante afluxo no período das marés vivas, mulheres, homens e até mesmo crianças de tenra idade ora cercando peixe muidinho com finas malhas ora apanhando conchas ou moluscos comestíveis.

Tão típico é isto quanto o prazer de encontros amigáveis na praia ao nascer e ao pôr do sol, nem que seja sob o pretexto da necessidade de defecar na praia (por tradição), ali se juntam grupos de pessoas em animadas conversas (e quem sabe não mais?) por várias horas.Grande parte da população dedica-se no entanto à pequena indústria artesanal e a outras ocupações liberais e informais bem como ao comércio, não deixando de praticar um pouco de agricultura para subsistência, com especial incidência no milho, mapira, mandioca e mexoeira.

Pemba, este pequeno satélite e entreposto swahili de tempos remo­tos, conserva ainda suas antigas tradições e hábitos assimilados das gentes do Tanganica. A preferência em artigos do mercado oriental e a quase generalização da língua swahili, embora misturado com o idioma macua e a língua portuguesa, é também realidade.

O “Sungura”, dança importada da Tanzânia, diverte todos os dias e durante toda a noite a população dos bairros periféricos.

Dessa gente não há quem falte, pois aliado ao divertimento algum namorisco poderá, eventualmente, acontecer.

Os três ou quatro conjuntos musicais que actuam em simultâneo nos principais bairros de caniço expressam-se em língua swahili. Os dançarinos os acompanham.

O "mini na kissikia swahili" (eu compreendo swahili) liga uns e outros numa libertação e fruição de mais um dia passado.

As comunidades de maior influência árabe-swahili, muito dedicadas ao comércio com a Tanzânia, localizam-se em ambas as extremida­des: Maringanha ao Sul e o Paquitequete ao Norte.

Contava há poucos anos um velho auxiliar de faroleiro uma interes­sante e peculiar história sobre a origem do nome Maringanha já que a explicação nos conduz a um facto de que a gente de Maunhane jamais viria a esquecer: trata-se da construção de poços de água, um dos mitos de mau agouro ameaçador de morte a quem o construísse.

O facto deu-se após o ciclone de 1914 quando, já reconstruída a povoação de Maunhane, o faroleiro Heliodoro José Carrilho inaugura os poços (por ele próprio mandados construir) gritando o lema: “Muringana?”, que em língua local significa "estão completos?" ao que a população respondia em uníssono "Ti ringana”, que nada mais é do que a confirmação.

Será que por popularização como indicava a fonte e deturpação da expressão "mu ringana" viria a resultar Maringanha?

As cartas no entanto designam de ponta "Maunhane" à região e não é de admirar já que localmente a expressão significa "no sítio dos macacos" dado que em tempos parece ter sido ali o local por eles preferido.

Ainda hoje muitas vezes se vêem macaquitos a vaguear pela Ma­ringanha saltitando por entre o sombreiro das casuarinas e coqueiros junto ao farol como que apreciando as centenas de mulheres que na vazante avançam pelo mar em busca de marisco, o "caril" diário.

Trata-se principalmente da apanha de certas conchas com carne comestível mas pouco ou nada comercializável por se tratar quase de um dever tradicional de toda a mulher e suas crianças procurar moluscos e pequenos crustáceos tanto para seu sustento como até por simples ocupação do tempo e desporto.

Para além da pesca artesanal a população da Maringanha dedica-se também à pequena agricultura bem como à fermentação alcoólica do caju. Aqui a amêndoa deste fruto é no geral consumida quer verde quer torrada depois de seca ou mesmo, em ambos os casos, também utilizados na culinária.

Na outra extremidade de Pemba encontramos o Paquitequete que apesar de desenvolver um forte comércio swahili alberga por outro lado famosos artesãos e gastrónomos ensinados no Ibo e trazidos para ali aquando da transferência da sede da administração da Com­panhia do Niassa.

Ourives trabalhando a prata das moedas portugesas antigas e o ouro das libras estrelinas que ainda vão aparecendo, arrancado às relíquias de algumas poucas “sinharas” (senhoras) ainda vivas apesar de velhinhas, que em seus quintais confeccionam para venda famosos doces, compotas, diversos bolos doces e salgados bem ainda como achares de variado tipo.

O Paquitequete está quase separado da cidade por uma lângua que seca quando a maré vaza mas repleta de água na enchente e, nessas ocasiões, não falta “negociozinho” aos miúdos das casquinhas ganhan­do algumas coroas aos que desejem encurtar o caminho caso estejam em ambas as extremidades já que a ponte se situa quase no extremo sul deste enorme bairro.

O nome de Paquitequete provém da expressão "pá hitequete” que significa por um lado "no sítio do hitequete" ou melhor uma planta que cresce toda emaranhada muito comum ali, por outro é aplicada à característica do próprio bairro com casitas todas muito juntinhas umas das outras formando um autêntico emaranhado.

Engloba ele junto ao mar as áreas de Cofungo na ponta Mepira, seguindo-se em direcção à ponta Romero as zonas conhecidas por Nazimogi, Paquitequete propriamente dito, Cumissete e Cuparata. Há a acrescentar ainda uma casta de mestiços do Ibo que se isolou um pouco mais para a costa a seguir a lângua, dando origem ao bairro da Cumilamba que galga um pouco a parte da escarpa Leste da cidade de Pemba.

Enquanto que na Maringanha a ponta é alcantilada e orlada por um recife de coral que cobre e descobre em Mepira ela è baixa e arenosa caindo a costa a pique sobre o mar.

Nas regiões centrais da península localizam-se os bairros semi-urbanizados de Ingonane, próximo à ponta Romero assim como o de Natite e Cariacó mais a sul onde vivem principalmente os novos artesãos, o pequeno operariado local e os potenciais produtores e negociantes de aguardente e outras bebidas tradicionais, tais como os fermentados de cereais ou farelos.

Estes bairros desenvolvem-se a partir da ponta Romero que é baixa e também orlada por recife de coral que cobre e descobre. Tem praias arenosas mas as ondas são no geral bastante violentas. A ponta Romero antes da ocupação pêlos portugueses era conhecida pelo nome Miranembo.

A tradição reza que ainda no tempo em que a região era floresta cerrada, albergando grandes manadas de elefantes certo dia enfurecidos avançam em direcção ao mar e o mais velho (o chefe) que seguia à frente não foi capaz de estancar na ponta o que o levou a precipitar-se por sobre as águas e dai engolido pelas ondas. De súbito os outros elefantes param e aterrorizados tomam rumo oposto fazendo uma retirada para o interior sem nunca mais por ali aparecerem.

Ora, localmente a expressão “umuiria” significa engolido e “nembo” o vocábulo elefante, ou seja o lugar onde foi engolido o elefante. Naturalmente, segundo a lenda, as duas expressões ter-se-iam fundido dando origem à palavra “umuirianembo”, posteriormente, “miranembo”.

Entre o Cariacó e a Maringanha encontram-se o Wimbe e o Nanhimbe (actual bairro Eduardo Mondlane) dedicando-se à agricultura de su­bsistência e à fermentação alcoólica do caju.

Já no cimo da colina podem-se ver, do levante ao poente, os bairros de Chuiba ou "Planalto dos Cajueiros", Gingone e Muxara, pratica­mente cobertos de cajueiros, e são os que mais comercializam a amêndoa do caju e se dedicam à fermentação alcoólica da respectiva maçã bem como à pequena agricultura.

O rochoso baixo de Nacole a 1,5 milhas para Sueste da Ponta Mepira, projecta ao longo das suas praias de Chibabuara onde, do ponto mais alto da cidade, a colina se faz cair abruptamente.

Outrora um esconderijo de larápios por possuir densa floresta, hoje a sua população é essencialmente constituída por pescadores que, apesar dos rumores de existência de um polvo gigante ali mesmo na baía, essa gente continua fazendo alguma pescaria sem qualquer receio.

No centro da península onde está instalada a cidade de Pemba, ergue-se a zona de cimento desde a Baixa ou "Cidade Velha" junto à qual foram construídas as primeiras casas de alvenaria por facilidades de acesso ao porto, estancando numa planície provida do melhor parque habitacional.

É também nesta zona onde se encontram o Governo e serviços públicos diversos, combinados com uma cadeia de estabelecimentos comerciais bem como um parque infantil onde funciona também uma creche.

O actual porto e ponte cais de Pemba na baixa estão localizados na região meridional da baía a 5 amarras para Sueste da ponta Mepira, com fundo de lodo. O fundeadouro pode alcançar-se a pouco mais de 80 metros, onde se encontra o molhe cais, dado que os fundos se aproximam bastante da terra.

Existem no porto diversas instalações para armazenamento de cargas e para serviços marítimos e aduaneiros. Está também apetrechado com um sistema para a contenção de combustíveis que, através de uma conduta de cerca de um quilómetro, são despejados para os depósitos da Petromoc próximos à povoação de Chibabuara.
- Do Livro "Pemba e sua Gente" de Luis Alvarinho.
EXTRAS - O FAROL DA MARINGANHA

Pudesse eu ligar para (289)824983 ou ir pessoalmente localizar a Rua Actor Nascimento Fernandes, lá para as bandas de Faro, Algarve, na terra de Camões, encontrar Maria dos Anjos Martins e conversarmos hoje sobre o Farol da Maringanha.

Não é por nada. É que no livro que me ofereceu, com o nome Pemba, de contos lusófonos, em retribuição ao meu “Caso de Montepuez”, ela me pôe muito pensativo quando na página 81 fala do faroleiro que sempre guarnecia aquele farol em tempos de sua juventude.

Apresentando-se com o pseudônimo, Angie Paraízo, a nossa escritora, que é natural de Cabo Delgado, apresenta um faroleiro que ficava horas a fio, sentado nos primeiros degraus do farol esperando ver os tentáculos do polvo gigante que emergia silencioso e rápido do fundo das águas do mar. Passava as tardes à espera do seu único amigo, a sua única visita, apesar de saber que ele só vinha ao pôr-do-sol. O velho faroleiro gretado pelo vento e pelo sol, cofió na cabeça de cabelos brancos, pés descalços, olhar perscrutando o mar até ao limite do horizonte.

Ás vezes, conforme Angie Paraízo, o polvo surpreendia o coitado do velho faroleiro, elevando os grandes tentáculos acima do nível do mar, deixando-os deslizar pelas paredes escuras do farol para em seguida rodopiar em espiral provocando agitação nas águas. O velho sorria e agradecia. Estamos perante um maringanha morto e monótono.
:: Júlio Gabão, Jaime L. Gabão e o saudoso Rodrigo Carrilho ::

O que gostaria então de dizer a minha amiga luso-moçambicana, é que no mesmo sítio, estou a dizer, no farol da Maringanha, já não há nada que justifique a solidão de que sofreu o faroleiro. O bairro da Maringanha não tem hipótese de ficar isolado, não há lugar para ser apenas o polvo a brincadeira do faroleiro e não só.Maringanha fica hoje alguns quilómetros mais perto da cidade de Pemba, porque a engenhosidade de mentes particularmente empresariais permitiu queo farol seja não só aquele dispositivo sinaleiro, mas também o nome de um complexo turístico-cultural, enfim, lugar para todo o tipo de lazer, que Pemba há muito precisava.

Aliás, não há mato a partir da praia do Wimbe, a pouco e pouco foram aparecendo lugares de restauro e brincadeiras adultas, sendo que a seguir vem a “Aquilla Romana”, depois temos a sempre trabalhadora Célia, o campismo, etç., etç., salta-se um pouco para permitir que um pequeno bosque ainda continue a viver por razões humanas. É que lá está o cemitério dos hindus, é lá onde se queimam, depois do que estamos no complexo “O Farol”.

É Albertino Cuomo, o cabo-verdiano que agora (há duas semanas) fez o destino obrigatório dos que sabem descansar, claro, com certas posses.

Houve tempos em que aos fins-de-semana tínhamos pessoas a irem a Nampula para se deleitarem com os ambientes quentes do “Xitende” ou “Monteiro Splays” ou ainda nas Quintas Nasa, do Galo e muito recentemente no complexo “O Bambo”. Noutros tempos a gente dirigia-se a Montepuez para usufruir do que “Zavala” proporcionava, hoje não.

Pudesse eu convidar a minha amiga Angie Paraízo para, com ela, com a sua idade, ficar pelo menos trinta minutos no “Farol”, depois iríamos pela costa até noutro complexo pertencente a Chabane Combo, só para ver que o espaço está sendo ocupado, por isso a solidão do faroleiro não mais voltará, pelo menos em Maringanha.
PS - Em tempo: Estiveram cá os “Massucos” do Niassa, para confirmarem que são na verdade os mais-mais da atualidade. Há muito que Pemba precisava de espetáculos de luxo, fora da cassete que se traz e se imita burlando deste modo o público que muito respeito merece. Ficou de parabéns Narciso Gabriel e o seu restaurante Wimbe que trouxeram os “Massucos”, agora traga-nos os “Eyuphuros” e verá.
- Pedro Nacuo - Notícias de 27/09/2002-Texto cedido por Anvar e Inez Andrade Paes.

(Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

1/04/08

Moçambique, turismo e a ocupação desordenada do litoral de Pemba...

(Clique sobre a imagem para ampliar)
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Moçambique: Receitas do turismo atingem 160 milhões de dólares em 2007
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""""MacauHub - Maputo, Moçambique, 02 Jan/08 - As receitas do turismo em Moçambique em 2007 atingiram 160 milhões de dólares, um aumento de 3 milhões de dólares relativamente ao número de 2006, afirmou terça-feira em Maputo o ministro do turismo, Fernando Sumbana.
O ministro precisou que o número referido diz apenas respeito ao dinheiro gasto por turistas que em 2007 visitaram Moçambique, que deverão ter sido 1,1 milhões, um aumento signficativo face à média de 650 mil turistas em anos anteriores.
“Para além de turistas provenientes da África do Sul, Zimbabwe e outros países da região... ...""""

Acrescento
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É bom que se fale de turismo, que se divulguem Moçambique, suas belezas naturais, que se acentuem receitas crescentes ano a ano.
Moçambique sempre teve vocação turistica, desde os tempos coloniais. Portanto não é novidade.
Tardou demais para acontecer, mas é um início prometedor.
Há que reconhecer, entretanto, com humildade, que o turismo em Moçambique ainda se encontra em estado embrionário, quase rudimentar, muito aquém do potencial que o país possui e carente de bases sólidas de educação ecológica, ambiental que consolidarão e perpetuarão os atrativos naturais que tanto encantam quem visita Moçambique.
O turismo olhado a sério, com profissionalismo, aliado à educação e valorização ambiental, trará benesses para a economia moçambicana desencadeando desenvolvimento, modernização. Conduzido por profissionais do ramo, gerará postos de trabalho, melhorias sociais, etç., etç.
Faz alguns anos que vou acompanhando por afinidade Moçambique - Pemba, razão deste blogue.
Considero Pemba e todo o litoral de Cabo Delgado últimos (entre outros cada dia mais raros) paraísos/refúgios do nosso planeta globalizado, tão fustigado pelo destempero do ser humano na questão ecológica. E por isso merecedores de todo o cuidado, sobretudo por parte dos habitantes locais, maiores favorecidos se souberem zelar e fazer que respeitem este espaço do norte de Moçambique.
Aos poucos, o litoral de Cabo Delgado e seus recantos magníficos vão ficando reconhecidos e cobiçados pelos amantes da natureza, do imenso mar azul de Pemba e do calor dos trópicos. Normalmente vêm para conhecer, julgam e voltam trazendo novos passeantes abonados em euros e dólares úteis para a renovação e criação de infraestruturas turisticas e sociais planejadas, sustentáveis, de futuro e interesse geral da região. Ou que assim deveriam ser.
Pemba cresceu desde que deixou de ser Porto Amélia em 1975.
Tornou-se densa em população de várias origens e países vizinhos, algo cosmopolita, mercado a céu aberto informal, de lixo raramente recolhido em ruas mal conservadas e terrenos vazios, com meia dúzia de comerciantes predominando em algumas empresas mantidas desde o tempo colonial e também de pai para filho, com ruínas que florescem entre predios abandonados uns, sem pintura outros, mas que contam História que poucos escutam.
Paralelamente surgem aqui e ali insuficientes, esporádicas iniciativas e alguns empreendimentos atuais voltados para a sociedade local ou para turistas que aportam ao velho aeroporto e se abrigam de imediato em hoteis/resort´s voltados para o mar, desfrutando comodidades e iguarias amortizadas a preço internacional salgado, indiferentes ou desconhecendo a penúria, mendicância e outras negligências sociais envolvendo uma população numerosa, forçosamente impelida para bairros simples, humildes que vão proliferando, ocupando e ampliando desordenadamente o contorno da cidade de Pemba. Uma Pemba que continua crescendo, crescendo, sem ordem, sem saneamento básico, invadindo as fronteiras da vida da selva que expulsa, se revolta e hostiliza os invasores (caso dos elefantes abatidos por atacarem a população)...
Vêm também notícias preocupantes de que o crescimento urbano intenso e desorganizado à volta desses que deveriam ser redutos ou templos ecológicos sagrados a respeitar, está a descaracterizar, a aniquilar a beleza das praias de Pemba, substituindo o espetáculo da natureza sadia pelo cimento de construções de todo o tipo, muitas inadequadas, sem regras ou respeito a normas de saneamento, padrões urbanisticos adequados, loteadas mercantilmente a particulares e turistas para férias.
As consequências já se vão notando, segundo nos contam: lixo, mendicância, poluição das águas, áreas verdes escassas, cólera, assaltos em plena rua, etç....
Há que despertar a municipalidade da apatia cómoda e complacência perante esse tipo de "progresso" sem planejamento.
Há que educar a população a acarinhar e cuidar da natureza de Pemba.
Esta é a riqueza e o "tesouro-escondido" de Pemba...a tal jóia rara ! Não se pode perder pela irresponsabilidade e ambição.
O turista vem pela beleza natural de Pemba, de seu clima, de sua geografia visualmente despoluida, de seu povo hospitaleiro, de sua História, de sua tradição, folclore, do seu mar azul transparente e límpido... E só continuará chegando a Pemba e arredores se tiver a certeza que tudo isso continuará existindo, preservado, melhorado, sem o constrangimento da brutalidade do concreto firmado no reino encantado das areias brancas da sempre bela praia do Wimbe quase abraçando a Maringanha do velho farol !

3/26/08

Balanço dos três anos da instituição do Parque Nacional da Quirimbas.

(Imagem original daqui)
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No terceiro ano desde a sua instituição:
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COMO VAI O PARQUE NACIONAL DAS QUIRIMBAS ?
As autoridades do Parque Nacional das Quirimbas continuam insatisfeitas face à continuação da prática de acções ilegais no interior do mesmo, por operadores florestais e de fauna bravia, exploradores fora-da-lei dos produtos pesqueiros, assim como por causa da morosidade da parte do juízo de execuções fiscais no tratamento das multas aplicadas e retorno do 50 porcento consignados aos intervenientes, para o que clama por uma melhor coordenação com a autoridade tributária.
Já no seu terceiro ano, desde a sua oficialização, o Parque Nacional das Qurimbas, localizado nos seis distritos centrais da província de Cabo Delgado, envolvendo uma área aproximada de 7.506 quilómetros quadrados, vai gerindo os conflitos que já se anteviam tendo em conta a sua especificidade.
Só o facto de 5.984 quilómetros quadrados pertencerem ao continente e os restantes 1.522 serem habitantes costeiros e marinhos, tendo dentro de si 11 ilhas, é por si, indicador, provavelmente, da razão por que tem que ser preservado, apesar das dificuldades que nestes primeiros anos está a encontrar.
Trata-se de defender as ilhas e a faixa litorânea que são constituídas por rocha costeira e têm origem recente, tendo sido formadas durante o período Terciário por meio de levantamentos ao longo da plataforma continental. Nas próprias ilhas há a tendência para a acumulação de areia ao longo do lado ocidental e daí resulta a maior parte das praias utilizáveis.
A maioria das ilhas não tem água doce, com a excepção de Ibo, Matemo e Quirimbas, por serem suficientemente grandes para manterem uma camada de água doce sobre a camada do lençol freático salino.
O Parque contém uma diversidade de habitates marinhos numa área relativamente pequena, que inclui as florestas de mangal do Ibo e Matemo, os tapetes de ervas marinhas, na desembocadura do rio Montepuez, bem como na área entre as ilhas de Ibo e Matemo, na baía de Quipaco e no espaço a ocidente das ilhas de Quisiwe e Mefundvo.
Há por outro lado, o recife de coral que se estende ao longo de todo o Arquipélago, até para lá dos limites do parque, junto a uma fauna marinha que é conhecida pela existência de pelo menos cinco espécies de tartarugas marinhas que visitam a área e uma delas é dada como nidificando na área do parque. Dungongos, cerca de 140 espécies de moluscos, 375 de peixes e tanta outra riqueza por baixo da agua do mar. E na parte continental?
Na verdade, matas costeiras, savanas ribeirinhas, prolongados mosaicos de um tipo de vegetação que varia não só de acordo com a elevação, distância da costa, como dependente das características do solo e água, mas também conforme o impacto humano sobre estes recursos.
A região do Parque é tida como prioritária para a fauna e nela foram identificadas três rotas importantes de migração de elefantes que atravessam a área e abundam diferentes espécies de animais, desde cudos, fococeros leões, hienas e numerosas aves de rapina.
Ora, em Outubro do ano passado já havia a informação de que a exploração ilegal dos recursos naturais no interior do Parque Nacional das Quirimbas (PNQ), que abarca os já citados seis distritos de Cabo Delgado, designadamente, Quissanga, Ibo, Meluco, Macomia, Pemba-Metuge e Ancuabe, continuava a inquietar as autoridades daquela que hoje já se afirma como instituição a ter em conta na conservação e preservação do ambiente naquele ponto do país.
Dados disponíveis indicavam que em três meses haviam sido apreendidos 469 toros de madeira, 1.604 barrotes, 179 tábuas, 46 pranchas e, em consequência desse comportamento fora-da-lei, aplicadas multas a 7 operadores, avaliadas em cerca de 527 mil Meticais.
Na altura em que o nosso jornal começou a reunir estes dados, já ficava descriminado que se tratava de 178 toros de pau-preto, 152 de pau-ferro, 123 de jambire e 16 de muanga, em mãos de operadores no interior do parque. São, na verdade, de agentes singulares de exploração de madeira, com licenças simples de exploração florestal, passadas pelos serviços respectivos na Agricultura, que acabam invadindo as áreas de conservação.
Com a empresa /Pacific International /, por exemplo, haviam sido encontrados 23 toros de jambire, já na vila-sede do distrito de Ancuabe e pela infracção, sido imposta uma multa de 86.020,00 MT, no mesmo lugar onde foram apreendidos mais 24 toros da mesma espécie, desta feita pertencente a /Mozambique Tienhe/, razão porque havia sido multada em 78.500,00MT.
A multa mais avultada encontrada pela nossa reportagem fora recair ao operador florestal Costa Ferreira, na aldeia Muaja, ainda no interior do distrito de Ancuabe, onde havia depositado em instância 25 toros de pau-ferro e 8 de jambire. A fiscalização do parque determinou que pagasse ao Estado, pela infracção, 250.999,00 MT.
José da Silva Mucavele, por sua vez, iria pagar por ter sido surpreendido com 34 toros de jambire, igualmente em Muaja, cabendo-lhe a multa no valor de 41.000,00 MT e o seu colega, José Vidyoko Kalamuka, da aldeia Napuda, já no distrito de Quissanga, pagaria 70.500,00 MT, por haver sido encontrado com 537 barrotes e 7 tábuas.
A /Kodak Professional Center/, é igualmente uma empresa madeireira, que pelas mesmas razoes teve de ser multada em 108.000,00 MT, em Biaque, distrito de Ancuabe, mesma divisão administrativa onde Khaeronissa Daudo enfrentaria uma multa de 125.500,00 MT, este na área conhecida por Rapale.
Todos estes processos, segundo apurou o /notícias/ haviam sido remetidos ao juízo das execuções fiscais, mas as autoridades do Parque Nacional mantinham o alarido decorrente da contínua violação dos recursos naturais que se pretende proteger.
Interessante porém, é o facto de muitos destes processos continuarem, desde meados do ano passado, à espera do seu veredicto e o destino do produto apreendido estar dependente do desfecho, havendo em alguns casos, apreensão de meios circulantes.
Ancuabe é o distrito onde os furtivos se sentem mais à vontade do que em todos outros pertencentes ao Parque Nacional das Quirimbas. Dados colhidos pelo nosso jornal, indicam que este distrito sozinho chamou à si infracções que resultaram na apreensão de 883 toros de diferentes espécies, mais 387 barrotes. Em contrapartida, Macomia, Pemba-Metuge e Meluco, disputam 680 barrotes e 122 tábuas apreendidas.
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ASSUNTO QUE NÃO É PARA JORNAIS.
O nosso jornal quis ouvir o comentário da Direcção de Execuções Fiscais, área de Pemba, em relação às lamentações do Parque Nacional das Quirimbas, sobre a alegada morosidade, da sua parte, quanto à resolução dos diferendos que opõem aquela instituição estatal e os exploradores ilegais de madeira.
A directora Helena Damas começou por dizer que não estava autorizada a falar para a imprensa e que na sua opinião não se tratava de assunto que fosse levado a debate em jornais, alegadamente por o funcionamento do Tribunal obedecer a regras que podem não agradar aos queixosos, neste caso, o Parque.
Helena Damas foi, entretanto, explicando ao nosso jornal que /não é de hoje para amanhã que se resolve um contencioso, tendo em conta que há também recursos que se podem interpor, obedecemos a prazos, são assuntos que envolvem muitos interesses. Os processos estão a seguir os seus trâmites.
Para Damas é estranho que o assunto tenha saído para o público sem que o Parque das Quirimbas sequer se tenha aproximado à Direcção de Execuções Fiscais para se aperceber do que está a acontecer com cada um dos processos à si remetidos.
Há aqui processos de mais de quatro anos, simplesmente porque a sua resolução leva tempo, precisamos de ser cuidadosos, tanto é que, nalguns casos, há aqueles cujos presumíveis infractores não pertencem a esta área fiscal e aí precisamos de trocar correspondência com a área congénere, aclarou.
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A PRESSÃO EM TERRA, NO MAR E CURIOSIDADES...
Para além da acção ilegal de exploração madeireira, conforme as autoridades do PNQ, nota-se uma grande pressão de caça furtiva protagonizada pelas comunidades locais, usando instrumentos proibidos, sendo que, nos últimos três meses do ano passado haviam sido desactivadas e destruídas 195 armadilhas, 71 cabos de aço e 381 laços, com particular incidência nas aldeias Napuda, distrito de Quissanga, Mitepo e Tipamoco, em Meluco.
Nos armazéns do Parque Nacional das Quirimbas há arcos e flechas armazenados, capturados na via pública onde são vendidos a novos candidatos a caçadores furtivos, assim como a turistas e outros compradores que as usam nas cidades como instrumentos eficazes para se defenderem dos ladroes nas suas próprias casas.
Entretanto, curiosa foi a atitude do governo distrital de Macomia, que sem ter coordenado com as autoridades do Parque, se envolveu no que hoje é qualificado como abate ilegal de animais, facto que soubemos ter sido notificado ao governador provincial. Tratou-se duma palapapa, abatida em Napala, zona no interior do parque, por isso estritamente protegida.
Em Namaluco, distrito de Quissanga, a população não quer entregar as pontas dum elefante que se considera ter morrido por causas desconhecidas, exigindo para isso uma compensação no valor de 50.000,00 MT. O Parque, perante tal realidade, nada mais fez do que escrever uma carta ao governo do distrito, que ainda não reagiu. Tal relutância não aconteceu em Pemba-Metuge, onde se confirma ter morrido um outro elefante, em iguais circunstâncias, na aldeia de Mareja.
Estes factos são o dia a dia das regiões no interior do Parque, pois na verdade, segundo reconhece o seu administrador, José Dias, o conflito homem/animais bravios é uma das questões mais criticas na parte terrestre do parque, onde se registam danos nas machambas e ataques a pessoas.
O gráfico que fala das incursões dos paquidermes é elucidativo: foram 398 no ano passado. Uma descida significativa, se se tiver em conta que em 2006 haviam sido registadas 933, do que resultou, então, na morte de 8 pessoas, contra 6 de 2007.
Fomos informados que o Parque está neste momento a fazer um levantamento das distâncias que separam as aldeias ao longo das estradas principais, com o objectivo de definir áreas para a passagem de animais, nas quais terão que ser proibidos o estabelecimento de novas aldeias ou abertura de novas machambas.
O que se pretende agora é alargar as machambas ou aldeias mais para o interior e não ao longo da estrada, justificam as autoridades do PNQ, ao mesmo tempo que se está a estudar a nível do Governo Provincial, doadores, sector privado e comunidades locais, a possibilidade de serem introduzidas vedações eléctricas nas áreas propostas para a conservação e turismo.
Há esforços tendentes a controlar a pesca artesanal a partir de um censo que inicia em Junho próximo, visando à actualização dos dados referentes à situação geral das unidades de pesca existentes e suas características, número de pescadores envolvidos, artes e outros aspectos que se consideram importantes, bem como, ainda se pretende melhorar o controle com uma proposta de um censo semestral.
Regista-se o envenenamento dos cursos de água por pescadores ao longo do rio Montepuez, usando pesticidas. Dois acampamentos com 17 pescadores ilegais foram destruídos, apreendidas duas redes mosquiteiras e retirada de três embarcações.
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TURISMO COMUNITÁRIO.
A proposta é aliciante: implementar um turismo sustentável e de alta qualidade no Parque Nacional das Quirimbas. Ao mesmo tempo se pretende que o turismo comunitário faça com que os rendimentos familiares dupliquem ou tripliquem em todos os meses.
Na Ilha do Ibo, desde Fevereiro do ano passado que foi operacionalizado o turismo comunitário. Quando quisemos saber dos resultados, obtivemos a seguinte resposta:
Três casas a receber hóspedes e um quarto reabilitado, a associação do turismo comunitário de N´lamba ficou registada ao nível distrital para desenvolver actividades e serviços turísticos, havendo ainda perspectivas de alugar duas a quatro casas para o desenvolvimento de actividades turísticas, como sejam, passeios, saídas, transportes, actividades culturais...
Na verdade, o rendimento proveniente do aluguer dos quartos nos dá a sensação de que há seriedade no tratamento deste tipo de turismo. Em 137 noites vendidas, soubemos que houve ganhos na ordem dos 35.250,00 MT, dos quais 21.150 foram para as donas de casa e 10.575 para o fundo comunitário e 3.525 para a administração.
Em Muagamula o comité de gestão dos recursos naturais de Ningaia tem a responsabilidade quase total. Com dois guardas que trabalham em turnos e para a manutenção e limpeza do sitio de acesso, mas sobretudo para controlar as entradas, que estão fixadas em 50MT para estrangeiros e 25 para os nacionais.
As entradas de turistas no acampamento nos meses de Julho, quando o controle começou, até Novembro, apenas 84, nos informam terem sido colectados 4.200,00 MT.
Em Meluco-sede está a ser reabilitada a pensão Ana Maria para oferecer alojamento básico e estão em formação três guias para passeios nas montanhas e nos arredores e se perspectiva a observação de elefantes nas fontes de água e actividades turísticas, tais como a dança e comida tradicional.
Em Namau, distrito de Pemba-Metuge, está em construção uma ponte-passadeira para a observação do mangal, ao mesmo tempo que está em construção uma casa de hóspedes.
Os ganhos sociais vão ainda muito longe com a atribuição de bolsas de estudo a 30 alunas no distrito considerado piloto de Macomia, na tentativa de incentivar a rapariga a continuar a estudar, sendo elegíveis aquelas que completam a quinta classe e que vivem nas aldeias que se separam a mais de 5 quilómetros duma escola primária do segundo grau. Só uma não conseguiu chegar ao fim do ano passado com bom aproveitamento.
Da mesma forma, continua a construção de uma escola com duas salas de aula, usando material convencional, na aldeia Darumba, posto administrativo de Mucojo, ainda no distrito de Macomia, numa colaboração entre o PNQ e a Direcção da Educação no distrito. Em fase de conclusão está ainda a escola de Mefundvo, que devido a problemas de supervisão está a demorar.
Pedro Nacuo - Maputo, Quarta-Feira, 26 de Março de 2008:: Notícias
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8/09/07

África: encontradas seis novas espécies de animais.

Enquanto uns matam e exterminam (aqui) outros, descobrem novas espécies de animais em África:
Quarta, 8 de agosto de 2007, 14h23 - Uma expedição a uma floresta remota da República Democrática do Congo descobriu seis novas espécies de animais. Os pesquisadores da Wildlife Conservation Society (WCS), organização que liderou a expedição, descobriram uma nova espécie de morcego, uma de roedor, duas de musaranho e duas de sapo.
A expedição foi realizada entre janeiro e março de 2007 em uma região perto do lago Tanganica, uma área fora do alcance dos pesquisadores desde 1960, devido à instabilidade política.
"Se conseguimos encontrar seis novas espécies em um período tão curto, podemos imaginar o que mais está lá", disse o pesquisador da WCS Andrew Plumptre.
Plantas
Os ambientalistas acreditam que podem ter encontrado várias novas espécies de plantas na região próxima à Floresta de Misotshi-Kabogo.
Os botânicos que participaram da expedição não conseguiram identificar cerca de 10% das amostras de novas plantas que coletaram. As amostras agora serão examinadas por especialistas para confirmar se representam novas espécies.
A equipe acrescentou que a área é extremamente rica em biodiversidade, apesar dos anos de conflito que afetaram a região.
A pesquisa descobriu que muitas espécies de pássaros, répteis e anfíbios estavam vivendo na floresta. Também revelou mamíferos maiores incluindo chimpanzés, búfalos, elefantes, leopardos e várias espécies de macacos na região, apesar de estarem em números menores do que o esperado, possivelmente devido à caça clandestina.
Os pesquisadores acreditam que a floresta possui uma vida animal rica devido à sua localização isolada, com poucos habitantes. A WCS afirmou que agora existe uma necessidade real de proteção na área.
"A pesquisa descobriu que a região de Misotshi-Kabogo é biologicamente importante para ser conservada na forma de uma área de proteção", disse James Deutsch, diretor do Programa para África da WCS.
"Já que poucas pessoas vivem lá, seria relativamente fácil criar um parque e, ao mesmo tempo, manter o sustento das pessoas que moram na região", acrescentou.
BBC Brasil
Leia esta notícia em:

5/10/10

Retalhos: De Porto Amélia a Pemba - Conto Arquivado

Amanheceu depressa aquele Domingo de Outubro, 1967.

No largo do Posto, mal o sol espreitou, bochechudo, por entre os cajueiros da mata, sentavam-se velhos negros, encolhidos nas capulanas de caqui barato. Esperavam, em triste paciência, carpindo para os cipaios madrugadores todas as desventuras da sua noite mal dormida.

- Senhor, tem ali gente com milando grande! – anunciava, solene, no seu jeito sério, o Cabo Sanica, chefe incontestado dos cipaios administrativos da região.

O Carlos, ensonado, digerindo uma agitada sessão de king, levantou a esteira da janela baixa e lançou um “já vou” em contrariado bocejo. E o Sanica, depois de uns desajeitados salameleques, foi regressando para junto do grupo.

O Carlos era um jovem de 19 anos. Viera, havia pouco mais de um ano, das serranias beirãs para aquele sertão africano fascinante e medonho, belo e arrepiante; caixa grande de mistérios que, sonhador, se propusera desvendar. E os negros da área achavam graça àquele “menino branco” idealista, ao seu espírito aventureiro e despreocupado, qual fruto verde em chão maduro!... Mas, talvez por isso, representava a seus olhos a rampa de lançamento, através da qual faziam chegar até ao Administrador de Balama a sua nave recheada de lamentações, pedidos e mal disfarçadas exigências.

O Administrador era já pessoa idosa, vestuta, que eles não ousavam incomodar, talvez por respeito às barbas majestosas implantadas numa carranca sisuda. Era um cabo verdiano letrado, da Ilha de S. Vicente, branco ou crioulo oxigenado, e chefe duma interessante família, pessoas de educação esmerada.

Quando o Carlos, ainda esfregando os olhos, foi ao encontro do ajuntamento, por entre um interminável coro de salamas, viu naqueles rostos de ébano um problema maior, bem diferente das choramingas questões a que já o haviam habituado.

- Então o que se passa? O içar da bandeira é só às oito horas e vocês vêm para aqui tão cedo? – perguntou, em tom de graça para desenferrujar a língua muda do régulo Momola, um bondoso preto de carapinha grisalha, ancião influente, guia espiritual duma população e duma área mais vasta que todo o Alentejo; era admirado pela sua sabedoria e pela verdade com que manifestava os anseios do seu povo, de que era mandatário de linhagem.

- Tem garramo muito mau, senhor adjunto, está comer nosso povo!... nosso pede ajuda, está sofrer muito..., e continuava a explicar-se o melhor que sabia, no seu português estudado na universidade das suas velhas rugas.

Depois, todos foram dando achegas, em alvoroço: que era velho o leão solitário; entrara, noite dentro, numa aldeia do Lúrio e levara a mamana do Jamisse; mas que andava havia já muito tempo na região, pois saciara a sua sede e fome carniceira em dezasseis vítimas, homens, mulheres e crianças...

- Então porquê só agora vêm dizer-mo?
- Ah, senhor, nosso andava a preparar armadilha, mas aquele garramo não tem bom, não! Tem esperto no cabeça: ginga, ginga, e não deixa apanhar...-, e continuaram todos a descrever as animalescas façanhas da fera.

Pelo que os desventurados negros narravam, não era nada comum o comportamento do bicho. Aqueles métodos manhosos assentavam melhor no leopardo, mas não no leão, um animal feroz mas leal na sua agressividade.

Por tradição nativa, antes da imposição dos aldeamentos, uma família agrupava-se dispondo em círculo as suas palhotas maticadas, cobertas de capim seco e porta de bambu. Surgiam, assim, pela floresta, núcleos habitacionais de quatro, cinco, seis casas, em cujos intervalos brincavam os putos do clã.

E a velha fera, ao que contavam, bacharel em caça, não se fazia rogada: alta noite, abeirava-se mansamente e esgadanhava as unharras na parede frágil da palhota onde se alojavam os catraios da família. E, enquanto os pais dormiam na casa ao lado, a uns escassos dez metros, os miúdos acordavam assustados, gritando pelos “velhos” em desespero. Mas o leão não forçava a entrada. A mãe dos garotos acorria aos gritos aflitivos dos filhos e era recebida pelo leão, de bocarra aberta, que a arrastava, presa nos seus caninos devoradores, para longe, pois o macabro repasto era sempre em recatada sala de micaias, na selva fechada.

Era este o ardiloso estratagema, como já referi, pouco comum no comportamento habitual dos leões, mas utilizado nos casos concretos que o Carlos foi ouvindo com um misto de estupefacção e medo, enquanto coçava a meia dúzia de pêlos que lhe despontavam no queixo esguio.

Que raio! Por aquela é que ele não esperava! Fôra caçador, sim senhores, de pardais descuidados, de melros desaninhados, caídos na sua fisga infantil..., mas qualquer cão rafeiro o fazia fugir, hirto de medo, só pelo ladruçar raivoso, quanto mais uma fera daquelas!...

Mas não era ele o adjunto do posto, aquela gente não viera até ele procurando ajuda?! Não se sentia, pois, no direito de lhes defraudar a expectativa... e eis o Carlos a encher o peito de ar,, a vestir rija pele de valente, enquanto ia vertendo consoladoras promessas de justiça e vingança nos coações condoídos pela perda de familiares.

A seguir, foi vê-lo, qual D. Quixote do Índico, a preparar os seus bravos Sanchos e a escolher as armaduras com que havia de partir os dentes ao assassino.

A caçada ía começar...

- Sanica, chama mais dois cipaios. Traz também a tua Mauser. Vê se o Land-Rover tem gasóleo... e vamos embora!
- Senhor adjunto, o senhor administrador não tem de saber? – lembrou o cabo, em respeitoso reparo.
- Tem, pois é... vai lá dizer-lhe, enquanto eu vou buscar um bom´4e, mas se estiver a dormir deixa o recado à senhora ou ao mainato.

Entretanto, o numeroso grupo corria já em direcção ao povoado. Iam dar a nova e preparar toda a gente para a batida. Conhecedores dos caminhos secretos da mata densa, encurtavam muito os cerca de quarenta quilómetros que, por estrada, os separava do Lúrio.

O Carlos não levava a Mauser, como os cipaios. Não simpatizava com aquela espera-pouco de madeira, muito menos do seu coice demolidor. Só mais tarde lhe viria a reconhecer vantagem. No momento, preferiu munir-se de uma pequena pistola-metrelhadora FBP que o governo lhe havia distribuído.

Já acomodado no jeep cinzento, o cabo e o adjunto na cabina e os outros dois lá atrás, na caixa larga, passaram pelo barracão do posto, para o abastecimento. Este barracão era um misto de armazém e fábrica de curtumes, um casarão de troncos de umbila e capim seco, onde, por entre tambores de gasóleo e outras mixórdias, se espalhavam as peles que o administrador Barbosa, o grande senhor da terra, ia coleccionando, sabe-se lá se para fazer jus à sua nobre condição de herdeiro de Mouzinho...

Brilhantes as de jacaré, pardacentas as de itata, muito valiosas seriam as de leopardo, mas as esteticamente mais sugestivas eram as de zebra, pelo desenho artístico, a duas cores: a preta, dos naturais, a branca, dos europeus. Num canto do armazém, com as mãos sabujas de unguentos, o negro Majemba, químico de ocasião, amanhava mais uma pele de lince que ía exalando um odor horripilante.

- Não podemos demorar! A esta hora já o Momola com a sua gente está a chegar ao Lúrio...
- Ainda, senhor. Parece agora estão passar Monte Nivato, - resposta pronta do Sanica, com um sorriso sabe-tudo nos lábios gretados pela suruma, enquanto apertava a espingarda contra as cabedulas de caqui branco, domingueiro.

O jipão rosnava forte na picada estreita, cabrito da serra, de pedra em pedra. Estremecia, pulava, parava, acelerava, que o piso de matope esburacado, ondulado, mais parecia o mar encrespado ao largo de Matosinhos. Mas o Land-Rover era uma boa traineira, concebida para sulcar aqueles caminhos improvisados na selva, onde nunca haveriam de chegar os “pidacs” e os “feders” da CEE. Surpreendente era, também, a resistência daqueles pneus a que nem mossa faziam as mordeduras constantes de troncos salientes espreitando, disfarçados, nos tufos de capim verde.

Uma viagem assim era um verdadeiro exercício físico, ainda mais desgastante que viajar de Aveiro a Vouzela na velha automotora da Linha do Vale do Vouga!...

- Ué, mocunha, já viu aquele macaco todo?! – e o Sanica apontava, com as duas mãos espetadas na janela do carro, - come a machamba toda!

A uma centena de metros, os mais brincalhões habitantes da floresta, almoçavam lauto banquete: uma refeição gratuita, servida pelo suor dos nativos que, e não só por isso, detestavam a macacada.

O Carlos afrouxou e parou o carro, ensaiando fortes aceleradelas, no intuito de os amedrontar. Os bichos olharam curiosos e, depois de estudarem a situação, continuaram a ladroagem, arrancando à terra, com primata avidez, enormes tarolos de mandioca que devoravam sem cerimónia. Os mais velhos carregavam às costas pequenos filhotes de pêlo azulado, tupilis reguilas, mas imaturos nos trabalhos de pilhagem.

- Sanica, corre-os a tiro!

O cabo esfregou as mãos contentes, saiu da cabina e... pum!.. o macaco mais corpulento tombou, de ventre para o ar, lançando gemidos que confundiram o Carlos. Aquele choro aflitivo tinha qualquer coisa de humano, de súplica desesperada.Com a cabeça entre as patas, como que a rogar clemência, o bicho foi-se virando, lentamente, até que sucumbiu, encostado a um ramo de mandioca.

Os outros, nem vê-los! Haviam fugido para as árvores mais altas e frondosas, onde aguardariam, nervosamente, que os primos inteligentes, mas bem mais maldosos, abalassem.

- Hoje já tens almoço, Sanica!

Este, com um trejeito comprometido, olhou de novo para trás, para a caixa do jeep, onde imaginava já uma negra caçarola bem cheia de saboroso caril de macaco, cozinhado com bastante piri-piri...

- Vou também dar um bocado ao Iussufo e a Jamú... – enquanto acenava com a cabeça na direcção dos dois cipaios que viajavam de pé, na retaguarda, como que prestando honras fúnebres à vítima ensanguentada do seu cabo.

Nem todos os nativos de Moçambique comiam carne de macaco. Faziam-no os macúas, mas, mesmo no seio desta etnia, só certos nihimos o incluíam no menú. Porque até na alimentação eram diversos os costumes dos numerosos grupos étnicos daquele país. Como o são, adiante-se, as suas crenças, dialectos, personalidade e anseios. Nestes aspectos, Moçambique é uma autêntica manta de retalhos, em que só o espírito de nação, que começa a despontar, e a língua portuguesa são factores de união.

- Ainda falta muito?
- Não, senhor. Depois do rio, além, é mais pouco-pouco -, e o Sanica acompanhava a explicação com um abanar calculista da mão direita.

O sol quente, trémulo de fogo, trepava, apressado e irreverente, pelas vastas escadas do horizonte, quando, finalmente, atingiram o Lúrio. Era um rio pouco caudaloso, mas um viajante longínquo, nascido lá para os contrafortes do Niassa: deixava, ao passar, uma vegetação luxuriante a embelezar as margens sonhadoras...

Para o atravessar, o régulo Momola e a sua gente, haviam, anos antes, lançado mãos da sua empírica engenharia artesanal: compridos troncos de árvores, dispostos de uma lado ao outro do rio, revestidos por esteira pacientemente urdida por mãos habilidosas, de bambus entrelaçados.

Mas era precisa muita atenção ao efectuar a travessia auto daquela ponte, pois fora idealizada e projectada bem à maneira daquela gente: à medida da largura da viatura utilizada pelo administrador, e nada mais...

Ao Carlos, novato naquelas travessias, mais acostumado a travessuras, não ocorreu que urgia reduzir a velocidade, para galgar sem problemas os primeiros troncos e... zás, o carro salta, estrebucha, o capô abre-se, corta literalmente a visão... o jeep segue, bate... e pára.

- Senhor, tem bom? – interrogam os olhos arregalados do Sanica, fitando o Carlos como se ele acabasse de fugir das amarras do purgatório.
- Não é nada! -, olhando para os lados e para trás. À frente só via aquela chapa cinzenta, barreira que lhe havia ocultado uns bons dez metros de ponte, estreita, como já vimos.

E o jovem Carlos, com nervosismo comprometido, acabou por se rir, quando perspectivou a frio a ridícula cena que durou segundos e podia ter absorvido anos de vida.

Lá para trás, bem no meio da ponte, os dois cipaios estavam ainda sentados, boca entreaberta, olhando, mudos, as águas impávidas e serenas correndo lá no fundo, a uns bons trinta metros. As suas armas estavam tombadas, em desalinho, na caixa da viatura. E pensou, refeito do susto, como teria sido possível atravessar toda a ponte daquela forma...

- Tens de perguntar ao Mussa como é que ele traz o capô solto! Aquilo não se solta de qualquer maneira!-, como se quisesse transferir para o pobre mecânico/desenrasca lá do posto, a sua azelhice e inexperiência, ali tão evidente.

O Sanica não respondeu e, quando ambos saíram do jeep, olharam ao mesmo tempo para os duendes perdidos na floresta, interrogando-se qual deles plantara aquele providencial jambire no azimute desvairado do carro!... Se não fosse aquela amorosa árvore, esperava-os o abismo profundo, na margem do rio...

Os dois cipaios cuspidos, ainda espantados, atravessavam já o resto da ponte, aconchegando nas cabedulas assustadas, as camisas desfraldadas pela queda livre a que se viram sujeitos.

- Vamos chovar o carro para trás! - , ordenava já o cabo aos dois cipaios. E chovaram...

Estavam, então, a uns escassos duzentos metros do povoado, onde por fim chegaram, aliviados.

O Carlos depressa esqueceu o acidente e retomou o entusiasmo pela caça que, afinal, ali o levara. Tanto mais que aquela multidão, como raramente vira, armada de zagaias, pontas de lança, arcos, flechas, catanas, machados, tambores, latas e apitos, e todo um sortilégio de instrumentos, lhe lembravam, com certa ironia, as hordas de Viriato nas serranias da Estrela.

Mas, para além do costumeiro cumprimento, uma vénia mal dobrada, aquela mole humana mantinha-se silenciosa, num descampado dominado por quatro mangueiras ramalhudas, onde pontuavam já frutos amadurados.

O régulo Momola adiantou-se ao grupo, juntando-se aos recém-chegados, acompanhado de mais três ou quatro elementos, seus conselheiros tribais,, e um outro negro, ainda novo, armado de caçadeira: era caçador privativo de um europeu de Namuno que, casualmente, ali havia acampado e se dispusera a participar na caça ao leão.

Formou-se, ali mesmo, um “conselho da revolução” da caça, em que o Carlos desempenhou a cómoda função de moderador. Reconhecia, intimamente, ser o menos credenciado para ditar estratégias. Mas mostrou-se interessado e participativo e, sobretudo, prestava especial atenção aos experientes alvitres que íam surgindo. Estava ali, mais ou menos com a função do rei de Espanha: não governa, mas é um símbolo...

O plano para caçar o leão não era assim tão complicado! Consistia tão só em formar uma linha de nativos com os instrumentos sonoros e armas rudimentares de um lado do hipotético esconderijo da fera, enquanto os elementos com armas de fogo se emboscavam nos previsíveis pontos de fuga.

É que o Rei da Selva incomodava-se perante um ajuntamento grande e barulhento, habituado que estava à sua vida de anacoreta da mata silenciosa. E era com passada pachorrenta, com desprezo manifesto, que se virava, abanando a cauda, à arruaça que, do género, se lhe deparasse.

- Está tudo bem, mas onde encontrar agora o bicharoco? – e o Carlos olhava interrogativo para os seus pares.
- Nosso sabe, senhor, garramo tem além -, e o Momola apontava para a encosta arborizada do planalto ao fundo, e rematava, decidido: - tem junto do monte. Nossa gente leva lá...
- Vamos, então.

E o pequeno exército pôs-se em marcha pelos carreiros das machambas de mapira alta, de campos de milho com maçarocas douradas ao sol brilhante. Aqui e ali, iam ficando faixas rasteiras de amendoim e, mais adiante, fartos cachos de banana marrouce, dependuradas de troncos com larga folhagem.

Representava tudo o que ia vendo a base de subsistência, da vida daquela gente, numa economia mista, recolectora/produtora. Não era aquela, ainda, uma sociedade de consumo. Era a vitalidade de uma terra forte, que ofertava os frutos na medida do trabalho de cada um: quase sempre suficientes, sem excedentes, mas sem graves faltas.

Aproximavam-se já do monte, em cujas fraldas, de vegetação cerrada, estaria o refúgio do leão devorador. Mas nem o Momola, nem ninguém da aldeia, sabia indicar ao certo o local, tão vasta era a área.

- Vamos fazer a batida por bocados, Sanica?

A ideia era dividir toda a zona arborizada, entre a clareira e o monte, por faixas a bater.

Dividiu-se o pessoal: o da batida (a barulhaça) para um lado, os armados, para outro.

E a festa começou!

- Senhor adjunto, nós é melhor ficar ali. -, o Sanica apontava para um morro de mochem, abrigo natural para a espera. Os dois cipaios e o caçador foram-se, também, dispondo na zona.

Já o Carlos sentia um leve tremor do corpo, uns arrepios gélidos em sol escaldante, mas que se iam diluindo na azáfama. Tinha a impressão, sentia-o ao fitar os rostos excitados dos outros, que com feras daquela estirpe não se brinca.

Fosse pelos nervos, fosse pela fome – estava em jejum – o cara-pálida sentia um palpitar doloroso no estômago, quando se acocorou numa pequena saliência do morro baixo.

Era quase meio-dia. Um silêncio sepulcral dominava o ambiente. Nem um leve esvoaçar da passarada; nem o cair duma folha seca; o rastejar furtivo de uma cobra ou a corrida elegante e vaidosa de uma gazela!...

De repente, como o estropear da fúria louca de uma manada de elefantes rasgando a selva, como o alarido raivoso de mabecos em luta pela posse de um javali, a serra ecoa, o ar sacode-se. Todos aqueles tambores rufando, latas chocalhando e os sonoros berros das gargantas fortes dos nativos da batida, na outra orla da mata, impressionavam mais que o sapatear raivoso do nosso Parlamento em dias de polémica orçamental ou períodos eleitorais...

A selva tremia, o barulho aumentava, na justa medida que os batedores íam cruzando a mata em direcção aos emboscados. Só que já estavam bem perto, sem que o rei da selva aparecesse. Nenhum disparo soara, até ao momento.

- Ei, Sanica, o gajo não está cá! – diz o Carlos, quebrando a concentrada atenção do cabo, a focar a mata, rígido que nem uma marmota congelada.
- Parece não está, senhor -, sem, contudo, retirar os olhos desorbitados do arvoredo.

E não estava, de facto, naquela faixa. Deu-se o encontro dos dois grupos e leão nem vê-lo!

Curiosamente, nem um coelho, uma gazela, um javali, nenhum animal passara em frente dos emboscados. A esta constatação do adjunto, observou o caçador, com segura convicção:

- Pois não tem outro bicho, porque leão está por perto. Nosso vai encontrar, já viu patada dele...

O Carlos ficou a saber que numa área considerável em redor do palácio do rei leão, não havia lugar para outros animais menores: os súbditos, amedrontados, fugiam perante a presença ameaçadora do seu despótico amo.

E, a ser assim, nada estava perdido, tanto mais que haviam fortes indícios apontando para a presença próxima do devorador. Ía tentar-se a faixa seguinte.

E a operação repete-se.

Desta feita, à falta de outro abrigo, o Sanica sugeriu ao Carlos uma árvore velha de melala bifurcada. Era este o poleiro de espera para o mocunha, com a pele ardendo sob a inclemência do sol dum fim de manhã. Por baixo, brilhavam as micas soltas duma ribeira, seca naquela época do ano.

Enquanto esperava, de novo, ía pensando na sua posição caricata, qual ave no choco e deu consigo a conspirar surdamente contra o Sanica por lhe ter alvitrado aquele poleiro de abutre medroso. O sacana do cabo pensaria que ele tinha medo?!...

Mas, intimamente, até se sentia bem posicionado. Do pouco que sabia, os leões não voavam, ali não haveria perigo. Mas não se desvaneceu de todo aquele tremor dos dedos...

A algazarra recomeçara, ao longe. De novo os tambores, as latas, os apitos, os berros musicais do outro grupo, que se ía aproximando.

De repente, bem ao lado, soa um tiro. O Carlos, estendido num ramo, redobra de atenção, com a pistola metralhadora bem aperrada, pronta a disparar...

Tac..., tac..., tac..., o coração batia-lhe como cavalo em solto galope na pradaria. O suor aumentava-lhe no rosto, o ar faltava-lhe nos pulmões, quando, mesmo por baixo, a uns escassos três, quatro metros, na vertical, o nosso leão, com as patas enterradas na areia, olhava pesadamente para um e outro lado da ribeira, desconfiado. Ouvia-se nitidamente a densa respiração da fera, uma bisarma medonha, grande, nutrida...

O Carlos agiu, então, como um autómato; o seu consciente estava às portas do bloqueio, em presença de tão leonina figura. Ensaiou uma duvidosa pontaria na direcção do monstro e disparou uma rajada breve, sem se preocupar com a escolha dos pontos mais vulneráveis; bastou-lhe divisar a massa enorme do bicho na mira e carregar no gatilho.

Era difícil, quase impossível, não acertar, de cima para baixo, àquela distância!

Mas, ao contrário do que pressupunha, aquele não tombou: soltou um urro arrepiante e empreendeu um salto descomunal, embrenhando-se pelo capim alto.

E o nosso jovem manteve-se quieto, mudo e surdo, por uns instantes. Veio-lhe, depois, um pensamento derrotista: falhara..., e saltou da árvore. Na areia seca, nem um pingo de sangue. E ia cogitando: mas era impossível não lhe ter acertado!...

Procurou o Sanica com os olhos, mas o cabo não estava à vista e continuava a remoer no sucedido, quando troaram dois tiros de caçadeira, mais além. Mas manteve-se no local.

- Senhor, já está! O gajo já morreu, tem ali..., o caçador Sacura encontrou caído lá... -, gritava o Sanica, entusiasmado.
- Encontrou caído?! Mas não foi ele que o matou com aqueles dois tiros? – interrogou o Carlos, já bem mais animado.
- Não, não senhor, - voltou o cabo, - o gajo já estava sofrer p’ra morrer, com tiros do senhor adjunto. Sacura deu tiros para segurar ele, que leão ferido fica perigoso mesmo...

Começou a desvanecer-se aquela sensação amarga do fracasso. Afinal, acertara-lhe!

Quando chegou, com o cabo, junto do animal moribundo, o Sacura fez questão de lhe mostrar os três pequenos furos com que o Carlos o havia atingido na espádua. Só que, como aquele continuou a explicar, aquela zona do corpo é dura, não dá para matar logo, com balas de 9 mm. Ele, sim, atirara como um bom caçador: bem na cabeça do gigante..., os zagalotes desfizeram-lhe o focinho...

Mas já um verdadeiro festim começara.

Uns cantavam, outros dançavam, fez-se batuque com o rufar dos tambores; vieram mamanas, vieram catraios, um mar de gente em delírio fez círculo em volta do odioso assassino.

O Carlos sentia-se baboso com tanta e espontânea lisonja, tanto kuerine, tantos beijos de ousada gratidão que as moçoilas lhe iam depositando na face!

Bem real, era para aquela gente o fim de um pesadelo e, também, o vingar dos seus mortos; o castigo do criminoso ditado por um código penal que de pimentel nada tinha...

E a festa continuou ali mesmo, agora com um estranho ritual, nunca visto: toda aquela gente alinhou em fila e, um a um, ao som de afinado cântico, foram espetando uma lança, passada de mão em mão, na cabeça da fera assassina.

Já eram quatro da tarde daquele agitado domingo quando o cadáver, após ter sido arrastado até à aldeia, foi carregado, por uma dezena de braços fortes, na caixa do jipão. Era o regresso. Antes, porém, ainda no povoado, fora o almoço: frango à cafreal com xima e sumo de caju não faltaram, que toda a gente se dispunha a presentear quem, a seus olhos, eram os seus salvadores. Para o Carlos, apesar dos insistentes protestos, ia uma cangarra de galinhas e um cacho de bananas. Eram pessoas generosas na sua pobreza, gratas na sua humildade, os macúas.
- Senhor, eu pode ir? – perguntou o régulo Momola, rodeado pelo seu povo. – Vai dar-me um pouco de xicuembo? Referia-se à gordura que reveste os intestinos do leão.

Entre os macúas e até de parte da colónia de indianos e europeus, era convicção ser aquela gordura um excelente remédio para o reumatismo e até muitas doenças do foro íntimo, como a impotência.

- Mas o leão é vosso! Podem fazer dele o que quiserem!...
- Não, senhor é dono de leão. Quem mata é dono, pode fazer o que quiser dele, - interveio o Sanica, para dar a conhecer mais um dos costumes ancestrais dos nativos.

Já o motor do jeep roncava alegre, de novo na picada. Desta feita, com mais cuidado, não fosse, mais uma vez, a ponte tecê-las...

Chegaram tarde ao largo do posto. Já os miúdos da missão, em visita à sede administrativa, brincavam chilreantes, após o arrear da bandeira.

O administrador, sentado com a mulher e filhos à sobra duma frondosa bugambília, dirigiu-se-lhes apressado e interrogativo.

-Então, Carlos, que tal a caçada? Já estava preocupado com tanta demora! Oh, mas que grande bicho!... – largou, estupefacto, ao debruçar-se no bordo da viatura. - É um grande bicho!

Surgem as explicações de toda a ordem; o onde, quando, como e porquê; dão-se parabéns, vai chegando mais gente, curiosa.

A notícia corre célere e aparecem, também, os europeus da terra: o Fonseca da cantina e a mulher, o Carvalho do algodão e as filhas, e pessoal do aquartelamento militar, que apenas ali se encontrava aquartelado por questões de quadrícula, pois não havia qualquer conflito latente na região.

Todos se encontravam ali mais empenhados em registar na película a sua momentânea comunhão com o senhor da selva.

Os de camuflado não deixariam de enviar uma foto de ocasião às suas madrinhas de guerra, saudosas, em Portugal.

E durou horas aquela peregrinação fotográfica, a quebrar a monotonia sertaneja dos pacatos dias de Balama, enquanto o administrador Barbosa ía passando o tempo a lamentar o exagerado esburacar da pele, que a deixava pouco fiável para a sua desmesurada colecção de curtumes, na salgadeira do armazém.

Quanto ao Carlos, esse tivera direito a algumas duras unhas de leão. Se para mais não servissem, ajudá-lo-iam a esgadanhar nos escolhos que se lhe foram deparando na encruzilhada da vida.

Por longos anos, se foi falando no norte de Moçambique do tristemente célebre “leão dos 16”.

Mas, triste sorte, negro fado o daqueles macúas, pois antes, então e depois, foram sempre vítimas de leões, se calhar mais carniceiros que aqueles, com jubas de todas as matizes... E dessas feras, nem Carlos, nem Sanicas, nem Sacuras os puderam livrar...

Quanto ao autor, tendo passado ao papel este seu conto já lá vai mais de uma dezena de anos, só agora ganhou coragem para o compartilhar, mais por temor àqueles cartazes que se vão vendo em alguns estabelecimentos de venda de armas: “Aqui se juntam caçadores, pescadores, advogados... e outros aldrabões”.

Mas vale a pena correr o risco, suplantado pelo testemunho do maravilhoso fascínio das terras moçambicanas, na sua original e genuína natureza!
- Francisco José Branquinho de Almeida - 1978.

(Transferência de arquivos do sitio "Pemba" que será desativado em breve)

6/05/07

PEMBA - SUA GENTE, MITOS E A HISTÓRIA - Parte 2

(Continuação daqui)
II.
A BAIA DE PEMBA
A baía de Pemba, a 13o 00’ Sul e 40o 30’ Este da costa de África, é vulgarmente considerada a terceira maior do mundo, sendo a primeira a de Guanabara no Brasil seguida da de Sidney na Austrália.
As suas águas ondeando tons, ora azuis ora verdes, apresentam-se mansas em dias de bom sol e agradável tempo mas também escarpadas, rugindo de encontro aos rochedos ou regalando pela areia quando os ventos sopram furiosos do Sul.
Este ventos mais conhecidos na região por “kussi” originam, não raras vezes centros depressionários bastante fortes do tipo tropical que arrasam quase por completo a cidade.
O mais antigo temporal que a documentação disponível nos pôde recordar data de 18 de Dezembro de 1904 que causou vários danos assim como levou ao afundamento um pequeno vapor e um iate. É feita referência nessa altura à falta de faróis ao largo da baía, sendo o único o da ponta Said Ali que, para além de ter somente 6 milhas de alcance e não 9 como indicavam as cartas de então, não era aconselhável aos navios que passassem no alto mar.
Outro grande temporal devasta Pemba em 1914, destruindo pratica­mente todas as habitações e provocando grandes embaraços aos serviços da Companhia. (1)
Estes ciclones assolam de tempos a tempos a região de Pemba, tendo o mais recente ocorrido em 1987.
Em sua extensão a baía de Pemba atinge os valores de 9 milhas de Norte a Sul e 6 de Leste a Oeste, perfazendo um perímetro de 28 a 30 milhas.
Mas não só por isso ela goza de tal fama como também pela pro­fundidade do canal de acesso e do porto, com sondas que variam entre 60-70 metros na entrada e 10-40 na parte média, para atingir os 25 metros no fundeadouro junto ao cais diminuindo em direcção á costa.
A sua entrada é, pois, franca a qualquer tempo e hora, podendo nela penetrar à vontade navios até cerca de 6 metros de calado. No entanto, devido a alguns perigos isolados formados por rochas e bancos de coral, é necessária a pilotagem para os navios de alto mar.
A boca de entrada a partir da qual é feita a pilotagem é delimitada a Norte pela ponta Said Ali e a Sul pela ponta Romero, havendo actualmente farolins em ambos os lados.
Desaguam na baía alguns pequenos rios sendo o maior o Meridi cuja foz desemboca nas proximidades do baixo Mueve.
A baía de Pemba constitui, sem dúvida, um porto natural bastante seguro e, apesar de tudo, abrigado dos temporais regionais, tendo sido qualificado por Elton - Cônsul britânico em Moçambique a finais de 1890 - como "O melhor desde Lourenço Marques a Zanzibar”.
Alguns autores supõem que a baía de Pemba possa ter tido uma origem vulcânica, baseando-se no facto de ali se encontrar com abundância a "pedra pomes" própria de rocha vulcanizada. Mas a sua constituição calcária e não basáltica vem a contradizer tal suposição.
Das origens do nome pouco mais se sabe do que as escassas informações recolhidas da tradição oral, algumas das quais baseadas em lendas, e deve tomar-se em consideração que a designação de Pemba para nome da região não foi a única ao longo dos tempos.
Em anos muito recuados da nossa história a baía de Pemba era frequentada apenas por alguns pescadores malgaches e swahilis que em suas pequenas lanchas e pangaios arrecadavam o alimento sem nunca ali se fixarem.
Conta então uma antiga lenda que por essa altura uma de tais embarcações apanhadas por um temporal naufragou tendo como sobrevivente uma mulher que se viu obrigada a procurar algum refúgio nas proximidades da baía.
A mulher importante (“nuno” em língua local ) conseguiu sobreviver e montar ali a sua guarita. Naturalmente conotada a "Nuno" pelos pescadores como "mensageira divina" demonstrando que a zona poderia ser perfeitamente habitada, ela fê-los seguir o seu exemplo.
Nasce a zona de Nuno pelo qual foi conhecido por longos anos o actual bairro do Paquitequete. Mais tarde viria a anexar-se a esta designação a expressão “pampira” (no sitio da borracha) em virtude da grande quantidade da árvore da borracha que no local nascia espontaneamente.
A região servida pela baía de Pemba foi também já conhecida por Mambe expressão que pode simultaneamente significar quantidade e longitude.
Embora certos autores relacionem “mambe” à baía de Pemba, a região a que a administração colonial designa por esse nome se situa mais a norte, no distrito de Macomia.
Uma outra tradição oral refere que um europeu, em data também não precisa, proveniente de Zanzibar faz desembarcar na baía os indí­genas que o acompanhavam e, estes, vendo-se assaltados por grandes enxames de moscas gritavam dizendo “pembe” que em swahhili si­gnifica mosca.
Teria sido mambe, pembe ou outra a origem da expressão "Pemba" no território moçambicano (2), certo é que ela figura nas primeiras cartas inglesas como "Pembe Bay”.

III.
A "FORMOSA" E OUTRAS PRAIAS
Na enseada do Imbo ao longo da reentrância de 2,5 milhas para Oeste da ponta Maunhane estendem-se as praias mais límpidas de areia bastante fina e solta umas vezes branca outras vezes negra, alter­nando zonas com rochedos e outras completamente descobertas.
De fronte de quase todas elas existem áreas de corais de diversa variedade visíveis mesmo a olho nu.
A principal praia é a de Wimbi ou a "Formosa", nome por que era conhecida pêlos portugueses, povoada de coqueiros da índia e é a mais procurada pelo turismo na zona dada a sua serenidade, contras­tando ali o suave sibilar das ondas com o movimento de restaurantes bastante frequentados.
A praia do Wimbi está localizada a cerca de 6 quilómetros do centro da cidade em direcção à ponta Maunhane e é mais usada para o recreio desde 1950, altura em que os portugueses iniciaram a sua urbanização.

IV.
A GENTE E A SOCIEDADE
A população de Pemba é bastante heterogénea, tendo para lá emi­grado do interior os macuas, os ngonis ou mafites e os macondes. Do litoral, os nguja do Tanganica, os sacalaves do Madagáscar e os mujojos das Comores. A civilização europeia, particularmente a trazida pelos portugueses é também notória, já que ali a colonização assimilou grande parte da população, mesmo a não mista.
Nas regiões circunvizinhas à cidade de Pemba existiam já antes da ocupação pelos portugueses algumas povoações chefiadas por ré­gulos, sendo o principal o sultão Mugabo, seguido de outros como o Said Ali, Mutica, Macesse e o Mugona.
O Governador de Cabo Delgado que, em em 1857 foi incumbido de ocupar a região e aí formar uma colónia, faz especial referência ao "velho" Mutica que, à excepção dos outros, falava ainda a língua portuguesa e muito contribuirá para o sucesso das negociações.
Fortemente swahilizados estes régulos que se expressavam e escre­viam geralmente em árabe, edificaram sociedades semi-feudais cuja autonomia se manteve ao longo dos tempos, até mesmo hoje, con­tinuando a exercer grande influência e poder no seio da população, cujo principal credo é o maometanismo mesclado de antigas tradições fetichistas como em quase todas as regiões da província.
A estas autoridades de relações amigáveis e até mesmo honestas com outros povos em certas alturas, também não lhes faltaram momentos de agitação e saque.
Já em 1843 o cheique Macesse, que chefiava a região actualmente conhecida por Pemba-Metuge, revolta-se contra a submissão aos portugueses, expulsando a companhia militar portuguesa estacionada num navio à entrada da baía de Pemba. Como corolário do desenrolar destes acontecimentos o cheique Macesse devolve a bandeira por­tuguesa às autoridades coloniais nas mãos do ajudante de Arimba, José F. Carrilho e recusando-se a pagar qualquer espécie de tributo.
Salientam-se também as investidas feitas pelos régulos Mugabo, Said Ali e outros contra caravanas europeias no circuito de Quissanga, obrigando-as a uma rota que levaria a mercadoria antes para Porto Amélia.
Se por um lado isto viria a abrir um caminho para o desenvolvimento de Porto Amélia a finais do século XIX, não menos verdade é que o facto veio a onerar bastante o processo de embarque e desembarque da carga já que Quissanga comunicando mais directamente com o "medo" era o principal porto exportador de então para o comércio e tráfico “ajaua-meto”.
A maior parte dos régulos antes da segunda década do nosso século se submetiam, na cintura de Pemba, ao régulo Mugabo, cujas terras confinavam com as da "coroa do medo", estas chefiadas pelo pode­roso maravi Mualia, ora submetido ora sublevado aos portugueses.
O quadro etnológico da população de Pemba remonta-se principal­mente à fusão do grupo macua com castas muani, penetrados res­pectivamente a partir de Murrébue e Quissanga.
Embora de diferentes origens as populações de Pemba se subordi­navam ao régulo Muária também de origem maravi.
O regulado Muária nasce cerca de inícios dos anos de 1880 quando famílias como Heri e Bachir pertencentes ao mesmo clã atingindo a região do medo avançam em direcção ao litoral pela rota Chiúre/ Mecufi/Murrébue.
De acordo com a "rainha" Muamba Omar Ussofo mais conhecida por Nhanicuto e descendente dos Muária, a dinastia se inicia com um tal Heri l na região de Changa (Murrébue) nas terras do régulo Nampuipui.
À morte de Heri l sucede ao trono Heri II que, para não defrontar o régulo Nampuipui que lhe fizera guerra acusando-o de ocupação ilícita das suas terras e compromisso com os portugueses, foge e refugia-se em Pemba na área da Maringanha. Parte do clã seguiu para Quissanga.
O successor de Heri II foi Remane Bachir que viajando para a África do Sul, como era seu hábito levando consigo voluntários (de acordo com a fonte ) que para lá queriam ir viver, foi chamado para assumir o cargo e é nessa altura adoptado o cognome de "Muária" para o regulado que agora começava.
Muitas vezes se fala de Muária como tendo alguma relação de parentesco, de clã ou mesmo qualquer outra com o regulo Muália, o que é negado por Muamba Ussofo, mas pode sobreviver a ideia de auto-identificação com o poderoso e conterrâneo maravi das terras do medo.
Amad Ali, avô do régulo Remane Bachir, descobre a zona de Marindima em Pemba e mobiliza a sua família e a gente de Changa para a habitar, o que veio a acontecer.
No entanto, fugitivos aos ataques dos ngonis, que lançavam as suas investidas com armas de fogo e azagaias a partir do ponto da colina que cai a pique na região de Marindima, bem como pelo facto de ali não haver água potável, a população deixa a zona e vai fixar-se junto às lagoas de Natite.
É então que Remane Bachir manda limpar as áreas de Nuno e Ingonane para ser habitada colocando lá como chefes dois familiares seus, nomeadamente as rainhas Nhanicuto e Nhacoto.
Enquanto isto o régulo Remane Bachir Muária entrega o Wimbi ao chefe Namacoma e a região compreendida entre o Nanhimbe e Maringanha ao seu irmão capitão-mor Tagir Bachir.
Anra Bachir sucede a Remane no regulado Muária e tendo este morrido fica como sucessor o seu sobrinho Fadili Adi, seguindo-se - lhe o seu irmão Anli Mugola.
Durante o reinado de Anli Mugola, este entregou a zona do Cariacó ao chefe Amada Muária, já na década de 60 do nosso século, que ao ser preso pela Pide é substituído por Abdul Latifo Ncuo.
Para além das já citadas rainhas o Paquitequete teve ao longo dos tempos ate à independência de Moçambique outros chefes, no­meadamente Mussa Amad, Pira Anlaue, Said N’Ttondo, entre outros.
Das relações com as autoridades coloniais que, mesmo antes de ocupar a região mandavam anualmente um encarregado de cobrança do imposto, a velha Omar Ossofo relata que quando chegava tal enviado eram içadas três bandeiras portuguesas: uma na praia junto à ponta Romero, a outra à frente da residência do régulo Remane e a terceira no quintal deste.
A população para não pagar o imposto abandonava as suas casas e internava-se mais para o interior e o funcionário da administração colonial em acto de vingança queimava todas as residências, obri­gando a população a construir alpendres provisórios após a sua retirada.
Em língua macua “marapata” significa alpendre ou algo provisório, alcunha que a população deu ao dito funcionário.
Nessa altura a designação de Pemba limitava-se somente a uma pequena área, próximo à ponta Miranembo, onde o governador colonial Jerónimo Romero havia instalado o "Estabelecimento da Baia" e construído um fortim que a população de Muária usou como refúgio nas razias que os sacalaves levaram a cabo.
Embora fora dos parâmetros deste estudo mas para dar uma ideia mais ampla da distribuição territorial do regulado Muária podemos acrescentar que dados de 1970 indicam que o régulo Ntondo, ocupava em Porto Amélia uma área de 1.042 km2 (Paquitequete), seguido do propriamente chamado Muária em Natite com 264 km2, Namacoma no Wimbi com 504 km2, o Piripiri no Gingone chefiando uma área de 8 km2 e o Nansure do Cariacó a Changa com 230 km2. (3)
Considerando por outro lado que os portugueses recrutavam na região do medo os carregadores para as suas caravanas é óbvio que muitos deles em Pemba se foram fixando, o mesmo sucedendo à gente migrada das regiões costeiras.
Os conflitos tribais que sempre existiram entre ambas as etnias (e para um período mais curto também com os macondes) eram compensados pelas trocas comerciais, sobretudo o contrabando e tráfico de toda a espécie.
Apesar de Pemba ser zona costeira, provida de uma enorme baía, muito pouca gente se dedica hoje à pesca, absorvendo o sector pes­queiro apenas cerca de 200 pescadores (dados de 1987) que em suas casquinhas, lanchas e algumas pequenas embarcações fazem não mais que uma produção anual de 150 toneladas de pescado. É também verdade que a intensiva exploração ao longo dos tempos dentro e ao largo da baía, tornaram os recursos marinhos mais escassos.
De marinho típico é, por aquelas bandas, verem-se, nas vazantes das águas com bastante afluxo no período das marés vivas, mulheres, homens e até mesmo crianças de tenra idade ora cercando peixe muidinho com finas malhas ora apanhando conchas ou moluscos comestíveis.
Tão típico é isto quanto o prazer de encontros amigáveis na praia ao nascer e ao pôr do sol, nem que seja sob o pretexto da necessidade de defecar na praia (por tradição), ali se juntam grupos de pessoas em animadas conversas (e quem sabe não mais?) por várias horas.
Grande parte da população dedica-se no entanto à pequena indústria artesanal e a outras ocupações liberais e informais bem como ao comércio, não deixando de praticar um pouco de agricultura para subsistência, com especial incidência no milho, mapira, mandioca e mexoeira.
O comércio ambulante vem ganhando dimensões cada vez maiores e os mercados provêm essencialmente do tráfico swahili com quem qualquer negociante mantém fortes laços.
Pemba, este pequeno satélite e entreposto swahili de tempos remo­tos, conserva ainda suas antigas tradições e hábitos assimilados das gentes do Tanganica. A preferência em artigos do mercado oriental e a quase generalização da língua swahili, embora misturado com o idioma macua e a língua portuguesa, é também realidade.
O “Sungura”, dança importada da Tanzânia, diverte todos os dias e durante toda a noite a população dos bairros periféricos.
Dessa gente não há quem falte, pois aliado ao divertimento algum namorisco poderá, eventualmente, acontecer.
Os três ou quatro conjuntos musicais que actuam em simultâneo nos principais bairros de caniço expressam-se em língua swahili. Os dançarinos os acompanham.
O "mini na kissikia swahili" (eu compreendo swahili) liga uns e outros numa libertação e fruição de mais um dia passado.
As comunidades de maior influência árabe-swahili, muito dedicadas ao comércio com a Tanzânia, localizam-se em ambas as extremida­des: Maringanha ao Sul e o Paquitequete ao Norte.
Contava há poucos anos um velho auxiliar de faroleiro uma interes­sante e peculiar história sobre a origem do nome Maringanha já que a explicação nos conduz a um facto de que a gente de Maunhane jamais viria a esquecer: trata-se da construção de poços de água, um dos mitos de mau agouro ameaçador de morte a quem o construísse.
O facto deu-se após o ciclone de 1914 quando, já reconstruída a povoação de Maunhane, o faroleiro Heliodoro José Carrilho inaugura os poços (por ele próprio mandados construir) gritando o lema: “Muringana?”, que em língua local significa "estão completos?" ao que a população respondia em uníssono "Ti ringana”, que nada mais é do que a confirmação.
Será que por popularização como indicava a fonte e deturpação da expressão "mu ringana" viria a resultar Maringanha?
As cartas no entanto designam de ponta "Maunhane" à região e não é de admirar já que localmente a expressão significa "no sítio dos macacos" dado que em tempos parece ter sido ali o local por eles preferido.
Ainda hoje muitas vezes se vêem macaquitos a vaguear pela Ma­ringanha saltitando por entre o sombreiro das casuarinas e coqueiros junto ao farol como que apreciando as centenas de mulheres que na vazante avançam pelo mar em busca de marisco, o "caril" diário.
Trata-se principalmente da apanha de certas conchas com carne comestível mas pouco ou nada comercializável por se tratar quase de um dever tradicional de toda a mulher e suas crianças procurar moluscos e pequenos crustáceos tanto para seu sustento como até por simples ocupação do tempo e desporto.
Para além da pesca artesanal a população da Maringanha dedica-se também à pequena agricultura bem como à fermentação alcoólica do caju. Aqui a amêndoa deste fruto é no geral consumida quer verde quer torrada depois de seca ou mesmo, em ambos os casos, também utilizados na culinária.
Na outra extremidade de Pemba encontramos o Paquitequete que apesar de desenvolver um forte comércio swahili alberga por outro lado famosos artesãos e gastrónomos ensinados no Ibo e trazidos para ali aquando da transferência da sede da administração da Com­panhia do Niassa.
Ourives trabalhando a prata das moedas portugesas antigas e o ouro das libras estrelinas que ainda vão aparecendo, arrancado às relíquias de algumas poucas “sinharas” (senhoras) ainda vivas apesar de velhinhas, que em seus quintais confeccionam para venda famosos doces, compotas, diversos bolos doces e salgados bem ainda como achares de variado tipo.
O Paquitequete está quase separado da cidade por uma lângua que seca quando a maré vaza mas repleta de água na enchente e, nessas ocasiões, não falta “negociozinho” aos miúdos das casquinhas ganhan­do algumas coroas aos que desejem encurtar o caminho caso estejam em ambas as extremidades já que a ponte se situa quase no extremo sul deste enorme bairro.
O nome de Paquitequete provém da expressão "pá hitequete” que significa por um lado "no sítio do hitequete" ou melhor uma planta que cresce toda emaranhada muito comum ali, por outro é aplicada à característica do próprio bairro com casitas todas muito juntinhas umas das outras formando um autêntico emaranhado.
Engloba ele junto ao mar as áreas de Cofungo na ponta Mepira, seguindo-se em direcção à ponta Romero as zonas conhecidas por Nazimogi, Paquitequete propriamente dito, Cumissete e Cuparata. Há a acrescentar ainda uma casta de mestiços do Ibo que se isolou um pouco mais para a costa a seguir a lângua, dando origem ao bairro da Cumilamba que galga um pouco a parte da escarpa Leste da cidade de Pemba.
Enquanto que na Maringanha a ponta é alcantilada e orlada por um recife de coral que cobre e descobre em Mepira ela è baixa e arenosa caindo a costa a pique sobre o mar.
Nas regiões centrais da península localizam-se os bairros semi-urbanizados de Ingonane, próximo à ponta Romero assim como o de Natite e Cariacó mais a sul onde vivem principalmente os novos artesãos, o pequeno operariado local e os potenciais produtores e negociantes de aguardente e outras bebidas tradicionais, tais como os fermentados de cereais ou farelos.
Estes bairros desenvolvem-se a partir da ponta Romero que é baixa e também orlada por recife de coral que cobre e descobre. Tem praias arenosas mas as ondas são no geral bastante violentas. A ponta Romero antes da ocupação pêlos portugueses era conhecida pelo nome Miranembo.
A tradição reza que ainda no tempo em que a região era floresta cerrada, albergando grandes manadas de elefantes certo dia enfurecidos avançam em direcção ao mar e o mais velho (o chefe) que seguia à frente não foi capaz de estancar na ponta o que o levou a precipitar-se por sobre as águas e dai engolido pelas ondas. De súbito os outros elefantes param e aterrorizados tomam rumo oposto fazendo uma retirada para o interior sem nunca mais por ali aparecerem.
Ora, localmente a expressão “umuiria” significa engolido e “nembo” o vocábulo elefante, ou seja o lugar onde foi engolido o elefante. Naturalmente, segundo a lenda, as duas expressões ter-se-iam fundido dando origem à palavra “umuirianembo”, posteriormente, “miranembo”.
Entre o Cariacó e a Maringanha encontram-se o Wimbe e o Nanhimbe (actual bairro Eduardo Mondlane) dedicando-se à agricultura de su­bsistência e à fermentação alcoólica do caju.
Já no cimo da colina podem-se ver, do levante ao poente, os bairros de Chuiba ou "Planalto dos Cajueiros", Gingone e Muxara, pratica­mente cobertos de cajueiros, e são os que mais comercializam a amêndoa do caju e se dedicam à fermentação alcoólica da respectiva maçã bem como à pequena agricultura.
O rochoso baixo de Nacole a 1,5 milhas para Sueste da Ponta Mepira, projecta ao longo das suas praias de Chibabuara onde, do ponto mais alto da cidade, a colina se faz cair abruptamente.
Outrora um esconderijo de larápios por possuir densa floresta, hoje a sua população é essencialmente constituída por pescadores que, apesar dos rumores de existência de um polvo gigante ali mesmo na baía, essa gente continua fazendo alguma pescaria sem qualquer receio.
No centro da península onde está instalada a cidade de Pemba, ergue-se a zona de cimento desde a Baixa ou "Cidade Velha" junto à qual foram construídas as primeiras casas de alvenaria por facilidades de acesso ao porto, estancando numa planície provida do melhor parque habitacional.
É também nesta zona onde se encontram o Governo e serviços públicos diversos, combinados com uma cadeia de estabelecimentos comerciais bem como um parque infantil onde funciona também uma creche.
O actual porto e ponte cais de Pemba na baixa estão localizados na região meridional da baía a 5 amarras para Sueste da ponta Mepira, com fundo de lodo. O fundeadouro pode alcançar-se a pouco mais de 80 metros, onde se encontra o molhe cais, dado que os fundos se aproximam bastante da terra.
Existem no porto diversas instalações para armazenamento de cargas e para serviços marítimos e aduaneiros. Está também apetrechado com um sistema para a contenção de combustíveis que, através de uma conduta de cerca de um quilómetro, são despejados para os depósitos da Petromoc próximos à povoação de Chibabuara.
A primeira obra efectuada na "Formosa" em Pemba data de 1958, quando as autoridades locais colocaram à disposição do município pouco mais de 29 contos para a construção de um pavilhão / balneário, a que os pembenses tanto se acostumaram para estacionar seus haveres e petiscos que traziam para divertidos piqueniques.
Esta obra foi concluída dois anos mais tarde com um subsídio adi­cional de cerca de 18 contos dispensados pelo Governo do Distrito para os custos de urbanização e arruamentos da praia do Wimbi, por forma a melhor ligá-la à cidade.
Em 1961 possuía já aquela praia duas pequenas habitações para quem quisesse passar lá alguma temporada e o exemplo foi seguido por alguns residentes das classes mais abastadas que ali começaram a montar suas próprias casas para repouso.
A mais exótica casa construída por essa altura na Formosa foi a do Governador do Distrito, hoje do Presidente da República, com arqui­tectura naval, projectando um navio – o “WIWIPI”, onde a residência se encontra instalada.
Assim, uma casa após outra a urbanização da praia do Wimbi se tornou realidade e sempre chamando a si mais gente.
A meados dos anos 60 funcionava já nesta praia o bar "Tininha", assim baptizado por ser também o nome mais popular da f ilha do proprietário que à morte de seu pai toma as rédeas da "embarcação" com grande prestígio e fama nada deixando esmorecer.
Em 1968 abriu na praia do Wimbi o Centro Náutico (hoje extinto) onde funcionava uma escola para velejo, natação e pesca desportiva.
Promovia este centro diversas actividades de recreio ao largo da baía, sendo de realçar as competições entre velejadores, almadiadores, caçadores submarinos e ao currico bem como interessantes con­cursos de construções na areia nas festividades do dia da cidade.
Em 1971, por ocasião de tais comemorações o Governador do Distrito de Cabo Delgado, concedeu um subsídio de 20 contos para a aqui­sição de um motor de popa para um barco destinado ao apoio da Escola de Vela que nesse mesmo ano começou a funcionar. Com idêntico objectivo algumas firmas locais contribuíram com 12.500 escudos.
Ainda a inícios dos anos 70 foi construída na praia do Wimbi o centro social do Aeroclube (agremiação também já extinta).
Para além da praia do Wimbi espalham-se pela cidade tantas outras sendo de realçar a de Natite de fronte às antigas instalações de processamento de peixe da “INOS" e em tempos a de Cumissete com bastante rocha, também conhecida por "praia dos pecados" (com excelentes rochas na escarpa em forma de sombreiro), mas hoje praticamente um porto de pesca bastante frequentado.
Junto ao cais, que igualmente não deixou de ser usada por gentes das regiões baixas encontra-se a praia de Marindima, ou popularmente da Sagal, em virtude de as instalações daquela empresa algodoeira colonial estarem ali situadas. Foi nesta praia, apesar de lodosa, que muitos jovens de Pemba aprenderam natação e disputaram diversos torneios da modalidade.
Na parte setentrional da baía, nas áreas dos régulos Macesse (Bandar) e Said Ali (Mussange), localizam-se também belas praias ainda não exploradas com fundeadouros propícios e o seu correcto apro­veitamento deixaria muito a lograr o desenvolvimento do turismo na região.
(Continua)