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1/14/08

Palma, em Cabo Delgado declara guerra aos animais...

POR VENTURA ALGUÉM JÁ INDAGOU OU TENTOU PESQUISAR O PORQUÊ DE OS ANIMAIS DA SELVA, NOMEADAMENTE OS ELEFANTES AFRICANOS, EXERCENDO SEU INSTINTO NATURAL DE SOBREVIVÊNCIA, PASSAREM A DESTRUIR AS CULTURAS AGRICOLAS E A HOSTILIZAR O SER HUMANO ?
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Palma - Cabo Delgado: Conflito Homem/animal ganha níveis calamitosos - Pedro Nacuo, Maputo, Segunda-Feira, 14 de Janeiro de 2008:: Notícias
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Cerca de 370 hectares de culturas diversas, entre as quais extensas áreas de palmar, cajueiros, mapira, mandioca e arroz, foram destruídas em Palma por elefantes e outros animais bravios, deixando sem sustento 836 famílias.
A acção dos animais naquele distrito setentrional está a tomar níveis de uma calamidade natural e o Governo distrital ainda não possui nenhum plano para socorrer as vítimas, embora reconheça que o conflito representa um dos mais persistentes problemas, que trava o bem-estar dos habitantes daquele ponto da província de Cabo Delgado.
Numa visita efectuada semana finda à Palma, constatou-se extensas áreas de palmar e de cajueiros destruídos, assemelhando-se à acção de um ciclone, sobretudo no posto administrativo de Quionga, com destaque para a sede e as aldeias de Namoto e Quirinde, onde famílias estão de braços cruzados depois da razia das suas culturas, provocada pelos animais bravios.
O elefante é apontado como sendo o mais destruidor.
Amade Issa, um dos residentes da sede do posto administrativo de Quionga, perdeu 310 coqueiros e 210 cajueiros. Trata-se de um dos cidadãos que representa apenas uma das 836 famílias estimadas pelo Governo distrital.
A vítima não esconde a sua total insatisfação, sobretudo por as autoridades não se mostrarem capazes de resolver o conflito nem de minorar a situação calamitosa em que se encontram as pessoas depois de verem os seus produtos arrasados pelos paquidermes.
“Eu estou a falar de 310 coqueiros, 10 hectares e 210 cajueiros meus que foram deitados abaixo por elefantes. Os animais destruíram ainda machambas de mapira e de mandioca. Não sei o que darei à minha família, composta por duas esposas e treze filhos”, disse.
Neste momento, conforme o nosso entrevistado, a população residente nas três regiões citadas vive de peditórios ou recorre à outras formas para conseguir algo para comer na vizinha Tanzânia.
O chefe do posto de Quionga, Francisco Kawawa, disse ter caminhado as preocupações ao distrito e as autoridades de Palma falam da estratégia local que consiste na criação de uma unidade de caçadores locais a ser estabelecida naquele ponto e ainda sobre algumas medidas tradicionais.
Kawawa confirmou que os elefantes atacam todos os dias a acrescentou que as estruturas já perderem a contagem das áreas cultivadas e que foram destruídas.
“O resultado imediato é a fome que enfrentaremos este ano, pois todo o esforço dos camponeses foi em vão. Localmente, a solução passa pela criação de uma unidade de caçadores e pelo recurso a métodos tradicionais, mas receamos que não sejam eficientes”, disse.
O chefe do posto ajuntou que os ataques agravaram-se em 2007, falando-se de muitos grupos de elefantes, embora sublinhe que os maiores estragos são responsabilizados a um paquiderme solitário.
Palma situa-se no extremo do país, junto à fronteira com a Tanzania, na zona de Cabo Delgado, que deu o nome àquela província e tem na agricultura como o principal sustento dos seus habitantes.

11/23/07

Elefantes - Espécie em extinção ?

(imagem daqui)

Apreendidas mais de seis toneladas de marfim resultante de abate ilegal.
Maputo - Moçambique possui mais de seis toneladas de marfim guardados em vários armazéns a escala nacional.
Estas quantidades resultam da apreensão de marfim em Maputo, no sul do pais, Manica e Tete, no centro, bem como em Niassa e Cabo Delgado, províncias nortenhas.
O marfim em destaque foi armazenado na sequência da caça furtiva ao elefante.
De acordo com a autoridade administrativa da Convenção Internacional de Comercio de Espécies em Extinção (CITES) em Moçambique estas quantidades vão se acumulando porque o país não pode vender o marfim porque a sua comercialização é proibida.
Antes do banimento do comércio de marfim no mundo, em 1989, Moçambique vendia um quilograma deste produto a 116 dólares norteamericanos (ao cambio daquela altura).
O maior comprador era o Japão.
Sanções Mahanjane, da autoridade administrativa da Convenção Internacional de Comercio de Espécies em Extinção (CITES), disse que as mais de seis toneladas de marfim deviam ser colocadas num depósito nacional, uma vez que se trata de um produto que requer cuidados para não perder qualidade.
No ano passado foram roubadas quantidades não especificadas de marfim num armazém localizado em Cabo Delgado. A fonte revelou que os custos de transporte da mercadoria é que fracassaram a iniciativa de agrupar o marfim num único armazém.
A AIM apurou que, em 2005, o Governo conseguiu transportar marfim num armazém de Tete, Centro do pais, para Maputo, via aérea, operação que custou 180 mil dólares para 2.5 toneladas.
Outra iniciativa foi de transportar, por via terrestre, de Manica para Maputo.
“Estas quantidades resultam da confiscação da caça furtiva, morte natural do elefante, abate por este ser problemático, ou por conflito com o homem.
O marfim devia estar concentrado num único sitio mas por falta de meios para transportar ainda esta muito disperso”, disse a fonte da AIM.
Bonito Mahanjane contou que algumas pessoas interessadas apresentaram proposta de compra do marfim a nível do pais, reiterando a posição de que não deve haver abate ilegal de marfim e nem o seu comércio.
Mas tal proposta não foi aceite pelo Governo, que não concordou com as condições impostas pelos interessados, principalmente de destruir o marfim no país, tendo em conta o valor que representa para os moçambicanos.
A situação da acumulação de marfim se verifica também noutros países da região, com destaque para África do Sul, Namíbia, Botswana e Zimbabwe, uma vez que estes possuem uma população muito elevada de elefantes.
Estes quatro países da região decidiram, em 1989, continuar a comercializar o marfim, tendo exportado este produto depois do seu banimento.
Este banimento surgiu do facto de se ter verificado que o abate ilegal de elefantes estava a crescer e que punha em risco a extinção desta espécie.
Fátima Mimbire-AIM-Diário de Notícias, 22/11/07-n. 1027.

Alguns link´s com referências a marfim e elefantes:

2/23/10

A "linguagem secreta" dos elefantes...

Segundo a BBC-Brasil, os elefantes têm uma "linguagem secreta" que os homens estão tentando decifrar. Será que conseguem?...

- Pesquisadores do zoológico de San Diego, na Califórnia, estão estudando o que chamam de "linguagem secreta" dos elefantes.

Os pesquisadores estão monitorando formas de comunicação entre os animais que não podem ser captadas pelo ouvido humano.

Muitos dos sons emitidos pelos elefantes ocupam frequências inaudíveis para nós.

Na pesquisa que está sendo conduzida no Zoológico de San Diego, microfones sensíveis a essas baixas frequências e aparelhos de localização via satélite foram acoplados a oito elefantes fêmeas.

Assista à reportagem:

In - BBC-Brasil, 22/02/2010.

8/12/06

Cabo Delgado - A multa que não foi paga!


Mais um capítulo do grande "filme" nos é dado a assistir, a partir das matas de Nairoto, cerca de 370 quilómetros a sul de Pemba, em Cabo Delgado, desde Maio de 2001, região que teve o pecado de ter muita e diversificada fauna bravia e floresta por respeitar.
Com efeito, o Ministério do Turismo já cancelou a multa que recaía sobre a coutada de caça, "Negomano Safaris", de Nairoto, distrito de Montepuez, em Cabo Delgado, de 6.156.600 Mtn (seis milhões, cento e cinquenta e seis mil e seiscentos meticais), aplicada alegadamente para sancionar o abate ilegal de elefantes, praticado por um dos sócios, facto que ficou provado como tendo sido urdido internamente para fazer parte de uma disputa da liderança da sociedade que há três anos se mergulhou numa crise sem precedentes. O despacho do Ministério do Turismo é de 11 de Julho passado, mas dado a conhecer a 3 de Agosto corrente, em resposta a um recurso interposto há exactamente um ano, por Manuel Carona, o sócio de quem se lhe acusava o cometimento da referida ilegalidade. Na verdade, segundo vem acompanhando o "Notícias" este e outros imbróglios daquela empresa, através de um auto de notícia da Direcção Provincial do Turismo de Cabo Delgado, de 2002, acusava-se Manuel Carona de ter caçado sem licença, armazenando recursos florestais e faunísticos sem autorização, violando o período de defeso geral e abatido espécies raras, ameaçadas ou em vias de extinção. Por causa disso deveria pagar de multa o valor acima referido, sendo seis milhões de meticais (Mtn) pelo abate de seis elefantes, cento e vinte e seis e seiscentos meticais (mtn) por caça sem licença e trinta mil meticais (Mtn) por caça no período de defeso geral. Manuel Carona, que já foi sócio e gerente da "Negomano Safaris" e fundador da mesma, não conformado com o referido auto de notícia intentou junto do Gabinete do Ministro do Turismo um recurso, com a alegação de que o auto fora lavrado por encomenda do outro sócio e co-gerente, Luís Santos e que se encontra repleto de vícios insanáveis que clarificam ilegalidades formais e materiais. Enquanto esperava pela resposta do recurso, Manuel Carona ficou exactamente três anos sem actividade, por ter sido impedido de trabalhar em Moçambique, a partir de uma informação que a província de Cabo Delgado fez circular a outras províncias, dando conta de que aquele caçador era "non grata", bem como as autoridades oficiais desta província evitaram convidá-lo para resolver o problema do conflito Homem/animal, quando se procurava especialistas no abate de elefantes. A província do Niassa, através de um ofício da Direcção Provincial da Agricultura, de 3 de Março de 2005, dizia categoricamente que o caçador havia perdido a confiança em razão das informações que lhe vinham de Cabo Delgado, pelo que deveria ser impedido de operar numa nova empresa da especialidade, da qual é igualmente sócio, no distrito de Majune. A propósito, pela nota 117 de 15 de Março deste ano, o administrador de Majune, Domingos Junqueiro, interdita a permanência de Manuel Carona, ordenando-o a abandonar o distrito até ordem em contrário e fundamentava a sua decisão alegando que não possuía nenhum documento em que constasse como representante legal da "Majune safaris, SARL" nem do grupo dos subscritores da referida sociedade, nem ainda que lhe credenciasse a operar no distrito. Domingos Junqueiro dizia mais: a nossa constatação fundamenta-se ainda em outros antecedentes desabonatórios que ditaram a suspensão das suas actividades em Cabo Delgado, conforme comunicação expressa a coberto da nota 43, data de 3 de Março de 2005, enviada à sociedade Majune Safaris. Tratava-se da que foi produzida pela Direcção Provincial da Agricultura no Niassa.
PEDRO NACUO -Maputo, Sábado, 12 de Agosto de 2006:: Notícias
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"NEGOMANO SAFARIS": Sem dados suficientes.
O Administrador de Majune não se havia munido suficientemente de dados que indicavam a ligação profissional de Manuel carona à empresa Majune Safaris, SARL, e que se baseava nos seus conhecimentos técnico-práticos para a sua implantação e desenvolvimento e sem o qual era impossível o seu início. A ordem de abandono decidida por Domingos Junqueiro acabaria impedindo o desenvolvimento do projecto da empresa, desempregando 41 trabalhadores que tiravam o seu único sustento do trabalho que exerciam, prejudicou não só o seu distrito, como o de Marrupa, igualmente abrangido directamente pelo empreendimento.
Entendidos na matéria dizem hoje que aquele responsável terá, por outro lado, cometido a ilegalidade de proibir de residir no distrito um cidadão estrangeiro superiormente autorizado através do Documento de Identificação e Residência de Estrangeiros (DIRE), a procuração passada pela administração da empresa que o dava poderes de gestão e a carta de autorização passada pelo Ministério do Trabalho, todos emitidos com datas anteriores à ordem de abandono do distrito. A ordem emanada para Domingos Junqueiro afirmava que o visado tinha antecedentes desabonatórios, que em sua opinião haviam ditado a suspensão das suas actividades em Cabo Delgado, tendo fé em tais informações respeitantes à multa, entretanto, recorrida hierarquicamente. No recurso que temos em nossa posse, Manuel Carona alega que o auto fora lavrado por encomenda doutro co-gerente, por isso ferido de vícios insanáveis que explicam as ilegalidades formal e material e evoca o facto de a fazenda do bravio ter sido concessionada à "Negomano Safaris L.da" e não a ele, não havendo, por isso, justiça quando é chamado a responder em nome próprio pelas infracções alegadamente imputadas à sociedade. No seu recurso, Carona adianta que o auto de notícia fora lavrado fora do prazo legal, por isso, a coberto da ilegalidade na aplicação da lei e justifica que a 9 de Dezembro de 2002, o regulamento da Lei de Florestas e Fauna Bravia, citado como fundamento legal para ordenar tais multas, ainda não estava em vigor. Entretanto, da leitura do recurso mais aspectos se colocam, nomeadamente que a comissão que investigou o alegado abate de elefantes e outras infracções viajou em viaturas e logicamente abastecida pelo outro litigante que foi o denunciante e não acredita que o elefante seja considerado uma espécie rara e em vias de extinção como fundamento para o agravamento da multa. Para o recorrente, à luz da lei moçambicana, aquele paquiderme não pertence à classe de espécies raras, razão por que a sua caça é permitida e, ironicamente, para comentaristas à volta do assunto, o grande problema que hoje se vive em muitas aldeias de Moçambique, leva o nome comum de conflito Homem/animal em que os elefantes são os mais perigosos pela quantidade e o nível de destruição que fazem nos campos. Foi analisando as posições factuais apresentadas pela Direcção Provincial do Turismo de Cabo Delgado, nomeadamente o relatório do inquérito instaurado, que culminou com o respectivo auto de notícia, o procedimento processual na sua instrução preparatória e compulsando com o recurso hierárquico, o Ministério do Turismo, ao seu mais alto nível anular a multa. "É de acolher o fundamento porque procede, também aliado ao facto de que já decorre muito tempo e as pontas dos elefantes abatidos tempestivamente foram recuperadas pelo Estado, que desde essa altura não se reportaram mais actividades ilícitas por parte da sociedade 'Negomano Safaris, Lda.' nem por parte dos dois sócios e gerentes em bagunça, é de declarar nulidade e por via disso dar sem nenhum efeito o auto de notícia 01/DPTUR/CD02 e, consequentemente, mandar arquivar o presente processo". Para fechar a declaração de nulidade, decide a não responsabilização da empresa "Negomano Safaris L.da", pelos factos praticados pelo sócio-gerente nem em nome próprio de Manuel Carona, por um lado, porque as pontas de marfim foram recuperadas pelo Estado por outro, porque o processo não foi legalmente instruído.
PEDRO NACUO - Maputo, Sábado, 12 de Agosto de 2006:: Notícias
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Os pedidos de Manuel Carona
Manuel Carona, liberto agora para exercer as suas actividades profissionais, pede às entidades que o consideraram culpado, que rectifiquem os seus pontos de vista, através de ofícios.
Ao Governo Provincial de Cabo Delgado pede que, da mesma forma que fez circular a informação de que ele tinha antecedentes desabonatórios, por isso não deveria trabalhar em nenhuma parte de Moçambique, tendo embora a autorização de o fazer, volte a distribuir pelos mesmos locais outra, desta feita para contrariar, pois fê-lo, sabendo que o assunto estava ainda em recurso. Ainda em Cabo Delgado, o ilibado quer que de tal forma graves os danos provocados pelos três anos de inactividade, durante os quais as instituições não o autorizaram a exercer a sua profissão devido à multa, sente-se obrigado a pedir que se apurem as responsabilidades de quem a aplicou e a quem levou a ser executada, mesmo sabendo que existia um recurso por si interposto. Em Niassa, Carona pede que o administrador do distrito de Majune, "confiando na sua sabedoria e depois de analisar todos os documentos que comprovam a minha situação legal, mas que não mos pediu anteriormente, e na presença da nulidade da multa irregularmente aplicada à minha pessoa, não só retire a ordem de abandono, como informe, todas as entidades a quem deu conhecimento da sua decisão". Chega, assim, ao fim o barulho da "Negomano Safaris" somente respeitante à multa que numa reportagem publicada na segunda quinzena de Janeiro passado, perguntávamos quem a pagaria, tendo em conta que o juiz das execuções fiscais de Pemba havia escrito à Direcção Provincial da Agricultura, informando que corria um auto de execução fiscal administrativa em que era exequente a Fazenda Nacional e executada aquela empresa, não se deveria emitir qualquer expediente relativo à exportação dos troféus do executado. Era porque a empresa, tendo-se deixado incriminar, por via do seu actual gerente, entendeu que era possível punir, pelo suposto abate ilegal de elefantes, Manuel Carona que pretensamente havia cometido a infracção. Na verdade, o facto de a Direcção Provincial do Trabalho não ter percebido que Carona representava uma sociedade e ter emitido uma multa contra ele, acabou sendo aproveitado por um dos litigiantes, o actual gerente, para quem não havia razão alguma que levasse "Negomano Safaris" a ser demandada pelo facto de a multa não ter sido paga e por isso interdita de exportar os troféus. A empresa ficou tremida, depois que houve a interdição de exportação dos troféus, pois o organismo competente para a atribuição de quotas de animais a abater no exercício venatório, a única e exclusiva actividade da "Negomano Safaris" entendeu reduzir substancialmente.
PEDRO NACUO - Maputo, Sábado, 12 de Agosto de 2006:: Notícias
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Três pontas de marfim desaparecem em Pemba.
Três pontas de marfim pertencentes à coutada de caça de "Negomano Safaris" são dadas como desaparecidas desde 29 de Julho passado, no Aeroporto de Pemba, quando se preparava a sua exportação em forma de troféus.
Informações disponíveis indicam que as três pontas já se encontravam embaladas e pesavam ao todo 20 quilos, mas nem a Polícia, nem os donos da mercadoria querem pronunciar-se à volta do assunto, apesar de não desmentirem o seu desaparecimento. António Pedro Mirelles, da "Negomano Safaris", preferiu deixar tudo ao critério da Polícia de Investigação Criminal, mas a porta-voz desta corporação disse ao nosso Jornal que não se podia pronunciar, alegadamente porque o processo se encontra em fase de instrução. Confirmou, todavia, que a PIC está a trabalhar no assunto. A mesma posição tem o advogado daquela empresa de caça desportiva, Rui Seuane. Trata-se da primeira exportação de pontas de elefante, desde que o Ministério do Turismo decidiu anular a multa de seis milhões de meticais da nova família, penalização que tinha sido decretada pela Direcção Provincial do Turismo por armazenamento de recursos florestais e faunísticos sem autorização, violação do período de defeso geral e abate de espécies raras em vias de extinção. Em virtude disso, o Juízo das Execuções fiscais em Cabo Delgado havia ordenado a interdição da exportação de troféus de elefantes e outros provenientes da coutada, antes do pagamento da multa, o que não veio a ocorrer em razão da ilibação, por parte do Ministério de tutela, depois do recurso interposto pela empresa.
Maputo, Sábado, 12 de Agosto de 2006:: Notícias

11/07/07

Elefantes aprendem a se fingir de mortos para denunciar caça...na Índia !

(Foto: Rupak De Chowdhuri/Reuters)
Exemplo que deveria ser colocado em prática em Moçambique-Cabo Delgado:
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Um elefante se finge de morto em Siliguri, na Índia, na terça-feira (6).
O "ator" vive num santuário onde todos os elefantes passam por um adestramento para conseguir isso.
A "encenação" serve para lembrar as condições dos elefantes fora das reservas, sujeitos à ação dos caçadores.
O adestramento acontece numa reserva na cidade indiana de Siliguri.
Animais fora de santuários são presas fáceis de caçadores.
Do G1, no Rio, com informações da Reuters-07/11/2007-01h01-Atualizado em 07/11/2007-07h03
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Leia mais sobre "elefantes" aqui e aqui,

12/18/12

OS ELEFANTES DE MAREJA - QUIRIMBAS desejam FELIZ NATAL ao mundo...

Se VOCÊ se importa, ajude a acabar com o massacre dos elefantes em MAREJA-QUIRIMBAS - Assine a petição (http://is.gd/2bl0B1) e divulgue.
Uma reportagem publicada no Jornal @Verdade no final de Outubro de 2012, põe a descoberto a caça ilegal de elefantes na Reserva de Mareja, situada em Cabo Delgado, na região Norte de Moçambique. Segundo o artigo, o “massacre” é perpetrado por grupos de caçadores furtivos “sofisticadamente armados” e “tem vindo a ganhar proporções gigantescas”...
ForEVER PEMBA - O massacre dos elefantes em MAREJA - QUIRIMBAS - Partes 1 e 2
Clique nas imagens para ampliar. Edição de imagens e texto de J. L. Gabão para o blogue "ForEver PEMBA" em Dezembro de 2012. Permitida a reprodução e/ou distribuição dos artigos/imagens deste blogue só com a citação da origem/autores/créditos

7/21/07

Cabo Delgado - Bilibiza...

Bilibiza: Assim se faz o desenvolvimento.
Quando se chega a Quissanga, distrito costeiro, a cerca de 80 quilómetros a norte da cidade de Pemba, em Cabo Delgado, a primeira coisa a constatar é a sensação de não ter sido essa distância percorrida, sobretudo quando se pretende ir por aquela que seria a mais curta ligação com a sede daquele distrito, via Metuge. São três horas e mais para fazer 80 quilómetros!

A outra forma de ir a Quissanga é preferir, nos tempos que correm, fazer acima de 200 quilómetros pela estrada nacional que leva ao norte (Mueda, Muidumbe, Nangade, Mocímboa da Praia e Palma) para fazer o desvio na aldeia 19 de Outubro, a poucos quilómetros de Macomia.
Quissanga é distrito inevitável para quem vá, via terrestre, à Ilha do Ibo, assim como à maioria das ilhas do arquipélago das Quirimbas, sendo óbvio, que tais dificuldades sejam extensivas a quem tenha como destino aqueles locais históricos e turísticos que chamam a muitos curiosos por este mundo fora.
O administrador distrital, Alafo Abdala, de cada vez que recebe hóspedes coloca, por isso, as vias de acesso como o principal problema que leva a que o seu distrito ainda, na sua opinião, continue muito pobre. A seguir, é o problema perene do conflito entre homem e os animais bravios. O comandante da PRM de Quissanga secundando o seu administrador, quase que acusa as visitas governamentais como factores que atiçam o conflito ao afirmar que “de cada vez que vem uma visita, logo a seguir à sua retirada os elefantes atacam e matam”. Por outro lado, os membros do Governo distrital acreditam que os esforços dos camponeses são em vão e aumentam as dívidas destes face aos seus compromissos com as organizações e empresas que apoiam ou fomentam a agricultura.
Alafo Abdala, interpretando o sentimento que disse ser das populações que dirige, ainda fala da energia da Hidroeléctrica de Cahora Bassa, do ensino secundário e da falta de água potável, para além da peculiaridade de ser um distrito totalmente no interior do Parque Nacional das Quirimbas sujeito às regras que guiam os propósitos que nortearam a sua criação.
Quissanga tem apenas dez moageiras como representação do que estaria na lista do que seja alguma infra-estrutura industrial e não possui nenhuma loja, mas todo este rol de lamentações e sofrimento parece não incluir o posto administrativo de Bilibiza, onde se está a fazer um desenvolvimento paulatino, com apoio da Fundação Aga Khan.
O nosso Jornal esteve em Bilibiza, um nome sonante por ter sido local onde se experimentou, até ao início do conflito armado em Moçambique, a formação de técnicos básicos da agricultura e num outro momento campo para a reeducação de cidadãos provenientes de todo o país sobre quem se pensava se pudessem corrigir mediante a sua separação com as famílias.
Jaime Assuba, líder comunitário, congratula-se pelos esforços que a Aga Khan está a levar a cabo, principalmente nos aspectos ligados à nutrição e desenvolvimento das aldeias, pois de acordo com ele, o aconselhamento no uso de latrinas e aterros sanitários, o hábito de as pessoas se dirigirem ao posto de Saúde quando doentes, incluindo mulheres grávidas está a fazer parte do “modus vivendi” das populações locais.
Por seu turno, Jaime Fumito Antumane, da aldeia Nacoja manifesta-se profundamente satisfeito com os desenvolvimentos visíveis na agricultura, Saúde e Educação mas diz haver um programa daquela fundação, cuja origem e encaminhamento estão a ser difíceis para as populações.
“Quando a Aga Khan chegou estávamos a sofrer de fome e disse que aumentássemos a produção, o que veio a ser emperrado pela praga dos elefantes e outros animais bravios. Por causa dessa coincidência, chegámos a pensar que a fundação trouxe os animais destruidores. Mas voltámos a pensar de novo: será que a Aga Khan haveria de distribuir sementes e instrumentos de produção para produzirmos para os elefantes”, questionou-se Antumane.
Referiu, no entanto, que todos os esforços tendentes a aumentar a produção vão por água a baixo, mas o nosso interlocutor voltou aos benefícios sociais para tecer as seguintes considerações: “na Educação, o número de alunos aumentou substancialmente com a Aga Khan, que trouxe escolinhas. Agora são salas que escasseiam. Na Saúde, antes não havia quem desse parto numa maternidade, agora o problema não é a falta do local onde dar parto, mas sim que a maternidade se tornou pequena”.
Outro líder comunitário, que é ao mesmo tempo secretário da aldeia 25 de Setembro, Alfredo Ali, explica que não há quem tenha dúvidas de que o ambiente mudou em Bilibiza com a presença de Aga Khan e destaca as mudanças que na sua opinião são positivas.
“Na alfabetização, agora até adultos vão à escola. Houve muitas mudanças positivas, o que há por pedir é a continuidade dos programas e o seu incremento com vista a abranger as outras aldeias em redes mosquiteiras, por exemplo...”.
O chefe do posto administrativo de Bilibiza, Adolfo Navaia, secunda os seus dirigidos ao concordar que o único empecilho na sua área de jurisdição leva o nome de elefantes e outros animais bravios responsáveis por destruir todo o esforço comunitário de luta contra a fome.
“Eles não só destroem como matam. A nível da Saúde, as redes mosquiteiras haviam sido distribuídas para todas as aldeias, mas o número de crianças de zero aos cinco anos está a crescer. Ora, quanto à desestabilização dos animais bravios, um problema que se está a levantar de forma insistente há quatro anos fica como questão de fundo, pois tendo em conta a liberdade que os animais e homens gozam. Ficamos dependentes de ouvir das nossas estruturas superiores”.
Navaia recordou que por orientação superior uma equipa de alto nível, dos ministérios da Agricultura, da Acção Ambiental e do Turismo tinha a responsabilidade de fazer um estudo que trouxesse uma solução que passados dois anos ainda não se pronunciou, pelo menos do conhecimento das áreas afectadas.
O director de programas da rede Aga Khan em Cabo Delgado, Lebreton Saah Nyambe diz com prazer que o quadro, cinco anos depois da presença da sua fundação em Bilibiza, é de uma região que está a mudar profundamente, mas precisa que sejam esforços complementados por outras organizações ou, sobretudo, pela própria população.
“Lembro-me com alguma tristeza, que em 2001 nós fazíamos 27 quilómetros a pé para o cruzamento, na aldeia 19 de Outubro, para apanhar uma boleia para Pemba ou 20 quilómetros até Mahate para fazer o mesmo, simplesmente porque por aqui não passavam carros, pois para ver um, passava um mês”.
Para Lebreton Nyambe, o elefante, não sendo pensante, o que a sua organização recomenda é que as pessoas saiam dos seus corredores. O mesmo acontecia com os crocodilos que matavam pessoas em Bilibiza. Não foi necessário chamar pessoas vindas de longe para acabarem com a praga de crocodilos. Hoje, não se fala de vítimas daqueles répteis.
Pedro Nacuo
Bilibiza: Mulheres pedem capacitação.
Da aldeia 19 de Outubro é nos dado a ver uma associação de nove mulheres, que fazem olaria, fabricando bilhas, panelas, pratos, travessas, frigideiras, bandejas, chávenas, jarros, copos e outros, tudo de barro.
São mulheres que dizem: “precisamos de capacitação, acesso ao transporte, novas técnicas. O nosso rendimento está entre 100 a 600 meticais por mês e trocamos o fruto do nosso trabalho com produtos para a alimentação”.
Elas apontam como desafios que se lhes colocam o aumento do seu rendimento, fabrico de tijolos queimados e o incremento das áreas de produção e têm um fundo avaliado em 800 meticais.
Mas à frente temos uma associação de latoeiros, com quatro elementos, fundada em 5 de Março deste ano. Com uma chapa de zinco de 3,60 metros de comprimento, faz cinco latas para água que custa cerca de 100 meticais. Quer dizer, numa chapa ganham 500 meticais.
“Fazemos também fogões, regadores, baldes, bules, copos, panelas, frigideiras e lamparinas. Entretanto, precisamos de novas técnicas de moldura de peças, organização da associação, de materiais, como tesouras, alicates, escopros, ácido, solda, serrotes de ferro, fita métrica...”. Os desafios desta associação passam pela melhoria da qualidade da produção e tem um fundo de 500 meticais.
É também em Bilibiza onde existe uma associação de cestaria constituída por quatro mulheres com uma renda de 1500 meticais e um fundo de 1000 meticais. Trabalha a palha grossa fazendo bolsas, chapéus, vassouras, esteiras, cilhas, esteiras, anéis e cestos.
“Precisamos de tinta, catanas, tesouras, agulhas e pretendemos melhorar a qualidade da nossa produção” eis o grito dos associados que em resposta o director nacional da Promoção do Desenvolvimento Rural, Salimo Valá, apela:
“Estamos a ver as pequenas coisas que fazem, que podem ser grandes com o andar do tempo. Isto pode levar-nos ao desenvolvimento, mas apelamos que não se colem sempre à Fundação Aga Khan ou uma outra qualquer. Devem fazer esforços para se desmamarem da fundação. Imaginem uma criança que desde que nasceu nunca mais deixou de mamar, como ficaria a mãe?
Pedro Nacuo
Bilibiza: Escola agrária nasce por decisão do III Congresso.
A Escola Agrária de Bilibiza, segundo dados reunidos pelo “Notícias” resulta de uma das decisões do III Congresso da Frelimo realizado em Fevereiro de 1977, cuja materialização devia ocorrer nos anos 80 com a implantação efectiva de uma escola da especialidade naquele ponto da província de Cabo Delgado. Até aqui já formou 1704 alunos.
Inicialmente, funcionaram dois cursos, nomeadamente de Mecanização Agrária e Agricultura, antes que o conflito armado viesse paralisar o funcionamento quase total daquele estabelecimento do ensino técnico-profissional. Tratou-se da fase mais crítica da Escola de Bilibiza durante a qual foi saqueada tendo perdido maior parte do seu aparato, em termos de equipamento, bem como os recursos humanos foram desaparecendo.
No ponto mais crítico da crise, a Escola Agrária de Bilibiza chegou a ter apenas 20 alunos com um curso que tinha apenas cinco alunos. Em 1998, depois da guerra, a ADPP (Ajuda de Desenvolvimento de Povo para Povo), uma associação dinamarquesa, manifesta interesse de aproveitar as instalações então literalmente abandonadas para a formação de professores primários.
O Executivo de José Pacheco, então governador de Cabo Delgado, sugeriu que quem tomasse as instalações não descurasse a procura de financiamentos para a revitalização da componente formação para a agricultura, que era a primeira vocação da escola.
Dos vários parceiros que foram aparecendo, segundo director da escola, Lestivo Albano, a intervenção da Aga khan foi determinante e em 2004 começa com a reabilitação dos outros edifícios para logo a seguir trazer os programas de bolsas de estudo.
“O número de raparigas subiu cinco para 200. Também dos outros alunos e de professores. As condições materiais, em termos de logística, também começam a melhorar e em 2005 o número de alunos explode para lá das capacidades instaladas da escola e do internato”, explica o director da escola.
Entra-se num outro tipo de crise que Lestivo Albano a apelida de depressão em razão da superlotação da escola e do internato. A Aga Khan amplia as instalações e constrói um centro-internato para raparigas. Mesmo assim, as infra-estruturas físicas não suportam e o resultado foi a má conservação das mesmas, ao mesmo tempo que a nível meramente pedagógico se iam desenhando programas de elevar a escola para além do nível básico.
No ano passado a escola faz um diagnóstico das suas capacidades e identifica as áreas fundamentais. Chega à conclusão de que deve trabalhar com programas de curto prazo (semestrais e trimestrais) e deveria obedecer a um plano de redução de alunos sem afectar aqueles já a estudar.
Na verdade, a Escola de Bilibiza tem neste momento 775 alunos, entre os quais 422 a viverem no internato, calculado para albergar apenas 300 do número total de discentes 178 são raparigas. Tem 18 professores para 13 turmas.
“Para tanto, decidimos ir reduzindo os alunos, primeiro por via do afunilamento nos ingressos, segundo, sendo rigorosos no aspecto disciplinar, porque chegámos a descobrir que alguns pais mandavam os seus filhos para aqui, não porque tivessem uma queda pelas matérias ligadas à agricultura, mas sim como um lugar para a reeducação, entre outras medidas”, explica o director Lestivo Albano.
Hoje, a Escola Agrária de Bilibiza reergue-se num posto administrativo onde são visíveis sinais de desenvolvimento e sonha com melhores dias. Os alunos bolseiros que de algum tempo para cá haviam sido enviados para os cursos médios em Chimoio e em Boane, já estão de regresso e precisam de um pequeno treino para engrossarem o grupo de professores.
“Aliás, já temos professores que saíram daqui como bolseiros, outros estão por vir. Há muitas vantagens nisso, a maior das quais é o conhecerem bem a escola”, afirma o director da Escola Agrária de Bilibiza.
Para este ano, contam com 42 bolsas de estudo, mas o orçamento que lhe é destinado não satisfaz a demanda. São 34 mil meticais, muito abaixo do que recebem as suas congéneres, incluindo da vizinha província de Nampula, conforme revelou o director da escola.
Pedro Nacuo
Maputo, Sábado, 21 de Julho de 2007:: Notícias

7/08/08

Luz e esperança no horizonte dos desfavorecidos - Os milagres do microcrédito no norte de Moçambique. - II

(Clique na imagem para ampliar. Imagem original daqui.)
...continuação:
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Quando chegou, Rahim Bangy começou por ir aos mercados, conhecer a cidade, falar com as pessoas. Uma prática que mantém: de 15 em 15 dias, das sete da manhã até ao anoitecer, procura passear pelos mercados, conversar com pessoas, visitar mutuários.
O programa não se auto-financia na totalidade. O que falta vem de uma organização norueguesa e do Imamato Ismaili, a instituição assente na autoridade do Aga Khan. A agência para o microcrédito é apenas uma das que fazem parte da Rede Aga Khan para o Desenvolvimento, que agrupa organismos de âmbito económico, desenvolvimento social e cultura, para áreas tão diferentes como turismo, indústria, finanças, ensino, microcrédito, cidades históricas.
Rahim Bangy entusiasma-se com os resultados do programa nas vidas das pessoas.
"Já estive no meio do mato, em sítios em que as pessoas ainda se cobrem com folhas. Nunca viram o mar, mas já ouviram falar do microcrédito. Queremos agora introduzir o financiamento a associações e grupos, porque o impacto será maior."
Está já em marcha o próximo projecto: transformar o programa num Microbanco Rural.
"As pessoas enterram o dinheiro, às vezes encontram-se sacos com dinheiro ou jóias. Há necessidade de a população poder guardar as poupanças."
Até ao final deste ano, o processo legal deverá estar terminado, para que em 2009 o banco possa começar a operar.
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20 filhos.
As placas do programa de microcrédito estão já presentes em muitos locais de Pemba. Faqui Saide Ali está entre pneus, jantes, velas, câmaras de ar. Pediu apoio em Fevereiro de 2007 para montar uma barraca de venda de peças de veículos. "Correu bem mesmo, estou a gostar, comprei uma casa." Falta um mês para acabar de pagar os 10 mil meticais.
"No bairro de Ingonane, Jamal Mbamela, 58 anos, tem uma mercearia com café. Teve 20 filhos de duas mulheres, morreram dois. Não consegue sustentar toda a gente: "Esta vida dá pouco." Mas os 50 mil meticais que pediu em 2004 permitiram melhorar as contas. O filho Abdul, 18 anos, a estudar contabilidade, é um dos que o ajuda.
O café de Lurdes Loureiro, 48 anos, à beira da praia do Wimbe, inovou com os combos - hambúrgueres com batata frita e refresco. E melhorou a vida dela e dos dois filhos que ainda vivem com ela.
Um juro de dois por cento ao mês, uma taxa de incumprimento residual.
Rahim Bangy pretende que tudo seja transparente com os beneficiários. Mas não quer ficar pela relação económica. O microcrédito prevê acções paralelas sobre a sida ou a malária. As mulheres são um alvo importante para o financiamento. São 20 por cento dos beneficiários, mas a meta é pelo menos 30 por cento.
"As noções de saúde e higiene passam melhor através das mulheres."
Esta será uma mensagem repetida pelos responsáveis dos projectos na ilha do Ibo ou na aldeia de Bilibiza, mas já lá chegaremos. "São mais cuidadosas com o próprio dinheiro, porque sabem que têm que alimentar os filhos.
"Até ao final deste ano, Rahim Bangy quer ter pronta um espaço, por detrás do escritório do programa, dedicado a passar a mensagem:
"Nos dias de reembolso, enquanto os mutuários esperam, queremos ter pessoas a falar de sida, malária, amamentação. Assim, ouvirão a mensagem e irão levando essas ideias para suas casas."
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O caderno de João Baptista.
Pode um homem conter toda a história de uma ilha?
João Baptista "tem tudo aí", num caderno escrito com caligrafia aprendida na escola primária. "Ibo é Ilha Bem Organizada", começa o "era uma vez" desta terra no meio do Índico.
Árabes à procura de escravos, depois os portugueses e as especiarias, aportaram ao Ibo.
Hoje, a ilha tem 8700 habitantes, vivendo sobretudo da pesca. Porventura atraídos pela magia do Índico, que neste arquipélago das Quirimbas se pinta de vários tons de azul e verde. Na rua principal da vila, ainda se adivinha a traça colonial das casas, mesmo com décadas de degradação e esquecimento."
Ibo foi governo da província, quando Porto Amélia, hoje Pemba, era simples aldeia.
Era ali o palácio onde está a pensão; tivemos aqui o Banco Nacional Ultramarino, cadeia civil, a fábrica de sabão de Filipe e António Veríssimo, uma fábrica de fósforo, jornais. Foi sítio importante", regista o caderno.
Por João Baptista, cachecol da selecção portuguesa de futebol ao pescoço, passaram duas mulheres (a primeira morreu), doze filhos e 42 administradores coloniais.
"Eu estava no gabinete deles, aproveitava para apontar isto. Eu é que sabia tudo, eu era daqui." Hoje, João Baptista diz que o Aga Khan é que está "a ajudar muito a ilha". O ano passado conheceu-o, quando o líder dos muçulmanos ismailis visitou a ilha.
Elsa Rodolfo, administradora da ilha, confirma a "diferença palpável", desde que as instituições do Aga Khan estão no Ibo: "Anos atrás havia focos de fome, agora já não." Os miúdos já vão à escola - mesmo as raparigas, o que não acontecia antes por uma questão cultural. "Agora, vêem que a mulher pode estudar e ter emprego: já há uma administradora, uma directora de educação..."
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Moedas com 100 anos.
O desejo de Rahim Bangy, de alargar o apoio a grupos e associações, tem também já experiências na ilha do Ibo. A Associação dos Viveiristas do Ibo, presidida por Vita Tuaibo, máquina fotográfica a tiracolo, é uma das beneficiárias.
Criada em 2006, com 19 membros (nove são mulheres), a associação teve um empréstimo de 80 mil meticais (quase 2300 euros).
Alface, couve, batata doce, tomate, laranjeiras, cajueiros crescem numa machamba de 800 metros quadrados. Construir o escritório, usando uma técnica tradicional para a argamassa, é a tarefa imediata. Jason Morenikeji, de ascendência anglo-nigeriana, explica que a forma de construção do telhado permite aproveitar a água da chuva para sistemas de irrigação e canalização.
Ourivesaria Moderna é o nome de uma associação de artesãos. As mãos encurtam-se para pegar nas finas pontas de prata, trabalhando a filigrana com pequenas espátulas, alicates, fios e arames. É uma arte tradicional que vem do tempo dos árabes, explica Susan Esteves, responsável pela ligação com as associações locais. Brincos, colares, pulseiras, anéis que nascem da criatividade de Sufo Sufo, 52 anos, e dos restantes 13 membros da associação (quatro são mulheres). Rendilhados, entrelaçados, floreados vendidos a turistas de passagem, com preços variados, consoante a origem do metal: moedas antigas fundidas ou prata pura.
Na Associação Fortaleza, onde se faz um trabalho semelhante, os 25 artesãos mostram algumas das moedas. Ali estão as efígies do rei D. Carlos ou da República, datadas de 1891, 1899, 1915...
O trabalho das duas associações já permitiu sucessos pessoais. Manlide Amade, da Associação Fortaleza, diz que o artesanato em prata possibilitou construir casas, comprar motorizadas, bicicletas, celulares... E teve sucesso internacional: um comprador da África do Sul fica com uma parte da mercadoria e exporta para a Europa; em 2007, os artesãos levaram peças para uma feira internacional no Maputo. Um êxito e quatro mil dólares, a terceira maior receita bruta da feira.
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Afastar os elefantes.
O piripiri pode ser uma arma contra os elefantes. Há um problema para os agricultores de Bilibiza, no interior da província de Cabo Delgado, 200 quilómetros a norte de Pemba, e das aldeias vizinhas: os elefantes e os macacos destroem grande parte das culturas, porque homem e animais ocupam o mesmo espaço. Com a criação do Parque Nacional das Quirimbas, em 2001, cerca de 250 mil pessoas (60 mil famílias) ficaram sujeitas a regras mais estritas de relação com o ambiente. Truque para evitar o flagelo provocado pelos animais: cultivar piripiri junto das plantações agrícolas. "Sabemos que o piripiri provoca irritação nos elefantes", diz Lebreton Saah Nyambe, camaronês, técnico de desenvolvimento rural, há cinco a trabalhar com a Fundação Aga Khan em Pemba.Contudo, o piripiri não é solução definitiva. "O único sucesso é a produção em bloco", machambas colectivas vigiadas rotativamente pelos agricultores da aldeia. Para afugentar os elefantes basta fazer barulho. Assim, a vigilância por turnos permite atenuar o problema. Com os macacos, é mais fácil: depois da escola, as crianças entretêm-se a lançar-lhes pedras.
A introdução de culturas mais precoces é outro caminho. O milho de ciclo curto pode colher-se em 90 dias, antecipando a chegada dos animais à procura de água e comida. Hoje, as machambas colectivas envolvem já 21 mil famílias, o objectivo, até 2010, é chegar às 25 mil. Em 2001, começou-se com dez aldeias, hoje há 147 a participar neste projecto.
Bilibiza mantém o céu em estado puro. As estrelas afagam-nos o olhar. Mas a vida é dura, secas extremas e inundações destrutivas são problemas frequentes.
Para produzir riqueza, também a criação de gado caprino é apoiada. Desde Outubro de 2002, em 40 aldeias, a fundação entregou três cabritos, duas fêmeas e um macho, a dez famílias por aldeia. Cada uma das famílias beneficiadas deu depois outros três cabritos a novas famílias. Os 600 cabritos entregues transformaram-se em mais de 1700 cabeças. Do mesmo modo, é incentivada também a conservação das culturas em celeiros.
Na Escola Agrária de Bilibiza há alunos a concluir a debulha do milho. Esta segunda campanha deverá dar dez a quinze toneladas de milho, talvez para o ano a escola já possa vender excedentes. A escola é uma das instituições que começou a trabalhar com o programa Pontes para o Futuro, criado pela fundação em 2006. São duas as componentes: apoiar a liderança emergente através de bolsas de estudo (154 já atribuídas, em áreas como a agricultura, saúde materno-infantil, ensino, turismo, informática, contabilidade, gestão) e o fortalecimento institucional.
Sifer Rodrigues, bolseira de 18 anos, no 3º ano da escola, está a acabar um relatório sentada na cama - a maior parte dos 550 alunos estão em regime de internato, só vão a casa nas férias. Recebe 200 meticais (cerca de seis euros) de bolsa por mês. "É muito, permite ajudar a família, posso comprar sabão..."Marcelo Soverano, 39 anos, responsável do programa Pontes para o Futuro, diz que o desafio é transformar agora a escola básica numa escola média (equivalente aos 8º, 9º e 10º ano de escolaridade), melhorando ao mesmo tempo as estruturas para os estudantes.
- Continua acima... - (extraído de PÚBLICO.pt - 06.07.2008 via Moçambique Para Todos.)

6/05/08

Crueldade contra os animais, cantora Alaska, touradas, elefantes e o dia mundial do meio ambiente...

(Imagem original daqui.)
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Segundo o Blue Bus de hà instantes, "O grupo PETA, People for the Ethical Treatment of Animals, lançou mais uma de suas campanhas contra a crueldade com os animais - e é mais uma a recorrer à nudez. Desta vez, condena as touradas, tradição espanhola, e mostra a cantora Alaska, sucesso no país. Nua, tem nas costas as 'banderillas' que os toureiros espetam nas costas dos touros para enfraquecer o animal por conta da perda de sangue. O anúncio coincide com uma ação dos toureiros espanhois no Parlamento Europeu, em Bruxelas - um esforço para influenciar positivamente os politicos."...
Práticas "tradicionais" como essa que maltratam e matam animais são infelizmente comuns não só em Espanha, como em Portugal e no México perante o deleite de muito "boa-gente" e justificadas como essenciais para conservar folclóricos, arcaicos e desumanos costumes. Devem ser condenadas, denunciadas e combatidas como algo pernicioso que alimenta e leva a um mundo emocionalmente violento, protesto que, desta feita, conta também com a participação polémica mas útil da bela Alaska.
Mas o tema faz recordar e repensar, a propósito, outras crueldades em outros animais pelo mundo adiante (luta de galos, etç.) e em recantos como África do Sul ou Moçambique, onde, por exemplo e com justificativas(?) ambíguas, se matam elefantes acuados em seu meio ambiente invadido pelo crescimento desorganizado de populações e prejudicado pelo desmatamento inconsequente, irresponsável, criminoso que aproveito para realçar já que hoje é também "Dia Mundial do Meio Ambiente".
  • Leia também, porque, entre outras coisas, 'fala' do respeito que deveremos ter como seres pensantes, presumidamente inteligentes, pelos animais - Nicolle Zilli em Adorável Mundo Animal !

4/19/08

The Elephant Song - Lição para os homens que não gostam de elefantes...

(Imagem original daqui)
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Enquanto em África o elefante e o as animais da selva são desrespeitados, mortos em seu habitat natural, Eric Herman, cantor-compositor de músicas para jovens canta sobre elefantes e outros animais para estimular a imaginação e o amor das crianças pelos bichos da floresta, pela vida.
O vídeo foi criado pela sua mulher, Roseann, com a ajuda da sua filha de três anos, Becca.
Bela lição que pode acompanhar aqui:
(Para evitar sobreposição de sons, não esqueça de "desligar" a rádio "ForEver PEMBA.FM" no lado direito do menu deste blogue.)
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Outros post's deste blog sobre o mesmo tema:

E o portal do Eric Herman:

8/08/07

QUIRIMBAS - A guerra dos animais...

Cabo Delgado : FADM tentam mitigar conflito Homem/animal.
Estão já em Cabo Delgado os primeiros 15 militares das FADM com a missão de afugentar ou mesmo matar os animais bravios identificados como responsáveis pela morte de pessoas e destruição de culturas dos camponeses no interior do Parque Nacional das Quirimbas, localizado nos distritos centrais da província. Esta informação foi prestada recentemente pelo governador provincial, Lázaro Mathe, que acrescentou que a medida segue-se a uma recente contagem terrestre, a primeira do género, dos animais existentes no Parque Nacional das Quirimbas, cujos primeiros dados numéricos não revelou por alegadamente serem necessárias outras contagens para se aproximarem à realidade da população animal, principalmente de elefantes existente no interior do parque.
De acordo com a fonte, a decisão de pôr militares no terreno para a mitigação do conflito vem igualmente na sequência do cumprimento da orientação central, segundo a qual, em face do grau de instabilidade social que os animais criaram, é necessário tomar medidas conjuntas entre os Ministérios da Defesa Nacional, Interior, Agricultura, Turismo e de Coordenação da Acção Ambiental.
O Parque Nacional das Quirimbas ocupa uma área de aproximadamente 7506 quilómetros quadrados, 5984 dos quais no continente, e estende-se pelos distritos de Quissanga, Metuge, Macomia, Meluco, Ancuabe e Montepuez e interior e distrito insular do Ibo. Trata-se, por outro lado, de uma área em que despontaram empreendimentos turísticos de alta qualidade, bem como estão a ocorrer levantamentos sísmicos visando a descoberta de petróleo ou gás natural.
Nos últimos tempos, os animais, principalmente elefantes, matam pessoas, criando insegurança nas comunidades, assim como se lhes acusa de fomentarem, com macacos e porcos selvagens, a fome, ao destruírem parcial ou completamente as culturas.
Uma outra medida visando a diminuição do conflito, de acordo com dados avançados pelo governador de Cabo Delgado, passa pela construção de barreiras físicas que vão delimitar as regiões onde as populações irão desenvolver normalmente as suas actividades e zonas dos animais bravios, permitindo deste modo que nenhuma das espécies seja prejudicada.
Trata-se de um projecto cujo desenho, feito pela Direcção do Turismo, foi apreciado pelo Governo provincial que, por seu turno, o encaminhou aos órgãos centrais para decisão final. O governador descarta a hipótese disso trazer um novo conflito resultante da impossibilidade de as comunidades explorarem para a sua subsistência os recursos naturais localizados nas zonas vedadas.“São as próprias populações que estão a indicar os locais a vedar”, disse Mathe, para quem as outras regiões com os mesmos problemas, como a faixa do Rovuma, poderão se sentir aliviadas com as actuais medidas, se bem que, disse, os animais usam os mesmos corredores.
Maputo, Quarta-Feira, 8 de Agosto de 2007:: Notícias

8/10/06

Cabo Delgado - Multa perdoada a coutada de caça.


O ministério do Turismo anulou a multa arbitrada pela sua Direcção Provincial, em Cabo Delgado, contra a coutada de caça da "Negomano Safaris", situada no posto administrativo de Maioroto, distrito de Montepuez, cerca de 370 quilómetros da capital provincial, Pemba, por armazenamento de recursos florestais e faunísticos sem autorização e violação do período de defeso geral e abate de espécies raras, ameaçadas e em vias de extinção.
Um auto de notícia, com o número 01/DPTUR/CD/02, acusava um dos sócios-gerentes, Manuel Carona, de ter cometido tais infracções, tendo em consequência, o juiz das execuções fiscais, em Cabo Delgado, ordenado a interdição da exportação de trofeus de elefantes e outros provenientes da coutada, antes que a multa, no valor de 6.156.600.000.00MT fosse paga. Entretanto, confrontada com esta realidade, a empresa declinou o pagamento, imputando a responsabilidade a um dos seus sócios, no caso, Manuel Carona, que, por sua vez, não reconhece os factos, porque inexistentes e aliou-os a uma pretensa necessidade de o difamarem para que saísse da sociedade.
Por outro lado, Manuel Carona, entendeu que a ser paga a multa não seria por si, individualmente, se bem que não teria agido por conta pessoal, mas sim ao serviço da empresa "Negomano Safaris", pelo que impôs recurso, sobretudo porque o facto estava a afectar a sua vida profissional.
No 11 de Julho do ano passado o recurso chega ao ministério de tutela, que depois de analisado, concluiu-se que as posições factuais, apresentadas pela Direcção Provincial do Turismo, em Cabo Delgado, designadamente o relatório do inquérito, bem ainda o culminar com o respectivo auto de notícia, o procedimento processual na sua instrução e compulsando com o recurso hierárquico apresentado por Manuel Carona, era de acolher a reclamação. "Também procede o facto de que já decorre muito tempo e as pontas de marfim dos elefantes abatidos tempestivamente foram recuperadas pelo Estado e desde essa altura não se reportam mais actividades ilícitas por parte da sociedade, nem por parte dos sócios e gerentes em litígio", lê-se da conclusão.
Deste modo, tanto Manuel Carona, quanto a empresa "Negomano Safaris" não são responsabilizados pelos factos praticados e porque o processo não terá sido legalmente instruído, entre outras lacunas, que a queixa da Direcção do Turismo, em Cabo Delgado, teve no tratamento da matéria.
Maputo, Quinta-Feira, 10 de Agosto de 2006:: Notícias

4/08/07

Cabo Delgado - FLORESTA DE SANGUE.

1971. Moçambique/Norte. Manhã de cacimbo fresco. Folhas de cajueiro velho, perdido na mata, choram gotas de orvalho na picada estreita de matope enrijecido pelas tardes quentes. Perto, aves sinistras lançam, a espaços, silvos irritantes por entre centenários embondeiros.
Nada mais se ouvia ao redor. A noite acabava fria, silenciosa e calma, não fora uma gazela atrevida infiltrar-se, em desenfreada correria, cortando o círculo, por entre as três dezenas de fardas negras que, em alvoroço, viram o seu fraco repouso interrompido, num bater de coração mais forte, num aperrar de armas tão nervoso quanto inesperado.
Era um novo dia que rompia, um novo dia que até nem contava. Era só mais uma data, apenas, para rapazes já homens, a quem o dever não permitia calendário de vida. O de morte também podia servir para a contagem indiferente de uma manhã que surge numa floresta sem horizonte.
O Comando havia sido claro na ordem que transmitira. Aquele grupo de homens, fracção duma força de combate estacionada algures no Norte de Moçambique, teria por missão interceptar um grupo inimigo, fortemente armado, que dias antes atacara e saqueara um aldeamento de nativos. O resto era com eles. A zona conheciam-na bem, os perigos não contavam e o medo não era o melhor conselheiro para quem queria conservar a "pele" naquela guerra traiçoeira onde, por vezes, era imperioso "dar" primeiro.
O alferes Carrilho que, com dois furriéis e enfermeiro eram os únicos europeus entre homens de rostos bronzeados, nados junto ao Índico, dava as últimas instruções ao grupo, antes da partida para o terceiro dia de marcha. Os sacos de campanha, acomodados sobre as fardas húmidas e sujas, haviam já sido aliviados de algumas latas de conserva de porco, gordurosas, que só o negro Manjate, fruto recente das Missões cristãs, comia. Os outros, por Alá, nem cheirá-las...
Mais leves, olhos já lavados no orvalho do capim alto, em fila espaçada, aproximavam-se já dum trilho batido, detectado na véspera pelo pisteiro Capoca, um recuperado à Frelimo, a que nada escapava. Por isso, lhe chamavam "o Perdigueiro".
Ali mesmo fora decidido montar a emboscada. O inimigo, com o saque e elementos da população raptados, poderia escolher aquele itinerário para a retirada mais para norte, para recônditos e mais seguros refúgios, em região onde se pensava estar implantada a Base Manica.
E, quando os cortantes raios de sol tropical já rasgavam as copas frondosas do arvoredo, os homens de negro, espalhados por entre os arbustos, aguardavam silenciosos. Esperavam na incerteza....mas esperavam. Afinal, aquela até era uma guerra de espera.....espera de um final que tardava em acontecer e o último capítulo daquela rude aventura de anos era uma assustadora incógnita....O silêncio doía muito! Aquele "silêncio" era duro! Via-se no rosto do comandante. Ele próprio preferia gritar bem alto. Ouvir o eco da sua voz lançado pelos rochedos soltos. Queria gritar que não queria a guerra, mas que não tinha medo. Talvez para assustar esse mesmo medo. Queria não pensar em nada, automatizar-se, mas aquele marasmo de silêncio, que já durava horas, punha-lhe o cérebro mais desafinado que a barulhenta fanfarra do Batalhão.
Nada mais aconteceu naquele dia que desse outra cor àquele quadro vivo de corações enervados.
Com o cair da tarde, o alferes incumbe o Ferreirinha, um baixinho furriel europeu, quase no fim da comissão, da retirada para pernoita. Impunham-se cuidados especiais neste "mudar de sítio": o local onde haviam pernoitado na véspora não servia. Nem em tal pensar! "Por o periquito nunca mudar de ninho é que lhe roubam os filhos", dizia o Ubisse, um homenzarrão negro que não largava a metralhadora mais pesada do quartel.
E foi afastado da zona, o novo local de pernoita que, afinal, não era diferente: as mesmas árvores, o mesmo pouco céu, a mesma terra seca, os mesmos pássaros e, até, os mesmos semblantes sofridos do pessoal.
- Meu alferes, isto já não dá nada! Quase não há ração, a água é pouca e os "turras" já passaram por outro lado!
Este era o estribilho do enfermeiro Correia, um dos poucos europeus do grupo. Estribilho que, mais uma vez, ensaiou aos ouvidos do Carrilho, já habituados aos alvitres conselheiros do cola-adesivos lá da malta.
E, quando o alferes lhe retorquiu não se poder retirar sem a certeza de que o inimigo havia passado para norte, lá foi o Correia, coçando o barrete salpicado de mercúrio, embrulhar-se por entre as ligaduras e bebericar a água a que ele, para desinfectar, dizia, juntava álcool. Só que o mordaz Sacura afiançava que o Posto de Socorros estava quase todo na barriga do Correia!....Eram já 10 da manhã do outro dia. Mais cinco horas eram já passadas daquele dia em nova espera. De novo o silêncio, de novo a quietude ansiosa de outra emboscada junto trilho adversário.
- Isto é demais, meu alferes! Que se lixem os turras! Já nem água tenho, quan do é que isto acaba? –sussurrava interrogativo o furriel Bazuca, um minhoto novato, dois meses antes largado pelo Niassa naquelas longínquas paragens.
- Estabelece ligação rádio com o Comando, que eu quero falar com os gajos! – balbuciou o Carrilho, também já preocupado com aquela situação nada agradável.
E foi de abatimento o encolher de ombros agitado e discordante do grupo, quando se espalhou a resposta do oficial de operações.
- Porra, mas quando é que a malta atinge o Rio Montepuez? Em vez de irmos para o Messalo onde eles se acoitam, vamos para sul? E se não encontrarmos água até lá? E o que vamos comer amanhã se a ração está a acabar?
Ninguém respondeu ao Correia, de novo a espalhar pessimismo, qual Velho do Restelo das selvas africanas.
Mas a ordem era para cumprir, estava acima de qualquer desabafo, era superior a qualquer dúvida ou rezinguice do pessoal. E, bem no íntimo, eles tinham a noção disso, mas aquelas "bocas" descontraíam e davam as energias que iam faltando.
Estava prometido o abastecimento hélio para a tarde do outro dia. Viriam mais umas caixas de alimentação pré fabricada.... A água, só por sorte se encontraria, a não ser quando atingissem o rio, para sul, razoavelmente caudaloso e onde, na anterior operação, o Capoca havia colhido um bom Kg de camarão. Ricos rios que até camarão davam! A malta até se imaginava os balcões da Portugália.....
A progressão era lenta, por perigosa. Por vezes, a indicação do "cinco" da frente, periodicamente rendido, o grupo abria em linha, metade para cada lado do trilho inimigo que seguiam, não fosse uma rajadas traiçoeiras, por detrás de um tufo de vegetação mais denso ou de uns rochedos soltos, surpreendê-los. Para triste e doloroso exemplo chegara o que, dias antes, acontecera ao alferes Marques, um jovem quase formado em Medicina, que se vira privado da perna direita, quase esfacelada.
Este tipo de avanço era difícil, mas necessário, e retardava um pouco o andamento que, em tais circunstâncias, não chegava aos dois Km. por hora.
Eram já duas da tarde. O sol, na vertical, jorrava vagas de calor inclemente sobre os corpos suados. O Ferreirinha largava imprecações minuto a minuto, quando uma aborrecida micose lhe ardia ao roçar as calças de caqui... e o sacana do Correia só levava mizórdias... acusava o furriel.
De repente, tudo pára. Num movimento sincronizado, qual grupo de bailado rítmico em estreia no Olímpia, todos se deitam, sem ruído, indicador a tremelicar, hesitante, junto ao gatilho. Mas não soaram tiros. O passa-palavra chegou depressa aos últimos homens que, já levantados, sorriam: uma jibóia, que mais parecia o tronco de uma umbila, atravessara-se no trilho, pachorrenta e indiferente a tantas espingardas.
- Mata-se, meu alferes? – perguntou o Ambasse, um maconde esguio, especialista em liquidar cobras daquela envergadura, arrastando-as vários metros pela cauda, com o auxílio de um pau-forquilha.
Não satisfeito nas suas pretensões, ensaiou um esgar de desolação por entre as secas faces tatuadas e juntou-se ao grupo, que já recomeçara a progressão. A jibóia lá ficara, imperturbável, a digerir os restos de qualquer gazela azarenta.
O sol já declinava. Não sendo viável atingir, ainda de dia, o Rio Montepuez, objectivo que, no momento, os movia, com as calças a balançarem largas e soltas debaixo das cartucheiras pesadas, pensou-se em calar o estômago contraído. Não tinham aqueles homens, já bastante identificados com a vida no mato e com os perigos que lhe eram inerentes, por hábito tomar a última refeição, ligeira, no local da pernoita. O Carrilho sabia bem quanto lhe tinha custado, um ano antes, livrar-se das carnívoras formigas a que, muito a propósito, apelidavam de "cadáver". Fora uma noite de sofrimento: os detritos, o cheiro das latas engorduradas, eram um tentador convite para aqueles bichinhos gulosos. E apareciam de todo o lado, como que chamados por batuque festivo ao banquete real que a carne odorosa da malta lhes oferecia.
Assim, havia que comer qualquer coisa antes de anoitecer e do descanso, pois impossível seria romper às escuras por uma selva tão fechada.
E foi nessa paragem que o alferes caiu num daqueles erros negligente, ele que não costumava facilitar em questões de segurança. Quando num trabalho de nomadização, em que se andava pelo mato em busca de indícios que levassem ao encontro do inimigo, mas ainda se não seguia qualquer pista, era natural que em qualquer lado se fechasse o circulo para a refeição. Não era este o caso, pois seguia-se um trilho que os guerrilheiros utilizavam. E a norma seria deixar metade da força emboscada junto àquele, enquanto o resto se afastava uma meia centena de metros. Passados uns dez ou quinze minutos, tempo suficiente para tragar umas sardinhas em azeite e umas quantas duras bolachas, haveria a troca do pessoal.
- Como a refeição tem de ser breve, comemos mesmo aqui. Manda abrir o circulo e avisa o pessoal para que se não demore. - E lá foi o apressado furriel Bazuca dispor os homens naquela roda rotineira que fazia lembrar o circulo das caravanas de caras-pálidas perante a iminência de um ataque de Apaches, que o faziam vibrar junto à caixa televisiva, na sua meninice não muito remota.
Foi, então, que um tiro seco soou. Seguiu-se um desordenado e barulhento pegar nas armas em repouso junto aos joelhos dos fardas-pretas, ocupados a esburacarem as latas da ração. Ouvidos atentos, olhos a girarem em todas as direcções, interrogativos, numa fracção de segundos.
De repente, o ar em volta é cortado por uma sinfonia macabra de tiros, rebentamentos e gritos de ordem que não se ouviam.
-UIO-MAMA! - E os homens levantam-se, de armas apontadas. O grito era o sinal já antigo que os elementos em confronto lançavam para avisarem os mais recuados que o inimigo debandava e era o momento de os perseguir. O pessoal da retaguarda cala as armas, enquanto a secção avançada continua a disparar sobre o adversário em fuga.
Foi breve a perseguição. Tinha que o ser quase sempre, quando os poucos guerrilheiros se dispersavam por entre a mata densa. Seguiu-se a batida em linha, para detectar armamento abandonado no confronto.
- Eu sabia que ela estava aqui, meu alferes! O gajo deve ir ferido, porque eu atirei-lhe num braço!.... - e o Jonange, com os dentes afiados por debaixo dos seus lábios espessos, sorria, exibindo uma "Simonov" ainda nova, oriunda do bloco soviético, o maior arsenal da Frelimo. Outros haviam, também se encontravam armas de origem americana e de potências ocidentais.
- O artista vai mesmo ferido, - dizia o ferreirinha, ao inspeccionar a semi-automática com umas gotas de sangue ainda fresco, ao longo da bandoleira de caqui.
Não eram mais do que cinco os inoportunos estraga-jantares, mas foram mais do que suficientes para agitar e desgastar, ainda mais, aquela trintena de homens já cansados.
Seguiu-se o afastar do local para o "estudo da situação" que o Carrilho costumava fazer nestas situações, não só para se inteirar dos pormenores do confronto, mas também para acalmar os homens ainda agitados, com o coração a bater forte e os ouvidos a repetirem, teimosamente, o eco da metralha.- Foram eles que deram o primeiro tiro, meu alferes. O Amisse estava levantado a afiar um pau para tirar o ananás da lata. Foi para ele que os turras dispararam.
- E porquê tanta demora a responderem? - interrogou o Carrilho, fitando o velho cabo negro, que fora caçador de elefantes lá para as serras do Niassa.
- Nós só os vimos quando voltaram a fazer fogo. Foi então que o Jonange começou a disparar sobre os gajos....
Já escurecia. O alferes estava desolado. Irritado mais consigo próprio por ter falhado daquela maneira de checa principiante, que já não era. Mas que raio de azar aparecerem logo naquela altura! E, pior ainda, não era o grosso da coluna inimiga que tinha por missão deter. Cinco homens seriam, ou uma guarda avançada ou, o mais provável, emissários enviados ao "quartel-general" da área, algures mais a norte, dando conta dos resultados do ataque ao aldeamento, ou na procura de remuniciamento, pois os guerrilheiros quando perpetravam qualquer ataque eram "generosos" no gastar de munições, que não podiam armazenar em grandes quantidades.
Mas tudo isto eram conjunturas falíveis.
- E se os tipos recuam e vão avisar os outros que estamos a tentar apanhá-los? Já não dou nada por isto! - desabafava o Ferreirinha, sem deixar de coçar a micose que naqueles momentos de tensão ainda mais o importunava.
- Não devem ir, meu furriel, - interrompeu o Capoca, com o seu ar de sabe tudo -, eles quando vão para qualquer sítio já têm combinado o local de encontro no caso de serem atacados. Separam-se agora na fuga, mas vão juntar-se lá mais à frente, para continuarem a marcha rumo ao seu inicial destino.
O Carrilho apostou nesta versão. Não só pelas provas de intuição guerrilheira que o "Perdigueiro" já havia dado, mas pelo facto de ter sido já combatente activo da Frelimo. E, vá-se lá saber porquê, era considerado "acima de qualquer suspeita"...
Não houveram baixas nos fardas pretas. Apenas uma camisa furada e um ligeiro arranhão nas costas do Amisse, onde o Correia já colocara mais um adesivo.
A noite marcou-lhes encontro quando já procuravam local próprio para mais um descanso. Não o foi muito, porque os nervos excitados ainda não haviam atingido o "rilex"; tão difícil de conseguir naquela guerra desgastante, nada convencional.
O outro dia seria mais complicado. A ração, em termos logísticos, já havia acabado, não obstante o pouco apetite do dia anterior e o "calo" de poupança do pessoal guardassem umas latas providenciais. A água é que molhava poucos cantis. Ma o rio seria atingido pela manhã e o reabastecimento "hélio", já prometido, era esperado à tarde.
- Falta muito para chegarmos ao Rio Montepuez? - pergunta o Ferreirinha, quando já tinham duas horas de marcha do novo dia, eram, então, seis e meia da manhã e o sol já raiava há muito por entre o arvoredo, agora mais verdejante e espesso, com o aproximar do rio tão desejado. E o Alberto, uma macua que vivera naquela zona, agora deserta, muitos anos, até que a guerra chegou, e onde tinha a sua palhota e uma grande machamba de mandioca, aponta para o céu sem nuvens e, indicando um ponto imaginário, respondeu ao ansioso furriel:
- Se não pararmos, quando o sol estiver ali, já estamos no rio.
Não foram muito enganadores os dados do velho cabo Alberto. Pouco passava das onze, quando o grupo atingiu a margem de vegetação densa e viçosa do tão familiar Montepuez. O trilho, que nunca haviam deixado de seguir, bifurcava-se ali e perdia corpo, para se transformar numa manta de abundantes pegadas, por entre o tufo de lianas entrelaçadas em árvores de copa larga.
Era aquele o local pretendido para a última tentativa de interceptar o inimigo no seu regresso de ataque ao aldeamento.
Para o Carrilho, que não deixando de respeitar, no essencial, as ordens que recebia, valia bem mais o seu objectivo pessoal e o melhor que se podia conseguir daquela missão era subtrair do controlo do inimigo os elementos da população por ele raptados no aldeamento e que, segundo indicação rádio, rondavam as 20 pessoas. Ele sabia que aquela gente não ia de vontade. Conhecia bem a realidade macua. Se fosse da sua vontade, oportunidades para se juntarem aos guerrilheiros da Frelimo não lhes faltavam, atendendo ao isolamento da aldeia, onde se dedicavam ao cultivo de produtos para sua subsistência e de rendimento, como o algodão e o caju. Os macuas eram pacíficos, queriam paz e não se deixavam aliciar pelos insistentes convites dos "mabandidos", como então chamavam aos guerrilheiros.
Daí as retaliações frequentes, caracterizadas por um vandalismo primário, pouco compatível com o alardear de intenções libertadoras que apregoavam. Daí, também, o desprezo, a raiva incontida que alimentava uma fogueira de vingança no peito daqueles negros fardados, que deram a algumas forças expedicionárias, exemplos de coragem e de luta interessada, passe a categoria de algumas tropas europeias de elite que se souberam bater com honra.
Por tudo isso, o esforço, o espírito de sacrifício, indiferente à sede e à fome, daquele grupo de fardas negras, preocupado, agora, no encher dos cantis, no refrescar dos corpos sujos naquelas águas transparentes dum rio que desliza em suave paz, alheio aos sentimentos de dor, de medo, de horror àquela guerra e seus terríveis efeitos, de homens que procuravam dentro de si mesmos justificação para uma guerra de irmãos que nunca haviam experimentado. Como acabá-la, como extirpar o ódio, como dizer basta?! Perguntas sem resposta.......
Mas, enquanto estas meditações ocorriam, tratava-se era de cumprir mais uma missão, mais uma peça duma engrenagem bem complicada e havia tão só que a desempenhar o melhor possível, com o profissionalismo a que o dever obrigava.
- A secção do Bazuca já está abastecida de água. Vou agora com o meu pessoal. - informava o Ferreirinha, enquanto o alferes, esticando a antena do Racal, tentava comunicar ao Comando a sua nova localização, atingido que fora o objectivo imediato. O restante pessoal, disposto em linha paralela ao leito do rio, tomava posições, não fosse surgir nova surpresa, enquanto uns vinte metros mais abaixo os outros se dessedentavam.
As três da tarde surpreenderam o Carrilho com o Bazuca e um grupo de cinco elementos a reconhecerem o local da emboscada, que até nem era muito apropriado: a vegetação cerrada, com ramos entrelaçados por sobre a margem do rio, apesar de abrigada e bem camuflada, tinha o inconveniente de não permitir ligação á vista entre o pessoal, mas tinha a vantagem de colher o inimigo na travessia do rio, com pé naquela estação, passe o razoável caudal de água corrente. Outras alternativas não eram mais viáveis.
-Apre, mas aqueles gajos passam por aqui? Esta porcaria está cheia de feijão macaco! - vociferava o Bazuca, enquanto se coçava aflitivamente. Aquele pó que as malvadas feijocas libertavam ao serem tocadas era mesmo demoníaco! Irritava bem mais que um bravo urtigal das Beiras. E o comichão não passava, sem que a pele ferida de arranhões fosse esfregada por providencial cinza de queimada recente. Era, naquela região, um dos maiores inimigos que a vegetação tropical lançava contra o homem.
- Os tipos têm a pele dura, não barram as orelhas com creme Nívea, como o meu furriel....-zombou o Correia, que não deixou de ir meter o espevitado nariz no breve trabalho de reconhecimento.
Vinte minutos depois já quinze homens estavam dispostos ao longo da margem, com o rio e o lado oposto à vista, numa linha que, por força da natureza do terreno, não teria mais que quarenta metros de extensão. Os restantes quinze ficaram recuados a uns trinta metros dos emboscados e tinham por missão fazer face a qualquer, pouco provável mas não impossível, aproximação do inimigo pela retaguarda.
Renderiam os outros duas horas depois e, no caso de surgir o grupo inimigo, ocorreriam para os flancos, em reforço do pessoal da frente.
Mas tudo começou pouco depois. O Inferno, numa aparição contraditória, abriu-se, abrasador, por entre as águas frescas do rio e passou-se a meia hora mais longa na vida destes combatentes, passe o facto de já estarem habituados a situações de confronto.
Aquela foi diferente, foi desumana, terrível!....
Haviam sido dadas instruções para que só se disparasse quando o inimigo surgisse em grande número, já dentro de água. Mas ele usava das suas cautelas. De início, só dois guerrilheiros entraram na água. O grosso da coluna aguardava em fila, do outro lado.
Não arriscavam de qualquer maneira. Os ensinamentos colhidos pelos chefes na China e URSS haviam sido bem assimilados. Viam-se os primeiros três estáticos, aguardando que os dois primeiros fizessem a travessia....
E não se sabe quem abriu as portas daquele inferno trovejante, quando aqueles divisaram o cano brilhante de uma G3 menos escondida. Quais molas de aço, atiraram-se em cambalhotas aquáticas, disparando sempre, até caírem atingidos dentro de água.
Foram as primeiras vítimas. Os outros recuaram, retomaram posições e despejaram sobre os quinze emboscados quantas armas traziam.
Seguiu-se um tiroteio intenso, medonho. Três bazucadas inimigas fizeram lume por cima das lianas esfaceladas, por sobre a cabeça do Ferreirinha. Os gritos confundiam-se com o rebentar constante das granadas que levantavam água fervilhante. Gritos de dor, à mistura com outros de incitação, davam àquele quadro incandescente um reflexo de luta e morte.
Os abutres não tardariam a esvoaçar sobre ele!...
O grupo inimigo era numeroso e aguerrido. Notara-se logo, aos primeiros disparos. Mas, se alguém tinha que abandonar o terreno, seriam os guerrilheiros. Eles sabiam-no e convinha-lhes por estratégia, mas a força do seu número e armamento davam-lhe inusitado ânimo de experimentarem o pulso dos fardas negras, talvez, também, para darem cobertura e tempo à retirada da escolta com a população raptada. Só eles sabiam......
- O morteiro, depressa! - grita o alferes, correndo por entre o capim ao encontro do apontador Zé João, um misto landim muito dedicado.
Era o último recurso. Quando a força inimiga era forte, insistente e bem armada, só o rebentar das granadas de morteiro 60 a podia desmoralizar. E, em catadupa, foram caindo na outra margem, com uma impressionante regularidade, dez granadas que elevavam por cima das copas, uma nuvem de folhem seca.
As armas ligeiras foram-se calando, pouco a pouco.
- Meu alferes, temos um morto. O Manjate já não tem vida.. - gaguejava o Correia, com o rosto lívido e os olhos desorbitados a jorrarem lágrimas envergonhadas, - também há feridos, mas ainda os não alcancei. Estão entre as lianas. Eu oiço-os...-e já corria com a caixa de medicamentos por entre o arvoredo.
O eco da metralha calara-se de vez. Só a vozearia excitada e os chamamentos aflitos, entrecortados por gemidos de dor, se ouviam.
Além da baixa do Manjate, atingido em cheio no peito por estilhaços de granada de bazuca, haviam mais três feridos, com alguma gravidade.
Já o furriel Bazuca, com o pessoal que acorrera aos flancos, atravessava o rio em corrida. Era a perseguição ao inimigo que se sabia levar feridos. Os dois mortos, tombados na água, lá contiuavam...
Os homens que sofreram o impacto directo do combate, reagrupavam-se sob a orientação do Correia; transportavam os feridos para local mais aberto e recuado. Um deles era o Ferreirinha, o veterano que, a dois meses do fim da sua comissão, gemia e jorrava sangue. A bala ficara-lhe alojada no antebraço. Talvez no osso.
- Já pedi a evacuação. Depois desta merda acabar, vamos directos à estrada de Macomia que fica mais próxima e, às nove horas, a Companhia de Muaguide tem viaturas para nos recolherem. Disse-lhes para não trazerem rações.....ninguém tem fome depois desta porcaria....
O Bazuca, com o pessoal empenhado na batida no outro lado do rio, tardava em aparecer. Mais do que o braço do Ferreirinha, o Carrilho notava a atrapalhação do Correia às voltas com o Ambasse, com um estilhaço de granada alojado na cabeça. O seu aspecto não era assustador, mas o enfermeiro sabia, por experiência, do perigo de tal ferimento. O braço do furriel, a que fora estancado o sangue, ia inchando assustadoramente. Não lhe faltava o ânimo, alimentado pelas palavras reconfortantes do Carrilho, mas não escondia a dor que começava a sentir, cada vez mais forte.....
Os olhares sofridos do pessoal evitavam o corpo do infeliz Manjate, coberto por um abafo de pescoço. Era a primeira mortalha de um negro jovem, que nunca deixava de estar nos locais mais perigosos da luta.
No emaranhado de sentimentos que assaltavam os seus camaradas, ainda não viera à superfície a dor profunda que os dominou, largo tempo, no perder dum companheiro de armas....
- Meu alferes, lá vêm os passarinhos! - informou o Amisse, apontando para os dois helicópteros vindos do horizonte baixo.
Aproximavam-se. Um pouco acima, um barulhento T6 dava-lhes protecção.
A clareira da retaguarda serviria para a aterragem, apesar do capim alto. Montou-se segurança e uma granada de fumo largou um espesso cogumelo.
- E o Bazuca que não vem com a malta! Se houverem feridos dos gajos ou da população raptada, não são evacuados!
Já se fazia tarde e a Força Aérea não faria evacuações nocturnas. Mas, de momento, interessava prestar assistência aos nossos feridos.
Não muito do agrado da tripulação, lá se conseguiu meter o Manjate, o primeiro morto dos fardas pretas desde que há cerca de dois anos o Carrilho os comandava. Teve que viajar no "hélio" com boletim de ferido. Teria um funeral mais digno e humano que aquele que, localmente (na base), lhe poderia ser oferecido.
E quando os helicópteros, barulhentos, se elevavam lá no alto, algumas lágrimas teimosas saltavam dos olhos de homens endurecidos no calor da selva e da metralha, de corações forjados na selva inóspita em fortes laços de cumplicidade. Mas eram homens, sensíveis como todos os outros....alguns bem mais ainda. Não eram mariquices aquelas lágrimas que lhes rolavam pelas faces....começavam a compreender o mundo, a vida, à custa de sofrimento e de morte. À custa de si próprios....
- Já chegaram ao rio. Trazem muita gente com eles! -avisou o Zé João, agarrado ao morteiro 60, que nem a dormir largava. E vinham mesmo. O Jonange trazia mais cinco armas que não eram as suas: três Kalascnicov e as duas Simonov molhadas que, entretanto, retirara do rio. O Ubisse, como se a sua pesada metralhadora lhe não pesasse, exibia duas granadas de bazuca. Outro maconde carregava com dois sacos de papéis e, com a habitual graça, ia informando, zombeteiro, que "os gajos queria montar no mato mesmo o gabinete do administrador....".
Com os últimos cinco homens, vinham, então, elementos da população do aldeamento atacado. Com eles haviam perdido grande parte do tempo, pois cada qual dos civis se esquivara para seu lado, ao soarem os primeiros tiros. Outros teriam mesmo fugido do local e tentariam, por certo, alcançar a aldeia donde haviam sido raptados.
Tal não acontecera ao filho duma velha negra, que chorava copiosamente: ao tentar subtrair-se à vigilância dos frelimos, fora abatido, de imediato.
Um velho, de peles secas, que diziam ser importante conselheiro do aldeamento, andava com muita dificuldade. Dos dedos dos pés, mordidos pelas micaias espinhosas, jorrava sangue a cada passo.
Não tinha descanso o Correia, naquele lúgubre fim de tarde.
- Os tipos eram muitos, meu alferes – diz o Bazuca, que , mal chegou da batida final, se encostou, hirto de cansaço, a um pequeno arbusto. -Diz esta gente -apontando para uma dezena de populares de ambos os sexos e variadas idades -que devem ser à volta de setenta. São oriundos de várias bases e só se reuniram para este ataque ao aldeamento do Longote. Além dos que tombaram no rio, encontrámos mais um, logo na margem, e outro já mais longe. Levam feridos, pois há rastos de sangue, devem tê-los carregado. Só lá estava este! - e de dedo em riste apontava para um maconde muito jovem, 16...17 anos, já sob os cuidados do enfermeiro. Não gemia, só lançava, a espaços. Gritos de dor. Tinha a perna bastante ferida, talvez pelo rebentamento de uma das granadas de morteiro.
- Temos de o carregar. Tratem de improvisar duas macas de ramos, pois o velho também não consegue andar e temos de atingir a estrada de manhã cedo. Vamos pernoitar mais à frente. O Alberto, que conhece bem a zona, ainda que nos vá custar, pode guiar-nos mesmo no escuro, para ganharmos algum tempo.
Foi, então, que parte dos fardas pretas começou a rodear o alferes, com um semblante estranho, a passos lentos mas decididos.
- Que quem vocês? Mexam-se que temos que arrancar daqui!...
- Nós queremos dizer-lhe que só carregamos o velho, meu alferes. O turra fica! Morto ou vivo, não interessa. Mas nosso não vai carregar com bandido que matou Manjate!
E travou-se um diálogo acalorado, nada agradável. O Carrilho olhava para o Bazuca, como que pedindo reforço de argumentos, mas aquele, ainda encostado aos arbustos, limitava-se a passar as mãos pelos cabelos desgrenhados....
- Vocês não sabem que é crime abandonarmos um homem ferido, seja quem for? Também gostavam que eles vos fizessem o mesmo? Guerra é guerra, mas o combate já acabou! – insistia o alferes.
- Eles fazem pior! Então porque é que os gajo quando apanha os milícia na picagem mata aqueles que ficam feridos nas armadilhas? Aquele meu primo Silale que ficou escondido na mata, não viu eles darem tiro na cabeça daquela gente?!- explodiu o Capoca.
- E meu alferes já esqueceu o que turras fizeram com seu primo cantineiro lá em Ancuabe, um homem que nem arma tinha e eles mataram junto com senhor Daniel do algodão, lá na estrada de Moja?! – observa o Zé João, num tom mais respeitoso, mas com mal contida raiva.
O Carrilho viu-se perante um dilema que não esperava enfrentar. Aquela atitude de quase insubordinação geral, perante a indiferença comprometedora do furriel e do Correia, tomava foros delicados, de indisciplina.
A muito custo, depois de lhes lançar o ultimato de que pediria para abandonar o G.E. logo que chegassem ao Quartel, caso a recusa de transportar o "turra" ferido, lá o foram carregando, contrariados e vociferando impropérios contra o frelimo que, afinal, era tão só mais uma vítima de guerra, de que pouca culpa também teria. E que, mais do que trazer no peito a ânsia de independência, mais não era do que um joguete de interesses internacionalistas e dos jogos de poder de altas potências.
E a abatida caravana arrancou daquele local sinistro, que ficaria gravado para sempre nas suas memórias.
Local de morte, de desolação, que poderia ser de trabalho e de paz.
Mais um pedaço de vida ficava ali perdido por entre lianas entrelaçadas que as balas raivosas cada mais desuniam.
No lodo das margens daquele rio ficavam enlameados bocados de almas de jovens que pretendiam conseguir o que, viu-se mais tarde, responsáveis não souberam respeitar, indiferentes aos sentimentos duma população que procurava fraternidade e entendimento.
Indignos do sacrifício de tantas vidas foram uns e outros. Uns por teimosia doentia, outros por incompetência e outros, ainda, mais recentes, por pressa e traição vergonhosas, quando decidiram ao total arrepio da vontade das populações.
FIM - Francisco José Branquinho de Almeida*
*O Autor - Francisco José Branquinho de Almeida - Cumpriu campanha militar atuando no Grupo Especial (GE) 201, no tempo de Moçambique colónia, como ex-Furriel Miliciano e ex-Alferes Graduado do Exército Português. Este conto também poderá ser lido aqui: Moçambique - Guerra Colonial - Floresta de Sangue.